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Capítulo 8 - Conto 01 - A Coleira

Arco 2 - A missão e os Irmãos


Durante o período de treinamento de Camicazi.

Banguela

Já está de noite e como de costume espero Camicazi dormir para sair. Caminhar com a lua e as estrelas como companhia, me faz sentir acolhido, confortável e relaxado, afinal elas são as únicas que nunca me abandonaram em toda a minha vida. É nostálgico.

É necessário de apenas cinco minutos para que a mesma tenha um encontro com o seu sono extremamente pesado. Hora de sair.

Vou para a janela quando escuto passos vindo para cá. Droga, se me pegarem saindo, será a última vez.

- Noite bonita essa é. – Nessas horas, a melhor coisa é o disfarce.

- Achei que já teria fugido. – Disse Runa escorada na porta.

- Fugir? Não sou ladrão para fugir, respeito por favor.

- Está bem então, uma saída seria melhor? – Ela está contendo uma risada, é bem notável isso e não gosto nenhum um pouco.

- Bem melhor, o que quer? Me impedir? – Tanto ela quanto a Sayaka não curtem muito a minha presença, pra falar a verdade só a Camicazi se sente bem comigo nessa casa.

Afinal, cheguei trazendo o caos inteiro. Só fiz a minha obrigação, mas para elas é como se tivesse destruído toda essa harmonia perfeita que tinha na casa. Nossa relação é bem direta e curta, só falamos um com outro quando é extremamente necessário.

- Na verdade conversar, não precisa ficar na defensiva.

Só para deixar claro, não estamos falando alto e sim sussurrando. Posso ser orgulhoso, mas não gosto de atrapalhar o sono dos outros (mesmo sendo o sono da morte), por isso saio do quarto da Camicazi e vou andando pelo corredor.

- Onde está indo? – Perguntou ao ver eu andando.

- Ela está dormindo, não vamos atrapalhar. É melhor irmos para a cozinha, assim, aproveitamos o momento para você colocar comida para mim. – E começo a descer as escadas com Runa me seguindo.

- Banguela já está tarde para comer.

- Nunca é tarde e você não é a responsável em determinar quando devo comer.

Chegamos na cozinha. Vou em direção ao meu prato, esperando pela comida.

- Não estou tentando determinar o seu horário de comer. Só digo isso, porque à essa hora, geralmente, todos aqui já estão dormindo. Assim, fica difícil para você comer.

- Você está acordada.

- Eu disse geralmente.

Volto a prestar atenção ao mais importante, comida.

- Como a Camicazi anda? – Perguntou ao puxar a cadeira e se sentar.

- Com as pernas, oras. – Olho para ela com a minha típica cara de julgamento.

- Banguela!

- O que? O que quer que eu diga? Que ela está andando pelas mãos e não pelas pernas?

- Não estou falando disso, estou falando do treinamento!

- Então seja direta, há várias formas de interpretar as palavras. Hmpf!

Volto a comer, e assim que termino me concentro na pessoa que está ao meu lado.

- Você deveria ir perguntar para ela. A Camicazi é quem está treinando, eu sou o treinador. Melhor, ela é a sua filha e eu sou apenas o gato enxerido que fica com ela. Engole o seu orgulho e vá falar com ela.

- Não é orgulho e você não é enxerido...

- Se falar que é por caso da Sayaka, só vai piorar. Se não sou enxerido, então qual o melhor termo? Atrevido? Já sei qual é o perfeito, Destruidor de lares!

- Essa é a ideia que te passamos né. Eu sinto muito, não era a minha intenção.

- Já estou acostumado com isso, Camicazi não é a primeira pessoa que treino. Tenho experiência com isso, afinal são 80 anos só atuando nessa área.

- Eu achei que todos gostavam de você, o que fizeram? Espera, 80 anos??? 80 anos em idade humana, certo? – Ela estava extremamente chocada, seus olhos arregalados.

