Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

Capítulo 36


— Concentração, Flor Selvagem — exigiu, Vincent. — És previsível como um livro. E por que estais vestindo estas vestes? O que eu lhe disse antes? Isto irá atrapalhar-te.

Mileide não via nada de errado em estar vestida com seu uniforme de criada, dado que metade de suas roupas eram trapos remendados. Trajava um vestido carmim de muitas saias e mangas compridas e bufantes, pois a duquesa resolvera que era hora da criadagem trocar as cores de seus uniformes. O único problema era vesti-lo sem sentir coceira. Além do que, parecia que seu uniforme era o único que aparentava ter sido costurado com pano velho e desbotado, mas Mileide como sempre, acostumava-se com a ocasião inoportuna. O que ela realmente achava estranho, eram estarem treinando em plena quinta hora da manhã. Mas como o atalaia havia dito antes, ele tinha planos de sair durante à noite. Resolveu não questioná-lo mais.

— Em guarda de sexta! — Vincent ordenou.

Mileide fincava a espada no ar, repetindo os golpes.

— Guarda de quarta!

Outra vez, repetiu o golpe.

— Pare! — exclamou, irritadiço.

— O que foi? — Mileide manteve-se com a postura paralisada com a espada de madeira em mãos.

— Mantém essa flexão exagerada nas pernas — bateu na panturrilha de Mileide com um graveto, incitando-a a endireitar-se. — E seus braços estão deveras estendidos. — cutucou o braço direito da moça. — Tente não ficar tão tensa.

— Estou tentando não ficar nervosa, mas sempre que faço algo, me corriges.

— Isso porque sou o teu mentore, e minha função é ensiná-la. Continuaremos com a "marcha".

Mileide avançou e recuou. Primeiro avançou, apoiando-se na ponta do pé, e recuou, apoiando a planta do pé no chão.

— Errado.

— O que errei agora?

— Está arrastando os pés e a tua postura está muito arqueada. A flexão de tuas pernas fica em velocidade reduzida durante os deslocamentos. Não fazes ideia de como isso seria fatal em uma luta de verdade. Ainda sabes como fazer o "afundo", ou esquecestes?

Mileide cruzou os braços, irritada.

— Estais muito exigente esta manhã. Parece que deseja ver meu suor transformar-se em sangue. Veja minhas mãos. Estão cheias de calos. — ergueu as mãos, com bolhas em formação e outras, estouradas. — E as minhas costas doem, como se eu tivesse sido pisoteada por cavalos.

— Significa que seu treinamento não foi em vão. Está tirando frutos disto. O cansaço significa que está chegando lá, e quando ficas cansada deves tirar o máximo de proveito disso e encontrar sua força.

— Bem, tens razão — sorriu, corando. — Sinto que meus reflexos melhoraram! — dissera, ufana. — Sim, acho que com um pouco mais de treino, serei como a major Isidora.

— Para isso, deves falar menos e treinar mais. Faça para mim, o "afundo".

Suspirando com cansaço, Mileide inclinou a perna direita, e deixou a perna esquerda estendida atrás de si. Ergueu o braço direito, deixando-o armado para frente.

— Enfim, uma postura perfeita — dissera Vincent. — Outra vez.

Mileide o obedeceu.

— Outra vez.

Ela obedeceu de novo.

— Outra vez.

E de novo.

— Pare — dissera o rapaz. — Está bom.

— Tu achas que eu melhorei? — Mileide arfava, apoiando a mão no joelho.

— Sim. Digo-lhe com toda sinceridade que avançastes bem nos treinos.

Mas ainda não sentia-se pronta para enfrentar a fiera.

— Achas que eu estou apta à lutar com espadas de verdade?

Vincent assentiu.

— Eu posso... — apontou para a espada na bainha presa no cinto de Vincent. — Não irei fazer nada demais, eu prometo. Só desejo vê-la de perto.

Desamarrou a bainha da espada do cinto, e a entregou para Mileide. A moça admirou os detalhes da espada. O que mais lhe chamou a atenção foi o enfeite do guarda-mão da espada, forjado em forma de asas.

— Chama-se Arcanjo — dissera Vincent.

Mileide o olhou tal como uma criança confusa.

— Sua espada se chama Arcanjo?

— No lugar onde vivi, costumávamos dar nomes à armas.

— E onde era esse lugar?

Vincent silenciou-se.

— Lembra-te de quando disseste que eu era previsível como um livro? — Mileide o questionou. —Bom, tu não és previsível como um livro. És como uma concha dura e difícil de abrir, cujos segredos nunca são revelados e permanecem guardados no fundo do oceano.

— És assim que me vês?

— Mas, sabes, creio que há algo de bom nisso — Mileide continuou. — As conchas são conhecidas por carregar as pérolas, e com as pérolas, produzimos lindas joias. Creio que assim seja contigo. Pode parecer duro e inquebrável como uma concha, mas dentro de ti há uma pérola brilhante.

Vincent olhou-a com espanto. Previamente, achava que aquela garota seria um estorvo e que o pedido para ensiná-la seria um enfado em sua vida. Enganou-se. Era prazeroso ter aqueles momentos com ela. Não a considerava como uma amiga, mas ao menos, em sua presença, sentia-se menos solitário.

Condenado a viver solitário, seguindo os passos sangrentos do pai.

— Mileide! — a aia de voz rouca e nariz adunco a chamou. — A duquesa insiste em vê-la.

— E-eu? — Mileide tremeu.

Seria a fiera desejando castigá-la?

— E este atalaia também — aia prosseguiu. — Venham comigo.

Atenderam ao chamado e foram para o claustro da mansão. Não encontraram a duquesa, mas depararam-se com um senhor de aparência gentil, sentado no banco, que sorriu assim que os viu. Mileide corou quando o pequeno Zeno lhe abraçou as pernas, desequilibrando-a.

— Deves ser a Mileide, estou certo? — Alesso estendeu a mão.

Mileide solevou a mão que fora apanhada por Alesso, e muito educado, depositou um beijo em seu dorso. A garota corou por tal gesto, visto que quase ninguém a tratava assim.

— Vim pessoalmente agradecê-la pelo que fez, minha jovem. Obrigado por encontrar meu filho. — Alesso sorriu para Zeno — Eu jamais me perdoaria se algo de ruim acontecesse com ele.

— Foi apenas uma boa ação. Não precisavas agradecer-me. Logo eu que sou apenas uma criada.

— É por trás da beleza simples que vives um coração honesto. Não pensei que fosses tão nova e tão bela.

— Ora, não fiz tudo sozinha — Mileide sorriu. — Vincent ajudou-me.

O rapaz que até então permanecia de costas, virou-se lentamente quando Mileide o apresentou ao visitante desconhecido. Alesso ficara pasmo com os olhos do jovem. Não por conta do vermelho que dominava a sua íris, mas porque ele havia visto aqueles olhos antes...

Olhos da cor de sangue...

Occhio assassini.

— Desculpe-me, meu rapaz — afastou-se de Mileide, dando atenção ao jovem de olhos rubros, — mas como te chamas?

— Vincent.

— E teu sobrenome?

— Ryder.

— Ryder... — Alesso dissera, aéreo. — Não é quem eu procuro.

Mileide sentiu-se excluída da conversa, pois Alesso pareceu deveras interessado no atalaia.

— Quantos anos tem, Sr. Ryder? — perguntou Alesso.

— Dezoito.

— Em italiano, Sr. Ryder — Alesso uniu as sobrancelhas.

Diciotto — dissera Vincent, controlando a superficial irritação.

— Tão jovem... — Alesso admirou-se. — Aposto que escutas muito isso.

— De certa forma.

— Minha esposa dissestes que tu tinhas uma beleza diabólica. Óbvio que ela mentiu.

Alesso riu com a troça que dissera.

