Capítulo 15
Há semanas atrás Campum Florum me parecia atrativo e contagiante, me achava única e sortuda por ter caído aqui, agora tudo está diferente. Me dizem o que devo fazer, me ensinam coisas que não desejo saber e mais que tudo, queria minha vida de volta.
Eu sou diferente de todos aqui, eu não tenho uma habilidade especial, não sou uma boa lutadora ou uma boa nephilin. Apenas uma garota desconhecida e fraca, uma simples humana que chora todas as noites rezando para voltar ao mundo real.
Joker me chamou para treinar. Uma das poucas vezes em que conseguimos fazer isso, ainda não sei oque temos entre nós, tantas coisas aconteceram em pouco tempo que não paramos para conversar.
Núbia conseguiu sentir a presença de Priam, Ignis e Dustin estão à procura da entrada para o reino de Asphar que acreditam ser ao sul da Ilha dos Corvos. Joker passa horas trancado em seu laboratório com o intuito de fabricar armas envenenadas que serão utilizadas contra Baalihans, por isso foi difícil arranjarmos um tempo para treinar.
"Ignis lhe ensinou como entrar na mente de alguém?" ele perguntou assim que entrei na sala de vidro, sua voz parecia cansada e arranhada. Poucas horas de sono.
"Sim." Respondi. Ele deu um meio sorriso e silabou em minha mente "Tente brincar com meus pensamentos, vasculhe o que penso sobre você ou qualquer outro. Tente me enfeitiçar e criar uma armadilha em minha mente''
Fechei os olhos e me concentrei, era algo difícil de se explicar e muito mais de entrar na mente de alguém. Estiquei um feixe de luz em sua direção, percorri todos os caminhos até entrar em seu subconsciente e foi ali que quis parar.
Lembranças tristes e quebradas vinham em minha direção, o choro de uma criança ecoou em meu pensamento, me senti sufocada e quanto mais tentava puxar o feixe de luz para mim, mais ele me enrolava na bagunça que era a mente de Joker. Uma risada fraca foi ouvida e minuto depois estava no chão.
"Ignis é uma ótima professora, contudo não conseguiu lhe ensinar corretamente. Primeiro, jamais feche os olhos, pense que eu sou seu inimigo e que seria fácil lhe atacar neste minuto. Segundo, não tente vagar entre as minhas memórias, irá se perder sendo facilmente enganada e por ultimo, não tente ser amável, você está utilizando um golpe sujo, apenas diga o que quer ou faça rápido oque deseja." Ele me repreendeu com a voz forte e firme, senti um sorriso brincando em seus lábios. Algo superior e muito menos humilde.
"Desculpa, eu só estou cansada e não pratiquei muito."
"Não. Você não está cansada, apenas com preguiça e se sentindo uma iniciante. Veja como faço e tente entender oque deve fazer." Ele falou autoritário, sem fechar os olhos ou apenas mudar de expressão, senti os dedos gelados de Joker em minha mente, eles puxavam e agarravam meus fios de memórias.
Uma risada e palavras atravessavam minha mente.
"Porque você gostaria de sair deste mundo? Porque você chama a vida real de tão divertida assim?" Ele descobriu meus pensamentos egoístas e tristes, havia os trancado em uma "caixinha" com cadeado e agora tudo estava escancarado.
"Jasmim, os próprios humanos estão destruindo aquilo que foi lhes dado. Eu sei que nossas espécies não são tão diferentes assim, mas tudo oque fazemos tem um propósito maior que a religião, uma raça perfeita ou qualquer motivo mundano para começar uma guerra." Joker falou de um modo cativante, como se quisesse me deixar trancada neste mundo.
"Eu só estou cansada Joker, eu não sou como vocês. Todos dizem que sou filha de um anjo, que consigo curar pessoas e ver o futuro mas eu já fiz isso? Não, eu apenas sou uma garota que não deveria ter entrado neste mundo. Eu só sou uma humana." Respondi secamente, por dentro estava quebrada e fraca, a vontade louca de gritar e chorar me sufocava.
"Você pensa que eu sempre fui assim? Quando descobriram o sangue que eu carregava não me colocaram para fora apenas por ser perigoso demais. Eu tive que provar quem eu realmente era e não foi a coisa mais fácil e simples de todas."
"Não tente nos comparar, você cresceu neste mundo, já eu caí de paraquedas aqui. Você é forte e poderoso, já eu sou fraca e mal sei lutar, eu cresci em um mundo onde anjos, demônios, feiticeiros, nephilins e fadas são apenas contos para crianças, onde dizer que tudo isso aqui é real lhe torna um louco. Agora vocês desejam que eu esqueça de tudo, de minha família e meus sonhos por uma guerra que acabará com tudo? Eu não posso fazer isso." Deixei as lagrimas brotarem, mordi meu lábio inferior para controlar o choro, o gosto de sangue invadiu meu paladar.
"Não estou tentando nos comparar, você que está fazendo isso. Eu só não quero que se vitime-se tanto e que pense que esta batalha só diz respeito a você. Yasmim, todos nós temos problemas, todos nós choramos e rimos, e a vida não é uma competição de problemas." Ele disse rindo fraco, virou as costas no mesmo momento que abri a boca.
"Eu sinto muito, eu só estou cansada." Consegui silabar.
"Isso não é motivo para tratar os outros mal."
Fiquei a observar a porta por onde Joker saiu, queria que ele voltasse, ao mesmo tempo desejava que ele fosse para o mais longe possível, para onde não nos víssemos mais.
As palavras ditas e pensadas doeram mais que tudo, mais que a saudade de casa, mais que os arranhões e cortes na pele, mais que tudo ao meu redor. Eu sabia que a arrogância era o defeito da humanidade mas nunca notei que a mesma arrogância da qual eu condenava tantas pessoas fazia parte de mim, talvez Joker esteja certo, eu não estou cansada, estou com medo de me acostumar a este lugar, talvez eu consiga ser útil neste mundo mais do que fui no outro. Nunca esquecerei de quem e do que amo naquele lugar mas esta é a minha nova casa.
E farei de tudo para protege-la.
"Logo você terá que escolher uma arma para o combate" lembrei do que Joker havia me dito em um de nossos treinamentos. Levantei apressada do chão e fui em direção as armas, arcos e flechas, Sidus, espadas e adagas estavam por todos o lados em prateleiras ou cravadas nas paredes. Ao fundo, uma grande caixa de madeira chamou minha atenção, limpei o vidro empoeirado conseguindo ver dentro, duas longas correntes de um cinza brilhante e atrativo estavam penduradas. As pontas tinham o formato de duas adagas, eram douradas como o ouro e todas as suas argolas eram crivadas de espinhos afiados, as correntes eram tão belas.
Queria segura-las em minha mão, porém a caixa estava trancada com um cadeado escuro e enferrujado. Tive a vontade de quebrar o vidro da caixa apenas para toca-las, fechei o pulso em um extinto impulsivo e atingi o vidro com tudo.
Cacos de vidros voaram para todos os lados, eu não sabia da força que tinha. Consegui o que queria, estava com uma das correntes na mão, a qual estava cortada e um tanto ensanguentada. Mas não ligava para isso, eu queria senti-las, desejava torna-las minhas.
"Jasmin, estava procurando você por todo os lados." A voz de Darla quebrou meus devaneios, um grito de susto foi ouvido "J-Jasmin, oque você fez? Está maluca?" Ela disse tentando retirar as correntes de minhas mãos, segurei mais forte puxando-as para mim, os espinhos gravaram na palma de nossas mãos.
"Elas são minhas agora, elas desejam minha proteção tanto quanto eu." Gritei enlouquecida, não me importava com os ferimentos em minha mão.
"Largue minhas correntes agora."
Uma voz desconhecida soou em minha cabeça, dei um grito ensurdecedor assim como a voz, as correntes voaram para o lado, caindo aos pés do homem à nossa frente. Ele era alto como qualquer outro nephilin, tinha os cabelos não muito curtos e cacheados, a pele branca, a barba estava por fazer e seus olhos castanho claro, irritados com o que viu.
"Quem é essa ai?" Sua voz soou forte, mas não tanto quanto antes, estendeu a mão em direção as correntes as fazendo irem ao seu encontro, mesmo segurando nos espinhos elas não o machucavam. Ele era o dono delas, não eu.
"E-eu sinto muito, não sei onde estava com a cabeça. Eu pensei que ..."
"Pensou o quê? Que estas correntes respondiam a qualquer um? Que uma garota fraca e indecisa como você conseguiria empunha-las sem nenhum ferimento? Você tem muito oque aprender." Sua voz soou autoritário e muito mais arrogante que qualquer um.
"Eu só estava atrás de uma arma, Ignis havia me dito que já estava pronta para ter a minha arma." Falei convicta mas por dentro estava envergonhada.
"Fique com uma espada ou alguma adaga, mas não mexa nas coisas que tem dono. Você destruiu o vidro da minha caixa e nem ligou aos ferimentos que fez em sua mão ou nos ferimentos de Darla, ela é sua irmã e você deve prezar pela segurança de seus irmãos."
Olhei para minhas mãos, o vermelho carmesim escorria dos machucados, pedacinhos de vidro estavam dentro das feridas, eu não havia prestado atenção em nenhum daqueles machucados. O pior, eu me tornei agressiva ao ponto de ferir Darla, a morena do sorriso mais belo.
"Darla, Darla eu sinto muito!" Falei chorando, ela me abraçou de lado murmurando algo como 'está tudo bem'.
"Se um dia você me provar que é forte e determinada o suficiente, estas correntes serão suas. Até lá, se divirta com socos e armas mais fracas." A risada do homem foi frouxa e sincera, o desconhecido talvez esteja falando a verdade.
"Vem, vamos cuidar dos nossos cortes." Darla disse assim que o homem nos deixou sozinhas.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro