Capítulo 3 - Novos Ares
John conseguira um emprego temporário de caseiro, em uma pequena fazenda afastada da cidade, que ficava há alguns quilômetros de uma reserva natural. Sendo este um lugar ideal para a matilha se estabelecer. Não tinham animais na fazenda e a única função de John para o qual havia sido contratado, fora a de manter o local impecavelmente igual aos que os proprietários deixaram, antes de saírem de viajem. Além de proteger a residência contra saqueadores e vândalos drogados, que era muito comum na região. John também ficara responsável pelas caçadas e na maioria das vezes saía caçar sozinho, pois não havia presas de grande porte na região.
Seis semanas se passaram desde o incidente ao acampamento com Jennifer e seus adorados marshmallows. Allec e Jenny estudavam em casa, pois a distância da escola mais próxima era muito longe, até mesmo para os lobos. Depois dos estudos, eles passavam as tardes treinando. Jennifer começara a aprender a como controlar sua consciência na hora da transformação. Já a gestação lupina de Acira aparentava estar de quase oito meses, mas devia estar próxima do término de seu terceiro mês. A data exata do nascimento era improvável, podendo ser em alguns dias ou semanas de diferença. Acira também adquirira um hábito de costura, no qual começou a criar pequenas peças de roupas de cores unissex para o bebê.
— Consegue ouvi-lo? — perguntou Allec sussurrando e sentado em uma raiz centenária, enquanto observava Jennifer de costas e de olhos fechados, sentada a alguns metros na folhagem, concentrada em seus sentidos.
— O som está fraco, mas consigo... — ela respondeu ainda de olhos fechados.
Jennifer surpreendeu Allec se levantando e correndo ferozmente em direção ao cheiro da lebre, que havia sido solta por eles. Jenny estava há semanas tentando apurar a audição e o olfato para perseguir um alvo. Ela tomou alguns dribles do animal de cor caramelo e quando foi abocanhá-lo, dois braços a abraçaram por trás e a seguraram firme, pois ela resistia e queria mais que tudo provar do sangue do coelho.
— Jenny, calma amor, sou eu Allec!
Ela rosnava, mas seus olhos e presas foram voltando ao normal ao reconhecer a voz e presença dele e o coelho acabou fugindo. — Al? Eu consegui desta vez?
— Quase lá amor... Só precisa focar mais no momento da transformação, pois esta "ferocidade" inicial é o que separa nossa consciência da natureza selvagem que temos dentro de nós... — disse ainda na mesma posição abraçados.
Jennifer ficou pensativa por um segundo, mas Allec a fizera girar ao puxar seu braço direito e a segurou antes que caísse no chão, ficando em uma posição, que sutilmente lembrava uma dança sensual.
— É difícil... — disse desanimada encarando os penetrantes olhos azuis dele.
— Eu sei meu amor, mas em tão pouco tempo treinando, você já consegue se transformar sem a lua cheia, isso já é um progresso! — sorriu e a beijou.
— Também tenho um ótimo professor! — disse entre os beijos.
— Desculpe interrompê-los pombinhos, mas olha o que encontrei. — comentou John, se aproximando dos dois e erguendo sua mão direita, que segurava uma lebre de cor caramelo, presa pelo cangote que esperneava, tentando fugir dos lobos.
No ombro esquerdo, John carregava alguns roedores e pássaros mortos, amarrados em uma corda.
— Ai que bom que o encontrou John! — Jennifer se soltara dos braços de Allec e fora pegar a gaiola.
— Valeu mano, pensei que havíamos perdido este também, nosso estoque tá acabando. — Allec pegou o coelho da mão de John.
— De nada, mas cedo ou tarde nós o encontraríamos de qualquer jeito.
— Obrigada! — Jennifer afirmou, posicionando a gaiola para que Allec colocasse o animal e fechou a gaiola. O jovem casal seguiu para o celeiro, para guardar a lebre junto dos outros, que eles haviam comprado para o treinamento.
02h27min da madrugada.
John despertou ao ouvir barulhos da corrente, que trancava o portão de ferro, sendo a única entrada da fazenda, cercada por alambrados. Caminhou até a janela e rosnou, ficando com os olhos de lobo ao avistar um grupo com quatro humanos, que arrebentavam o cadeado. Este já era o quinto cadeado que trocavam, por causa das invasões que sofreram desde que se mudaram para a fazenda. Como já estava nu, se transformou ali mesmo, sem tirar os olhos dos invasores e acordou o restante da matilha.
Como os lobos já estavam habituados com as invasões, cada um do grupo se posicionou em sua função e deixaram os invasores pensarem que não tinha ninguém na casa.
Os humanos entraram na casa e acenderam as luzes, passaram pelo saguão com acesso à escada e rumaram para sala de estar, próxima de uma cozinha. Começaram a guardar em uma enorme bolsa os objetos simples, porém alguns antigos e raros, como vasos e enfeites esculpidos a mão, além dos eletrodomésticos.
— Peguem tudo o que conseguirem!
John escutara uma voz feminina ordenar entre o grupo, composto por mais três machos. Estava escondido no banheiro, localizado logo após a cozinha.
Depois de alguns minutos em que os humanos já estavam próximos de John, as luzes se apagaram e Jennifer do lado de fora da casa, correu até a porta de entrada e a fechou com força, para assustar os visitantes.
