Capítulo Três
Will desejava muitas coisas para sua vida. Desejava cada coisa com certa vontade e certa afeição, na medida, conforme fosse preciso. Mas ele desejava e nunca deixaria de fazer isso.
Beatriz o deixou em casa depois da visita ao laboratório.
O jovem cumprimentou a família, mas não jantou e nem interagiu mais do que o necessário. Foi diretamente para seu quarto, onde se trancou.
As luzes no laboratório de pesquisa foram só o começo da sua experiência. No caminho de volta, Willian foi fazendo mais experiências e desejos. Pediu garoa, pediu um semáforo verde, pediu mais um litro de gasolina pro carro da Beatriz, pediu uma bala de hortelã no seu bolso, pediu até um pouco de bateria no seu celular.
E tudo aconteceu.
As luzes no laboratório não tinham sido um fato isolado.
- Muito bem – Willian esticou os braços e estalou os dedos. – Vamos brincar um pouco.
Ele desejou que as luzes do quarto se acendessem sozinha. A lâmpada do abajur ficou tão brilhante quando um farol na neblina.
Então desejou que houvesse uma queda de energia no bairro. Willian ouviu alguns gritos de protestos da família, dos vizinhos, de alguém que tomava banho no chuveiro elétrico e talvez alguém que assistisse o jogo da seleção. O jovem correu até a janela e olhou para a rua, conseguia ver até as estrelas do céu.
- Ok, desejo eletricidade de novo – ele disse olhando pela janela.
A luz voltou, as estrelas sumiram.
- Certo, agora eu quero dinheiro – Willian desejou. – Quero um colchão de notas de 100 reais marcadas com uma caneta permanente vermelha a cada 100 notas marcadas com uma caneta azul.
A matemática dos desejos era bem precisa, perfeita e plausível. A razão de notas foi feita, marcadas e organizadas, preenchendo todo o espaço que há poucos instantes era espuma no colchão.
- Ok, isso é muito legal – Willian disse animado. – Muito legal.
Ele desejou que o dinheiro desaparecesse logo em seguida, não precisava dele mesmo.
Willian pegou o celular e ligou pra Beatriz.
- Amor, sério, tá acontecendo uma coisa muito legal comigo – ele estava saltitando de animação.
- O que está acontecendo, uma aranha te mordeu e tu ganhou poderes?
- Bom, quase isso.
- Então o que foi, me fala logo – Beatriz estava muito interessada e animada também.
- Tenho que te mostrar pessoalmente.
Willian parou por um segundo e pensou em uma oportunidade.
- Eu vou testar uma coisa, chego ai em um segundo.
- Um segundo? Vai viajar na velocidade da luz?
O jovem já tinha desligado o celular.
Ele virou pra parede verde do seu quarto e se concentrou na suas mãos, nos seus pés, em seu corpo, em qualquer parte seja de onde fluísse aquela habilidade. Estava com um pouco de tontura, mas estava em pé e vivo, a adrenalina em seu corpo não deixava ele relaxar.
- Eu desejo um portal pra casa da Beatriz – pediu.
Um vórtex de luz surgiu na sua parede, parecia um buraco de minhoca em escala infantil para literalmente colocar na parede do quarto. Era incrível.
Will deu dois passos pra trás, cambaleando, sentindo sua visão turva e olhos pesados. Indo contra as vontades do seu corpo, ele correu e foi em direção ao portal que tinha aberto. O jovem desmaiou antes de atravessar o vortex, o portal fechou e seu corpo bateu na parede de tijolos.
Willian caiu desacordado no chão.
Na manhã seguinte, Will acordou após o meio dia, atrasado pra qualquer compromisso e extremamente fraco também. Parecia que tinha acabado de acordar de um coma.
Andou zonzo pelo quarto, andou o suficiente para cair na sua cama dessa vez e dormir por mais algumas horas. Seu corpo estava se restaurando, tudo tinha sido um gasto de energia muito grande para Will.
Ele só levantou no meio da tarde com o celular tocando. Era Beatriz.
- Ok, eu já estou um pouco preocupada com você – ela disse primeiro. – Então decidi ligar.
- Eu estava dormindo.
- Até agora? – sua voz mudou.
- Estava cansado.
Willian olhou ao redor e então viu a luz do seu abajur brilhando forte. E se lembrou de tudo.
- Beatriz, me encontra no parque, em uma hora – ele falou.
Antes mesmo da resposta da namorada, ele desligou o celular.
O jovem levantou entusiasmado, desejou um banho e estar vestido bem, por motivos tantos de experiência quanto preguiça, e então saiu da casa.
Uma hora depois Willian encontrou Beatriz no parque da cidade.
- Eu estou começando a ficar assustada – ela disse. – Tenho que falar isso.
- Relaxa, está tudo bem e tudo sob controle. Agora nós precisamos ir pra um lugar mais afastado.
Antes mesmo da garota responder, o jovem já puxava ela em direção ao interior do bosque até uma clareira. Deixou a namorada de um lado do campo e foi até o outro. Willian estava se sentindo renovado e bem poderoso também.
- Beatriz – ele começou calmo – Antes de qualquer coisa, quero que saiba que eu só descobri isso ontem a noite e ainda não sei quais os limites disso.
- Isso o que?
- Já vou te mostrar – Will tentava disfarçar a animação. – Agora deseja alguma coisa.
