TRINTA E SEIS - NOAH
Ouço o barulho do despertador parecendo bem distante na minha cabeça, mas ele rapidamente se aproxima, ficando mais alto, impedindo-me de continuar dormindo. Estico a mão para desligá-lo, ajeito meu travesseiro e tento voltar a dormir. Por qual motivo ativei o despertador mesmo?
Escola. As aulas voltam hoje. Passei as férias inteira dormindo até mais tarde, voltar a rotina de acordar cedo agora é bastante complicado. Com muita luta, consigo me sentar na cama. Esfrego os olhos para conseguir abri-los e me espreguiço. Parece que não dormi nada.
Só depois do banho me sinto realmente acordado. Arrumo minhas coisas e vou para a cozinha.
– Bom dia!
Harold está botando café em sua caneca, minha mãe está terminando de comer e Amy ainda está pegando a caixa de cereal.
– Bom dia, filho! – minha mãe diz.
– Obrigado, Amy. – Pego a caixa da mão dela e me sirvo primeiro. Amy me empurra. – Ei, calma aí! – coloco na tigela para ela também. – Você nem parece que está acordada.
– Não estou. – Ela resmunga e se senta ao lado de nossa mãe.
– Carona? – Harold pergunta apoiado na pia com sua caneca na mão.
– Não, obrigado. – Respondo derramando leite em minha tigela. – Gosto de ir andando, você sabe.
– Não sei por que ainda oferece. – Amy diz a Harold.
Reviro os olhos para ela e começo a comer.
– Estávamos pensando em te dar um carro de presente. – Minha mãe diz levando seu prato para a pia.
Travo com a colher a caminho da boca.
– Não estão pensando mais? – indago.
– Não precisa de carro. Gosta de andar, lembra? – Amy resmunga. Está mais mal-humorada hoje que o habitual.
– Não era para contar a ele, Julia. – Harold passa o braço por trás dos ombros de minha mãe e olha para mim. – Nós pensamos nisso não tem muito tempo e ainda não sabemos quando iremos te dar.
Não importa, saber que irei ganhar é o suficiente para me deixar mais animado. Ter meu próprio carro vai facilitar muito às coisas. Nada de pedir o carro deles emprestado, nada de táxi, nada de ligar para minha mãe me buscar. Só não quero para ir à escola. Gosto mesmo de ir andando com Callie como minha companhia.
– Já agradeço. – Sorrio.
– Você merece. – Minha mãe diz só para me deixar sem jeito.
– Rápido, Amy. Não podemos demorar. – Harold termina de beber seu café.
Amy assente, mas continua comendo lentamente.
– Eu não posso esperar. Tenho que ir. – Minha mãe diz. – Nos vemos a noite.
Ela beija o alto da cabeça de Amy e passa a mão no meu cabelo.
– Bom trabalho! – dizemos todos nós juntos.
Ela acena e vai embora.
Amy começa a reclamar que queria estar dormindo e eu quase me junto a ela.
– Eu também queria. – Harold diz. – Mas o que podemos fazer?
– Podemos fingir que ainda não acordamos e voltar para a cama. – Amy sugere abrindo um sorriso.
– Nada disso, espertinha. – Harold faz o sorriso de Amy desaparecer rapidamente. Ele pega o celular e respira fundo. – Olha aí por que não podemos fingir. – Ele leva o celular ao ouvido e sai da cozinha. – Morgan falando.
Amy resmunga e volta a comer.
Termino meu cereal e levo a tigela para a pia.
– Ei, linda. Estou indo. – Passo por ela e beijo seu rosto. – Tente não dormir em nenhuma aula.
– Vou tentar. Boa aula!
– Pra você também.
Saio da cozinha e pego minhas coisas. Harold não parecia nada feliz com quem falava ao celular. Ele acena para mim quando vou para fora.
Não é apenas o primeiro dia de aula. É o primeiro do último ano. Eu nem sei como reagir a isso. É meu último ano com meus amigos, depois cada um irá para um lugar diferente. Muita gente não consegue manter contato com os amigos escola, eu espero conseguir.
Chego à casa de Callie e a espero na varanda. Verifico as horas e vejo que não estamos atrasados. Encaro a porta, pronto para apertar a campainha, e ela se abre. Callie sai apressada como sempre. Ela só não topa comigo porque estou preparado, um pouco afastado e pronto para segurar seus ombros.
– Ei. – Sorrio para ela. Não há quase espaço entre nós.
– Ei. – Ela abre um sorriso enorme e aproveita que estamos bem próximos para me beijar.
– Só isso para me dar forças de enfrentar um dia de aula. – Sussurro contra seus lábios.
– Foi pensando nisso que consegui sair da cama. – Ela diz beijando o canto da minha boca e se afastando. – Estamos atrasados?
– Até que não. Acabei de chegar aqui. – Começamos nosso caminho. – Como você está?
– Bem, eu estou bem. – Sinto sinceridade em sua voz. Ela olha para mim. – E você?
– Ótimo.
Só de saber que ela está bem e ver um sorriso genuíno em seu rosto, eu me sinto ainda melhor. Depois de tudo que passamos, ser feliz é o que ela merece.
– Preparado para o último ano? – Callie pergunta segurando meu braço.
– Não sei. Acho que só quando eu entrar na escola, eu saberei. E você? Preparada?
– Sim. Acho que sim. Quando você começa a trabalhar em mais músicas?
– Ainda não sei. Tenho que me organizar com os horários agora. Te contarei quando eu começar.
– Espero mesmo que conte, nada daqueles malditos "talvez sim, talvez não" – ela me imita.
Solto uma risada.
– Eu vou contar, pode deixar. Sei que vai insistir para saber de tudo mesmo.
– Claro que eu vou querer saber de tudo, vai que você escreve uma música sobre comida.
– Se eu escrever, você será a primeira a saber. Pode ter certeza.
– Aí você me leva direto para o hospital.
– Não entendi. – Callie se acaba de rir.
Aproximamo-nos do portão da escola. Espero Callie me explicar, mas ela não diz nada. Apenas aperta a mão em meu braço e para de andar. A serenidade em seu rosto desapareceu dando lugar ao pânico.
– O que aconteceu, Callie? – Ela não está olhando para mim. Sigo seu olhar e a única coisa que noto são as pessoas próximas a entrada com os olhos em nós. – Tem alguma coisa errada para estarem olhando para nós?
Não consigo compreender. Volto a olhar para Callie.
– Eu acho que eles sabem – ela diz, amedrontada com a ideia de todos estarem encarando-a.
– Sabem sobre o que, exatamente?
– O que aconteceu com Mike, Noah.
Volto a olhar para os outros. Não tem razão alguma para estarem olhando para Callie desse jeito por causa do Mike. Posso ver alguns cochichando entre si e isso me irrita. Seguro firme a mão de Callie e com a outra mão, aceno para eles.
– Será que nós podemos ir pelo estacionamento? Lá vai estar mais vazio. – Callie anda mais devagar para tentar se esconder atrás de mim.
– Callie, você não fez nada de errado. – Respiro fundo. – É só ignorar.
– Era por isso que eu queria que ninguém soubesse do que eu tive com Mike.
– Eu entendo. As pessoas falam mesmo, só não podemos nos importar.
– A entrada dos fundos é uma ótima opção, Noah. Por que não vamos por ela?
– A entrada principal é essa e nós vamos por aqui. – Digo com firmeza. – Eu sei que é complicado, mas tenta ignorar.
– Me empresta seu casaco? – Callie entra na minha frente, me impedindo de andar.
– Se estivesse com frio, eu emprestaria. Mas para se esconder, não. Sinto muito. – Ajeito o cabelo dela.
– Obrigada pelo apoio, Noah – diz ironicamente.
– Você sabe que vai ter que enfrentá-los, não sabe? – pergunto com as mãos em seus ombros. – Ou vai se esconder até a última aula do dia? Até o fim da semana? Esse assunto só vai morrer quando eles notarem que você não dá a mínima para o que eles pensam, Callie. Se esconder não vai ajudar.
– No momento, eu não estou a fim de enfrentar ninguém.
