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Carta

A primeira vez que contemplei a possibilidade da sua futura existência foi numa internação psiquiátrica, fazendo esculturas de argila numa sessão de terapia ocupacional. Eu, que com vinte e dois anos recém completados já acreditava que a minha vida havia acabado, fui obrigada a representar artisticamente algum motivo que me fizesse me querer viva quando fosse liberada da clausura da clínica. Eu, que até então gritava aos quatro ventos que JAMAIS seria mãe – não por odiar crianças ou por qualquer idéia antinatalista idiota –, mas por ter visto a minha mãe e a mãe da minha mãe que também é minha mãe (como eu espero que a sua avó também seja para você) fazerem tantas concessões simplesmente para me manterem viva! Por ter certeza de que eu, tão desequilibrada, tão instável e irresponsável nunca seria capaz de te oferecer tudo o que me foi oferecido enquanto criança. Eu tinha medo, filha. E por me achar incompetente em todos os aspectos eu decidi, ainda muito jovem, que você nunca viria. Além disso, haviam outros motivos que me davam repulsa da idéia de te trazer ao mundo: Eu conhecia o mundo. Inconscientemente eu já te imaginava, na minha mente você era tão parecida comigo quando menina que isso me dava pânico. Inconscientemente, eu sabia que eu não estaria ao seu lado em todas as horas do seu dia e pelo resto da sua vida para te proteger com a minha das coisas que infelizmente estamos expostas por termos nascido assim, meras meninas. Nem todo o cuidado das minhas mães – que não por um acaso também eram mulheres trabalhadoras e que nunca falharam em nenhuma das duas funções – foi capaz de me proteger do mundo. Quando você tiver idade suficiente para ler essa carta, muito provavelmente você já terá percebido: Este mundo não nos pertence. Ele nem sempre será gentil conosco. E tudo o que eu havia feito até então tinha sido remendar os estragos que ele me causou e lutar por uma sociedade onde eu pudesse pertencer sendo menina, mulher... E sem que novos estragos fossem feitos. Eu pensava nas décadas que eu possivelmente ainda viveria e me enchia de horror com a certeza de que outras coisas, talvez ainda piores, me aconteceriam. E elas aconteceram. De novo, de novo, de novo e de novo. A luta perdeu o sentido, eu me via impotente, completamente refém do destino. Foi então que eu parei de pensar nas décadas que eu possivelmente ainda viveria e decidi não viver mais. Nem mais uma hora. E aqui voltamos à clínica:

Filha, nessa época eu só pensava em mim. Meus medos, meus traumas, meus neuroreceptores defeituosos, eles me cegaram para minha família, meus amigos, minha carreira, meu potencial, meus prazeres, para todas as bençãos que eu recebia, mas que decidi deixar para trás. Mesmo antes de você existir, por isso te peço perdão. Depois de muito apoio, o mesmo apoio incondicional que te prestarei, eu já me perdoei por tudo isso. Mas esta carta não é para mim, é para você. Para te falar das coisas que eu queria ter escutado antes de me permitir chegar a este ponto. Quando te esculpi em argila pensando sobre como você seria um motivo forte para me manter viva, meu mundo mudou para melhor. A simples fantasia da sua existência me deu um novo senso de esperança, de comprometimento, fez com que eu me sentisse capaz. Fez com que eu quisesse me tornar a inspiração de alguém que não se inspiraria em mim pelas minhas conquistas acadêmicas ou profissionais, mas pelo meu amor. Ágape. Absoluto. Puro. Me fez entender que as concessões que eu tanto vi minhas mães fazerem foram feitas por este mesmo amor e que elas, como eu, também eram mulheres de carne e osso, cheias de traumas, inseguranças, medos... E ainda assim mães que me dão orgulho. Filha, ainda não sei quem será seu pai ou se ele estará presente conosco na nossa jornada. Apesar de entender que os esforços dispendidos a mim pelas minhas mães foram de coração aberto, também entendo que a maternidade às vezes é um fardo pesado que temos que carregar sozinhas. Se for este o caso, carregarei sozinha o quanto for necessário, porque sei que você também me carregará quando eu precisar da sua ajuda.

