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Logo cedo, pela manhã, Aline desceu com suas malas. Nervosa, ela deixou que uma delas batesse nos degraus. Quando o barulho ecoou pelo salão, ela xingou a si mesma mentalmente.
A atriz estava junto do balcão, prestes a fazer seu check-out, quando foi chamada.
— Aline?
Ao ouvir seu nome, ela fechou os olhos e respirou fundo antes de se virar para Cícero.
— Até quando vai fugir de mim? — indagou, ressentido.
— Olha, eu sei que vacilei! — Ela explodiu em explicações, gesticulando no ar. — Devia ter conversado mais, ter tentado... Eu fui fraca, eu...
Cícero conteve uma de suas mãos agitadas.
— Eu não a condeno — afirmou calmamente.
Aline encarou-o, incrédula.
— Eu...
Cícero inclinou a cabeça, indicando o recepcionista, que os contemplava com curiosidade.
— Faça o que tem que fazer.
Aline se viu paralisada, sem reação. Cícero, então, tomou a frente, pedindo ao funcionário do hotel, em um italiano medíocre:
— Leve a bagagem da moça de volta ao quarto, por favor.
Aline observou, impotente, enquanto o funcionário chamava um carregador. Sem palavras, ela encarou Cícero.
— E você vem comigo — disse ele.
Aline obedeceu. Uma vez na rua, ela retomou o controle sobre suas palavras:
— Você está me vigiando?
— Não! É claro que não! Mas achei que você iria querer fugir de novo. Desejei estar errado, mas não estava.
— Vai me dizer que dormiu no saguão do hotel? — indagou, indignada.
Cícero sorriu sem mostrar os dentes. Um sorriso sem graça.
— Eu não acredito! — Ela deu um tapa em seu braço. — Você é maluco?
Alguns italianos que passavam por ali fitaram-nos com curiosidade.
— É, eu quase fiquei maluco, sim — rebateu, de repente irritado. — Você sumiu sem dar notícias, eu fiquei preocupado com você, todos ficamos! Comprei um cachorro que você nem viu! Mal consegui dormir nas primeiras noites! Por dias eu esperei por uma notícia sua, até que eu entendi que era o que você queria e fiquei me sentindo um tolo por ter gostado de você, mas então eu vi a entrevista e tive esperança de que talvez você tenha gostado de mim, nem que fosse um pouquinho.
Aline piscou, estarrecida.
— Você... Você gosta de mim?
— Eu pensei ter sentido uma conexão entre nós. Viajei até aqui para você me dizer se era real ou se eu só estava sendo um burro iludido. Eu estava errado, Aline?
— Cícero, eu... Como me encontrou?
— Te encontrei nas redes sociais. Vi que você segue o diretor, aí entrei no perfil dele. Ele postou algumas fotos daqui, então só pude supor... A propósito, você foi incrível! Me comoveu naquela cena e...
Aline agarrou seu cachecol, puxando-o para um beijo. Ela segurou seu rosto, fechando os olhos. Cícero estremeceu ao contato com suas mãos gélidas, mas logo a puxou mais para perto, enlaçando-a pela cintura, correspondendo. Surpreso com a maciez de seus lábios, ele fechou os olhos. Ambos sentiram se encaixar bem e prolongaram o gesto.
Por fim, se afastaram, arfando. Olharam nos olhos um do outro.
— Significa que eu não estava enganado — concluiu Cícero, com um sorriso bobo, enquanto recobrava o fôlego.
— Pode apostar!
Ela o beijou mais uma vez. Cícero segurou seu rosto enquanto ela sorria contra sua boca. Aline se sentiu nas nuvens. Mal se deu conta de que ficara nas pontas dos pés.
Ao fim do beijo, se abraçaram. Aline suspirava em seus braços, estudando o ombro em que estava aconchegada e a parte da cabeça que lhe era visível. Ela fechou os olhos apertados, temendo estar sonhando e acordar a qualquer instante.
— Isso é real? Você está mesmo aqui? — indagou baixinho.
— Pode acreditar que estou!
Ela acariciou a parte de trás de seu cabelo, lamentando por ter que se afastar.
— Ah, Aline, eu quero te contar tanta coisa! — Ele segurou sua mão. — Ouvi muito Jorge e Mateus e Henrique e Juliano por sua causa.
— Você me comprou um cachorro! — Ela sorriu.
— Sim!
— E você fala italiano!
Ele assentiu.
— Bem pouco. Não prestei muita atenção às aulas que minha mãe arranjou para mim, na época, só queria saber de brincar.
Ela olhou ao redor, como se procurasse por alguém. Tentava assimilar tudo.
— Vai me dizer pra onde pretendia fugir? — indagou Cícero.
Ela riu. Ele parecia mais sério agora, mais maduro.
— Bem, já que você não vai me entregar à polícia, acho que não faz mal contar. — Ela apertou sua mão. — Estava indo para Trieste. Tem um castelo lá, chamado Miramare, que eu quero muito conhecer.
Os olhos de Cícero brilharam de interesse.
— Talvez possamos ir juntos! — sugeriu com um sorriso.
Aline encarou-o, surpresa.
— Você tem tempo? Quero dizer, não está com um monte de coisas para fazer...?
Ele meneou a cabeça.
— A política ficou para trás. Por enquanto eu estou parado, ainda não sei o que vou fazer. A única coisa que eu tenho certeza é de que quero estar ao seu lado. Quero viajar, descobrir o mundo e a mim mesmo. E quero fazer isso com você.
Aline mal conteve um sorriso, maravilhada. Não era o que ela mesma estava fazendo?
— Bem, neste caso, acho que podemos tomar aquele café.
E, sem qualquer aviso, Cícero começou a cantar.
— Con te partirò, Paesi che non ho ma... — Ele estendeu o braço para que Aline se unisse a ele.
Ela olhou ao redor, envergonhada. Algumas pessoas não disfarçaram seus olhares ao passar pelo casal.
— O que foi, está com vergonha? — indagou, zombeteiro. — Ora, você é atriz!
Aos poucos, Aline foi se soltando. Ela levantou a cabeça e, sorrindo, enlaçou seu braço ao dele. Alegres, os dois saíram cantando pela rua, sem se importar com a atenção que chamavam.
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