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Capítulo 17 - As Visitas

E abraço a minha esposa chorando como ainda não chorei desde que tudo aconteceu. Tenho me mantido forte por tanto tempo pela minha família que me esqueci de fazer a minha dor sair, aos poucos fui cedendo ao cansaço.


Na tarde seguinte da fuga da Madalena, o Manuel (pai da Maria), ligou-me desesperado pela fuga da nossa neta. Tentei acalma-lo, mas nem eu estava assim tão calmo. E o que começou por uma conversa civilizada acabou numa conversa mais acesa...

"- Carlos, tu prometeste-me que eles iam ficar bem. E agora venho a saber pela minha Leonor que a Madalena desapareceu."

"- Ela não desapareceu, ela simplesmente se perdeu. Ela saiu da Igreja ontem e deve-se ter baralhado com as ruas. Mas a polícia já está à procura dela..."

"- Mas porque raio é que ela saiu da Igreja sozinha? Ela passou a noite na rua? Pelo amor de Deus, ela tem 14 anos e dormiu na rua..."

"- Eu sei, achas que eu não sei." - eu já não estava a aguentar as lágrimas que desde ontem caiam dos meus olhos."- Bolas, mas que culpa tenho eu se a Madalena faz coisas que não lembram a ninguém. Nós estávamos na missa, o Padre Ricardo começou a falar da Maria e ela saiu disparada da igreja."

"- Ela está a sofrer, eu sabia que isto era uma má ideia, ela não devia ter ido para Coimbra. Pelo menos em Lisboa tinha os amigos..."

"- Sim, e tinha também aquele traste que a violou e a espancou. Nós falámos sobre isso há meses atrás Manuel."

-" Sim, mas neste momento não sei se foi o melhor para os nossos netos. Nós vamos agora mesmo para Coimbra, queremos ver os meninos e ajudar nas buscas."

"- Manuel a polícia já está à procura, não vens cá fazer nada..."

"- Nós vamos e nem o Papa me vai impedir. Quero ver os meus netos e a Marta, o Luís e os meninos vão connosco."

"- Tudo bem, não vos posso impedir. Querem vir cá jantar? As meninas vão gostar com certeza."

"- Se não for incomodar jantaremos sim. Passaremos apenas no Hotel para deixar as malas. Até logo."

"- Não é incomodo nenhum, até logo."- Despedi-me do Manuel e fui ter com a minha esposa...- Candi, a família da Maria está a caminho de Coimbra...

- Eles souberam?- apenas assenti...- Mas como?

- Pela neta, eu convidei-os para virem cá jantar. Acho que será bom para as meninas.

- Sim, elas estão tão tristes. Principalmente a Lu, ela sente a falta da Madalena. Mas vêm todos?

- Pelo que o Manuel me disse sim. Vêm eles, a Marta, o Luís e os miúdos, pelo menos as meninas vão estar distraídas com os primos.

O dia vai passando e no final da tarde Manuel telefona-me a dizer estão a chegar, que daí a uma meia hora mais ou menos estarão lá em casa.

Digo à minha esposa e falo com as meninas que vamos ter visitas e que elas vão gostar. Clara e Sofia ficam eufóricas e tentam de todas as formas fazer com que lhes diga quem são as visitas, mas a Luísa continua sentada no sofá não fazendo caso do que falo.

- Lu, não queres saber quem são as visitas? Eu tenho a certeza que vais gostar. - digo-lhe tentando desperta-la da letargia em que está.

- Não.- e vira costas para mim. Viro-me para Clara e Sofia e peço que vão ajudar a avó na cozinha, sei que elas adoram e preciso de um tempo sozinho com a Luísa.

- Lu, eu sei que queres que a Madalena volte depressa, e eu também quero...

- Não, tu não queres. Tu não gostas dela, só gritas com ela.- reparo que ela tem lágrimas a escorrer pelos olhos...- Tudo o que ela faz tu ralhas com ela. Eu quero os meus pais, eu quero minha irmã de volta, eu quero a minha vida de volta...- e começa a chorar como eu nunca a tinha visto chorar.

Tento abraça-la mas ela foge, eu forço o abraço e não a largo, sei que ela precisa disto, mesmo que ela diga ou faça o contrário.

- Lu, sei que tenho agido mal com a Madalena. E quando ela voltar eu vou falar com ela e resolver tudo. Prometo.- sinto finalmente a minha neta a ceder ao abraço...- Ela vai voltar, nem que eu tenha que revirar as pedras de todas as ruas de Coimbra...eu vou encontrar a tua irmã.

- Avô, se revirares as pedras todas ficamos sem ruas para andar...- e ri-se olhando com aquele ar que só eu e a Madalena temos quando fazíamos as nossas piadas secas que ninguém percebia e que apenas nós conseguíamos rir.

- E agora já queres saber quem está em Coimbra?- e neste momento tocam à porta...- Vai lá abrir, acho que vais gostar.

