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Capítulo 39 -Desespero

Olho para o lago. Levanto-me e caminho até à beira do mesmo. Respiro fundo. Olho para o céu. Caminho passo a passo, sentindo a água fria gelar-me os ossos, mas eu não paro, continuo. Já tenho água até à cintura, coloco-me de joelhos, e contando até três mergulho.

Sinto algo. Mas nem sei sequer o que sinto, deixo-me simplesmente ir e aos poucos a minha mente apaga e a paz chega. Estou livre, finalmente estou livre da dor.

Eu e o Martim deixámos a Mara sozinha com a Madalena, embora eu soubesse muito bem o que tinha acontecido, sabia que falar com a Mara sobre o assunto seria talvez mais fácil. A vontade que eu tinha era de ir a Lisboa e dar cabo daquele animal. Até hoje eu não me conformo por não ter partido no minimo o nariz daquele infeliz. O Martim percebeu a raiva com que eu estava, porque eu não a conseguia disfarçar.

- Vê se te acalmas. Não sei o que se passou, mas ficares com raiva não vai ajudar a Madalena.

- Eu sei, mas eu não consigo evitar, o que aquele animal lhe fez...- respiro fundo tentando acalmar-me um pouco...- Eu não sei se algum dia ela vai conseguir superar tudo o que lhe aconteceu.

- Perder os pais é difícil, eu já passei por isso. Perdi os dois num espaço curto de de tempo, tive a sorte de ter uma avó que me amou como um filho, mas mãe e pai são insubstituíveis.

- A Madalena perdeu muito mais que a mãe, ela perdeu-se por inteiro. Martim, a Madalena foi agredida pelo ex-namorado e quando digo agredida não foi apenas com uma bofetada ou um pontapé.

Contei ao Martim tudo o que aconteceu entre mim e a Madalena: como nos conhecemos, as trocas de mensagens, o descobrir que afinal ela era menor. Até que chegou à noite em que tudo aconteceu, contei-lhe ao pormenor e depois de eu acabar, vi o Martim com lágrimas nos olhos e percebi que eu estava igual.

Levantei-me de onde estava e decidi ir ter com elas, senti algo no meu intimo que me fazia ter medo, medo de perder o meu amor. Quando cheguei vi o olhar chocado de Mara, percebi imediatamente que a Madalena lhe tinha contado.

- Madalena...- a minha Rainha só chorava...e a Mara estava chocada com o que tinha acabado de ouvir...- Ele...

- Infelizmente não consegui chegar a tempo para impedir. E só não matei o desgraçado ali, porque o nosso primo me impediu.- disse eu interrompendo a conversa das duas...- A Gabi já tinha chamado a ambulância e assim que olhei para a Madalena desmaiada, não pensei em mais nada. - sentei-me ao seu lado e abracei-a...- Não te deixei sozinha até que os teus pais chegarem ao hospital. Contei-lhes o que tinha visto, os médicos conversaram com os teus pais, e confirmaram o que eu pensei que tivesse acontecido.

- Tu estiveste com os meus pais? Tu viste-os?- pergunta-me Madalena confusa...

- Sim. O teu pai estava bem nervoso quando descobriu o que te aconteceu. Acho que no início estava furioso contigo por teres saído e mentido, mas depois a fúria passou para aquele desgraçado.

- Espera tu sempre soubeste o que me tinha acontecido? Tu nunca pensaste em me contar? Tu mentiste-me Diogo.

- Eu não te menti. No início, quando te encontrei naquela capela eu nem sabia quem eras. Depois lembrei-me da minha "Rainha da Noite", mas eu percebi que tu não sabias quem eu era. Depois quando finalmente me reconheceste eu falei com o teu irmão e soube que tu não te lembravas de nada daquela noite e que os médicos disseram a todos que ninguém te podia contar, que se um dia te lembrasses então...

- Mas tu...eu confiava em Ti.- as lágrimas começaram a escorrer-lhe pelos olhos. Senti ali que a tinha decepcionado, que talvez a tenha perdido. Não eu não a posso perder apenas por querer protegê-la.

- Madalena, eu não consegui, tu já estavas a sofrer tanto por tudo o que te tinha acontecido.

