CAPÍTULO CINCO
|Alicia A. Sanders|
Eu devo admitir que eu nunca fui muito boa com relacionamentos amorosos. Em determinado momento de minha vida eu decidi ter outras prioridades maiores do que construir relacionamentos, me apaixonar, ceder tempo de minha vida para reservar a outra pessoa... Essas coisas sempre foram algo que comecei a deixei em segundo plano, ou terceiro, ou último plano em qualquer hipótese ou situação. Claro que isso não significa que eu nunca beijei, ou nunca transei, ou nunca gostei de alguém, não sou alguém sem coração ou uma frigida. Meu primeiro beijo foi na oitava série e minha primeira paixonite foi na quinta série. Tudo normal. Mas quase sempre foram coisas muito rápidas, descompromissadas, sem importância sentimental verdadeira.
Meu primeiro namoro durou apenas três meses e eu acabei partindo o coração do garoto porque não gostava dele da mesma intensidade que ele, qual é, o cara já estava até mesmo imaginando nosso casamento, e nós só tínhamos catorze anos. E quando percebi eu só tinha um namorado a cada seis meses e que duravam dois meses ou menos ao meu lado. Mas para ser sincera, isso nunca me afetou, meu foco era o meu trabalho, eu preferi uma realização profissional do que um relacionamento amoroso duradouro, se eu tivesse que escolher entre alguém para me beijar, me bajular e assistir filmes comigo no sábado a noite ao invés de ter um trabalho estável, uma carreira promissora e um nome reconhecido pelo meu trabalho.
Não havia dúvidas de que eu escolheria meu trabalho.
Achei que todos que se envolveram comigo tivessem percebido isso antes de se apegar ao relacionamento.
Mas estava claro que Marcelo não percebeu isso a tempo. E isso me deixava com a consciência pesada.
O céu já estava escurecendo sobre mim e o vento no terraço já estava começando a bagunçar meu cabelo e esfregar minhas mãos em meus braços para tentar me aquecer, mas eu não tinha nenhuma pretensão de ir para o meu apartamento agora, não enquanto eu sei que lá embaixo um jantar super caloroso estava acontecendo.
Olhando para baixo, assim tão perto do pequeno muro de proteção, eu percebia o quão pequenos nós, seres humanos, somos comparados ao mundo e mesmo assim parecemos ter uma influência muito maior sobre as coisas do que realmente deveria, principalmente sobre os sentimentos dos outros.
Quando eu parti o coração do meu primeiro namorado eu passei um longo tempo me sentindo culpada pelas coisas que fiz, até que eu percebi que a culpa não era minha por ele ter depositado tantos sentimentos acima de nós dois, e desde então eu nunca mais me senti culpada por magoar alguém ou não atender as expectativas de alguém. Contudo, a figura bêbada de Marcelo, implorando para conversar comigo enquanto eu tentava inutilmente coloca-lo dentro de um táxi, fez meu coração apertar e minha consciência pesar.
Céus, eu era realmente um desastre quando o assunto era namoros e sentimentos não é?
Deveria ter um aviso pregado em minha testa.
PERIGO. QUEBRADORA DE CORAÇÕES. NÃO SE APROXIME.
As coisas seriam muito mais fáceis. Para todos os lados envolvidos.
— Caramba! - a voz surpresa de Rafael me tira de meus devaneios e me faz olhar para trás, para ele, parado em frente a porta entreaberta, com os olhos focados na vista em sua frente, sem nem notar minha presença.
— Vista legal né? - pergunto e sorrio quando ele me olha como se só agora reparasse em mim.
— Mais que legal. - ele se aproxima e dessa vez não tenho nada para implicar com ele, apesar de ser divertido. A aparição de Marcelo foi o suficiente para me cansar mentalmente ao ponto de nem me dar ao trabalho de me importar com a aproximação de Rafael naquele momento.
O que me faz pensar, eu só vi Rafael umas quatro vezes desde que nos conhecemos, porque eu fico tão afetada com a presença dele? Se o acho tão insuportável e insignificantes, porque eu me estresso tanto com ele? Não fazia muito sentido agir da forma que estou agindo se eu realmente não o suportasse, ou sentisse uma antipatia gratuita por ele.
— Também acho. - volto a olhar para as ruas abaixo de mim. Acho que ficar aqui no terraço e pensar em meu deplorável histórico de desastres amorosos e todos os meus problemas com os sentimentos alheios me fez ficar emotiva demais. Eu posso muito bem não suportar alguém e me estressar com isso.
Não tinha problema nenhum nisso.
— Perdeu o jantar. O frango à parmegiana estava uma delicia. - ele começa, se sentando em um dos caixotes que estava jogado pelo terraço após uma tentativa do restos dos condôminos de montar um jardim aqui em cima como no filme "E se fosse verdade...". — E a torta de limão estava incrível, e não só porque fui eu que trouxe. - ele puxou outro caixote e bateu em cima levemente me convidando para sentar ao seu lado.
Isso estava estranho, horas atrás não conseguíamos falar um com o outro algo que não fosse insulto e agora ele estava puxando assunto comigo e puxando um caixote para eu sentar? O que diabos tinha acontecido nesse jantar?
— Espero que tenha sobrado um pouco para mim. - mesmo desconfiada, e com razão, me sento no tal caixote.
— Não posso te garantir. - ele deu de ombros.