– Nem comigo ao seu lado?
Ela toma um momento para pensar.
– Você disse que me ajudaria – ela olha ao redor e relaxa os ombros. – Não me solte, ok? – sinto seus dedos se entrelaçarem aos meus.
– Pode deixar.
Passamos pelo portão e os cochichos deixam de ser em voz baixa. Não perco meu tempo tentando entender o que dizem, apenas ergo a cabeça e seguro firme a mão de Callie para dar certeza a ela de que não a soltarei.
Conseguimos pegar nossos horários de aula e chegar em nossos armários sem mais problemas. Callie está quase enterrada em mim, toda vez que ela sentia que ia surtar, apertava seu corpo contra meu braço.
– Está melhor? – tenho que perguntar.
– Eu queria que você tivesse em todas as aulas comigo, seria bem mais fácil. – Ela insere a senha do cadeado. – Eu já te disse que estou melhor, Noah.
– Só estou perguntando. Bem, eu sei que não precisará de mim agora.
– Quem disse que eu não vou precisar de você? – ela pega seu caderno, fecha o armário e me encara. – Eu preciso de você, sempre precisarei, por mais que custe admitir isso as vezes.
– Quer que eu te acompanhe até sua sala? Só preciso passar no meu armário primeiro.
– Eu adoraria sua companhia.
Pego em meu armário o que preciso para a primeira aula e vou com Callie até a porta do laboratório de química. Estudo nossos horários no caminho para saber que aulas nós vamos ter juntos.
– Hoje, no último tempo teremos biologia. – Observo.
– Só no último tempo?
– Infelizmente.
– Pelo menos é biologia. Se eu tiver alguma dúvida, fica mais fácil de me ajudar. – Ela analisa e sorri.
Paramos ao lado da porta do laboratório. Sorrio para ela e seguro seu queixo.
– Lembre-se do que eu falei. – Inclino–me para olhar bem em seus olhos. – É só ignorar.
– Obrigada, Noah.
Eu a beijo com ternura e lentidão.
– Nos vemos no intervalo. – Sussurro.
– Sim. Até mais tarde. – Ela diz.
Mas não nos afastamos. Sua mão quente está em meu rosto e a minha em sua cintura. Voltamos para o beijo. É como se não estivéssemos preparados para nos vermos apenas no intervalo, como se não pudéssemos ficar longe um do outro.
Sorrio aprofundando o beijo.
– Acho que estou atrasado para a minha aula. – Digo sem me mover.
Callie me dá um beijo rápido antes de recuar.
– É melhor você ir. – Diz descendo a mão pelo meu ombro. – Até mais!
Beijo seu rosto, aceno e corro para a minha aula de economia. A sala é bem longe daqui.
Chego na sala e o professor ainda não está. Respiro aliviado e me sento. Coloco meu caderno sobre a mesa e vejo que não sou o único que chega correndo. Tyler passa pela porta pedindo desculpas pelo atrasado automaticamente e quando não vê o professor, ri de si mesmo, junto com toda turma.
Ele se senta na cadeira em frente à minha e se vira para trás.
– Só se sabe falar de uma coisa nesta escola. – Ele sacode a cabeça. – Michael Sloan. Como podem estar sentindo a falta dele?
Dou de ombros e rabisco o alto da folha de meu caderno.
– Não quero saber do que estão falando, muito menos se tiver Sloan no assunto, Tyler. – Deixo claro.
– Como isso não te irrita?
– Irrita, mas se eu for ligar, vou acabar explodindo. Estou muito bem assim. – Ergo o olhar para ele. – E você esperava que não falassem nada? A cidade é pequena e o Mike era o melhor jogador da equipe.
– Isso porque nunca me aceitaram no time. – Tyler resmunga.
– Talvez seja por causa do teste que você não passou? – ergo as sobrancelhas.
– Eu não estava preparado aquele dia. – Ele argumenta me fazendo voltar a atenção para o rabisco em meu caderno. – Não podem nos julgar por um dia ruim.
– Tente esse ano outra vez. – Sugiro.
– É o que farei. – Ele se inclina mais na minha mesa. – No que está pensando?
– Em nada específico. – Fecho o caderno. – Como está Bella?
– A ponto de matar o próximo que perguntar a ela sobre Mike. E Callie?
– Ela está bem. – Pelo menos eu acredito que sim. Ela é forte, mesmo que ache que não.
– Ah, quase esqueço de te falar. – Tyler começa a mexer em seu celular. – Querem você, Noah!
– Como é? Quem? – franzo a testa.
– Todo mundo. Mais pessoas querem te ouvir, mais lugares querem uma apresentação sua. Eu nem estou conseguindo lidar direito.
– É sério?
– É sério, Noah. Ontem meu celular não parou de tocar.
– Conseguiu alguma coisa?
– Meu amigo, está uma disputa. Dois restaurantes te querem para sábado da outra semana. Estou estudando qual será melhor para você, vendo o público e essas coisas. Não podemos arriscar. – Ele guarda o celular. – Chloe e eu somos quase melhores amigos. Conversamos e a única preocupação dela é você ficar sobrecarregado com a escola, as novas músicas e shows, mas eu a assegurei que vamos fazer tudo direitinho.
– É, eu tenho que dar conta.
– E vai dar, tenho certeza.
Sorrio animado e dou um soquinho no ombro de Tyler.
– O que seria de mim sem você?
– Apenas um Noah muito sem graça. – Ele entorta os lábios.
Rimos até que o professor Huntington entra em sala se explicando pela demora. Tyler se vira para a frente e eu foco minha atenção no professor.
Encontro Callie com Annie, Bella e Jessie sentadas a uma mesa no pátio externo. Sento-me ao lado de Callie e aceno para as meninas.
– Já estou sentindo falta das férias, e vocês? – pergunto.
– Meu Deus, Noah, as férias mal acabaram! – Callie resmunga.
– Eu sei, mas podiam ter durado um pouco mais.
– Tenho que concordar – Annie diz digitando algo no celular. – Eu não dei o máximo de festas que podia.
– Nada mais de ir as suas festas para sempre. – Digo pegando um pedaço da pizza de Callie. – Delas eu não sinto falta.
– O que você tem contra as minhas festas, Noah Young? – a voz de Annie parece ameaçadora. Bom, ninguém nunca falou mal das festas dela antes.
– Elas são sinônimo de confusão. – Levanto as mãos em forma de rendição.
– Ei, Annie, se você quer entrar numa faculdade, você não vai dar mais festas esse ano – Bella lembra. – Todo mundo vai ter que estudar, até você.
– Pelo menos o meu aniversário eu vou comemorar – ela dá de ombros. – Eu nem sei se quero fazer uma faculdade mesmo.
– Por que não? – Callie parece surpresa. – A faculdade de moda é a sua cara, mas eu também te indicaria jornalismo.
– Não sei se estou animada para passar mais quatro anos da minha vida estudando.
– Seus pais não vão te bancar para sempre – retruca Jessie. – Eu vou acabar fazendo faculdade por aqui mesmo, melhor que ficar sem estudar.
– Melhor vocês pararem com esse assunto chato porque Tyler chegou! – ele se anuncia e se senta ao lado de Bella. – Que tal sairmos essa tarde? Temos que aproveitar a única folga antes das coisas piorarem.
– Eu concordo, mas o que sugere? – pergunto.
– Eu acabo de dar a ideia de sairmos, para onde iremos é com vocês. – Ele dá de ombros.
– Santa Mônica Café, quem é a favor, por favor, erga sua mão – Callie dispara.
Todos nós erguemos nossas mãos, apenas Annie hesita. Olhamos para ela.
– Vocês fazem complô contra as minhas festas, mas, admitam, adoram minha companhia – então ela concorda com a sugestão de Callie.
– Marcado. – Tyler acena para alguém atrás de mim. – Ei!
Thomas se aproxima da mesa e sorri.
– E aí? Como vocês estão? – pergunta.
– Estamos bem. – Respondo por todos. – E você?
Thomas abre a boca para responder, mas Tyler o corta.
– Por que não fica aqui com a gente?