— Ryder, desejo muito que venhas para a minha casa amanhã. Almejo tê-lo em um jantar especial, e quem sabe após, poderemos jogar xadrez. Sabes jogar xadrez?

— Perfeitamente.

— Ótimo. Virei buscá-lo. Assim que o sol se pôr. O duque está doente e careço de companhia.

Vincent assentiu e apertou a mão de Alesso. Quando apertou a mão de Alesso, de alguma forma, conseguiu ver através de seus olhos cor de mel, seu passado furtivo e sangrento, a linhagem maldita a quem pertencia e os pecados que cometera. Era possível enxergar o passado com uma clareza absurda e ouvir os gritos de sua mãe a avó enquanto sucumbiam a morte. Viu, mais uma vez, sua irmã morrer frente aos seus olhos, enquanto seus dedos sacudiam-na, tentando revivê-la, mas tudo que conseguira era manchar-se com sangue. Sentiu a cicatriz no peito lhe rasgar, como se fosse um ferro em brasas marcando o seu corpo. Enquanto apertava a mão daquele homem e olhava no fundo de sua alma, desvendou sua real faceta. Era Alesso, o homem da qual estava atrás para concluir sua vingança. Aquele homem era um Illuminato, não um Illuminato qualquer.

Era o Cavaleiro Branco.

Puxou a mão, apartando-se de Alesso, e muito perturbado, Vincent correu, retirando-se do claustro, deixando Mileide claramente embaralhada.

— Oras, o que houve com este rapaz? — Alesso perguntou à jovem.

— Eu não sei lhe responder, senhor. — Mileide dissera, constrangida.

Mileide passou o resto da tarde trabalhando na cozinha, distraindo-se enquanto cortava as batatas. Ao que tudo parecia, sem surpresas pelo restante da tarde.

— Mileide, quero que vá ao mercado — dissera a aia. — Preciso que tu compres ervas para fazer um chá para a senhorita Tarsila.

— Tarsila está bem? — Mileide alarmou-se.

— Claro que está.

— Então, para que tantas ervas? — intrigou-se. — É para dor de estômago?

— Óbvio que não, menina.

— Então, para que servem?

— Não irias querer saber, meu bem — a criada balançou a cabeça, enquanto limpava o tampo da távola. — Não mesmo.

A aia não lhe respondeu, em vez de lhe dar satisfações dissera o nome das ervas e Mileide foi obrigada a rememorá-las. Repetiu até não mais esquecer.

— Leves um atalaia convosco — alertou a aia carrancuda. — Uma jovem não deve andar sozinha por Florença.

— Dracone não está por perto? É ele quem sempre leva-me para a cidade.

— Não faço a menor ideia onde esse cabeça de vento meteu-se.

A moça tinha em mente quem deveria acompanhá-la. Foi até o celeiro e lá estava o atalaia, sentado sobre o feno. Seu semblante, triste, chamara a atenção de Mileide. Parecia haver algo quebrado dentro de Vincent. Algo que jamais seria restaurado de novo. Ele tocava inconscientemente o pingente no pescoço, enquanto olhava para o nada.

— Estou indo para a cidade, comprar ervas para fazer chá.

Vincent olhou para ela, a face contorcida em dor.

— Queres ir comigo? — a moça convidou-o.

Ele não respondeu.

— Olha, não és bom ficar em silêncio o tempo todo. Creio que não seja benéfico.

— O que seria benéfico para ti? — perguntou, sem largar-se do pingente de asa.

— Desabafar.

— Eu não durmo há uma semana. Conhece algum chá que me traga bons sonhos?

— Para dormir bem... — Mileide estava confusa.

— Para que eu nunca mais tenha pesadelos. — Vincent disse, sisudo.

— Acho que não conheço nenhum chá que faça tal efeito. Mas, se você me contar seus sonhos ruins, quem sabe eles não voltam nunca mais?