Beatriz olhou duvidosa pra ele.
- Vamos, qualquer coisa, o que vier pela sua mente – ele insistiu.
A garota ainda estava receosa, mas acabou cedendo.
- Um telescópio – pediu. – Eu quero um telescópio.
Will repetiu sussurrando o desejo, tentando gravar ele em sua mente. Fechou os olhos e se concentrou também, repetindo novamente o pedido com vontade.
- Um telescópio – ele desejou.
Na frente de Beatriz, de forma instantânea e discreta, surgiu um equipamento tecnológico de metal e plástico, com lentes amplas e voltado pro céu, ótimo para colocar no jardim ou no laboratório de garagem.
A garota ficou surpresa, sem palavras. Will ficou feliz, tinha dado certo.
- Entendeu agora?
- Como você fez isso?
- Eu não sei, mas é uma coisa muito legal.
Beatriz parou por alguns segundos, trocando olhares entre o telescópio e seu namorado.
- Willian – ela começou. - O que você desejou para aquela estrela cadente?
- Eu nem lembro, o que isso importa?
- Tem que lembrar, me fala o que você desejou.
A mente de Willian foi até o dia do seu aniversário, até a lembrança da sua primeira estrela cadente e seu pedido. "Eu quero desejar algo sempre que quiser". Ele repetiu o pedido para Beatriz ouvir.
Ela estava surpresa.
- Isso é incrível! – Beatriz falou.
- Eu sei, não é?
- Não, não você – ela continuou.- Sua habilidade, ela é consequência do seu desejo, bom, é o seu desejo literalmente!
Beatriz repassava anotações e fazia cálculos mentais, então chegou a sua conclusão.
- Willian, acho que você é a prova que minha teoria está certa! – ela disse.
- Eu sou?
- Sim, você é!
Estrelas cadentes eram energia cósmica. Energia cósmica era a essência de tudo no universo, se transformava em qualquer coisa, e concedia desejos. Will tinha desejado poder desejar. Will tinha sua própria energia cósmica agora.
Ele podia criar na realidade a partir da energia cósmica. Parecia tudo muito logico para Beatriz. E depois da explicação, para Will também.
- Eu posso desejar qualquer coisa então?
- Isso é meio precipitado de falar agora – Beatriz falou. – Eu quero testar.
- Eu que tenho habilidades e você quer me testar como um rato de laboratório.
Beatriz sorriu pra ele.
- Exatamente.
Willian assentiu, estava bem interessado também. Talvez não conseguisse fazer tudo sozinho, testar tudo sozinho. Beatriz ia ajudar muito, talvez o contrário, ele que fosse ajudar ela.
- Ok, quando começamos?
- Agora mesmo – a garota respondeu.
Beatriz começou a conduzir os testes de imediato, sem pausas, queria ver o que Will podia fazer.
Will começou com o básico confiante. Movia grama, pedras, árvores, o telescópio que Beatriz tinha ganhado, a própria Beatriz. Só precisava desejar que qualquer coisa ia aparecer onde ele quisesse quando ele quisesse.
- Acho que podemos elevar um pouco o nível – ele disse.
- Como está se sentindo?
- Bem, como se tivesse acabado de acordar.
- Ótimo, vamos elevar o nível então.
Will começou a desejar carros, ônibus, um caminho cheio de areia, um caminhão cheio de pedregulho, uma razão um para dois de areia e sal. Tudo ia se acumulando na clareira.
- A matemática é certa – ele disse.
- Pelo jeito a energia cósmica é bem precisa nos desejos.
- Eu testei isso ontem.
- Você desejou dinheiro, né?
Willian deu com os ombros.
Eles começaram a testar as precisões dos desejos então. Will desejou uma estátua de elefante azul com pintas amarelas, ábaco antigo com o número 384 com pinos de cores quentes, um cubo mágico onde cada parte tinha que ser um elemento da química orgânica em um bloco maciço.
- Como eu crio um bloco maciço de oxigênio? – Will perguntou.
- Deixa pro universo decidir isso. Só deseja.
O cubo mágico surgiu na sua frente como ele tinha pedido.
- Como você está? – Beatriz perguntou.
- Com fome, e talvez um pouco cansado.
- Quero testar uma ultima coisa e nós paramos por hoje.
Will concordou e decidiu ouvir a namorada.
- Nós só testamos coisas materiais – ela disse. – Objetos, coisas físicas, um cubo mágico de oxigênio, carbono, nitrogênio e algo mais. Será que conseguimos algo imaterial?
- Defina imaterial.
- Você consegue desejar voar?
Will aceitou a proposta.
O jovem se concentrou no pedido e sentiu seu corpo responder de imediato. Abriu os olhos e estava levitando cerca de um metro chão. Beatriz olhava surpresa pra ele.
- Ok, você consegue voar – ela disse.
Willian disparou pelo ar como um foguete. Era veloz, sentia o vento em seu rosto, se sentia um herói. Ficou fazendo círculos no ar, dando rasantes próximo a Beatriz e depois subindo ao céu de novo.
Foi alto, muito alto. Mas então parou cansado, sua visão pesava e seu corpo parava de responder. Willian começou a perder altitude, caia em direção ao chão, rápido, atraído pela gravidade.
Com o mínimo de consciência, ele desejou algo macio para cair.
E apagou.
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