Ele lança seu olhar para Jessie e vejo que Callie não consegue ficar quieta.
– É, Tommy, por que você não fica aqui com a gente? – ela não está satisfeita com a postura dele. – Você já deu os parabéns ao Noah pelo contrato?
Sei bem pouco dos motivos desse estranhamento. Thomas e Jessie terminaram, mas, pelo que eu ouvi, foi de um jeito amigável.
– Vamos lá, Thomas. Não há motivo para se afastar de nós. – Falo e aponto para o lugar vazio. – Sente-se aí. – Ele continua de pé. – Marcamos de ir ao Santa Mônica Café hoje à tarde, quer ir com a gente?
Ele parece pensar um pouco.
– Hoje não vai dar. – Diz.
– Ele não quer mais andar com a gente. – Tyler diz para mim.
– Não é nada disso, Ty. Hoje eu não posso, só isso. – Thomas aperta uma mão na outra. – Podemos marcar outra coisa depois.
– É, podemos. – Digo.
Thomas dá um tapinha em minhas costas.
– Parabéns pelo contrato. Sinto muito por não ter aparecido na festinha que organizaram pra você.
– Tudo bem. Não vai mesmo se sentar aqui? – não quero ser chato em ficar insistindo, mas ele ainda não deu uma resposta.
– Eu tenho que ir. Nos vemos por aí. – Ele sai antes mesmo que eu consiga dizer mais alguma coisa.
Tyler parece incomodado.
– Depois falamos com ele. – Murmuro. Tyler assente e fala alguma coisa com Bella. Olho para Callie. – Como foram as primeiras aulas?
– Quase liberaram um gás tóxico no laboratório e eu morri de tédio com literatura – ela pega um pedaço da pizza com indiferença.
– Nem quero pensar em quando será minha aula no laboratório. – Ajudo-a com a pizza.
– Não pense, então.
– Tem algum conselho para me dar para quando eu for falar com Tommy? – Aproveito que não tem ninguém prestando atenção em nós.
– Não force-o a fazer o que não quer e tente entender que ele pode estar assim pelo fato de Jessie estar conosco enquanto ele ainda se sente deslocado. Nós não o afastamos em momento algum, ele acabou fazendo isso sozinho – ela para de falar como se as palavras entalassem em sua garganta – assim como você fez, Noah.
– Nossa situação foi diferente. Eu achei que eles estivessem bem.
– Eu também achei. Jessie chorou um pouco, mas isso é normal. Eles não brigaram, não foram traídos, só não deram certo. Eu continuo sem entender porque Tommy está agindo assim.
– Espero que ele me diga.
– Espero que ele não esteja envolvido com os amigos do irmão – ela diz com amargura.
– Eu não acho que esteja. – Espero estar certo. – Tentarei falar com ele ainda hoje.
– Diga que estamos sentindo falta dele. – Callie acrescenta e segura minha mão.
– Não me mate, mas preciso perguntar. – Beijo as costas de sua mão. – Como você está?
Ela sorri e mexe no meu cabelo.
– Eu estou bem, Noah. Não precisa ficar preocupado comigo o tempo todo.
– É mais forte que eu. – Reconheço. – Me sinto mais tranquilo quando tenho certeza que está bem. – Abaixo a cabeça, sem conseguir encará-la. – E esse assunto sobre Thomas parece estar te fazendo lembrar do que aconteceu com nós dois.
Tomo coragem para levantar os olhos, mas Callie não está olhando para mim. Está focada em nossas mãos.
– Desculpe. Eu não esqueci. Não é algo que se esquece fácil, mas não está me afetando como você deve estar pensando. – Ela levanta o rosto para mim. Um pequeno sorriso reaparece. – Nós nos tornamos pessoas melhores depois do que aconteceu. E eu gosto de como estamos, então não vou deixar o passado me atingir agora.
Meu sorriso se abre e eu a puxo para um beijo.
– O passado não pode contra a gente. Tenho certeza. – Beijo-a novamente.
– Por favor, parem. Estou comendo! – Tyler reclama.
Afasto-me de Callie e fulmino Tyler com os olhos. Ele dá de ombros e divide sua atenção entre sua pizza e Bella.