- Tenho 90 anos em idade de gato! Então me respeite, sou mais velho que todos vocês. – Demonstro meu ar de superioridade e aproveito para desviar da primeira pergunta. – Ela está indo muito bem, logo mais poderá realizar missões. Pergunte a ela e não a mim, vocês fazem falta pra ela e muito.

Afinal, superstições existem e durante muito tempo as pessoas acreditavam nisso, assim como sou um gato preto já é de se imaginar as situações que tiver que passar e passo (não são todos que deixaram de acreditar nisso). Além do mais, não é todo mundo que gosta de gatos, quem dirá ser treinado.

- De uma hora para outra ela se afastou, não sei como posso diminuir a distância. Eu deveria ter impedido isso, mas só fiquei assistindo.

- "Se a coisa mais difícil estou tendo que lidar sozinha, então porque deveria atrapalhar elas com coisas mais simples?" foi o que ela disse depois que comentei que vocês estavam mais distantes. Volte a falar com ela, vai ser difícil no início, mas depois as coisas vão melhorar.

O arrependimento estava estampado na cara dela, mas de nada adianta estar arrependida e não fazer nada. As palavras duras da Sayaka e o silêncio da Runa fizeram a Camicazi pensar que estava sozinha e atrapalhando as mesmas.

- Na verdade, você e a Sayaka deveriam se resolver primeiro e depois falar com a Camicazi. Seria a melhor coisa a ser feita, mas, claramente, você não vai seguir. Porque esse é o caminho mais difícil e demorado.

- De fato seria o melhor, mas prefiro começar pela Camicazi. É um mundo que não conheço, mas que a Sayaka fez parte durante anos e agora novamente, quero conhecê-lo primeiro para que, então, eu possa dar todo o apoio para ela e claro ajudar a Camicazi.

Acho que é a primeira vez que vejo um amor tão sincero e puro, é bonito e raro de se ver hoje em dia. Durante o tempo que fiquei apenas observando a Camicazi, pude notar o amor e a união presente nessa casa, mas agora é notável uma distância e um fingimento de que está tudo bem ou que nada aconteceu, só que quando fingimos algo é questão de tempo até que a máscara caia e revele o que realmente está acontecendo. Espero que as coisas possam seguir como a Runa disse, que aquele amor e união possam voltar mais fortes para nunca mais sumirem.

- Se você acha melhor assim, não farei nada.

- Hm, obrigada Banguela. – Disse, enquanto, se levantava com o rumo para sair da cozinha.

- Não precisa agradecer, está tudo bem. – Me junto a ela e subimos a escada.

Estou quase entrando no quarto de Camicazi, quando Runa me chama novamente.

- Não precisa sair a noite se não quiser. Pode parecer mentira, mas você é, realmente, bem vindo aqui. Peço desculpas por eu e a Sayaka ter passado a ideia oposta.

- Hm, está bem. - Entro no quarto e ela no dela.

Talvez as palavras dela mexeram comigo e não sinto mais vontade de sair hoje, talvez a companhia da ruiva não seja tão ruim como no passado. Olho para a Camicazi e a ideia de me juntar a ela não parece tão ruim assim. Faço exatamente isso e acabo tendo um bom sono.

- Camicazi, aonde estamos indo? – Pergunto, tentando disfarçar o meu nervosismo por não saber para onde raios estamos indo.

Já é dia seguinte, acompanho tanto a ida quanto a volta de Camicazi para a escola. Agora mesmo, estamos retornando, no entanto, ela optou por um caminho diferente. Como estou em seu colo, só me resta perguntar.

- Vamos passar em um lugar e depois voltamos para casa.

- E que lugar é esse?

- Vai saber quando chegar lá.

Tento ler a mente dela para saber onde é, mas sem sucesso. É estranho, dentre tantos Lendários que já tive contato, ela é a primeira que não consigo ter acesso aos seus pensamentos. Só consigo me comunicar, agora saber o que ela está pensando não é possível.

