VII. 𝑷𝒓𝒊́𝒏𝒄𝒊𝒑𝒆 𝒆𝒏𝒄𝒂𝒏𝒕𝒂𝒅𝒐
Emily Prentiss
Depois de duas semanas afastada, confesso que quase enlouqueci. O que me ajudou foi a visita dos meus colegas de equipe.
Primeiro, Derek apareceu com comida italiana e filmes de comédia. Pela primeira vez, ele deixou de lado os flertes e piadinhas e se mostrou um verdadeiro amigo. Fin e Rollins também vieram, trazendo cerveja para eles e uma bebida sem álcool para mim. Aproveitei para saber mais sobre o caso que estavam investigando. E, por último, Olívia.
Ela, que no início parecia me fuzilar com o olhar, agora me via como sua parceira e, quem sabe, até uma amiga. Além de trazer comida chinesa para o nosso jantar e passar um tempo conversando, trouxe um pacote de ração e uma nova bolinha de lã para Lili. Esses gestos fizeram toda a diferença para mim.
25 de setembro 2002
Enquanto me arrumava em frente ao espelho, Lili me observava com seus olhos curiosos e atentos de sua caminha. Finalmente livre da tipoia, eu estava pronta para voltar ao trabalho. Às vezes, ainda sentia algumas fisgadas, mas nada que um analgésico não pudesse aliviar.
Durante o trajeto até a delegacia, decidi parar em uma padaria local. O aroma do café fresco e dos pães quentinhos encheu meus sentidos. Comprei um café preto para mim, um salgado e alguns donuts, que eram para compartilhar com meus colegas. Adoçar o dia deles parecia uma maneira perfeita de celebrar meu retorno.
Quando meus sapatos pretos cruzaram a entrada da sala, uma onda de calor e entusiasmo me envolveu. A recepção foi calorosa e inesperada: aplausos, sorrisos e abraços se multiplicaram por todo o ambiente. Alguns colegas se aproximaram, exclamando palavras de boas-vindas e expressando sua felicidade por me ver novamente. Senti um rubor subir pelas minhas bochechas enquanto tentava absorver a energia positiva ao meu redor.
— Olhem o que eu trouxe para vocês! — falei, entregando a caixa de donuts para Derek. — Mesmo que eu não seja fã de doces pela manhã, fiz esse esforço só por vocês.
Todos riram e Derek deu um beijo estalado na minha bochecha antes de colocar a caixa aberta na mesa.
— Você é a melhor! — ele exclamou, sorrindo.
Olívia se aproximou com um sorriso caloroso.
— Estamos todos felizes por ter você de volta, Emily. Eu estou especialmente animada por ter minha parceira de volta. — Ela tocou meu braço de maneira gentil.
Eu lancei a ela um olhar e um sorriso de agradecimento. Se ela soubesse o quanto a sensação era recíproca. Essas duas semanas longe me fizeram perceber o impacto positivo que ter conhecido Benson teve na minha vida e como a equipe é importante para mim.
Antes que a recepção pudesse continuar, o Capitão saiu de sua sala com uma expressão séria, interrompendo a euforia.
— Bom ter você de volta, Emily. — Ele começou, seu tom sério indicando que a notícia seguinte não era leve. — Recebi uma ligação do Monsenhor, e preciso que você e Olivia vão verificar com cautela, por favor.
Antes que eu pudesse sair com minha parceira para o local, Crager me chamou para sua sala. Entrei e ele me cumprimentou com um sorriso cordial, mas seus olhos demonstravam preocupação.
— Emily, antes de começarmos, preciso saber se você realmente está pronta para voltar ao trabalho de campo. Não queremos que você se sinta pressionada.
Olhei nos olhos dele com firmeza e confiança.
— Estou pronta, Capitão. As semanas me ajudaram a recarregar as energias, e estou pronta para enfrentar qualquer desafio que apareça.
Ele assentiu, um semblante de aprovação no rosto.
— Ótimo. Vamos lá então. O caso nos espera e, com você de volta, estou certo de que faremos um excelente trabalho.
Saí da sala de Craiger com um senso renovado de determinação. Olivia já me esperava dentro do carro, com as mãos no volante, pronta para dar partida.
Ao chegarmos no Centro de Acolhimento fomos recebidas por Cabolt, que nos deixou a par do caso: Ellie Mendoza, catorze anos, desmaiou durante uma aula na Bendito Salvador, escola religiosa, e a suspeita é que esteja grávida. A mesma está retraída e se recusa a dizer quem seja o pai do bebê, querendo apenas ficar abraçada com a avó.
— Você fala bem espanhol ? — perguntou Cabolt, me observando atentamente. — A avó, é porto-riquenha.
— Falo, sim. É uma das línguas que domino — respondi, tentando não soar convencida.