- Eu estava a sofrer porque ninguém me contava o que raio se tinha passado, porque todos olhavam para mim como se eu tivesse a culpa de tudo e sabes que mais: EU TIVE CULPA. EU MATEI A MINHA MÃE. EU COLOQUEI O MEU PAI NUMA CAMA DE HOSPITAL.

- Madalena, não é bem assim. Tu não pediste para que aquele animal fizesse o que fez contigo, a culpa não foi tua.- diz Mara tentando acalmar-nos aos dois.

- Foi Mara. Porque a decisão de ir com o Ricardo naquela noite foi minha, de mais ninguém.- ela levanta-se e vira costas e afastando-se de nós.

- Madalena, Madalena...- grito por ela, mas ela ignora-me. Corro um pouco e consigo para-la...- Onde é que vais?

- Quero ficar sozinha...- diz e sai caminhando, e eu fico ali sem saber se vá atrás dela, ou se lhe dou este espaço...

- Diogo...- sinto Mara perto de mim...- Deixa-a sozinha um pouco, acho que foi muita coisa hoje. Ela precisa de se reencontrar, de perceber o que sente. Vem, vamos nos sentar um pouco, ela sabe onde nos encontrar quando se acalmar.

- Não, eu não vou sair daqui.- sinto uma dor no peito, como se algo estivesse a perfurar o meu peito...- Mara, ela está a precisar de mim...eu sinto...algo se passa com ela...- levanto-me e caminho por onde a vi desaparecer.

Assim que chego ao pé do lago, no mesmo local onde nos beijamos pela primeira vez , vejo algo que me faz gelar...a Madalena...no lago. Não ela não pode ter feito isto, atiro-me para o lago e grito pela Mara. Consigo chegar até a Madalena, os seus olhos estão fechados, pego nela e saio do lago. Coloco-a deitada na relva, Mara que felizmente ouviu os meus gritos chega com o Martim.

- Por favor, ela não pode...ela não. Mara salva-a, ela não está a respirar...- sinto os meus olhos a ficarem molhados, eu não a posso perder.

- Diogo, preciso que te afastes...- mas eu não largo a Madalena, não consigo. Sinto alguém a puxar-me enquanto vejo Mara a fazer as manobras de reanimação. Só agora percebo que Martim está ao telefone.

- A ambulância está a chegar...- ele olha para mim e para a Mara...- Mara...

- O pulso está muito fraco, ela está em hipotermia, ajuda-me a retirar as roupas...- ela olha para mim...- Diogo, vai buscar a toalha que trouxemos, temos que a aquecer.- fico ali parado, não consigo nem ouvir o que a Mara me diz...- DIOGO. Preciso da tua ajuda, sei que estás com medo, mas ela precisa de ti. Vai buscar a toalha.

Vou até ao carro e tiro a toalha e mais uma manta que encontrei no mesmo, chego e entrego à Mara que embrulha a Madalena, Martim está agarrado a ela sem a camisa fico vermelho de raiva, a minha irmã explica-me que o contacto de pele com pele pode aquecer a Madalena.

Ouvimos as sirenes e pouco depois vemos os paramédicos a chegarem, Mara explica o que aconteceu e o quadro da minha Rainha, eles levam-na e Mara vai com eles, eu fico com o Martim e vou com ele de carro.

Assim que chegámos Mara entra e eu fico ali naquela sala à espera de saber da minha Rainha. Martim vai fazer a ficha dela, e tentar que entrem em contacto com o avô. Não demora muito e vejo-o, pelos vistos ele estava no hospital com o filho. Martim explica o que aconteceu, e que Mara está lá dentro com Madalena.

Eu continuo ali parado sem me mexer, parece que cristalizei, ouço o Martim a falar comigo a levar-me não sei para onde. Entramos num quarto, ele pede que eu tire as roupas e dá-me umas calças daquelas que os médico usam no hospital e uma Sweat dele. E só neste momento percebi que tinha as roupas ensopadas, mas o medo de perder a minha rainha era tão grande que nem consegui sentir frio.

Ele pede que me deite na cama, e uma enfermeira entra, Martim diz que me vai dar apenas um antibiótico de prevenção pois estive muito tempo com a roupa molhada. Aos poucos fui fechando os olhos, e apercebo-me que o Martim me dopou, ele deu-me tudo menos um antibiótico.

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