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Samaris

Desde que eu era criança, a ideia de um homem de sucesso não me parecia muito bonita. Do alto dos meus dez anos de idade, tudo que eu sabia sobre os homens de sucesso era que eles acordavam muito cedo, envolviam o pescoço com um pedaço de pano e degolavam-se com ela.

Eu sou mulher, o que não tornava a situação mais agradável. As mulheres de sucesso usavam maquiagem feia, sapatos desconfortáveis e exibiam o mesmo semblante desesperador. Como se não bastasse, queriam que eu me esforçasse para alcançar esse status superior de tristeza. Todos os dias, na escola, repetiam para mim um discurso sobre como eu devo prestar atenção nas aulas, tirar boas notas, fazer uma bela faculdade para (se eu tiver sorte) viver a vida de uma "pessoa de sucesso". Não, muito obrigada! Eu prefiro ser feliz. Essa opção existe, não?

Meu pai era um homem de sucesso. De muito sucesso. Vivíamos numa grande mansão, afastados do resto da cidade. Meu pai usava helicópteros quando estava com pressa e nunca dirigia o seu próprio carro. Ainda assim só parecia realmente satisfeito quando chegava em casa e me encontrava brincando na sala.

O sorriso que abria era tão grande que transformava os seus olhos puxados em duas fendas (ele é japonês, aliás. A minha mãe não. Eu sou uma mistura).

— Samaris, venha aqui! — ele exclamava. Eu sempre pulava em seus braços, ele me balançava de um lado para o outro e brincava comigo até o Katsu aparecer (meu tutor, senhorio da casa) e avisar que era a minha hora de ir para a cama.

Nunca briguei para ir dormir, pois era um momento mágico. Quando deitava na cama, já sabia o que estava por vir. Meu pai pegava o seu objeto acústico de seis cordas como um príncipe saca a sua espada. Sentava em um banco ao lado da cama e começava a tocar o seu violão.

Da mesma forma que o meu pai se impressionava com as mesmas coisas todas as tarde, eu me impressionava com as músicas todas as noites. Era muito difícil entender que um objeto curvo de madeira, com cordinhas estendidas, como um varal, pudesse emitir histórias tão bonitas:

— Eu quero aprender a tocar violão, também — falei, ainda deitada na cama, quase pegando no sono. — Igual a você!

— Claro, Samaris . Eu te ensino.

— Os dedos doem? — perguntei.

— Só no comecinho...

Ponderei mais alguns segundos:

— Dói a cabeça?

Ele riu.

— Por que doeria a cabeça?

— Não sei...

— Qual música você quer que eu toque?

— Aquela dos Bitus.

— Dos Beatles?

— Isso!

— Ela se chama let it be.

Aquela música me proporcionava uma sensação muito parecida com um abraço. Quando cantada pelo meu pai, era como um abraço dele, que tocava sorrindo, alternando o olhar entre o violão e eu. Havia noites em que a visão dele cantando era mais importante do que a música.

Depois que a música acabava, era hora da história. Não eram várias fábulas, mas uma só, que fora dividida em várias partes. Toda noite meu pai me contava um pouco mais sobre a menina do tamanho de um polegar, que precisava de cuidados especiais dos seus pais que tinham um tamanho normal. A sua mãe costurava suas roupas usando uma lupa, ela dormia deitada no algodão e tomava banho em uma xícara.

Um dia, a menina do tamanho de um polegar caiu da bolsa da sua mãe, enquanto voltavam do mercado. Era tão pequenina que não fez barulho ao encostar na grama e sua mãe não pode sentir diferença no peso da bolsa. Ela gritou e gritou, mas não se fez ouvir.

A menina do tamanho de um polegar se viu sozinha em um mundo onde até a grama era maior do que ela e começa uma jornada em busca da sua casa. Nesse meio tempo, é sequestrada por formigas, consegue escapar, fica amiga de uma borboleta e quase é esmagada diversas vezes. Era uma aventura, cheia de reviravoltas e emoções. Eu adorava.

Também era uma história enorme. Ela começou quando eu tinha sete anos de idade e durou até os catorze, sem nunca ter chegado ao seu final. O hábito de ouvir histórias ao pé da cama é uma daquelas coisas que vai sumindo aos poucos, conforme você vai crescendo.

Duas partes específicas doem quando você está aprendendo a tocar violão: a ponta dos dedos e as costas das mãos.