Chegamos no tal lugar e é ai que me toco, é o PETSHOP. Eu não gostei nenhum um pouco disso!

Tento sair dos seus braços, mas essa menina me aperta mais e parece que vai me esmagar. Eu vou encher o braço dela de mordidas!!

- Calma Banguela, você não vai para o veterinário. Só vim buscar uma coisa, relaxe.

- De jeito nenhum, vindo de você, qualquer coisa é possível. Ao menos tivesse vindo aqui sozinha, oras. Eu vou te arranhar!!

- Suas unhas foram cortadas.

- Te morder!

- Suas mordidas não doem.

- Te infectar então, seja lá com o que.

- Pare de drama, já disse que não é veterinário. Você vai gostar. – Que afronto é esse?

- Duvido muito. – Vamos até o balcão.

- No que posso ajudar? – Disse a atendente.

- V-vim buscar um pedido, está no nome de Sayaka Dosei.

- Ah sim, irei buscar.

Fico encarando essa ruiva, tentando prever seus movimentos, mas só consigo tirar risadas da mesma. A atendente volta com o pedido em uma sacolinha.

- Obrigada. Tudo bem se eu abrir agora?

- Claro, é até melhor que se precisar de ajuda já vai estar aqui.

- Certo, obrigada.

Pulo no balcão e vejo Camicazi abrir a sacolinha com um sorriso estampado no rosto e é ai que eu vejo. Uma coleira vermelha carregando um pingente com o meu nome.

- Agora todos saberão que você já tem um lar, tem o meu número atrás.

É a primeira vez em anos que escuto isso, tenho que admitir que fiquei emocionado. Por isso, deixo ela colocar a coleira sem reclamar.

"Banguela, isto é para você. Assim, não só você, mas todos saberão que já tem um lar."

Ah, que nostalgia agora.

Tem vezes que a Camicazi lembra muito uma Lendária que treinei um bom ano atrás, ela também gostava da minha presença e me tratava muito bem. O triste é que já se encontra morta.

- E então? O que acha? – Pergunta a atendente.

- Ficou muito bom! Banguela ficou mais lindo do que já é.

Tenho que concordar, já sou muito bonito por natureza e essa coleira só ressaltou a minha boniteza. Sei disso porque estou me olhando no pequeno espelho em cima desse balcão.

Saímos da loja.

Pelo visto, minha conversa com a Runa resultou em algo, ela e a Sayaka estão me tratando melhor. Quase toda noite, Runa me pergunta como está indo o treino e pede explicações sobre "esse mundo que não conhece". E quanto a mim, parei de ficar saindo toda noite, agora fico desfrutando da companhia da lua e das estrelas pela janela até dar o horário da Camicazi ir dormir e eu lhe acompanho. Sem perceber comecei a gostar dessa garota e nunca mais tirei a coleira.

Estou dormindo confortavelmente, quando sinto alguém me pegando. Abro os olhos e vejo que se trata de Camicazi.

Espera, ela está com uma cara de quem vai aprontar, não gosto desse olhar.

- Peguei ele, Takeshi.

- Ótimo, vamos ver como que ele fica.

- O que vocês vão fazer?! E por que o Vitor está com o celular voltado para mim?!

- Se acalme Banguela, só queremos ver como que você fica.

- Essa cara não me engana, você tá aprontando!

E é ai que eu vejo, uma ROUPINHA de ABELHA e eles querem colocar EM MIM. Mas é hoje que vai ter três assassinatos de uma vez só, minhas unhas estão grandes!!

Tento escapar de todas as maneiras possíveis, mas eles me pegaram e colocaram a maldita roupinha.

O pior é que o Vitor tirou foto...

Nunca me senti tão humilhado e com vergonha como agora, é triste e eles só dão risada e falam como que fiquei fofo. Não preciso disso para ficar fofo, eu sou fofo e lindo por natureza.

Retiro o que disse sobre gostar da Camicazi, hoje vai ser o último dia de vida desses três!

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