Capítulo 19 - Nova Rotina
- Só se...se me perdoares a mim também...- e depois de nos perdoarmos um ao outro, abraçamos-nos.
É claro que ainda não é a mesma coisa, mas tinha sido o primeiro passo e talvez um dia conseguíssemos ser o que éramos: cúmplices, amigos, parceiros. Não sei, mas talvez um dia tudo ficasse bem. Pelo menos eu espero que sim tenho saudades do "Meu Avô".
Após estes cinco dias enfiada em casa comecei finalmente a escola, e tendo faltado cerca de um mês e meio de escola tive que me esforçar o triplo. Estávamos quase na semana dos primeiros testes e eu tinha que saber a matéria dada durante dois meses em semanas. E digo-vos que não foi fácil mas acho que consegui.
Estudar nunca foi algo difícil para mim, sempre gostei de estudar, nunca fui marrona ou croma, sempre apanhei a matéria à primeira. Porém, desta vez com dois meses de atraso senti pela primeira vez na minha vida a necessidade de me agarrar aos livros como lapa.
Estava na mesma turma que a minha prima Ana, o que nem uma nem outra gostava, mas tínhamos que nos aguentar pelo menos pelos próximos 3 anos (Uhhh! Três anos de sofrimento, e sem a minha querida Magui para me ajudar e animar vai ser uma verdadeira tortura.). É óbvio que ela é uma das mais populares da escola e eu já tinha sido "pintada" por ela como a coisa mais asquerosa possível, ou seja estava no fundo da cadeia académica.
Felizmente consegui arranjar uma "amiga" nesse nível da cadeia hierárquica, sim "amiga" entre aspas, pelo menos por enquanto. Ela parece-me fixe e a forma de ela pensar agrada-me. Ela diz que prefere ser croma com boas notas do que popular e fútil, tentei explicar-lhe que se podia ser popular, com boas notas e não se ser fútil, mas acho que não a consegui convencer.
Na minha escola em Lisboa sempre fui boa aluna, popular e como diziam alguns professores a palhaça de serviço. Acho mesmo que não levava mais castigos porque apesar de tudo era aluna do quadro de honra.
Apesar de ser uma rotina completamente nova e desconhecida acabei por me habituar a ela. O meu avô leva-nos de manhã para a escola e à tarde é a minha tia que nos vai buscar a mim, à Ana e à Lu. O meu avô vai buscar as três mais novas e leva-as para casa.
Depois de uma semana a chegada à escola já nem me custava, pois assim que eu chegava via a "croma" da Rute. Era hilariante ouvir a forma como ela falava com a Ana, chamava-lhe PiraAna (uma mistura de Piranha com Ana), era de morrer a rir ver as reações da minha prima às respostas da Rute. A mim colocou-me a alcunha de "Fugona" por causa da cena da fuga.
Fiquei a saber por ela que tinha sido o irmão dela que me tinha encontrado junto da capela...ele tinha sido o meu príncipe azul. Ainda não tive a oportunidade de lhe agradecer e espero que um dia o possa conhecer e agradecer. Se não fosse ele, talvez não estivesse aqui hoje.
Os testes passaram, e chegou a semana de começar a recebê-los. Sei que fiz o que podia e apesar de não ser daquelas que apregoam pelos sete ventos as notas que tive sempre gostei de ter boas notas e esforçava-me para isso. Os meus pais sempre nos ensinaram que as notas dos testes representavam o nosso esforço diário para nos superar e as boas notas eram o resultado desse esforço.
Tenho consciência que trabalhei bastante, contudo também sei que estudei para 8 testes em duas semanas. Mesmo gostando de estudar e apanhar tudo à primeira não estou à espera de grandes notas. Primeira aula do dia, primeira nota e o dia foi correndo assim, posso adiantar que as notas não foram más, se bem que podiam ser bem melhores.
- Nada mal Madalena e tiveste apenas duas semanas para estudar. Nem quero pensar nas notas dos próximos, vais simplesmente rebentar a escala.
- Não exageres Rute, tu também não estiveste mal. Um 20 a Filosofia não é para todos. Eu tive um 14.
- Isso foi só porque tiveste pouco tempo para estudar. Tenho a certeza que o próximo será um 20 certeiro.
Esta miúda era um prato, a sério para além de ser inteligente era uma comédia. De certa forma fazia-me lembrar a Magui se bem que não era tão louca. Estávamos a caminho da próxima aula, quando a parva e irritante da Ana se atravessou no nosso caminho. Eu conhecia o suficiente da "minha querida priminha" para saber que ela vinha provocar uma de nós, só faltava saber qual de nós seria a sua vítima.
- Achas que só porque o avô está a falar contigo de novo e até tens notas razoáveis, vai voltar a ser tudo como era?
- O que é que tu queres PiraAna? Tu tiveste o quê um 16 a Filosofia? Boa e tiveste dois meses para estudar, a Madalena teve um 14 e teve que estudar para 8 disciplinas, em duas semanas, matéria de dois meses.
- E se não tivesse fugido não teria faltado às aulas, isso já para não falar do que se passou em Lisboa.
- Podes parar por aí Ana. Tu até podes ser minha prima mas não te dá o direito de falares...
- O quê? Que fizeste porcaria em Lisboa? Que por tua culpa a tua mãe morreu e o teu pai está em coma?
- Tu...tu...- as lágrimas já me estavam a queimar a vista, não eu não vou chorar, não à frente dela...- Tu não sabes do que estás a falar...eu...
- Deixa de te passares por uma coitadinha, toda a gente lá em casa te culpa, eles só não te dizem nada por pena.