— Se não tiver nada para mim será maldade, fiz sala para você. - apontei, fingindo estar indignada com a possibilidade de não ter nenhuma sobra para mim.
— Você chama aquilo de "fazer sala para mim"? Ficamos na mesma sala por dez minutos e metade desse tempo foi trocando farpas, e logo depois seu namorado apareceu e você me deixou sozinho.
— Ei, te deixei com a posse do controle da televisão, a culpa não é minha se você não ligou. Se tivesse ligado teria ficado na companhia de Joey, Phoebe, Rachel, Chandler e Ross.
Ele fez uma careta.
— Quando você começou com Joey, pensei que os nomes que se seguiriam seriam Danny, Jesse, Becky, DJ, Stephanie e Michelle. Quase fiquei arrependido por não ter ligado a televisão. Mas aí você continuou os nomes e eu fiquei aliviado por não ter usado o controle.
É a minha vez de fazer uma careta.
— Eu já tinha suspeitas que você não tinha bom gosto, principalmente quando você apareceu na minha porta com um suéter Oxford, mas agora minhas suspeitas se confirmaram. Como assim você fez careta para Friends?
— Não gosto de Friends.
— Como alguém em sã consciência pode não gostar de Friends? - eu o encaro incrédula.
— Não gostando. - ele dá de ombros, fazendo pouco caso da minha indignação.
— E é por isso que eu não vou com sua cara.
Ele faz uma cara de ofendido enquanto põe a mão no peito para adicionar mais drama.
— Como assim você não vai com a minha cara? Eu sou um amor de pessoa.
— Você? Amor de pessoa? Você é insuportável e antipático.
— Ahn... Não. Eu sou um amor. Isso que você está dizendo é culpa do seu tesão reprimido por mim. - Minhas sobrancelhas se erguem e meu queixo cai sem eu conseguir me conter. — Não te culpo, acredite. Também estaria assim se fosse você e me visse com seus olhos.
Demora até que eu me recupere desse episódio de ilusão egocêntrica. — Culpo os seus pais. - anuncio, quando me recupero.
— Pelo que? - as sobrancelhas dele se juntam no meio do vale que normalmente os separam e ele me olha confuso.
— Por te iludirem tanto quando era criança. Paparicar e mentir para crianças nunca acaba em coisa boa. - balanço a cabeça enquanto dou uma leves batidas em seu ombro como se o consolasse.
— Está me chamando de iludido?
— Pelo menos não é lerdo também. - falo como se fosse um elogio e a cara que ele faz me faz rir descontroladamente.
— Olha só, ela sabe sorrir, pessoal. - ele finge estar falando com uma plateia em nossa frente. — Esse é com certeza um momento histórico, peguem suas máquinas fotográficas e registrem isso, não sabemos quando se repetirá.
Paro de rir e o encaro séria antes de revirar os olhos.
— Você é ridículo. - anuncio.
— Você usa óculos, não é?
— Minha visão é perfeita.
— Cuidado, daqui a pouco vai sair voando com esse seu ego inflado.
— Meu ego inflado? O egocêntrico aqui é você, camarada.
— Eu? Egocêntrico? Já disse, sou um amor de pessoa.
— Para um advogado seus argumentos são bem fracos.
— Para uma jornalista você é irritante de... Ei espera, você é perfeita como jornalista, tão irritante quanto todos os outros.
— Eu sou irritante? É isso que pensa de mim?
— Isso e muito mais, querida.
Levanto do caixote e me aproximo dele, alto o suficiente para ficarmos quase do mesmo tamanho mesmo comigo em pé, assim que ele ficou com a coluna ereta.
— Ah é? - pouso minhas mãos sobre minha cintura. — E o que mais? O que pensa sobre mim, Sr. Engravatado?
Ele também se levanta, chutando o caixote em que estava sentado para dar um passo para trás mantendo uma distância respeitável. Pelo menos isso ele é capaz de fazer.
Ele cruza os braços sobre o peitoral largo e me encara com um sorriso cínico no canto dos lábios.
— Você é enxerida, irritante e mal-humorada.
Como ele ousa?
— E você é insuportável, egocêntrico e ingrato. - cruzo meus braços assim como ele e sinto meu rosto esquentar de raiva.
— Ingrato? O que você sabe sobre mim para me chamar de ingrato?
— Muito mais do que você sabe de mim para me chamar de mal-humorada com tanta propriedade.
— Ah é? E porque diz isso? Qual argumento você tem para me provar que eu sou ingrato?
— Bom, que tal o fato de que eu te ajudei quando você estava no meio de uma crise e você não se dignou nem mesmo a me dizer um "Obrigado". É um bom argumento para você?
— É claro que eu te disse obrigado, você que não deve ter ouvido.
— Agora também sou surda? Quer saber, Rafael. Tchau. Não sou obrigada a ficar na presença de um engravatado egocêntrico. - marcho a passos pesados e largos até a porta do terraço.
— Ótimo, porque eu também não sou obrigado a ficar na companhia de uma jornalista irritante.
Abro a porta e saiu do terraço, batendo a porta com força em seguida, apenas para abrir novamente e deixar entreaberta já que ela não abre por fora.
Apesar daquele insuportável merecer passar a noite ao relento.
[💔]
Atualização fora de hora porque a quarentena tá me deixando ansiosa.
Já divulgaram Carma pros amiguinhos hoje?
(Façam isso por Alicia, ela agradece e jura que tem recompensa para quando chegar em 1k)
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