Oh, se ela soubesse os demônios interiores que corroíam a alma de Vincent. Dizer a verdade em forma de desabafo seria demais para a jovem. Vincent voltou-se a olhar para o nada.

— Tudo bem, se não queres me acompanhar, irei sozinha.

Quando deu por si, Vincent jazia ao seu lado. Mileide sentiu-se vitoriosa por convencê-lo.

(...)

Durante a viagem estranhou por ver um Vincent tão quieto e absorto. Mileide andava — quase saltitante — com a cestinha em mãos, andando lado a lado do atalaia.

— Posso te perguntar uma coisa? — prendeu uma mecha curta atrás da orelha.

— Pergunte.

— O que o pai do Zeno lhe disse?

— Nada demais.

— Tens certeza? — Mileide ficou de frente para Vincent, andando de costas. — Não é o que parece-me.

— Impressão sua. Deve ser porque a tua cabeça é cheia de ideias férteis — cutucou a testa de Mileide com a ponta do dedo indicador.

— Posso ir contigo na casa do Zeno?

— Ele convidou a mim, Flor Selvagem. Sou um convidado. E convidados não podem convidar outras pessoas.

— Oh! — exprimiu, decepcionada. Retornou a andar ao lado dele.

Viu-a entristecer-se e resolvera contornar a situação.

— Mas, se serve de consolo, falarei de ti para Zeno.

— Farias isso? — alegrou-se.

— Sim.

Mileide sorriu. Decerto ele não fosse tão "fechado" como uma concha. Avistou uma margarida e pôs no cabelo. O branco das pétalas da flor, sumindo no cabelo escuro.

— O que achas, atalaia? — Mileide perguntou, a flor escondida entre o cabelo.

Vincent não dissera nada.

— O que achas que... — Mileide corou. — o príncipe diria?

— Não sei — Vincent irritou-se. — Não sou um príncipe!

— Claramente não és — Mileide pisou duro. — És um homem grosso e rude, que sequer sabes como elogiar uma mulher.

— Não vejo mulher em parte alguma.

Dito isto, Mileide irritou-se e disparou alguns passos à frente. Vincent, de certa forma, divertia-se. Deixá-la irritada o divertia demasiado.

Vincent...

— O que queres, Flor Selvagem?

— Eu não disse nada — Mileide voltou-se para ele, ainda irritada.

Vincent...

— Escutei... alguém chamar por mim.

— Isso é ridículo.

— Shhh. Fique quieta.

Vincent...

De repente, as folhas dos arbustos farfalharam, como se houvesse um indivíduo por detrás delas.

— Vi alguma coisa ali — Vincent olhava para o misterioso bosque.

— Tens certeza? Não vejo nada.

Vincent...

Vincent tomou a atitude de seguir a voz que somente ele escutava.

— Fique aqui — ordenou.

— Mas...

— Volto já.

Adentrou entre os arbustos, os galhos impertinentes, as folhas secas das árvores. Era o fim da linha. Havia uma cachoeira.

— Vincent... — dissera a doce voz.

A ouvia com clareza, mesmo com o barulho das muitas águas. Investigou, virando a cabeça por todos os lados, esquecendo-se até mesmo da companheira de viagem.

E então, ele avistou.

Era um vulto.

Não, não era um vulto.

Era um anjo de luz.

— Esme... Esmeralda. — ficou estático diante da visagem.

— Oh, meu doce Vincent.

— És uma alucinação. Não podes está viva! — esfregava as palmas das mãos nos olhos. — Não podes está viva.

As lágrimas corriam pelo rosto do rapaz. 

— Meu querido Vincent, eu estou viva. Venha comigo — Esmeralda tocou a mão dele, guiando-o, fazendo-o andar outra vez.

— Para onde?

— Para um mundo sem dor, onde sua família lhe espera. Não há sentido em tua vingança. Junte-se a mim.

