Capítulo 44 - A Consulta
Foi uma noite agradável, jantámos, conversámos e namorámos um pouco separadamente. No final do jantar depois de nos despedirmos do Guga e da Magui, os outros dois casais (no caso eu e o Diogo, a Leonor e o Martim) decidimos separar-nos um pouco e assim podermos namorar sem "plateia". Marcámos uma hora para nos reencontrarmos e cada um foi para o seu "encontro".
Quando chegámos a casa os meus tios estavam à nossa espera, apenas nos perguntaram quem nos tinha trazido a casa, a Nono logo respondeu que o Simão nos tinha trazido e fomos dormir. Amanhã seria a consulta. Se eu estava nervosa? Sim, estava a tremer de medo. Adormeci a pedir a todos os santos para que tudo corresse bem.
Acordo cedo, não sei se com algum receio da consulta, se a ansiedade de estar com o Diogo. Olho para o lado e vejo a Nono ainda a dormir, como aqui não faço cerimónia, levanto-me e sigo para a cozinha, onde já está a minha tia.
- Bom Dia Tita.- digo e dou-lhe um abraço...- Isso aí está com um cheiro maravilhoso...- A tia Marta estava a fazer panquecas...
- Bom Dia Nena. Já acordada?
- Se eu te disser que não dormi nada, não te vais zangar pois não?
- Estás nervosa?- eu apenas assinto...- Nena, eu imagino que tudo o que te aconteceu , ainda te está aí nessa cabeça...
- Não tia, eu não quero falar disso. Já passou...
- Se tivesse passado não me tinhas proibido de falar sobre o assunto!
- Eu...só não quero estar sempre a lembrar-me do que aconteceu. Em relação à consulta eu estou ansiosa. E se eu não puder ter filhos tia? Quem vai querer casar ou namorar comigo?
- Madalena, se alguém se negar a ficar contigo só porque não podes ter filhos, então esse alguém não te merece.
- Mas...eu...- não consigo segurar mais as lágrimas...- E eu...e se eu me achar um nada por não poder ter filhos? Eu quero ter filhos tia...
- Calma Nena. Que tal comermos antes que os pestinhas acordem depois vais te vestir. A Luísa ia ver-te cedo lá na clínica.
- Posso comer as panquecas com Nuttela? Por favor?
- Eu juro que não sei como conseguem comer essa coisa. A tua mãe quando estava grávida de ti comia às colheradas, ela dizia que era o bebé que queria...
- "Desejo de grávida"...e ainda perguntas porque é que gosto? Foi a mãe que me viciou desde que eu estava na barriga dela...
Olhámos uma para a outra, muito sérias, até começar a rir à gargalhada. Tinha saudades disto, dos momentos descontraídos com a minha Tia na cozinha quando vinha passar os fins-de-semana em casa dela. Tal como hoje eu acordava primeiro que toda a gente, vinha para a cozinha e ajudava-a a fazer o pequeno-almoço.
Quando terminamos de comer, o meu tio apareceu na cozinha. A minha tia foi logo orientando o coitado que tinha um olhar completamente perdido com tanta recomendação. Assim que ela acabou, subimos as duas para nos arrajarmos. Quando descemos já todos estavam a comer...e estava uma confussão na cozinha. Ainda perguntei se ela não queria ir ajudar o Tio Luís, mas ela com olhou para mim "Não, faz-lhe bem, para ver o custe tomar conta dos teus primos."
A clínica não ficava muito longe da casa da Tia Marta, aliás as nossas casas aqui em Lisboa ficavam todas muito próximas umas das outras. De repente lembrei-me da nossa casa, será que a venderam? Será que já vive lá alguma família? Pensar nisso doi. Foi a nossa casa, durante 14 anos, nasci e creci ali naquela casa.
- Tia. A nossa casa...o que aconteceu com ela?