Gostaria de te dar alguns conselhos. Se você for como eu fui, talvez não os escutará, até hoje sou um pouco ignorante. Mas, por favor, os escute. Porque eu aprendi tudo isso vivendo e eu não quero que você aprenda assim. Porque eu tive sorte de sair do fundo do poço andando com minhas próprias pernas, privilégio de poucas. A chance de se reconstruir do zero é um artigo de luxo na vida das mulheres.

O primeiro deles é: Esteja cercada de mulheres. Crie sua própria rede de apoio e faça parte da rede de apoio daquelas em necessidade. Aliás, de qualquer pessoa em necessidade, homens ou mulheres. Empatia é uma das coisas mais importantes para se ter dentro de si. E que isso nunca signifique abdicar do seu próprio bem-estar pelo bem-estar do outro. Você precisa estar bem para fazer bem ao mundo. Que isso signifique que você vai entender que o mundo é cheio de injustiças e que você tem o dever de ser um agente que lutará contra elas. Mas se cerque de mulheres. No final das contas, quando somos nós que estamos precisando, elas estarão mais dispostas a te estender a mão.

O segundo é: Ter opiniões não é um defeito. Eu sei quantas vezes te dirão para "se colocar no seu lugar", quantas vezes te dirão que você deve ser uma mocinha, mansinha, que deve omitir suas opiniões para não machucar os sentimentos alheios, especialmente os dos homens alheios. Não se cale. Não permita nem que adultos te calem. Suas opiniões nem sempre estarão certas e quando elas estiverem erradas, saiba escutar o outro lado humildemente e se desculpar pelo erro. Mas sempre diga o que pensa, com educação ou sem, caso uma abordagem mais agressiva seja necessária. Respeite quem te respeita, não tenha sangue de barata. 

Terceiro: Amor não machuca, não humilha, não ofende, não te agarra pelos braços ou te deixa hematomas. Ainda que ele apareça com um buquê de flores depois, isto não é amor. O amor também não te manipula, não te isola de pessoas queridas, não é possessivo, não te proíbe de NADA, não te pressiona a fazer o que você ainda não está pronta para fazer, não faz você se sentir difícil de ser amada. O nome disso é abuso, amor é outra coisa. Caso você se encontre numa situação assim, não sinta vergonha de pedir ajuda. Caso você tenha dúvidas de que está numa situação assim, não sinta vergonha de perguntar. Em qualquer circunstância, pode voltar correndo para mim que minhas portas estarão sempre abertas.

Quarto: Algumas pessoas vão te querer mal, mas muito mais gente te quererá bem. Você é amada, você é importante, você é única e por ser única fará coisas únicas no mundo. Não duvide nunca de que a vida vale a pena, mas caso um dia você duvide, você receberá todo o suporte psicológico, psiquiátrico e familiar que precisar. Doença mental não é vergonha, não é fraqueza, não é frescura: Doença mental é doença e deve ser tratada como tal.

Quinto e último: Mesmo sem te conhecer, já te amo mais do que todas as coisas do universo e se você ainda demorar a chegar, é porque estou me preparando para te receber cada vez melhor. Até nos seus piores momentos, sempre terei orgulho de ser sua mãe.

Tenho certeza de que você nascerá uma menininha bondosa, como todas as menininhas. Não deixe que o mundo roube isso de você. Não seja indiferente às desigualdades do mundo. Desafie o status quo. Desenvolva seu senso de justiça ao máximo. Não aceite ser maltratada ou taxada como um ser humano de segunda classe por causa do seu sexo. Tenha orgulho do seu sexo! Porque nós somos a força criadora da humanidade inteira.

Com todo o amor que cabe dentro de mim, sua futura Mãe.

Agosto de 2019  

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