A ponta dos dedos porque você precisa pressionar bem a corda para que a nota saia com decência. Isso dói e vai formando, aos poucos, um calo resistente. Nas costas das mãos é onde fica o maior problema. O esforço que você faz para separar um dedo do outro, da forma que o acorde pede, funciona como um alongamento forçado e o seu reclama disso.

Sem contar nos acordes em que você precisa fazer uma pestana, que consiste em segurar todas as cordas do violão com um único dedo. É uma das coisas mais difíceis do mundo.

Mesmo assim, segui treinando. Todos os dias, no jardim da minha casa, para que ninguém pudesse escutar os meus erros. Durante a noite, meu pai me ensinava um pouco, me passava alguns conselhos. A maior parte, aprendi sozinha.

Prestes a completar dezoito anos de idade, já tocava de olhos fechados:

— Nós precisamos comprar um celular para você — minha mãe disse, ao me encontrar tocando, deitada na grama do nosso jardim. — Essa casa é grande demais e você simplesmente desaparece com o seu violão, o tempo todo. Eu nunca sei se você realmente está em casa até te encontrar.

Ela sentou ao meu lado, na grama. Usava um vestido florido de verão e o cabelo preso em um coque.

— Eu não gosto de tecnologia — respondi. — Você pode sair gritando pela casa, juro que vou responder quando ouvir.

— O problema é você reparar em qualquer outra coisa que não seja esse violão — ficou me encarando com um ar de serenidade por um tempo. Eu conhecia bem aquela expressão. Eu sabia o que viria em seguida...

— Você virou uma mulher tão linda.

— Não começa, mãe.

— Mas é verdade! Você é uma mulher linda! O homem pelo qual você se apaixonar será muito sortudo...

— Não pretendo me apaixonar. Não nessa vida.

— Ninguém planeja apaixonar-se, Samaris — uma nuvem escura cobriu o jardim e começou a derramar uma chuva surpresa sobre nós.

— Não posso molhar o meu violão!

— Vamos correr para dentro!

Não precisamos andar muito e logo encontramos o Katsu carregando grandes guarda-chuvas a nossa procura. Do lado de dentro, meu pai nos esperava vestindo trajes de gala:

— Vocês duas ainda não estão prontas? Que surpresa!

— Prontas para o que? — perguntei.

— O seu pai tem um jantar importante, mas eu tenho certeza de que você não quer ir— minha mãe respondeu, fechando os nossos guarda-chuvas e entregando para o Katsu.

— Vamos deixar a Samaris decidir — meu pai interrompeu, esperançoso. — Querida, você quer ir?

Eu ri.

— Pode apostar que não!

Ele pareceu levemente contrariado, mas me deixou ficar. Subi para o meu quarto e cochilei ouvindo os sons da minha mãe esborrifando perfume em si mesma, escolhendo os sapatos e penteando os próprios cabelos. Ela sempre conseguiu ser muito mais doce do que eu.

Ouvi o barulho da porta, do carro e de eles indo embora. Levantei-me, olhei pela janela e observei o seu carro preto cruzando a esquina, sumindo da minha vista.

Eu deveria ter ido ao evento.

Existe uma propriedade da matéria que consiste em oferecer resistência à mudança do estado de movimento. Chamam de inércia aquilo que faz com que um corpo permaneça sempre com a mesma velocidade e em linha reta, a menos que uma força interfira no movimento.

Acredito que isso esteja relacionado com um fenômeno comum do automobilismo. Quando chove muito e a pista está molhada, frear bruscamente pode não ser uma boa ideia, pois a camada de água na pista faz com que o carro continue a deslizar e o motorista perde total controle sobre o veículo.

O nome do fenômeno é Aquaplanagem e foi isso que matou os meus pais.

Eu deveria ter ido ao evento.

Minha mãe morreu na hora, como uma vela que apaga ao ser assoprada. Meu pai estava no hospital naquela noite, já com a sentença dos médicos de que não haveria muitas esperanças para ele.

Encarregaram Katsu de me dar a notícia e eu puder notar a tortura que ele sofreu para conseguir falar.

Eu deveria ter ido ao evento.

Os homens gostam de dinheiro. Segundo os médicos, meu pai não deveria receber visitas, mas a quantidade de dinheiro necessária me colocou dentro do hospital, na sala de emergência, no meio da madrugada.

Tudo estava silencioso, exceto pelo bipe dos aparelhos. O meu velho não usava máscara de oxigênio ou tubos na boca. Seu rosto não parecia tão agredido quanto o resto do corpo.