- Como assim o que aconteceu com ela? Que eu saiba está no mesmo sítio que sempre esteve.
- Não é isso. Vocês venderam? Ou...
- A casa é do vosso pai. Enquanto ele estivesse em coma, nós não podíamos tocar em nada. O teu avô Carlos quis vender, mas concordámos que só se o teu pai...bem morresse ele poderia vender.
- Então e agora? Quer dizer o pai está bem, então o que vai acontecer?
- Sinceramente não sei Madalena, cabe ao teu pai decidir o que fazer. A casa está fechada, nenhum de nós conseguiu lá ir depois do que aconteceu.
Que o meu avô a quisesse vender, não é nada que me espante. Ele deixou claro que nos quer a morar em Coimbra com ele. Fiquei a pensar como será que está a casa, nós tínhamos umas seis malas à porta de casa. Será que as arrumaram? Será que ainda lá estão à espera que os donos peguem nelas para uma viagem que já não vai acontecer nunca mais?
- Ei! Chegámos. Estás bem?
- Sim. Vamos...
Assim que entramos, vejo alguém que não via há meses: Ceci. A Cecília era na altura a enfermeira mais nova da clinica, era com ela que ficávamos quando a mãe ou a tia Luísa precisavam de nos trazer para a Clinica por algum motivo. Ela era como uma tia bem mais nova que as nossas mães.
- Ceci!
- Ai, Meu Deus! Não acredito, a minha Mada.- ela abraça-me e é como se de repente eu voltasse a ser uma criança que acabou de abraçar a professora da primária...- A Doutora Luísa disse que hoje iria ter uma surpresa, mas eu nunca pensei que fosses tu.
- Olá Cecília. A Luísa já chegou, certo?
- Sim, ela está no consultório. Venham eu levo-vos até lá.
- Não precisas, nós sabemos onde é...
- E perder a oportunidade de ficar agarradinha à minha princesa numero 1? Nem pensar, vamos.
A caminho do consultório da Tia Luísa, passamos pelo consultório da minha mãe, que continua com o nome dela e com a porta fechada, é como se o tempo aqui não tivesse passado. Ceci, olha para mim, limpa-me a lágrima que escorre no rosto e dá-me um sorriso. Ela bate na porta e abre-a, após ouvir a Tia Luísa dar permissão de entrar.
- Doutora, a sua surpresa chegou...
- Era para ser a tua, porque eu já sabia que ela vinha.- Cecília deixa-me entrar...- Bom Dia meu amor...- abre os braços para me receber e apenas retribuo...- Bom Dia Marta. Cecília, podes preparar a sala da Ecografia por favor, há e avisa ao Ângelo que vou mandar alguma exames no nome da Madalena e que quero os resultados ainda hoje de manhã.
- Vou preparar tudo e avisar o Ângelo. Quer mais alguma coisa?
- Sim quando fizeres isso, vem recolher o sangue aqui da mocinha.- Ceci assente e sai...- Então, o teu pai ligou-me e disse-me o que te preocupa.
- Tia...
- Madalena, agora que já te lembraste de tudo, eu vou contar-te tudo o que se passou naquela noite, e como fiquei a saber de tudo. A tua mãe ligou-me do hospital...
" Era cerca da 00h00 quando o telefone toca, estranho mas poderia ser alguma doente com algum problema. Como estava ainda meio a dormir, nem olho para o telemóvel para ver quem é.
- Estou...
- Lu, sou eu...preciso que venhas para o Hospital. A Madalena, ela...
- Maria o que aconteceu com a Mada, em que hospital estás?
- Estamos no Hospital Central, eu só confio em ti...
- Estou a caminho, tem calma.
Levantei-me, acordei o Vasco e contei-lhe o pouco que sabia, ele quis ir. Acordámos o Guga, mas sem lhe contar nada, apenas dissemos que eu tive uma emergência e que o pai me ia levar para eu não ir sozinha a esta hora. Ele estava com tanto sono, que nem se apercebeu que não era a primeira vez que eu saía a altas horas.
