Capítulo 12
Com os dedos trêmulos, eu apertei sobre o contato de Laetitia, no meu celular, e apesar de saber que a minha amiga tinha os seus próprios dilemas para lidar naquele momento, ela era a minha última esperança.
Depois de alguns toques, pude então ouvir a voz alegre e doce da atriz, do outro lado da linha:
- Bom dia, fugitiva! - ela brincou comigo, insinuando sobre o fato de eu ter escapado à francesa de sua festa. - Como foi a sua noite com o bonitão?
- Bom dia, Laetitia! - eu respondi, sem conseguir esconder que estava um caco. - A noite foi realmente ótima, mas tudo terminou com a chegada da manhã...
Eu ouvi a minha amiga suspirar do outro lado da ligação, muito frustrada e preocupada comigo. Era muito claro que eu estava melancólica e desanimada.
- O que houve, Júlia? - ela perguntou, pronunciando o meu nome com seu sotaque bonito. - O que foi que ele fez?
- Sinceramente, ele não fez nada que fosse mau. Eu que sou complicada demais para me abrir para alguém - eu confessei, mesmo sem dizer nada demais. - E é justamente porque a minha vida está um caos agora, que eu preciso muito da sua ajuda...
Naquele segundo eu me senti mal, por ter que incomodar a Laetitia com os meus dilemas, mas se eu não arrumasse um emprego logo, o que seria de minha pequena Alexia?
- Diga o que precisa, que farei de tudo para te ajudar - ela disse, sem demonstrar estar chateada com a minha ligação. - O que tanto te incomoda, Júlia?
- Eu preciso urgentemente de um emprego - eu falei logo. - Eu sei que você pouco sabe sobre a minha vida, mas posso te adiantar que é disso que depende o futuro da minha filha.
- Oh, por que não me disse ontem que você também é mãe? - ela perguntou, muito curiosa com o assunto. - Agora, quanto ao emprego, saiba que a sorte está mesmo ao seu lado, pois eu iria te ligar ainda hoje, para te dizer que encontrei algo para você... Eu só não te liguei antes, pois achei que estaria curtindo com o bonitão!
- Ah, jura? - eu fui direto ao assunto, pois não queria falar sobre o Gabriel. - O que encontrou para mim?
- Uma amiga muito querida de minha família está construindo um hotel de luxo aqui em Paris, e neste estabelecimento terá uma parte dedicada à recreação das crianças, e ao mostrar o seu trabalho para ela, ficou encantada e muito interessada em ornamentar boa parte do hotel com os seus mosaicos... - ela disse, parecendo realmente animada. - E eu já lhe garanto que ela irá pagar muito bem... Então, o que me diz dessa proposta? Posso apresentar vocês duas em um café aqui em minha casa?
- Ah, Laetitia, eu não poderia ouvir uma notícia melhor! - eu disse, já vibrando de esperança. - Se não for te atrapalhar, eu aceitaria mesmo que você intermediasse o nosso encontro.
- Para mim será um prazer, Júlia... Mas já te digo que só te ajudo, se me contar a sua história também! - ela falou, me mostrando a mim que tinha um lado curioso também.
- Eu te conto, sim, mas já vou avisando que não é uma história bonita... - eu falei, com medo de que ela se afastasse, ao ouvir sobre os horrores vividos por mim no passado.
- Toda história tem o seu lado bonito e o seu lado feio, Júlia... Então só nos basta decidir qual lado queremos cultivar dentro de nós - Laetitia disse, mostrando que apesar de tudo, ela era bastante positiva. - Se arrume e venha logo para cá, pois quem sabe eu não consiga encontrar um ponto de luz em meio à sua escuridão?!
Depois disso, eu e minha amiga nos despedimos, e depois de eu alimentar Vicenzo e de limpar a sua caixa de areia, eu tomei um banho e me vesti, decidida a pegar logo um táxi que me pudesse levar até a mansão de Laetitia.
Todavia, ao deixar a minha residência e cruzar as ruas de Montmartre, eu comecei a me questionar se Alexia iria gostar de viver ali, pois depois de tantas perdas, eu não queria fazer com que a minha pequena se sentisse ainda mais furtada, ao levá-la embora de sua terra natal.
Mas ao me lembrar do tanto que minha filha adotiva era forte e resiliente, eu percebi que seria bastante fácil para ela, escrever uma nova história ali em meio às belezas de Paris.
Não tardou muito após essas reflexões de minha mente, e eu me vi dentro da mansão de Laetitia, sendo recebida calorosamente por minha amiga, que me abraçou afetuosamente.
E logo após isso, nos sentamos frente a frente, em sua extensa sala com paredes de pé alto e grandes janelas de vidro.
Todos os móveis daquele cômodo eram de luxo e de cor clara, o que remetia ainda mais para mim, como tudo ali na mansão de Laetitia, era no estilo clássico e elegante.
- Está pronta para saber sobre a minha tragédia? - eu perguntei, fingindo bom humor, mas, na verdade, eu estava com muito medo da reação dela.