E assim ela faz, quando ela chega à porta dois furacões saem da cozinha directas para a porta, Luísa olha para mim como que pedindo autorização para abrir eu apenas lhe dou um sorriso e ela abre. Quando elas vêm os avós e os Tios, nem querem acreditar: Clara atira-se para a avó e Sofia para o avô.

Luísa fica parada, tanto olha para mim como para os cinco que estão à porta. De repente sem ninguém esperar ela sai e sobe para o quarto. Cândida olha para mim, mas eu não sei o que se passou, decido ir ter com ela. Entro no quarto e ela está encolhida junto ao armário.

- Lu. Ei! Pensei que gostasses da surpresa. Não tinhas saudades dos avós e dos tios?

- Está a doer avô...está a doer muito...aqui...- e aponta para o coração...- eu sinto saudades...eu sinto saudades da mamã.

- Ó meu doce. Ouve o avô, a tua mãe vais estar sempre aqui no teu coração. Vai estar sempre em vocês: em cada sorriso, em cada lágrima, em cada descoberta que fizerem, em cada etapa que vencerem e principalmente ela vai estar na tua família: nos teus avós, na tua tia e nos teus irmãos.

- Eu quero a Mada, avô onde é que ela está? Diz-me que ela volta que também não a vou perder. Por favor?

- Ela vai voltar, ela tem que voltar.- E dizendo isto apesar de não ter a certeza de nada, abraço a minha neta e faço uma prece para que a Madalena volte logo para casa. Como é que vou olhar para o meu filho quando ele acordar e lhe dizer que a filha desapareceu...- Vamos ver o Avô Manel e a Avó Nina?

Desço com a Luísa e assim que vê os avós abraça-se a eles, depois fala aos tios e finalmente com a prima. Manuel diz que ficaram pelo menos até ao fim de semana, que apenas trouxeram Leonor pensando que talvez esta pudesse distrair os primos.

Pergunta-me pelo meu filho, o que lhe repondo que está na mesma e peço-lhe para deixar Leonor cá em casa contando-lhe a conversa que tive com Luísa, ele concorda que a presença da prima talvez a ajude neste momento.

Jantamos num ambiente familiar que quase nos esquecemos de toda a desgraça pela qual esta grande família está a passar. É bom estar de novo assim todos juntos, todos felizes. No final da noite, as visitas vão-se embora garantindo que no dia seguinte estarão de novo cá em casa para nos ajudar e estar com as meninas, ficou decidido no meio do jantar que as meninas não iam à escola.

Na manhã seguinte ligaram-me do hospital, a Madalena tinha sido encontrada e levada para lá. Apesar de ter pedido mais informações, quem me ligou não me pode dizer nada. Assim que o Manuel e a Marina chegaram, e embora as meninas quisessem ir nós sabíamos que elas nunca poderiam entrar.

Leonor conseguiu convencer as meninas a ficar e preparar uma grande recepção para receber Madalena quando ela voltasse para casa, e com isto as quatro, pois neste grupo inclui-se a Catarina, ficaram logo entusiasmadas e com mil e uma ideias do que fazer. Penso para comigo que tenho que agradecer ao Manuel e à Marta por trazer esta miúda, ela tem um jeito com as primas que nunca vi, bem tirando a Madalena.

Assim fomos: eu, a Cândida, o Manuel, a Marina, a Marta e o Luís; em casa ficou a Cátia com as crianças. O Pedro, o Afonso e a Ana não puderam faltar às aulas, por isso ficaram só as mais novas mesmo.

Assim que chegámos fomos encaminhados para uma sala onde ficámos a aguardar os médicos, a assistente social e a polícia; nunca pensei estar numa situação destas. Primeiro falou o médico Dr. Martim Costa, pelo que percebi a Madalena estava com uma Broncopneumonia, tinha sido encontrado junto à Capela de São Miguel, neste momento ainda estava nos cuidados intermédios mas que estava a corresponder bem ao antibiótico.

Depois foi a vez da Assistente Social nos fazer algumas perguntas, e pareceu-me estar num julgamento. Explicámos toda a situação pela qual a Madalena passou, o acidente dos pais que resultou na morte da mãe e no coma do pai, na mudança de cidade, escola e rotinas, e expliquei o que tinha acontecido naquele dia.

Depois de toda as explicações dadas encaminharam-nos até ao quarto onde estava a Madalena, como não podíamos entrar todos ao mesmo tempo, deixei que o Manuel e a Marina entrassem com o Pedro, que entretanto tinha lá ido ter.

Finalmente chegou a minha vez, entrei com a Cândida, e assim que a vi não consegui evitar as minhas lágrimas de caírem. Ver a minha Nena ali deitada de novo, senti-me um ser horrível, como consegui ser tão insensível, frio, rude com a "minha menina".

Aproximei-me dela, dei-lhe um beijo na testa e baixinho fiz-lhe uma promessa: "Eu prometo-te Nena, que tudo vai mudar. Vou voltar a ser o avô que sempre fui. Desculpa-me minha princesa, desculpa o teu avô. Eu estava a sofrer, e não consegui ver que tu sofrias também."

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