— Ótimo, então você fala com a avó e eu converso com a garota. Combinado? — disse Olívia, virando-se para mim. Assenti com a cabeça em sinal de concordância.
A avó de Ellie, dona Guadalupe, me acompanhou até uma sala reservada, onde poderíamos conversar com mais calma. Gentilmente, ofereci a cadeira à frente e, assim que ela se acomodou, sentei-me de frente para ela.
— Señora, debe ser muy difícil criar sola a una niña de catorce años — comecei, tentando criar uma conexão com ela. — Só vocês duas moram no apartamento?
— Sí — respondeu com um suspiro. — Hace diez años mi hija falleció, desde entonces cuido de Ellie. Minha filha... — ela hesitou por um momento, com o olhar distante — foi uma menina difícil, sempre se metendo em problemas. Engravidou aos quinze.
— Lo siento mucho — disse, com sinceridade.
Ela assentiu e continuou, a voz carregada de lembranças.
— Sempre falo para Ellie tomar cuidado, para não seguir os mesmos passos da mãe. Mas minha neta... ela é diferente. Está esperando o homem certo, o príncipe encantado.
Pude notar o brilho de esperança nos olhos de Guadalupe, enquanto ela falava sobre Ellie. Era um amor misturado com a preocupação de uma avó que já havia visto o pior, mas ainda acreditava no melhor para sua neta.
Eu não sabia se sentia mais compaixão pela situação de Guadalupe ou pela ilusão que ela mantinha — e que parecia ter passado para Ellie — de que príncipes encantados existem. Não apenas por eu ser uma mulher bissexual e saber que posso me apaixonar tanto por uma mulher quanto por um homem, mas porque já entendi que nossa felicidade não pode estar atrelada a outra pessoa. Criar essa fantasia de que o príncipe virá num cavalo branco para salvar é, na verdade, uma das ideias mais perigosas. Além disso, na vida real, a maioria dos garotos e homens que conhecemos são apenas sapos disfarçados de encantados.
Depois de fazer mais algumas perguntas sobre a relação entre as duas e o comportamento de Ellie nos últimos meses, agradeci a Guadalupe e me dirigi à saída, onde Olívia me aguardava.
— A senhora Mendoza acredita fielmente que a neta está esperando pelo príncipe encantado — suspirei, ainda incrédula com a situação.
— E a garota não quer falar. Disse que a criança é um milagre de Deus e que não teve relações — Olívia balançou a cabeça, frustrada. — Vamos ter que investigar mais a fundo.
Assenti, ciente de que isso não seria simples.
De volta à delegacia, repassamos tudo o que conversamos com Ellie e a avó. Três horas depois, o laboratório confirmou o que já suspeitávamos: Ellie está realmente grávida, e já está de dois meses.
— Como é possível se ela está com o hímen intacto? — Derek perguntou, perplexo.
— Isso não é impossível — respondi, sentando-me na minha mesa e tirando um chiclete do bolso.
— Na verdade, é mais comum do que vocês imaginam — Olívia acrescentou, pegando um chiclete da minha mão. Trocamos um olhar cúmplice.
— Algum homem envolvido na vida delas? — Rollins perguntou, sempre direta.
— A avó disse que o pai raramente aparece — respondi.
— E ela garante que não tem namorado e muito menos a neta — completou Olívia, enquanto se acomodava em sua cadeira.
— Much e Derek, vocês falam com o Monsenhor. Fin e Rollins vão falar com o pai da garota. E vocês duas... — ele nos apontou — vão até o Bendito Salvador. Conversem com as amigas e professores.
Cumprimos as ordens do capitão e seguimos direto para a escola de Ellie, o Bendito Salvador. Ao chegarmos, fomos recebidas pela diretora, uma mulher de postura rígida e profissional. Conversamos com ela em sua sala, uma típica sala de diretoria com certificados pendurados nas paredes e uma mesa organizada com precisão.
— Qualquer coisa que tenha acontecido com Ellie, garanto que não foi dentro da escola — afirmou, cruzando os braços em uma postura defensiva. Era sempre a mesma história: ninguém nunca sabe de nada, ninguém nunca vê nada. E, claro, a escola sempre garante que seus muros protejam todos os alunos.
— Entendo — respondi, sem esconder meu ceticismo. — Mas ainda assim, gostaríamos de conversar com alguns alunos.
Após um breve silêncio desconfortável, ela finalmente assentiu.
— Está bem. Vou permitir que falem com alguns colegas de classe dela — disse, tentando manter a aparência de colaboração.
Olívia e eu seguimos pelos corredores da escola, que estava em seu típico ritmo: professores falando, alunos rindo em grupos ou caminhando apressados. Paramos na sala de aula de Ellie, onde aguardamos a autorização para conversar com os outros jovens. Sentia o peso de estarmos invadindo um mundo de aparências, onde tudo parecia calmo e em ordem, mas sabíamos que, sob a superfície, as verdades que procurávamos estavam escondidas.
— Vamos ver o que eles têm a dizer — murmurei para Olívia, enquanto nos preparamos para interrogar os colegas de Ellie, esperando que alguém finalmente quebrasse o silêncio.
A maioria dos jovens mencionava o mesmo nome: Arturo. Disseram que ele estava sempre ao lado de Ellie, inseparáveis. Uma das estudantes até usou a expressão "como um cachorrinho atrás do osso" para descrevê-lo. Como Arturo havia faltado à aula, conseguimos seu endereço com a diretoria e decidimos fazer uma visita.
A casa era simples, humilde, mas irradiava aconchego. Fomos recebidos pela mãe de Arturo, que, desconfiada, nos deixou conversar com ele na sala de estar. Ela parecia preocupada, temendo que o filho estivesse em apuros. Percebendo a tensão no ar, Olívia, sempre rápida em suas ações, pediu um copo de água, criando uma desculpa perfeita para me deixar a sós com Arturo.
— É um prazer conhecê-lo, Arturo — sorri de forma acolhedora. — Eu sou a detetive Emily Prentiss, mas pode me chamar só de Emily.
Ele assentiu com a cabeça, um pouco hesitante.
— Estamos aqui por causa da Ellie — continuei.
— Ela está encrencada? Ou doente? — perguntou de imediato, visivelmente preocupado. — Eu sei que ela não foi à escola hoje.
— Você falou com seus colegas? — perguntei, observando sua reação. Ele confirmou com um gesto discreto.
— Não conta pra minha mãe, ela não gosta que eu mexa no celular — admitiu com um sussurro, quase como um segredo. Eu apenas assenti, compreensiva.
— Arturo, estou aqui para saber se a Ellie tem namorado... ou se está saindo com alguém — perguntei, tentando parecer casual.
— Não, não que eu saiba. Ellie é uma garota legal — ele disse, abrindo um sorriso tímido.
— Vocês parecem ser grandes amigos, não é? — comentei. Ele balançou a cabeça afirmando. Decidi tentar uma abordagem diferente. — E quanto a um professor... ou o pai de alguma colega? Pode confiar em mim.
Ele começou a parecer nervoso, seus olhos vacilaram, como se estivesse se sentindo pressionado.
— Eu não sei... Se eu soubesse, eu falaria — sua voz tremia e ele parecia lutar para respirar. — Eu... preciso da minha bombinha...
Arturo ficou visivelmente desconfortável quando toquei no assunto de Ellie estar envolvida com alguém. Seu corpo enrijeceu, e logo ele precisou usar a bombinha de asma, tentando desesperadamente recuperar o fôlego. A tensão no ar era palpável, e percebemos que continuar pressionando só pioraria a situação. Optamos por encerrar a conversa e sair.
— Tenho a sensação de que Arturo sabe mais do que está disposto a admitir — comentei enquanto abria a porta do carro.
— Concordo. Essas duas crianças parecem estar apavoradas com o que aconteceu com Ellie — respondeu Olívia, seus olhos fixos nos meus, carregados de uma seriedade que me fez hesitar.
Por um breve momento, me perdi naquele olhar profundo, uma intensidade que me deixou um tanto desconcertada. Quando percebi o que estava fazendo, senti minhas bochechas esquentarem. Disfarcei rapidamente, me alegrando pelo fato de ela já estar entrando no carro, sem notar o meu embaraço.
Enquanto dirigíamos de volta para a delegacia, tentei mudar o foco da conversa.
— A Ellie é esperta. Se algo a ameaçasse, ela teria contado para alguém, não? Talvez Arturo tenha medo de quem está por trás disso — sugeri, tentando organizar meus pensamentos.
— Pode ser. Ele parecia mais do que apenas preocupado com a amiga. O medo que vi nele era profundo, algo que vai além de uma simples preocupação adolescente — Olívia comentou, pensativa, enquanto olhava pela janela.
O silêncio entre nós cresceu, carregado de possibilidades e suposições. A verdade estava próxima, mas, ao mesmo tempo, parecia escapar entre os dedos. Algo naquela dinâmica entre Ellie e Arturo não estava certo, e agora a prioridade era descobrir o que, ou quem, estava por trás desse medo que assombrava os dois.
Olívia quebrou o silêncio:
— Devemos focar em quem mais poderia estar envolvido. Se essas crianças estão com medo, então estamos lidando com alguém perigoso.
Assenti, ainda sentindo um leve calor nas bochechas, mas agora com a mente fixada no caso.
Estou amando escrever essas duas e espero que estejam gostando da história 🤍
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