Prólogo
Primeiro Livro da Saga de Reiwa:
As Peças Desvirtuadas
Prólogo
Ao todo, o mundo no tempo em que o homem era próximo do divino, é governado por deuses cultuados em regiões diferentes, onde a Península Escandinava, Balcânica, Somali, Dapeng, Itapagipe e Ibérica são as superpotências.
No sul da Península Escandinava, a Ilha de Reiwa fora criada nos tempos primórdios da terra dividida por Odin, o deus nórdico da sabedoria. O velho homem, com barba longa e branca, ao ser apaixonado em navegações e saques a alto mar, com grande engenhosidade estabeleceu um povo qualificado para povoar a ilha; os temerosos navegantes “Vikings de Reiwa”[1]. E dentre eles, escolhera a dedo julgador, um nobre guerreiro de coração blindado para comandar o lugar.
Dessarte, nascera o primeiro Lendário Viking de Reiwa.
Duzentas valquírias de Asgard desceram do céu numa tempestade de solstício, cavalgando em corcéis alados, imbuídos de selvageria nada passageira. Foram enviadas pelo próprio deus nórdico da sabedoria, para abençoar o povo com um combustível enigmático e bússolas de ouro, longe de poderem ser comercializados por simples mascates de portos ou fornecidos a imperadores de grandes impérios. Com o intuito que os Vikings de Reiwa não fossem dependentes dos deuses acima, ele os deu conhecimentos na área de navegação. Em anos longevos, chegaram a ser feitas embarcações especializadas e adaptadas para explorar o fundo do mar e o vasto céu imensurável, onde o combustível nomeado de IRIS era mais eficiente do que o vento gélido e as ondulações da água dos mares.
Já na Península Balcânica, era Zeus quem governava esplendorosamente, residindo no monte mais alto de Hélade. Ao possuir tantos filhos, cada um ficava designado a cuidar de uma pólis (cidade-estado). Ártemis, a deusa da caça, cuidava de Éfeso — entre aspas. O mensageiro Hermes estava encarregado de Peloponeso, lugar onde há muito tempo atrás teria abandonado as cinquenta novilhas de seu irmão Apolo. Atena ainda cuidava dos atenienses em sua morada principal, Atenas, enquanto sua irmã Ilítia, a deusa parteira, cuidava de Delos, lugar em que havia feito o parto de Leto e deleitava-se em virtude das lembranças que tinha. Já Apolo, o Iluminado, o deus mais belo do Olimpo, chegou a cuidar de Piéria em um curto período, no entanto acabou por se envolver com a rebeldia junto a outro deus e caiu em desgraça no início da guerra desatadora.
Seu povo era tão inteligente e intelectual — diferente dos nórdicos — Zeus orgulhava-se de sua criação. Ele olhava para Odin com as íris cheias de orgulho, glorificando-se.
Conjuntamente, a deusa Rá governava a Península Somali com seus filhos, netos e tataranetos desde o surgimento do primeiro Panteão dos Deuses Originais. Ao mesmo tempo em que ela aproveitava e cuidava do Cairo no Egito, seus descendentes cobriam a vasta área de areia, unidos aos faraós e nativos em uma boa convivência com o povo que se estabelecera às margens do Rio Nilo. Sendo eles, os egípcios somente inteligentes além da compreensão humana, Odin e Zeus regozijavam-se ao fazer ofensas pueris em direção a governanta deles: de que adianta lhe proporcionarem conhecimento, mas não beleza?
Absurdo!
No centro de Gália, onde estava uma das muitas portas interconectadas em terra para a famosa Rota da Seda, caravanas seguiam rumo ao sul asiático com o intuito de chegarem na Península de Dapeng; lugar exclusivo para comercializar e trocar produtos sob um par de olhos escuros com curvas proeminentes e estreitas. Em observação arisca, estava o desconhecido deus Pan Ku, planejando por dias a fio entrar numa caravana em busca de aventuras na Península de Itapagipe. Ao considerar que os nativos de lá eram rigorosos no quesito de limpeza, em que chegavam a tomar banhos todos os dias nos rios correntes, ele se lavara várias vezes consecutivas e se vestira com um hanfu fino sem gola, alegrando-se sem pudor ao ver a face inescrutável de Tupã, o deus do trovão responsável pela criação do Ocidente, que não fizera menção de machucá-lo ou expulsá-lo dali.
O governador que não possuísse península, apenas um local proporcionalmente pequeno para chamar de seu, seria visto como um ser “Inferior” àqueles que tivessem, não obtendo classificação alta o suficiente para participar das reuniões no Panteão dos Deuses Originais. Mas Danu, a deusa mãe, criadora do povo druida, pouco se importava com todo o status e a glória direcionada aos deuses originais, fazendo vista grossa em relação à doutrinação, e, sobretudo a serventia. Seu povo, que possuía beleza absurda e conhecimento abundante, lhe agradava o suficiente — embora eles fossem bem radicais sobre algumas questões, tais como se negarem a escrever em papiros ou pedras os ensinamentos aprendidos ao longo da curta vida humana, e, por desejar armazenar o conhecimento que adquiriram sobre o místico fundidos apenas nas mentes, pediam aos familiares para que decapitassem suas cabeças e as guardassem mumificadas, acreditando que assim, estariam preservando as informações que tinham.