Annie começa a reclamar de algum professor que já passou trabalho para a turma dela e Tyler e Jessie a apoiam. Bella tenta fazer Tyler ficar quieto, mas não consegue. Callie e eu ficamos rindo.
O sinal toca e vamos para nossas aulas.
Depois de uma boa aula de biologia, sei que preciso ir atrás de Thomas.
– Ainda bem que é a última aula. Eu não aguento mais nada depois disso. – Callie desabafa assim que chegamos em meu armário.
– Nem teve nada extraordinário na aula, Callie.
– Fale por você.
Termino de guardar minhas coisas e vejo Thomas do outro lado do corredor, em seu armário.
– Eu vou falar com ele. – Aviso a Callie. – Me espere para irmos embora juntos, ok?
– Estarei com Annie lá fora. – Ela me beija e segue em frente.
Vou até Thomas e paro ao lado dele.
– Precisamos conversar.
Ele fecha o armário e me olha preocupado.
– Aconteceu alguma coisa?
– Eu que pergunto. Por que está agindo desse jeito?
– De que jeito? Não estou entendendo. – Ele fica um pouco tenso, logo sei que ele está entendendo, sim.
– Tyler está chateado com você. – Digo. Thomas fica um pouco sem jeito. – Não quer mesmo me contar o que está havendo?
– Noah, é difícil. Você deveria entender. – Ele apoia as costas no armário. – Quando terminou com Callie também se afastou dos outros.
Bem lá no fundo eu sabia que ele ia dizer algo assim.
– É diferente. Muito diferente. – Me apoio contra o armário também. – E de qualquer forma, eu fui um idiota. Não quer agir do mesmo jeito. – Olho para ele. – Está saindo com Hunter e companhia?
Ele levanta os ombros.
– Eu vou às vezes à casa do Spencer jogar um pouco. Não é exatamente sair com eles.
Sinto-me um pouco aliviado. Acho que não tem nada de errado em apenas jogar videogame.
– Você e Jessie, vocês acharam melhor terminar, não foi isso?
– Mais ou menos, cara. É o que nós estamos falando, mas foi um pouco mais esquisito do que vocês pensam.
– Esquisito? O que aconteceu?
– Jessie e eu estávamos nos estranhando há dias, como se o que a gente sentia tivesse acabado. Você sente que o relacionamento acaba, mas tenta ignorar aquilo. Foi esquisito – ele mexe no cabelo enquanto parece buscar palavras para continuar falando. – Só que agora, parece que ela seguiu em frente, mas eu não, eu continuo sentindo algo pela Jessie.
Eu não estava preparado para isso. Fico sem saber o que dizer.
– Você pode tentar conversar com ela. – Recomendo. – Você não sabe se ela realmente seguiu em frente.
– Olhe para ela, cara. Claramente ela seguiu em frente. Se nós voltarmos a sermos bons amigos, o mundo desaba.
– Você não tem certeza disso. Está se afastando de seus amigos e isso não é legal.
– Eu preciso de um tempo para pensar, Noah.
– Estamos sentindo sua falta, Tommy. – Coloco a mão em seu ombro. – Você tem o direito de pensar, mas estaremos no café mais tarde e ficaremos bem felizes se você aparecesse. – Sorrio para tentar convencê-lo.
– Não prometo nada, mas vou tentar.
– Tente mesmo. E você sabe que se precisar de qualquer coisa, pode falar comigo. Só não se afaste.
– Pode deixar, Noah – ele sorri timidamente. – Obrigado pela ajuda.
– Por nada. Se cuida.
Despeço-me dele e procuro por Callie para irmos embora.
Callie e eu somos os primeiros a chegar no Santa Mônica Café. Nossa mesa – acho que podemos chamá-la assim – não está vazia, então nos sentamos ao lado onde há lugar para os outros quando chegarem. Deixo Callie cuidando da mesa e pego nossas bebidas.
– Aqui está. – Entrego a ela seu copo e me sento ao seu lado.
– Eu não consigo enjoar disso – ela aponta para a bebida. – Vicia muito!