Sentei-me ao seu lado e o ouvi respirar durante alguns minutos. Aos poucos, ele abriu os seus olhos e me encarou:

— Samaris... O que você está fazendo aqui?

— O Katsu falou que você está mal...

— Eu sei. Os médicos já me explicaram tudo.

— Está doendo?

— Sim...

Eu queria falar alguma coisa importante. Algo bonito, que fizesse aquela conversa valer a pena. Não conseguia pensar em nada:

— Essa sensação é ruim demais...

— Do que você está falando?

— Perder algo que amo. É sufocante.

Ele moveu a mão a procura da minha. Não parecia capaz de levantar o braço, então eu mesmo a peguei. Faltavam dois dedos.

— Samaris, nós nunca realmente perdemos algo. Tudo que você lembra e ama não pode ser apagado, entende? Você apenas vai viver coisas diferentes daqui para frente.

— Eu não quero sentir isso de novo.

— A outra opção seria nunca mais amar nada.

Ficamos em silêncio durante alguns minutos.

— Como a história termina? — eu odeio quando a voz vacila e denuncia que estamos fracos. Ao contrário do que as pessoas pensam, a voz pode nos entregar muito mais do que os olhos. Quando vacilamos ao falar, todos os nossos muros caem e o resto do corpo parece em não se importar em revelar-se triste. Assim que as lágrimas caem.

—Que história?

— A da menina do tamanho de um polegar. Você contou essa história durante anos, mas nunca me contou o final. O que aconteceu? Ela encontra o caminho de volta para casa?

Ele sorriu:

— Esse era um segredo meu. Eu inventava a história conforme contava para você, improvisando. Eu não sei o que acontece, a história não tem final. Nunca precisei contá-la.

— Eu estou aqui agora — disse, limpando as minhas próprias lágrimas. — Você pode inventar um final agora.

Meu pai olhou para o meu rosto da mesma forma que fazia quando me encontrava brincando na sala de estar, ao final do dia:

— A menina do tamanho de um polegar nunca encontra o caminho para casa — contou. — Mas também percebe que não precisa de uma casa. Sente saudades dos seus pais e de como sua vida era, mas entende que o mundo é um lugar repleto de possibilidades e que ela pode encontrar a felicidade onde quer que esteja...

— Obrigada, pai — tomei coragem para contar o que queria. — Eu não vou ficar em casa. Não quero mais. Não quero ter coisas, para não precisar perder coisas. Acho que vou levar o meu violão e tocar nos bares e nas ruas. Conhecer outras lugares e não me apegar a nenhum deles. O que você acha disso?

Não houve resposta. Nem a mim e nem a ninguém. Ele já não estava mais ali, e sim no misterioso mundo do outro lado da cortina. Chamei os enfermeiros, que marcaram o horário em um pedaço de papel.

Levei um ano me preparando. Na mala, meia dúzia de roupas úteis e fáceis de lavar. O case para o violão precisava ser bom, se eu fosse realmente correr o mundo, ele carecia de aguentar as adversidades.

Aos dezoito, transferi o dinheiro da herança para a minha conta pessoal. Não quis me despedir de Katsu, pois aprendi que despedidas são uma droga. Fui embora durante a madrugada, como um fantasma.

Chego a uma nova cidade, canto no bar para conseguir algum dinheiro extra, durmo nas camas dos hotéis, converso com desconhecidos e parto cinco dias depois.

É difícil. Perigoso, muitas vezes, tendo em vista que já fui perseguida na rua, não uma, mas duas vezes. Sei me cuidar.

Quanto mais velha a pessoa, melhor de se conversar, melhor a história que ela tem a contar. Uma cigana me presenteou com a sorte no pedaço de papel, abri o bilhete e nele dizia que eu devia amar os poetas.

Algumas cidades são sujas e barulhentas, outras são calmas e limpas. Todas carregam a sensação de que são o centro de seu próprio cosmos ignorando o quão o mundo é grande e com infinitas possibilidades. Sinto que estou passeando por diferentes planetas, conhecendo diferentes espécies e culturas que se distraem com as suas próprias bobagens.

Desde então, as pessoas, as coisas, os lugares, são como música para mim. Eles existem enquanto ressoam pelo ar, se fazendo escutar. Sempre impalpáveis, abstratos, sem pesos ou medidas. Sem necessidade de cuidados ou medo de arrependimentos. Sem nunca precisarem de uma despedida.

Aos poucos, vou me tornando música.

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