Assim que chegámos ao hospital, logo vimos os pais e a irmã de Maria. Caminhamos até eles, que nos disseram onde eles estavam. Quando os vi, o Pedro estava a nadar de um lado para o outro, e o pai dele estava a tentar acalmá-lo. A Maria estava sentada a chorar como não a via à muito tempo.
- Maria, o que é que se passa? Onde está a Madalena?
- Ela foi espancada pelo "namorado", e...foi...
- Aquele desgraçado violentou a minha filha. Ele...
- Pedro, tem calma. Não é dessa forma que vais ajudar a tua filha...- diz o Vasco para o amigo.
- Lu...eles querem fazer o exame de corpo delito...eu só confio em ti...por favor...
- Maria, eu não posso. Nestas situações quem faz o exame são os médicos legistas.
- Mas podes acompanhar. Por favor Lu...
- Tudo bem, eu vou acompanhar. Mas como é que ela está?
- Os médicos colocaram na num coma induzido. Mas na verdade, nós ainda não sabemos muita coisa.
- Eu vou a casa daquele animal, ele pode ser menor, mas não se pode escapar.
- Pedro, por favor, o principal neste momento é a nossa filha. O Vasco trata da parte judicial...
- Maria, eu não consigo ficar aqui parado com a minha filha em coma, e saber que aquele "miúdo" está em casa como se nada tivesse acontecido.
- Pedro, tu estás nervoso. Eu trato disso, fica mas é com a tua família..."
- Essa foi a última que vi os teu pais, o médico legista veio-me chamar e eu entrei com ele. E tal como prometi à tua mãe acompanhei tudo.- nesta altura batem de novo à porta e Ceci entra...- Bom agora vais com a Cecília tirar sangue, e depois vais ter comigo e com a tua Tia à sala de Ecografia.
E assim fui com a "Tia" Cecília, até ao laboratório onde me tiraram-me sangue. De seguida levou-me para a sala onde a Tia Luísa e a Tia Marta já me esperavam para fazer o que mais me assustava, porque era agora que eu ia perceber até que ponto tudo o que me aconteceu.
- Anda querida, deita-te. O exame que te vou fazer chama-se Colposcopia. O único desconforto que poderás sentir é quando te colocar o espéculo vaginal. Depois não vais sentir mais nada.
- Pensei que ias fazer apenas uma Ecografia.
- Podia fazer, mas teria que fazer a Transvaginal, mas é mais invasiva. Não te preocupes, se tiveres alguma dor avisas logo, está bom?
- Sim...
Deitei-me na maca e coloquei as pernas onde ela me indicou, era algo desconfortável, não só a posição, mas também por estar tão exposta. Mesmo que seja com a Tia Luísa que me mudou uma série de fraldas quando eu era pequena.
Começou então a colocar aquela coisa que ela disse, o tal de Espéculo Vaginal, e incomodou um pouco mesmo, principalmente quando ela mexeu lá naquilo, parecei que me estava a abrir por inteiro. Depois aproximou um aparelho que parecia uma microscópio gigante e começou a observar tudo e a escrever numa folha.
- Mada vou-te colocar um líquido que pode arder um pouco...- eu assinto...e bolas aquilo arde...
- Ai....Ai...isso arde tia, arde mesmo...- as lágrimas já me caiam...
- Calma...
Logo ela continua com o que está a fazer, as lágrimas caem-me pelo rosto, a minha Tia Marta está ao meu lado a tentar acalmar-me. Passado o que eu acho ser uma hora, o ardor começa a acalmar.
Assim que acabamos, a Tia Luísa convidou-nos para ir almoçar lá em casa e que lá conversávamos sobre os resultados, logo a Tia Marta concordou. Despedi-me da Ceci e fomos para casa para nos prepararmos para o almoço.
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