– É bom que não enjoe mesmo, assim eu sei sempre o que pedir.
– Mesmo se eu enjoasse, eu te falaria qual você tem que pedir para mim.
– Teria que me lembrar. Eu nem penso no que pedir, sai automaticamente.
– Como se você fosse esquecido e não prestasse atenção nas coisas – ela prende o cabelo e sorri. – Você está me encarando, Noah.
– Não posso? – ergo as sobrancelhas.
– Fica difícil pensar quando você está assim.
– Eu gosto de olhar pra você. Não quero perder nenhum detalhe, sabe? – minha voz sai baixa.
– Não espere uma conversa inteligente comigo se for ficar me encarando, então.
– Não sei como você só reparou agora.
– Antes você era mais discreto – reclama.
– Sinto muito pela indiscrição. – Sorrio e bebo meu café.
– Não se desculpe.
– Tentarei não encarar tanto, mas não prometo nada.
– Tentarei não falar besteiras, mas não prometo nada – Callie me desafia com o olhar.
– Você não fala besteiras.
Callie continua com o olhar desafiador, portanto prefiro não dizer mais nada.
Pego o copo de sua mão e o coloco sobre a mesa ao lado do meu. Ajeito-me para ficar de frente para ela e levo suas mãos até meus ombros, mas Callie decide envolver os braços em meu pescoço. Aceito bem isso. Coloco minhas mãos em sua cintura e aproximo meu rosto do seu, sem desviar o olhar.
– Se bem que eu acho que não precisamos de uma conversa inteligente agora mesmo. – Abaixo os olhos para os seus lábios e sinto que ela está encarando os meus também.
E então estamos nos beijando. Callie me puxa para mais perto dela, subindo uma das mãos para o meu cabelo. Mantenho o controle, beijando-a com calma, mostrando a ela que estou feliz por estarmos juntos, que é aqui com ela que quero estar e que problema nenhum irá nos afastar novamente.
Aperto minhas mãos em sua cintura antes de levá-las para suas costas. Pretendo parar esse beijo apenas quando nós tivermos que respirar – que não parece tão importante neste momento.
Sinto seu sorriso e sorrio também. Seguro seu rosto e não demoro a abrir os olhos. Preciso ver seu sorriso.
– Eu amo tanto o seu sorriso. – Suspiro e encosto os lábios em seu rosto.
Callie segura meu queixo e me afasta o necessário para observar meu rosto.
– Eu também amo o seu. – Ela continua mexendo em meu cabelo.
Sorrio mais ainda e a beijo novamente, contudo dessa vez dura pouco.
– Chegaram! – Callie diz pegando seu copo e olhando em direção a entrada.
Vejo Annie entrando com Jessie ao seu lado e Tyler e Bella logo atrás. Aceno para eles que pegam suas bebidas antes de virem até nós.
– Chegaram há muito tempo? – Bella pergunta sentando do outro lado da mesa com Tyler.
– Chegamos? – pergunto a Callie. Perdi a noção do tempo.
– Mais ou menos. – Callie dá de ombros. – Por que demoraram?
– Annie. – Tyler responde.
Annie se senta do outro lado de Bella e respira fundo.
– Eu não fiz nada. Passei na casa de Jessie para buscá-la.
– Você viu que Bella estava só esperando aquele homem sair para colocar o carro na vaga, então você foi mais rápida e ficamos sem vaga. – Tyler explica apertando os olhos para ela.
– Esperamos vocês encontrarem outra vaga. – Jessie defende.
– Tyler, por favor. – Bella coloca a mão sobre a dele.
– Não há nada de errado em ser mais rápida. – Annie leva seu copo à boca e olha para longe.
– Estão discutindo por causa de uma vaga para estacionar o carro? – começo a rir.
– Era melhor ter vindo de bicicleta. – Tyler comenta. – Mais prático, mais ágil. Sem brigas.
– Não, não mesmo. Eu não enfrentaria esse sol da tarde pedalando por aí. – Bella balança a cabeça.
– O sol está maravilhoso. – Tyler sorri para ela. – Você ainda vai pedalar comigo por aí. Não vai querer mais outra coisa. – Ele volta a olhar para nós todos. – É até uma boa ideia para todo mundo. Enquanto as coisas estão leves.
– Nem em sonho você me verá pedalando, Tyler. – Annie diz rapidamente.
– Qual o problema de vocês com a bicicleta? – ele pergunta quase ficando de pé.
Callie segura o meu braço e noto que está rindo.
– Eu topo, Ty. – Digo.
– É melhor que seja ainda esta semana. – Callie indica e sei que aceita a ideia. – Não sei se as coisas ainda estarão leves na semana que vem.
– Pode contar comigo. – Jessie sorri.
Tyler fica encarando Bella, esperando alguma resposta dela.
– Certo, Ty. Eu aceito.
Ele comemora e beija o rosto da namorada.
– Serei obrigada a ir, é isso? – Annie questiona. Todos nós confirmamos. – Ah, como vocês quiserem. Mas na próxima vez, eu irei decidir o que faremos e onde faremos.
– Nada de festas. – Aviso.
Ela revira os olhos e brinca com a beirada do copo.
Tyler nos conta que se inscreveu para os testes para entrar no time de futebol americano da escola. Eu tenho que segurar o riso para não derramar meu café.
– Eu não acho que seja a sua cara. – Jessie é a primeira a comentar.
– O que? Eu amo todos os esportes, Jessica. – Ele passa o braço ao redor de Bella. – Quero vocês torcendo por mim.
– Estaremos lá, Ty. – Callie diz animada.
Ela me cutuca para que eu diga o mesmo.
– Sim, estaremos. – Sorrio para ele. – Mas é bom treinar antes.
– Não será um problema. – Ele diz.
Sei que se Tyler pudesse, ele faria parte de todas as equipes e grupos da escola. Ele só não gosta de ficar parado. Passando ou não no teste, ele ficará bem. E se não ficar, estarei por perto.
– Oi, gente!
Todos ficam um pouco espantados ao ver Thomas. Ele segura um prato com waffle e sorvete e tem um sorriso no rosto.
– Que bom que decidiu vir! – aceno para ele.
– Eu sabia que não tinha compromisso algum. – Tyler resmunga e aponta para o espaço vazio ao lado de Annie.
– Eu tinha, mas resolvi. – Thomas se explica ao se sentar. – Meu pai queria me ajuda com algo. Lembrei que estariam aqui, então eu vim. – Ele olha para mim. – Fiz mal?
– Claro que não. – Balanço a cabeça.
Noto que ele ainda está um pouco sem jeito, mas pelo menos veio. Espero que algum dia ele volte a se sentir bem com todos nós.
– Você está bem? – pergunta Jessie parecendo preocupada.
– Eu acho que sim. – Ele responde sem olhar diretamente para ela. – O que estavam falando?
Olho para Callie que está olhando para mim.
– Tyler vai fazer teste para entrar na equipe de futebol americano. – Respondo entrelaçando os dedos com os de Callie. – Ele quer nossa presença.
– Só me dizer o dia e a hora. – Thomas diz e estica o braço para bater no ombro de Tyler. – Mas tem certeza de que é isso que você quer?
Tyler enterra o rosto nas mãos.
– Ele ama todos os esportes. – Bella diz deslizando a mão pelo cabelo de Tyler.
– Eu nunca soube disso. – Thomas ri.
– Ninguém nunca me perguntou. – Tyler se pronuncia.
Quando percebo, estamos todos nós rindo. Inclusive Tommy e Jessie. Sinto que essa estranheza não vai demorar para ir embora.
Passamos o resto da tarde juntos, conversando, rindo, aproveitando a companhia um do outro. Afinal, não sabemos quando conseguiremos outro dia assim de novo.
Tento controlar a felicidade que invade meu peito. Eu tenho uma família e amigos que me apoiam e tenho Callie que me ama e está aqui comigo para o que eu precisar.
Joguei as lembranças ruins fora – nada de pensar no passado, nada de fugir, nada de segredos. Espero que Callie também tenha conseguido se livrar das dela. Pelo sorriso em seu rosto, eu diria que sim.
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