- Estou pronta para te ajudar a ver o melhor lado dessa história, sim! - ela disse, muito convicta de que tudo tinha mesmo dois lados.
Eu então contei para Laetitia como eu e Denise nos conhecemos, ainda na infância, e sobre como mais tarde, eu tinha me apaixonado pelo irmão da minha melhor amiga.
Todavia, no decorrer da minha trama - que tinha tudo para ser linda, se não fosse o preconceito e a maldade humana -, eu mostrei para Laetitia, que em alguns casos, o "príncipe" poderia virar "sapo", e não vice-versa.
- Quer dizer que o seu ex-namorado te humilhou, só porque não quis apoiar as atitudes racistas e preconceituosas dele? - Laetitia perguntou, muito indignada.
- Na verdade, ele sempre foi tóxico e machista, eu que fechei os olhos e não quis ver a verdade, antes de tudo isso acontecer com a minha melhor amiga - eu fui sincera, afinal, antes do estopim, quando Denise engravidou de Paulo, Jonas já havia dado muitos outros sinais de que era maldoso, mas mesmo assim, eu os havia ignorado. - Todavia, depois que a Denise engravidou de um negro, e que toda a família passou a ameaçá-la e agredi-la, eu não tive mais como fingir que não estávamos à beira de um abismo... E a verdade era que estávamos mesmo, tanto que a minha melhor amiga está morta agora!
- O que houve exatamente com ela? - Laetitia perguntou, realmente interessada na minha história.
- Um dia, depois de milhares de ameaças por parte da família de Denise, sempre dizendo que ela deveria abandonar Paulo e a bebê que tiveram juntos, a minha amiga resolveu ir embora com a sua recém-família, para bem longe da maldade dos seus outros familiares, porém, no caminho até a outra cidade, o carro em que estavam perdeu o freio, causando assim um acidente muito grave... - eu falei, mas engasguei um pouco, em meio às lágrimas que vieram aos meus olhos com aquela lembrança. - A única sobrevivente foi a Alexia, que estava devidamente instalada em sua cadeirinha. Mas depois de vários exames, os médicos descobriram que ela havia sofrido uma lesão na coluna e que desse modo, nunca chegaria a andar em sua vida... - Naquele segundo eu desabei no choro; não porque eu não soubesse que a minha filha poderia ser feliz e realizada, do jeito que era, mas sim, porque eu desconfiava que aquele acidente não havia acontecido de maneira natural, e sem provas, nunca poderia vingar a minha amiga e o seu amado. - E foi assim que eu me tornei a mãe da minha pequena... Porém, nem depois da morte da Denise e do Paulo, os familiares da minha amiga deixaram eu e a minha filha em paz. Muito pelo contrário, sempre aproveitaram cada oportunidade que tiveram, para nos humilhar, sempre chamando a minha maravilhosa garota de aberração, somente pelo fato de eles serem pessoas muito más e sem alma. E é por isso também, que aceitei recomeçar tudo aqui na França: para que nunca mais nenhum deles possam ferir a minha doce Alexia com as suas palavras preconceituosas. Afinal, ela é perfeita para mim, do jeitinho que ela é!
- Que horror, minha amiga! - Laetitia disse, enquanto pegava as minhas mãos nas dela e me olhava dentro dos olhos, com sinceridade. - Mas o que realmente importa agora, é que faremos de tudo para que a Alexia conquiste tudo o que quiser... Saiba que estou contigo nessa luta, Júlia. Eu faço mesmo questão de te ajudar com tudo o que essa garotinha precisar, pois só de ela ter sobrevivido a tudo isso sendo ainda uma criança, eu tenho total certeza de que a Alexia merece conhecer o melhor lado dessa vida.
- Obrigada, minha amiga - eu disse, verdadeiramente emocionada. - Em breve eu irei buscar a minha pequena, e você será a primeira pessoa a conhecer ela.
Laetitia sorriu para mim, pois juntas éramos mais fortes. Afinal, de uma forma espontânea, cada uma havia segurado na mão da outra, nos momentos difíceis e adversos, que haviam surgido em nossos caminhos. E se essa não era uma grande amizade verdadeira, eu já não sabia mais o que poderia ser.
- Mas não pense que esqueci da sua noite com o bonitão nao, hein... então, pare de fugir, e me conte logo tudo! - ela pediu, muito entusiasmada com aquela história.
E sem poder negar nada a Laetitia, depois de sua ajuda providencial, eu contei em partes, tudo o que havia acontecido comigo e com o Gabriel. Porém, mesmo ouvindo de minha amiga que ele parecia ser um cara legal, eu também sabia que não estava preparada para me abrir para um romance. Afinal, ainda faltava muita coisa, até que eu e a Alexia estivéssemos bem, vivendo tranquilamente ali em Paris.
Então, até que esse momento chegasse, as minhas emoções teriam que ficar em suspenso; mesmo que a bússola do meu coração insistisse em apontar a todo instante para uma nova rota.
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