- Chega PiraAna. Vamos Madalena tu não tens que estar a ouvir esta piranha que só gosta de morder e espalhar o seu veneno. Anda comigo, vem.
A Rute tirou-me dali, não sei para onde ela me estava a levar, ela apenas me puxava, mas sinceramente nem me importei para onde ela me levava desde que fosse para bem longe da Ana. Como é que que ela podia ser assim tão má, cruel. Nós éramos família, tínhamos em parte o mesmo sangue, a nossa relação nunca foi boa. Sim sempre fomos bem diferentes mas eu nunca lhe diria algo como ela me disse.
Quando paramos percebi que estávamos dentro de uma sala vazia com a porta trancada, uma vez que ouvi o barulho da chave a ser rodada na fechadura. E nessa altura depois de olhar para o tecto deixei-me cair ao chão e chorei, o que ainda não tinha chorado.
Chorei toda a culpa que sentia pela morte da minha mãe e pelo estado do meu pai. A Rute sentou-se ao meu lado, sem me dizer uma única palavra, ela simplesmente me deixou deitar a cabeça no seu colo e eu chorei enquanto ela tentava acalmar-me.
Depois do que a mim me pareceu anos, mas que foram apenas alguns minutos, e de eu ter chorado tudo saímos rumo a uma nova aula. A Rute nunca me perguntou nada, deixou-se apenas estar ali comigo reconfortando-me sem cobranças. E neste momento sei que encontrei uma Amiga, não era uma Magui mas era uma Amiga.
No fim da aula de Biologia e de Português, onde mais uma vez foi humilhada por Ana e defendida por Rute, tivemos finalmente algum tempo livre.
- Ei, que tal celebrarmos as notas, afinal é a primeira vez que tenho alguém a competir comigo nesta turma.
- Rute, por favor, competir contigo? Tu tiveste um 20 a filosofia eu tive 14.
- Tu tiveste um 19 a matemática eu só tive 14 e um 18 a Biologia e aqui a Rute teve um mísero 14 de novo.
- Sim mas tu tiveste 18 a português eu tive 13 e ainda nem acredito, sempre tive 17 a português.
- Ah! Pobrecita teve um 13 a português. Esperem mas não é a mesma que teve um 19 a matemática. Ah! Para de ser dramática.
- Eu dramática, olha quem fala.
- Tudo bem, mas vamos comemorar ou não? Por favor não digas que não afinal é sexta feira.
- Não sei a última vez que saí, bem vamos dizer que não foi um dia bom. Acho que o meu avô...
- Ah! Então e se fizéssemos uma festa do pijama lá em casa. A isso o teu avô não pode dizer que não e se for preciso o meu pai vai a tua casa buscar-te.
- Vou falar com o meu avô, mas não te prometo nada.
Para a Rute foi como se eu lhe tivesse dito que sim, e embora eu lhe lhe relembrasse mais de quinhentas vezes que o meu avô ainda não me tinha autorizado ela tinha a certeza que ele não iria dizer que não. O problema é que a Rute não conhecia o meu avô e eu tinha a certeza que ele não me ia deixar ir, não depois do que aconteceu em Lisboa.
Quando chegámos ao portão despedi-me da Rute e fui ter com a minha tia que nos tinha ido buscar Quando olhei para onde a Rute estava vi-a cumprimentar uma rapariga jovem que reconheci como a médica do hospital, o que será que a Rute e a médica teriam em comum? Seria mãe dela? Não, a doutora era muito nova para isso. Podia ser tia? Sim devia ser isso.
Quando voltei ao planeta terra ouvi a Ana falar das notas, percebi pelo semblante da minha tia que ela estava orgulhosa da filha, e tinha que concordar com ela, nenhuma tinha sido assim tão má (16 a Filosofia, 14 a Matemática, 16 a Biologia e um 15 a Português).
Naquele momento deu-me um aperto no coração, eu costumava fazer o mesmo com a minha mãe, e recebia a mesma onda de orgulho que a Ana estava a receber, porém eu nunca mais iria receber e sentir esse sentimento tão bom de sermos reconhecidos pelos nossos pais. Quando reparei já tinha deixado uma lágrima cair, limpei-a discretamente e continuei a olhar para a rua.
- Então e tu Madalena como te saíste?- perguntou-me a minha tia, tirando-me do meu mundo...- Tiveste menos tempo para estudar, mas soube pela avó que estudaste imenso. Por isso, não te preocupes se desta vez as notas não foram tão boas, tenho a certeza que os próximos serão melhores.
- Sim Tia, eu esforcei-me. Tive que estudar em duas semanas o que eles deram em dois meses.
- Porque decidiste fazer asneira de novo...
- Ana, podes parar imediatamente com isso...- diz a minha tia olhando de lado para a minha "querida" prima.
- Mas mãe eu...- a Ana ia começar com a mesma ladainha de sempre, contudo, a minha tia impediu-a.
- Chega. E Madalena tenho a certeza que a Ana te pode ajudar a subir essas notas, não é Ana?- a Ana olhou para mim com uns olhos que se pudessem me tinham fuzilado, eu limitei-me a rir.
Era engraçado pensar na Ana a ajudar-me a subir as minhas notas: primeiro porque nós iríamos no mínimo fuzilar-nos só com um olhar, e depois para eu subir as notas só se fosse para rebentar a escala e sinceramente acho que sozinha faço um melhor trabalho. Mas não era eu que ia dizer, por isso dei apenas um leve sorriso, mas sei que Ana estava furiosa com aquela saída da minha Tia, porque ela sabia tão bem como eu, que nos próximos eu seria melhor que ela em todas as disciplinas.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro