Capítulo 3 - Um momento que vale milhões
Um novo dia que será gasto na Oncologia, Luís decidiu que faria uma surpresa a Amanda, já que fazia alguns dias que ele não conseguia passar para vê-la. Seus estudos ocupavam o pouco tempo que o médico tinha. Luís Henrique não via isso como algo ruim, por outro lado, ele sabia que como pediatra poderia ajudar muitas crianças e salvá-las de doenças descobertas tardiamente.
O médico dirigia tranquilamente pela cidade, quando recebe uma ligação de sua mãe, ele a ignora. Essa não é a primeira vez que o faz. Luzia insistia que Luís Henrique tinha que sair da cidade de Botucatu e ir para outro lugar, ela andava a pesquisar sobre os Médicos Sem Fronteiras e pensava em mandá-lo para o exterior, o que ele negava. Se pensar pelo lado da mãe, é claro que ela o mandaria para longe, haviam se passado 7 anos e seu filho continuava a sofrer pelo seu amor de infância. Luís Henrique e Karen estudaram juntos no jardim de infância, depois no fundamental e quando chegou no ensino médio, ambos passaram na prova da Embraer mesmo não sendo a área que atuariam no futuro. Era um desafio só deles e venceram cada obstáculo juntos. A mudança de Karen para Araraquara por 5 anos só aumentou ainda mais o sentimento de amor que nutriam um pelo outro e no último ano para Luís se formar como clínico, eles anunciaram o casamento que ocorreu pouco tempo depois. O amor é lindo, perfeito e pode ser destrutivo.
Luiza tem seus temores quanto a sanidade do filho, mesmo que César insista em dizer que Luís Henrique faça tudo isso como uma válvula de escape para não pensar no pior. Porém, tanto mãe e pai, eles se preocupam muito com a saúde e bem-estar do filho mais velho e para resolver toda a questão, César, sendo natural da Bahia, entrou em contato com um amigo de adolescência, Sebastião Costa, que tinha influência na política do estado e juntos arrumaram uma solução para não mandar o médico para o exterior. Será apenas um contrato, alguns meses fora de Botucatu para sentir novos ares e ver como a vida realmente não é só o hospital.
Depois de tudo que aconteceu, Luís Henrique foi obrigado a passar a fazer tratamento psicológico e psiquiátrico, embora faltasse na maior parte das consultas ou disse-se estar bem, até que seu pai achou melhor receitar alguns calmantes e antidepressivos ao filho, evitando qualquer acidente desagradável. No início, Beatriz foi morar com o irmão. Ela havia passado no vestibular da ETEC e lá estudava o Ensino Médio e um curso Técnico em Nutrição. Quando se formou preferiu ir estudar Nutrição na cidade de Bauru do que prestar a prova da Unesp. Beatriz pensava que por vir de uma família financeiramente boa, ela tiraria o lugar de outro aluno caso ganhasse a bolsa de estudos. Enquanto esteve com o irmão nos 2 primeiros anos, ela o vigiava constantemente, fazia de tudo para alegrá-lo e tentava tirá-lo da casa. O que nenhum deles entendia era que Luís prezava a vida, e que ele apenas a vivia corridamente. Sempre ocupado para tudo, mas nunca deixando de apreciar a beleza da natureza e fazer feliz aqueles que precisam de um pouco de luz em suas vidas.
O celular toca novamente quando ele está na rodovia, Luiza ligaria até que o filho atendesse, o que ele faria apenas quando chegasse em seu destino.
No caminho o médico aprecia a paisagem arborizada como sempre fazia. O ar quente da manhã entra pelo carro e ele sorri. Seu coração palpitava de alegria e seus olhos brilhavam por baixo dos óculos de sol. Um novo dia para recomeçar, esse é o seu pensamento constante. Mal sabe ele que sua vida estava mesmo para dar um giro de 360º graus.
Uma playlist escolhida a dedo tocava no rádio e encobria o som das ligações enlouquecidas de sua mãe. Luís aproveitava aquele momento em que dirigia para deixar a mente divagar.
Quando o carro estaciona na cidade de Jaú, mais um toque irrompe o veículo que agora estava com o som desligado.
— Onde você está? — pergunta preocupada.
— Vim visitar a Amandinha, faz dias que não a vejo.
— Meu filho, você saiu do hospital ontem eram quase 22h e agora não são nem 10h e você já está em outro.
— Estou bem, mãe. Não se preocupe. Trouxe um jogo de UNO — diz para trocar o assunto — vamos ver quem vencerá dessa vez.
— Alguém disse UNO! — César grita do outro lado da linha.
— Sim, papai. Jogarei com a Amandinha.
— Me espera que já estou chegando. Não perderei uma partida desse jogo e muito menos vê-la te massacrar novamente — o psiquiatra diz sorrindo.