Vincent sentia-se fraco, guiado por aquela dama que parecia exercer uma força sobrenatural sobre ele. Era como se seu corpo não obedecesse. Era semelhante como caminhar para a beira de um abismo. Segundos depois, o corpo chocou-se contra a água fria. Despencou e o corpo mergulhou subitamente em um lago. Observou as bolhas de oxigênio que escapavam de sua boca. A voz, que antes o chamava com amor, agora zombava de si.

Assassino tolo. Será consumido pelos teus pesadelos sem fim. Não há paz para um Assassino. 

E nem salvação.

Estava afogando-se. Não conseguia nadar para a superfície. Sua bota havia ficado presa entre duas pedras. Iria morrer, afogado por seus pecados.

Fechou os olhos. Aquela visão passando-se por Esmeralda, por fim, estava certa. Não havia mais motivos para permanecer com vida. Não havia sentido em sua vingança.

Um grito silencioso ficara preso em seu coração.

Devagarinho, os pulmões encheram de água, e Vincent ficou quieto, sem ter forças para lutar...

Vincent!

Uma voz o chamava.

Não era a voz do vulto. Esta era diferente. O chamava com desespero.

Vincent!

Ele não poderia lhe responder.

Vincent!

Uma mão puxava a sua. Não sendo o suficiente para resgatá-lo, o outro corpo atirou-se na água, resgatando-o. Ouviu as arfadas da pessoa que o salvou.

Seu corpo fora colocado com dificuldade sobre a margem do lago. Não respirava.

Vincent!

Como desejou abrir os olhos, e contemplar aquela que o chamava...

Mileide dava tudo de si para fazê-lo voltar a vida. Colocou ambas as mãos sobre o tórax do rapaz e empurrava-as, com a intenção de que ele cuspisse a água.

— Vincent? — sacudia-o. — Vincent! Por favor, não me deixe!

Colou os lábios nos dele, soprou com toda a força para que os pulmões de Vincent expelissem a água que bloqueava o ar de retornar à eles. Repetiu isto várias e várias vezes. O desespero tomando conta dela. Chorava, não compreendendo por que ele atirou-se do alto daquela cachoeira.

Colou os lábios nos dele, mais uma vez, e rezou para que Deus o salvasse. Na cabeça, fazia mil promessas caso aquele rapaz ficasse vivo.

Até que o milagre ocorreu. Vincent cuspira uma quantidade absurda de água. Tossiu, expulsando a água de seus pulmões, arfava, tentando retornar a respirar.

Uma face borrada estava a sua frente. Contemplou a conhecida íris esverdeada ser substituída por um par de olhos negros. Os cabelos longos e dourados dando lugar às mechas curtas e escuras. O sorriso amigável sumindo e um rosto triste e desesperado surgindo à sua frente.

Mileide desabou em seu peito, agarrando-se em sua camisa, chorando muito. Os dedos da mão tremiam, não se recuperaria tão cedo daquele susto.

— O que estava a pensar? — Mileide continuou com o rosto aninhado no tórax de Vincent. — Querias morrer?

— Esta é a segunda vez... que teus lábios colam nos meus.... — Vincent dissera em uma voz fraca.

— Eu realmente fiquei assustada — Mileide continuava a chorar. — Por que se atirou do alto da cachoeira? Por quê?

Vincent não sabia como responder. Tateou a mão nas mechas molhadas da garota. Ela era real, diferente do vulto que quase o puxou para a morte. Repousou a mão no dorso da garota, amparando-a. Atentou-se que Mileide havia tirado o pesado vestido para entrar na água e jazia somente de ceroulas e espartilho. Traçou os dedos por marcas salientes que haviam no dorso de Mileide. Cicatrizes! Sentiu as cicatrizes dela.

— Obrigado...

Mileide levantou a cabeça, os olhos inchados por chorar, encarando o rapaz que tinha os olhos focados no céu.

— Obrigado — continuou ele, — por me salvar.

— É isso que os amigos fazem — sorriu para ele.

Ele estava certo.

Ela era como ele.