Na cúpula vasta do horizonte ciano, aos badalos de sinos de cobre, um deus majestoso e sem nome descera do céu de forma graciosa sob dezenas de olhares espavoridos. A miríade de anjos sem semblantes na retaguarda pouco fez questão da pompa das capelas e santuários sagrados com ornamentos feitos de jaspe, safira, esmeralda, prata e ouro, deixando quão claro a exuberância era desnecessária na Península Ibérica. Porém, se o livre arbítrio imposto do porquê de tanta luxúria num monástico fosse questionado aos abades, não estariam os anjos dando ouvidos às besteiras ditas pelo adversário de uma história antiga, aspirante a rebeldia? Aquele que fora o responsável por questionar o superior do porquê lhe governava, sendo que não havia permitido tal ato. Negando a dominância do seu deus, aquele citado caiu na desgraça da rebeldia como Thor e Apolo.
— O questionamento é de fato uma praga contagiosa, que levou os semideuses a iniciarem a Guerra dos Gigantes? — Era a principal pergunta no Panteão dos Deuses Originais. — Quantos anos já se passaram desde então, meu amigo? Mais de vinte e seis?
A cabeça de Pan Ku aquiescera veementemente.
— Em vinte e seis anos… — Começou ele meio abatido, assim prosseguindo sem demonstrar como o desconforto deixava a voz grave: — Será a quarta vez que a Ilha de Reiwa nomeia um novo Lendário Viking de Reiwa. Preste atenção, Odin.
Tristeza repentina tomou conta do coração de Odin, sufocando-o. Pouco se notava a amargura que sentia ao ver o quarto comandante receber a antiga tira de seu ancestral, indicando que o posto superior havia sido transferido para ele através da descendência masculina com o falecimento do antigo soberano. Uma tira fina, com espessura de dois centímetros, da qual o couro marrom estava gasto além do imaginável, emaranhada do que outrora foram majestosos desenhos brancos que, com o passar do tempo, surgiram craquelados pela extensão.
Disfarçando não muito a testa sutilmente franzida do novo comandante, mas apenas destacando as curtas madeixas cor de mel volumosas, o rosto sombrio dele não se tornou desqualificado. Suas sobrancelhas em formato de espadas em riste, o deixava com um rosto feroz; embora também fosse jovial e carregasse traços de imaturidade ainda, não se podia tirar conclusões precipitadas sobre a idade dele. Odin se atrevia a dizer que fosse dezoito anos ou menos, predisposto a aceitar o equívoco. Já Pan Ku afirmava que ele prosperava em seus dezesseis anos. Sem a conclusão ter sido errônea, sorriu com um ar de mistério sobre ele.
— Você viu o que eu vi, os olhos dele mostrando um breve lampejo de fúria? — escarneceu sem muito disfarçar o quanto queria vangloriar-se pelo acerto certeiro. — Não obstante, esse lamentável menino segue estando ajoelhado, recebendo o título de Lendário Viking de Reiwa em mudez absoluta após a morte do pai.
— O coração do menino Thorfill está em conflito — disse Odin. — Mas quando ele realizar seus sonhos, o mundo se tornará um lugar menos sombrio. Não foi o mesmo para você, Tupã?
A entidade mencionada expressou confusão no semblante cor de centeio e perguntou-lhe de volta:
– Quem diabos é Thorfill?
— Cabeça de vento! — vociferou Pan Ku, bravo ao extremo. – Eu já não mencionei que o nome do quarto comandante foi alterado ao longo dos anos?! Ao nascer, os deuses nórdicos o abençoaram com o nome Thor, filho de Enon com a navegadora Gruditi. O que nenhum deles poderia imaginar é que a criança, numa idade precoce, se negaria a atender os chamados relacionados ao formoso deus de Asgard. Foi preciso adicionar quatro caracteres no nome dele para que pudesse solicitá-lo, caso contrário, a rebeldia estaria enraizada no seu mais profundo átomo até hoje! — Desviou o olhar e adicionou pacífico: — Olhe para ele agora, ainda incapacitado de fazer suas obrigações e desejando fugir para as colinas. Eu o apoio!
Tupã obedeceu sem mais questionamentos e vira o quarto Lendário Viking de Reiwa curvar-se resignado e de joelhos, tendo que colocar toda a extensão da testa encharcada de suor frio no chão batido de terra para enviar agradecimentos às almas dos antigos Lendários Vikings de Reiwa, mortos em combates ou pelas mãos dos próprios filhos rebeldes.
— Eu, Thorfill, filho de Enon, pagarei pelas dívidas e pecados de meu pai — enunciou cada palavra com o tom de voz frio como uma nascente congelante: — Para que a alma do antigo lendário possa descansar!
A verdade nem sempre aparece. Às vezes ela se perde por caminhos sombrios, pensou ele, inalando o ar carregado das cinzas do próprio progenitor.
— Para que a alma do antigo lendário possa descansar!
Em um coro, os Vikings de Reiwa vociferavam juntos, batendo fortemente em seus capacetes de ferros cinco vezes, fazendo um estrondo que poderia alcançar o céu acima de suas cabeças e desencadear tempestades nos mares traiçoeiros que tanto navegavam.
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[1]: A palavra viking vem do nórdico antigo víkingr, termo que designa não uma região, mas uma ocupação ou profissão. No caso, a navegação. O nome vem de vik, que significa "porto". O víkingr é o que se ocupa das atividades relacionadas ao porto. No livro, os personagens são apenas navegadores, não homens vikings como descrito na ficção.
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