— Não íamos para o shopping? — Luiza questiona olhando feio para o marido, ela estava de folga e queria ficar longe do hospital pelas próximas horas, mas pelo jeito será arrastada para aquela partida deles.
— Se quiser — e antes que o marido continuasse a frase, ela deixa o celular no balcão e sobe para trocar seu salto alto por um mais confortável. O local para o qual ia não combinava com a roupa que estava vestida.
César, sorrindo, pega o celular da esposa e começa a bater-papo com o filho, uma conversa corriqueira que tinha a intenção de preparar o terreno. Ele mandaria o filho pra Bahia, Luís querendo ou não.
Uma hora depois o casal chega no HAC e por lá passam o dia com a adolescente que sorria de felicidade pela visita. Amanda se sentia amada e ganhava forças para lutar contra a doença que podia matá-la. Ela havia feito uma cirurgia de medula óssea há dois anos e sua recuperação foi boa, porém pelo seu estado de saúde e pelo que ocorreu com sua mãe e irmão, a jovem de 13 anos continuou mantida no hospital. A família Guimarães propôs que caso ela fosse para uma casa transitória, eles a adotariam, entretanto, pelo conselho tutelar e suas condições, o melhor é que continuasse no hospital até ter uma melhora suficiente para ter alta.
A convivência entre eles sempre foi boa. Amanda chamava aquele espaço de casa, fazia 7 anos que morava ali e recebia diariamente os tratamentos necessários. Ela é uma incógnita até para os médicos que estudam seu caso no HCFMB de Oncologia da Unesp. O câncer da menina se estabeleceu em um progresso que poderia matá-la, mas não, ela falava e brincava normalmente e com a cirurgia houve uma melhora, só não o suficiente para ter alta. É como se algo Divino a mante-se na terra para alguma missão futura. Seus cabelos cresciam e caiam devido às quimioterapias e assim continuava.
— Eu ganhei de novo — ela diz ao bater palmas. O cateter balançando em seu braço e o soro que continuava a fazer seu percurso no corpo da quase adolescente. O líquido a hidratava internamente e amenizava qualquer dor que pudesse ter.
— Roubando até eu ganho — o psiquiatra diz carrancudo.
— Vovô, se continuar com essa cara vai acabar envelhecendo uns 100 anos — fala gargalhando da cara do mais velho.
Entre as risadas Amanda engasga e começa a tossir, os três logo a socorrem e Luiza coloca água em um copo oferecendo para a neta adotiva.
— Eu estou bem, só me afoguei com o cuspe.
— Você me assustou, menina! — Luís Henrique fala tentando controlar a respiração e as mãos trêmulas.
— Bobão, eu já disse que não vou morrer. Quero conhecer meus sobrinhos, maninho — afirma desafiando o médico. — Não só os da Beatriz como os seus também — responde mostrando a língua.
— Já tenho você — ele responde.
— Não vale, eu tenho a metade da sua idade. Pare de ser velho e ranzinza, assim não vai arrumar uma namorada.
— Eu falei para ele — César entrar na brincadeira que é um território perigoso — mas o Luís diz que não está pronto para um novo relacionamento.
— Eu sei quando ele vai estar pronto — a jovem sussurra — quando tiver 84 anos — e dá outra gargalhada tirando do avô adotivo uma crise de riso.
A tarde se passou em família, embora Aline e Beatriz não estivessem ali, cada uma delas estava ocupada com suas vidas adultas. Uma arrumava a casa enquanto as crianças brincavam na piscina com o pai e a outra deitada na rede relaxava o corpo após ter passado uma semana difícil. Beatriz enfim estava formada e trabalhava fazia poucos meses no Ambulatório Médico de Especialidades — AME da cidade, ela pretendia apresentar Gabriel, seu novo namorado, aos pais, porém estava em dúvida sobre a decisão. Ela o conhecia muito pouco. Já Aline, essa seguiu um rumo diferente, a filha mais velha de Luiza e César não era médica como os irmãos, ela era Professora de Educação Infantil. Em uma família de médicos temos nossa ovelha desgarrada que adora crianças e tem dois filhos que fazem o tio Luís Henrique de gato e sapato e os avós pior ainda.
Entre risos e brincadeiras no HAC, essa história está prestes a começar. Não é romance fofinho, não, aqui os personagens lutam contra seus traumas e os vencem com a ajuda uns dos outros. A união faz a força, a família vence qualquer barreira, o amor transforma as vidas e o luto nos ensina que no fim do túnel tem uma luz que leva a um caminho iluminado e cheio de novas possibilidades.
A vida é cheia de momentos, basta olhá-los com amor e não ignorar as oportunidades que batem à sua porta, entretanto, ter sabedoria é inteiramente importante nas horas de decidir.
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Vamos que vamos, porque essa história tem muito o que contar!
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