Ao chegar em casa após a breve aventura que viveu com o atalaia, pé ante pé com as sapatilhas encharcadas em mãos, Mileide adentrava a mansão. Passou pelo hall que dava de frente para a escadaria e espantou-se ao ponto de prender um grito sufocado. Na soleira da escadaria jazia o príncipe, sentado nos degraus, parecendo abandonado.

— Ah, olá — Lorenzo dissera, sorrindo para ela.

Mileide acenou, as bochechas queimando.

— Boa noite, Vossa Alteza — falara tímida e quase a gaguejar. — Com sua licença.

— Por favor, não vá — Lorenzo pediu. — Fique!

A garota virou-se para ele com os olhos arregalados. O príncipe estava pedindo para que ela ficasse. Sorriu, desajeitada, e sentou-se nos degraus, não muito perto do príncipe.

— O que houve? — Lorenzo indagou. — Suas vestes estão molhadas.

— É uma longa história — Mileide apenas conseguia abrir um sorriso sem graça.

Não conseguia mexer um músculo diante dele. Estava petrificada como uma estátua. Olhou-o suspirar de soslaio. Parecia incomodado com alguma coisa.

— Algo o preocupa, Vossa Alteza?

— Não tenho visto a major desde que ela decidiu iniciar a patrulha para encontrar a pessoa que feriu-me. Já não importo-me mais com isto, mas às vezes esqueço o quanto minha amiga é teimosa. — dissera, melancólico.

— São muito amigos, não é?

— Praticamente, fomos criados juntos como irmãos. Preocupo-me com o bem-estar de Isidora assim como ela se preocupa com o meu. Não quero vê-lo machucada nesta patrulha. Sei que ela era a filha de um soldado, e que quer provar a si mesma que não está na sombra do pai.

Lorenzo respirou profundamente, perdendo os dedos entre as mechas alaranjadas. Tal gesto só contribuiu para o coração de Mileide disparar louco.

— Soube pela manhã que salvastes um menino.

— Soubestes?

Lorenzo anuiu.

— Foi corajoso de tua parte teres dado atenção à um menino perdido. Muitos teriam o ignorado.

— Bem... — Mileide tinha o vermelho vivo estampado na face. — Não fiz tudo sozinha.

— E és modesta. És uma boa pessoa, Mileide. Creio que tenha sido uma honra conhecer uma pessoa igual a ti.

— Achas? — o coração da moça espancava seu tórax.

— Sim, eu acho. És mais valiosa que diamantes.

— Obrigada, príncipe Lorenzo. Essa, com certeza, foi a coisa mais bonita que já me disseram.

Mileide continuou petrificada diante do elogio. O coração martelando sem nenhum pudor. Guardaria as palavras dele. As palavras daquele pelo qual alimentava um sentimento maior que admiração.

No topo da escadaria, escondida pela sombra da pilastra, jazia Tarsila, observando o casal conversar. Deslizou a mão pela barriga reta, afagando-a, deixando uma lágrima cair. Ela não o amava. Não amava o príncipe. Não era justo se casarem, com seu coração pertencendo à outro. Não era justo com ele, que era um rapaz tão honrado e bondoso. Muitas garotas se matariam para casar com o futuro herdeiro do trono, e muitas garotas a julgariam como tola por não conseguir apaixonar-se por ele.

Talvez outra pessoa o fizesse feliz, da forma que ele merecia. Via em Mileide essa esperança. Sua prima que sempre tivera uma dura vida, sorria com deleite perto do príncipe. Sim, de fato era transparente o que estava ocorrendo ali. Tarsila não se ardia em ciúmes, afinal, jamais o amou. Torcia pela felicidade dele. Deteve a mão sobre a barriga. Sua mãe não o tiraria dela. Brígida estava desconfiada. Não poderia deixar sua mãe arrancar seu bem mais precioso. Sua sementinha. Sorriu, ao vislumbrar Mileide tão contente.

Almejou que a prima fosse feliz, pois a felicidade de Tarsila estava com os dias contados.


Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro