Epílogo
O frio no norte era tão penetrante que nem mesmo uma dúzia de mantas podiam afastá-lo totalmente. Como recurso, Ictar mantinha o fogo sempre aceso, mas ainda assim, Ivela tremia com eles diante da lareira, amaldiçoando as montanhas gêmeas.
–Eu era mais feliz quando tava longe dessas tetas de gelo! – Ela repetia aquela frase ao menos duas vezes por dia.
–Eu podia te levar de volta para Afigh... – Fez Ictar voltando de mais uma ida ao aparador onde tornou a encher sua caneca com bebida quente– Mas minha Borboleta quer você aqui, não é, Borboleta?
Ivela deu uma olhadela para Felps que sorriu, então ela revirou os olhos e ficou de pé.
–Ah Ictar, você sabe muito bem que eu não voltaria pra Portão Branco,nem se a sua "Borboleta" batesse asas de verdade. Só que também não quero ficar aqui, entende? Comendo essa sopa estranha.
–Vaia onde? – Felps não tinha certeza se era seguro ficar perambulando por Belvereth sozinha. O Palácio era três vezes maior que Portão Branco mas tinha alas totalmente escuras e abandonadas e parecia muito fácil se perder por elas.
–Eu vou lá embaixo no salão, se não se importam. – Ivela ajeitou a lacerna de lã sobre o vestido – Os darfs também fizeram uma fogueira, mas ao menos eles estão lá felizes, cantando e dançando ao invés de ficarem sentados comendo sopa. A Sícy até deixa eles abrirem um monte de barris de Irlan e ficam bêbados, e eu acho graça quando ficam bêbados, porque não conseguem falar direito com aquelas línguas estranhas, é tão engraçado porque...
– Hum...Acho que você só quer estar com os darfs porque Dom Einov toca viola.– Interrompeu Felps falando para dentro da própria caneca de chá, ao que Ivela corou violentamente, dando de ombros para disfarçar o embaraço. Então falou algo sobre gostar do som das violas e partiu, deixando entrar uma rajada de vento congelante quando atravessou a porta e a bateu.
Rindo dela, Ictar voltou para o seu lugar sobre a manta, e tanto ria que derramou chá numa das tranças da barba.
– É serio isso o que disse? – Fez ele tentando limpar a bagunça com uma mão desajeitada. – Sobre Dom Einov?
–Eu achava que não... – Fez Felps pousando a própria xícara no chão e ficando de joelhos para secar o outro com um lenço. – Mas você viu a cara dela?
Ictar riu de novo, a barriga enorme tremelicando. Felps se aproximou mais para sentir o próprio ventre estremecer também.
–Ela se acostumou rápido com eles. – Comentou o Caçador. – Não admite, mas se acostumou.
–E você tinha razão quando falou sobre o norte. É muito diferente do que pensávamos.
Ictar ficou sério.
–Você não tinha como saber.
–Eu devia ter confiado em você. Eu devia...
–Mas confia em mim agora, não confia?
Felps sentiu um sorriso se formar. Tinha pensado tanto sobre aquilo. Ensaiado dizer tantas vezes, que olhando os olhos tentantes de Ictar quase debochou de si mesmo, afinal como podia ter demorado tanto tempo para saber?
–Eu o amo – Disse e aquelas palavras fugiram dele com tanta facilidade,ferindo-o de tão fortes que eram, como um gládio banhado em mel.
Ictar também sorriu ao ouvi-lo e havia uma gota de chá presa no limite do seu bigode. Felps a secou e depois se curvou para ele.
E daquela vez escolheu dar-lhe seu beijo, seu próprio beijo, porque agora tinha um. E tomando de suas mãos a caneca a fez pousar com estrépito nalgum ponto do piso, enquanto Ictar apenas o segurava no rosto, como se não ousasse mais do que isso, apesar da forma apressada com que respirava, o peito arfando, os lábios recebendo-o docilmente.
Felps desfez com pressa os nós do corpete, um arrepio bom percorrendo apele que Ictar passou a aquecer com os lábios, a barba roçando levemente contra o seu peito e depois perto do umbigo e mais abaixo ainda, de modo que o calor da sua boca envolveu-o e Felps soluçou de prazer tragando o ar, entrelaçando nos dedos os grandes cachos de cabelo castanho.
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