Os homens praguejaram entre si e ligaram suas lanternas. Foi nesse momento em que John se aproximou sorrateiramente pela cozinha, tendo a escuridão como aliada, um dos homens lhe direcionou a lanterna e deixou cair o pé de cabra no chão, ao se deparar com um lobo negro sobre duas patas.
"Adoro esse cheiro...", pensou John enquanto farejava o fedor de medo de todos, ao se depararem com a figura inexplicável a sua frente. Ele apenas lambeu os beiços e começou a rosnar.
— Corram! — gritou a mulher saindo em retirada e o último homem bateu a porta da frente, antes que o lobo saísse e deixaram todos os objetos para trás.
John apenas com a pata direita encostada na porta fechada, só escutava os resmungos e xingamentos dos invasores e acabou deixando escapar um riso para si. Em seguida surgiram todos os outros lobos no saguão e John perguntou a Allec, que se encontrava no segundo andar:
— Está a fim de uma corrida Al?
— O que está esperando amor? — Acira perguntou.
— Estou apenas dando alguns minutos de vantagem, senão não tem graça...
— Demorou! — respondeu Allec já com os olhos lupinos amostra e voltou para seu quarto, para deixar suas roupas. Um minuto depois Al saltara bem no meio do saguão, já transformado.
— Vamos pegar todos os aparelhos eletrônicos deles!
John ordenou e uivou, saindo como um foguete em direção ao grupo.
Allec uivara em resposta e o seguiu pela mata.
Depois de alguns minutos fugindo da fazenda, o carro dos bandidos freou bruscamente, por causa do lobo sentado pacientemente e bem no meio da estrada.
— Cacete, ele nos seguiu! — afirmou um dos homens no carro.
— Não, espera, esse ai é menor... — comentou outro homem e todos olharam para o teto do carro, ao escutarem um barulho de pegadas.
— Fujam! — gritou a mulher saindo do carro e cada um do grupo foi para um lado.
John apenas os observou correndo para as árvores ao redor e focou em seguir a fêmea, a líder dos saqueadores. Allec fora em direção a outros dois.
Ele a perseguiu por aproximadamente dois minutos, até que a derrubara na lama. A mulher começou a implorar e a urinar de medo e havia fechado os olhos, só esperando pela morte. John a rodeou duas vezes, apreciando o odor da presa, que o fazia sentir-se poderoso. Começou a farejar o corpo da mulher em busca de aparelhos celulares. Após encontrar, o destruiu com as próprias garras e o jogou longe. Farejou a nuca da vítima e soltara um hálito quente, só para vê-la estremecer de medo. Deu um último rosnado e saiu em disparada para outra presa.
— Será que eles estão bem? — Jennifer perguntou, terminando de arrumar a sala.
— Não se preocupe querida, são apenas vândalos, em breve eles estarão de volta. — um uivo invadira a sala e Acira abrira a porta e ela continuou:
— Eu não disse? Lá vêm eles...
Os machos caminhavam triunfantes, com a sensação de dever cumprido.
— Foram rápidos! O que aconteceu? — perguntou Acira.
— Apenas demos um susto neles, não se preocupem... — comentou John, ficando sobre as duas patas.
— Foi divertido! — afirmou Allec.
— Mas eles viram vocês, será que não voltarão com a polícia? — perguntou Jennifer preocupada.
— Não irão, mas se forem, a polícia não acreditará neles, pois estavam cometendo delitos e o carro deles está cheio de drogas. — John respondeu e foram em direção aos quartos, enquanto dizia: — Bom trabalho a todos, vamos descansar agora... Vejo vocês de manhã. — acenara para o jovem casal, que rumava para outro quarto e lhe desejaram boa noite.
Allec e Jennifer já estavam no quarto. Ele ainda permanecia em sua forma lupina, sentado bem no meio do cômodo quando perguntou envergonhado:
— Pronto Jenny?
— Você é fascinante Al! — Jenny o rodeava observando sua anatomia, o tocando no focinho e ao redor de suas orelhas sem nenhum pudor. Admirava a maravilhosa criatura que era um lycan, pois nunca havia prestado atenção. Ela notara que ele se sentia incomodado de vergonha e continuou:
— Está com vergonha do quê? Você já me viu nua...
— Mas assim de repente? Você também já me viu em forma de lobo.
— Não é a mesma coisa do que prestar atenção nos detalhes, Al... Eu só aproveitei que você já está transformado. — ela lhe direcionara a mão direita e entrelaçou os dedos na pata dele, que a lambeu no rosto.
Ela o surpreendeu com um abraço.
— Obrigada por ser paciente Al. Agora que possuo os sentidos apurados, eu sei como você se sente... Sobre diversas coisas...
— Tipo o quê? — sentiu-se mais envergonhado por perguntar, pois imaginava o que ela queria dizer.
Ela também ficara corada, pois ambos eram muito tímidos para irem mais afundo no assunto, mas Jenny apenas respondeu:
— Outra hora nós conversamos, quero descansar agora. — e lhe dera um beijo no focinho.
— Certo, irei tomar um banho, boa noite Jenny.
— Boa noite.
Jennifer e Allec.
***
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