IX. 𝐎 𝐫𝐚𝐧𝐜𝐡𝐨
・:*:・ 62 ・:*:・
•─────✧─────•
DEPOIS DE UM LONGO TEMPO de caminhada eles finalmente pararam em uma sala cheia de quedas-d'água. O piso era um grande fosso, cercado por uma escorregadia passarela de pedra. À volta, nas quatro paredes, a água jorrava de canos imensos e tombava no fosso, e nem mesmo quando se dirigiu para ali o facho da lanterna conseguiu ver o fundo.
Briareu desabou contra a parede. Recolheu água em uma dezena de mãos e lavou o rosto.
━ Este fosso vai direto para o Tártaro ━ murmurou ele. ━ Eu devia mergulhar e poupar problemas a vocês.
━ Não fale assim ━ disse-lhe Annabeth. ━ Você pode voltar para o acampamento conosco. Pode ajudar a nos prepararmos. Sabe mais sobre como lutar contra os titãs do que qualquer outro.
━ Nada tenho para oferecer ━ disse Briareu. ━ Perdi tudo.
━ O que aconteceu com seus irmãos? ━ perguntou Tyson. ━ Os outros dois ainda devem ser altos como montanhas! Podemos levar você até eles.
A expressão de Briareu metamorfoseou-se em algo ainda mais triste: seu rosto de luto.
━ Eles não existem mais. Desapareceram aos poucos.
As quedas-d'água trovejaram. Tyson fitou o fosso e piscou, fazendo as lágrimas rolarem.
━ O que exatamente você quer dizer com "desapareceram aos poucos"? ━ perguntei. ━ Pensei que os monstros fossem imortais, como os deuses.
━ Percy ━ disse Grover com a voz fraca ━ até mesmo a imortalidade tem limites. Às vezes... às vezes os monstros são esquecidos e perdem o desejo de permanecer imortais.
Olhando para o rosto de Grover, Lily se perguntou se ele estaria pensando em Pã. A garota lembrou de algo que a Medusa dissera uma vez: que suas irmãs, as outras duas górgonas, haviam morrido, deixando-a sozinha. Depois, no ano passado, Apolo falou algo sobre o velho deus Hélio ter desaparecido e lhe deixado os deveres de deus do sol. Ela nunca pensara muito no assunto, mas naquele momento, olhando para Briareu, percebeu como devia ser horrível ser tão velho ━ ter milhares e milhares de anos de idade ━ e totalmente sozinho.
━ Preciso ir ━ disse Briareu.
━ O exército de Cronos vai invadir o acampamento ━ afirmou Tyson. ━ Precisamos de ajuda.
Briareu deixou a cabeça pender.
━ Eu não posso, ciclope.
━ Você é forte.
━ Não mais. ━ Briareu levantou-se.
━ Ei. ━ Percy agarrou um de seus braços e o puxou para um lado, onde o rugido da água abafaria suas palavras.
Lilian ficou com pena de Tyson e deu uns tapinhas em sua costa.
━ Calma, amigão... Briareu ficará bem.
━ Obrigado, Daisy.
Então, Briareu se virou e pôs-se a caminhar penosamente pelo corredor até desaparecer nas sombras.
Tyson soluçou.
━ Está tudo bem. ━ Hesitante, Grover também deu-lhe tapinhas no ombros. Deve ter reunido toda sua coragem para fazer isso.
Tyson espirrou.
━ Não está nada bem, menino-bode. Ele era meu herói.
Por fim, Annabeth levantou-se e colocou a mochila nas costas.
━ Venham, meninos. Este fosso está me deixando nervosa. Vamos procurar um lugar melhor para passar a noite.
O GRUPO SE ACOMODOU em um corredor formado por imensos blocos de mármore. Aquilo poderia fazer parte de um túmulo grego, pelos suportes de bronze para tochas presos às paredes. Devia ser uma parte mais antiga do Labirinto, e Annabeth concluiu que isso era um bom sinal.
━ Devemos estar perto da oficina de Dédalo ━ disse ela. ━ Descansem um pouco, todos. Vamos prosseguir de manhã.
━ Como vamos saber que é manhã? ━ perguntou Grover.
━ Apenas descansem ━ insistiu ela.
Grover não precisava que lhe dissessem aquilo duas vezes. Tirou um monte de palha da mochila, comeu um pouco, fez um travesseiro com o restante e começou a roncar imediatamente. Tyson levou mais tempo para adormecer. Ficou remexendo nos pedaços de metal de seu kit de construção, mas o que quer que estivesse fazendo não o satisfazia, pois ele montava e desmontava as peças repetidamente.
━ Lamento ter perdido o escudo ━ Percy disse a ele. ━ Você se esforçou tanto para consertá-lo.
Tyson ergueu a cabeça. Seu olho estava vermelho de tanto chorar.
━ Não se preocupe, irmão. Você me salvou. Não teria sido necessário se Briareu tivesse ajudado.
━ Ele só estava assustado ━ seu irmão disse. ━ Tenho certeza de que vai superar.
━ Ele não é forte ━ disse Tyson. ━ Não é mais importante.
Deixou escapar um suspiro triste e profundo, então fechou o olho. Os pedacinhos de metal caíram de suas mãos, ainda desmontados, e Tyson começou a roncar.
Percy tentou dormir também, mas não conseguiu. A sensação de ser perseguido por uma enorme mulher-dragão com espadas venenosas dificultava a tentativa de relaxar. Ele pegou seu saco de dormir e o arrastei até onde Annabeth Lilian estavam sentadas, de vigília. A morena não conseguiu pregar os olhos, então resolveu fazer companhia para sua melhor amiga.
━ Você deveria dormir ━ disse a loira, enquanto Lilian se distraia com algumas pedrinhas.
━ Não consigo. Você está bem?
━ Claro. Primeiro dia liderando a missão. Foi ótimo.
━ Vamos conseguir ━ Lilian disse, sem olhar diretamente para ela. ━ Vamos achar a oficina antes de Luke.
Annabeth tirou o cabelo do rosto. Tinha uma mancha de sujeira no queixo, e Lily imaginou como ela devia ter sido quando criança, perambulando pelo país com Thalia e Luke. Quando tinha apenas sete anos ela os salvara da mansão de um ciclope do mal. Mesmo se parecia assustada, como agora, mas ela era muito corajosa.
━ Eu só queria que a missão fosse lógica ━ queixou-se ela. ━ Quer dizer, estamos prosseguindo sem ter a menor ideia de nosso destino. Como se pode andar de Nova York até a Califórnia em um dia?
━ O espaço não é medido da mesma forma no Labirinto.
━ Eu sei, eu sei. É só que... ━ Ela me olhou, hesitante. ━ Lily, Percy, eu estava enganando a mim mesma. Todo aquele planejamento e aqueles estudos. Não tenho a menor pista de aonde estamos indo.
━ Você está se saindo muito bem. Além disso, nós nunca sabemos o que estamos fazendo. E sempre dá certo. Lembra-se da Ilha de Circe? ━ Lilian tentou animá-la.
Ela riu.
━ Percy e Cosmos deram uma de porquinho-da-índia fofinho.
━ E da Aqualândia, como Daisy conseguiu nos lançar para fora daquele brinquedo?
━ Eu nos lancei de lá? A culpa foi totalmente sua! ━ a garota falou indignada.
━ Vê? Tudo vai dar certo.
Annabeth sorriu, e isso deixou os dois amigos felizes, mas o sorriso desapareceu rapidamente.
━ Percy, o que Hera quis dizer quando falou que você conhecia o caminho para sair do Labirinto?
━ Eu também estou curiosa quanto a isso. ━ Lily acrescentou.
━ Eu não sei, meninas ━ admitiu. ━ Sinceramente.
━ Você nos contaria se soubesse? ━ Annabeth perguntou.
━ Claro. Talvez...
━ Talvez o quê?
━ Talvez, se você nos contasse a última linha da profecia, isso ajudasse.
━ Aqui não. ━ Annabeth estremeceu. ━ Não no escuro.
━ E quanto à escolha que Jano mencionou? Hera disse... ━ Lilian perguntou.
━ Pare ━ cortou Annabeth. Então respirou fundo, trêmula. ━ Desculpem. Só estou estressada. Mas eu não... Eu preciso pensar sobre isso.
Eles ficaram sentados em silêncio, ouvindo os estranhos estalos e gemidos no Labirinto, o eco de pedras em atrito enquanto os túneis se transformavam, cresciam e se expandiam.
━ Nico está aqui embaixo, em algum lugar ━ Percy disse. ━ Foi assim que ele desapareceu do acampamento. Ele encontrou o Labirinto. Depois achou uma passagem que descia ainda mais... para o Mundo Inferior. Mas agora ele está de volta ao Labirinto. Está vindo atrás de mim.
Annabeth ficou em silêncio por um longo tempo.
━ Percy, espero que esteja errado. Mas, se tiver razão... ━ Ela olhou para o feixe de luz da lanterna, que lançava um círculo pálido na parede de pedra. Lilian teve a sensação de que ela estava pensando em sua profecia. Ela nunca a vira com uma aparência mais cansada.
━ Que tal eu fazer a primeira vigília? ━ perguntou Percy ━ Acordo vocês se algo acontecer.
Pareceu que Annabeth ia protestar, mas depois ela simplesmente assentiu, tombou em seu saco de dormir e fechou os olhos.
Lilian estava tão cansada que se acomodou em seu saco de dormir e desejou boa noite para quem estivesse ouvindo. Um sorriso brotou em seus lábios quando ela sentiu alguém depositar um beijo em sua bochecha. Um beijo com cheiro de mar.
A GAROTA DEIXOU-SE SER CONSUMIDA pelo mundo dos sonhos, e logo ela estava de volta à prisão do idoso no Labirinto.
Agora se parecia mais com uma oficina. Havia mesas cobertas com instrumentos de medição. Uma forja queimava, incandescente, a um canto. O garoto que ela vira no último sonho estava alimentando os foles, mas agora era mais alto, já quase da minha idade. Um estranho dispositivo semelhante a um funil estava acoplado à chaminé da forja, aprisionando a fumaça e o calor e desviando-os por meio de um cano para o chão, perto de uma grande tampa de bueiro feita de bronze.
Era dia. O céu acima era azul, mas as paredes do Labirinto lançavam sombras pesadas sobre a oficina. Depois de passar tanto tempo em túneis, ela achava estranho que parte do Labirinto pudesse ser aberta para o céu. De certa maneira, aquilo o tornava um lugar ainda mais cruel.
O senhor parecia doente. Estava terrivelmente magro, as mãos em carne viva de tanto trabalhar. O cabelo branco cobria-lhe os olhos, e a túnica estava suja de graxa. Estava curvado sobre uma mesa, trabalhando em uma espécie de colcha de retalhos de metal ━ como uma tira larga de malha metálica. Pegou uma delicada espiral de bronze e a posicionou no lugar.
━ Pronto ━ anunciou. ━ Está pronto.
Então levantou seu projeto. Era tão bonito que o coração da menina deu um salto ━ asas de metal construídas com milhares de penas de bronze encadeadas. Havia dois pares. Um deles ainda estava sobre a mesa. Dédalo estendeu a estrutura, e as asas expandiram-se até alcançar sete metros. Parte dela sabia que elas nunca poderiam voar. Eram pesadas demais, e não havia como sair do chão. Mas a perícia da construção era impressionante. As penas de metal captavam a luz e refletiam trinta diferentes tonalidades de dourado.
O garoto deixou os foles e correu para ver. Sorriu, apesar de estar imundo e suado.
━ Pai, você é um gênio!
O senhor sorriu.
━ Conte-me uma novidade, Ícaro. Agora se apresse. Vai levar pelo menos uma hora para prendê-las. Venha.
Ícaro? O garoto que voou perto demais do sol.
━ Você primeiro ━ disse Ícaro.
O senhor protestou, mas o filho insistiu.
━ Você as fez, pai. A honra de usá-las pela primeira vez deve ser sua.
O garoto prendeu um arnês de couro no peito do pai, semelhante a um equipamento de alpinismo, com tiras que iam dos ombros até os punhos. Então começou a prender as asas, usando um cilindro de metal que parecia uma enorme pistola de cola quente.
━ O composto de cera deve resistir por várias horas ━ afirmou Dédalo, nervoso, enquanto o filho trabalhava. ━ Mas precisamos deixá-lo endurecer primeiro. E faríamos bem em evitar voar alto ou baixo demais. O mar molharia a cera...
━ E o calor do sol a amoleceria ━ completou o garoto. ━ Sim, pai, já falamos sobre isso um milhão de vezes!
━ Cuidado nunca é demais.
━ Tenho confiança total em suas invenções, pai! Nunca existiu ninguém tão inteligente quanto você.
Os olhos do senhor brilharam. Era óbvio que ele amava o filho mais do que tudo no mundo.
━ Agora vou fixar suas asas e dar às minhas a chance de fixar adequadamente. Venha!
O processo era lento. As mãos do idoso atrapalhavam-se com as tiras. Ele tinha dificuldade em manter as asas na posição certa enquanto as selava. Suas próprias asas de metal pareciam pesadas para ele, atrapalhando-o enquanto tentava trabalhar.
━ Lento demais ━ murmurou o senhor. ━ Sou lento demais.
━ Tenha calma, papai ━ disse o garoto. ━ Os guardas não devem chegar até...
BUM!
As portas da oficina estremeceram. Dédalo as bloqueara por dentro com uma braçadeira de madeira, mas ainda assim elas sacudiram nas dobradiças.
━ Depressa! ━ disse Ícaro.
BUM! BUM!
Alguma coisa pesada chocava-se contra as portas. A braçadeira resistia, mas uma rachadura surgiu na porta da esquerda.
Dédalo trabalhava energicamente. Uma gota de cera quente caiu no ombro de Ícaro. O garoto encolheu-se, mas não gritou. Quando sua asa esquerda estava presa às tiras, Dédalo começou a trabalhar na direita.
━ Precisamos de mais tempo ━ murmurou Dédalo. ━ Eles chegaram cedo demais! Precisamos de mais tempo para a cera se firmar.
Vai dar tudo certo ━ disse Ícaro, enquanto o pai finalizava a asa direita. ━ Ajude-me com o bueiro...
CRASH!
As portas estilhaçaram-se e a ponta de um aríete de bronze surgiu pela brecha. Machados limparam os destroços e dois guardas armados entraram no salão, seguidos pelo rei com a coroa de ouro e a barba em forma de lança.
━ Ora, ora ━ disse o rei com um sorriso cruel. ━ Estão indo a algum lugar?
Dédalo e o filho pararam, as asas de metal cintilando nas costas.
━ Estamos indo embora, Minos ━ disse o idoso.
━ Estava curioso para ver até onde vocês iriam nesse projetinho antes que eu frustrasse suas esperanças. ━ O Rei Minos deu uma risadinha. ━ Devo dizer que estou impressionado.
O rei contemplou as asas.
━ Vocês estão parecendo galinhas de metal ━ concluiu ele. ━ Quem sabe não devemos depená-los e fazer uma canja.
Os guardas riram como bobos.
━ Galinhas de metal ━ um deles repetiu. ━ Canja.
━ Cale a boca ━ disse o rei. Então voltou-se novamente para Dédalo. ━ Você deixou minha filha escapar, velho. Levou minha mulher à loucura. Matou meu monstro e me transformou em motivo de piada para todo o Mediterrâneo. Você nunca me escapará!
Ícaro pegou a pistola de cera e lançou um jato no rei, que recuou, sobressaltado. Os guardas investiram, mas cada um deles recebeu um jato de cera quente no rosto.
━ O respiradouro! ━ gritou Ícaro para o pai.
━ Pegue-os! ━ vociferou o Rei Minos.
Juntos, o senhor e o filho tiraram com dificuldade a tampa do bueiro, e uma coluna de ar quente explodiu do chão. O rei observou, incrédulo, o inventor e o filho serem lançados ao céu com suas asas de bronze, impulsionados pelo jato de ar.
━ Atirem neles! ━ gritou o rei, mas os guardas não haviam levado arcos. Um deles atirou a espada em desespero, mas Dédalo e Ícaro já estavam fora de seu alcance. Eles voaram acima do Labirinto e do palácio do rei, afastando-se rapidamente da cidade de Knossos e passando, mais além, pela costa rochosa de Creta.
━ Estamos livres, pai! Você conseguiu. ━ Ícaro ria.
O garoto abriu as asas em sua envergadura máxima e deixou-se levar, planando, pelo vento.
━ Espere! ━ chamou Dédalo. ━ Tome cuidado!
Mas Ícaro já estava sobre o mar aberto, seguindo para o norte, deliciado com sua boa sorte. Subiu ainda mais e espantou uma águia em sua rota de voo, então mergulhou na direção do mar como se tivesse nascido para voar, arremetendo no último segundo. Suas sandálias roçaram as ondas.
━ Pare com isso! ━ gritou Dédalo, mas o vento carregou sua voz para longe. Seu filho estava embriagado na própria liberdade.
O senhor lutava para alcançá-lo, planando desajeitadamente atrás do filho.
Estavam a quilômetros de Creta, sobre mar aberto, quando Ícaro olhou para trás e viu a expressão preocupada do pai.
Ícaro sorriu.
━ Não se preocupe, pai! Você é um gênio! Eu confio em sua obra...
A primeira pena de metal soltou-se da asa do filho e remoinhou no ar. Em seguida, outra. Ícaro oscilou em pleno voo. De repente, ele viu as penas de bronze se soltando e rodopiando no ar, fugindo dele como um bando de aves assustadas.
━ Ícaro! ━ gritou o pai. ━ Plane! Abra as asas. Fique imóvel o máximo possível.
Mas Ícaro batia as asas, tentando desesperadamente recuperar o controle.
A asa esquerda se foi primeiro, ao se soltar das tiras.
━ Pai! ━ Ícaro gritou. E então caiu, as asas desfazendo-se até que ele era apenas um garoto de arnês de alpinismo e túnica branca, os braços estendidos em uma tentativa inútil de planar.
Lilian acordou com um sobressalto, com a sensação de que estava caindo. O corredor estava escuro. Em meio aos gemidos constantes do Labirinto, pensou ouvir o grito angustiado de Dédalo, chamando o filho pelo nome, enquanto Ícaro, sua única alegria, mergulhava em direção ao mar, cem metros abaixo.
NÃO HAVIA MANHÃ NO LABIRINTO, mas assim que todos acordaram e tomaram um fabuloso café da manhã de barras de granola e suco de caixinha, eles continuaram avançando. Lilian tentou cultivar algumas frutas, mas o solo era ácido e infrutífero.
Os antigos túneis de pedra transformaram-se em barro sustentado por vigas de cedro, como uma mina de ouro ou construção parecida. Annabeth começou a ficar agitada.
━ Isso não está certo ━ disse ela. ━ Ainda deveria ser pedra.
Eles chegaram a uma caverna na qual as estalactites pendiam do teto até quase chegar ao chão. No centro do piso de terra havia um fosso retangular, como um túmulo.
Grover estremeceu.
━ Aqui cheira como o Mundo Inferior.
Percy viu um objeto cintilando na borda do fosso ━ uma embalagem de papel-alumínio. O garoto correu com o facho da lanterna pelo buraco e viu um cheeseburger mordido flutuando em um líquido marrom imundo gaseificado.
━ Nico ━ Percy disse. ━ Ele evocou os mortos novamente.
━ Fantasmas estiveram aqui. ━ Tyson choramingou. ━ Eu não gosto de fantasmas.
━ Precisamos encontrá-lo ━ Lilian falou determinada.
Nico estava perto. Ela podia sentir isso. Não podia deixar que ele ficasse perambulando ali embaixo, sozinho, a não ser pelos mortos. Percy começou a correr e Lilian foi atrás.
━ Percy! Lily! ━ chamou Annabeth.
Eles entraram em um túnel e viram a luz à frente. Quando Annabeth, Tyson e Grover os alcançaram, Lily olhava a luz do dia que escoava de uma série de barras acima da sua cabeça. Estavam debaixo de uma grade feita de tubos de aço. Dava para ver árvores e o céu azul.
━ Onde estamos? ━ Lilian perguntou.
Então uma sombra cobriu a grade e uma vaca os olhou lá de cima. Parecia uma vaca normal, exceto por sua estranha cor ━ vermelho vivo, como uma cereja. Ela não sabia que vacas podiam ter aquela cor, e logo ela desejou ter seu caderno para fazer anotações sobre aquele estranho animal, seria uma bela adição para seu livro de animais peculiares.
A vaca mugiu, pôs um casco nas barras e então recuou.
━ É um mata-burro ━ disse Grover.
━ Um o quê? ━ Percy perguntou.
━ Eles colocam as grades no chão, perto dos portões dos ranchos, para que o gado não possa sair. Os animais não conseguem andar sobre elas.
━ Como você sabe disso?
Grover bufou, indignado.
━ Acredite em mim, se você tivesse cascos, saberia sobre mata-burros. São irritantes!
━ Hera não disse algo sobre um rancho? Precisamos dar uma olhada. Nico pode estar lá em cima. ━ Lilian lembrou.
━ Tudo bem. Mas como saímos? ━ Annabeth concordou.
Tyson resolveu o problema batendo no mata-burro com ambas as mãos. A grade soltou-se e voou para fora do campo de visão. Eles ouviram um CLANG! e um Muu! assustado. Tyson enrubesceu.
━ Desculpe, vaca! ━ pediu ele.
Então os alçou para fora do túnel.
Estavam, sim, em um rancho. Colinas ondulantes se estendiam até o horizonte, pontilhadas por carvalhos, cactos e pedras. Uma cerca de arame farpado saía do portão, seguindo em ambas as direções. Vacas cor de cereja vagavam por ali, pastando tufos de grama.
━ Gado vermelho ━ disse Annabeth. ━ O gado do sol.
━ O quê? ━ Percy perguntou.
━ São sagrados para Apolo.
━ Vacas sagradas?
━ Exatamente. Mas o que estão fazendo...
━ Espere ━ pediu Grover. ━ Ouçam.
A princípio tudo parecia silencioso... mas então ouviram: o latido distante de cães. O som foi ficando mais alto. A vegetação rasteira começou a farfalhar e dois cães apareceram. Só que não eram dois cães. Era um cão com duas cabeças. Parecia um galgo, comprido, sinuoso e de pelo todo marrom, mas seu pescoço bifurcava-se em duas cabeças, ambas rosnando, prontas para abocanhar, no geral não muito contentes em os ver.
━ Cão de Jano malvado! ━ gritou Tyson.
━ Au! ━ disse-lhe Grover, e ergueu a mão em uma saudação.
O cão de duas cabeças mostrou os dentes. Acho que não ficou muito impressionado com o fato de Grover falar sua língua. Então seu dono surgiu do meio do bosque, e Lily percebeu que o cão era o menor de seus problemas.
Era um sujeito enorme, com cabelos completamente brancos, chapéu de palha de caubói e barba branca comprida ━ uma espécie de caipira gigante. Ele usava jeans, uma camiseta estampada NÃO CRIE PROBLEMAS NO TEXAS, e um casaco de brim com as mangas arrancadas, deixando seus músculos desnudos. No bíceps direito havia uma tatuagem com espadas cruzadas. Ele segurava um porrete de madeira do tamanho de uma ogiva nuclear, com aguilhões de quinze centímetros projetando-se da ponta.
━ Junto, Ortro ━ disse ele ao cachorro.
O cão rosnou para eles mais uma vez, só para deixar claro suas impressões, e voltou até os pés do dono. O homem os olhou de cima a baixo, mantendo o porrete de prontidão.
━ O que é que temos aqui? ━ perguntou ele. ━ Ladrões de gado?
━ Viajantes apenas ━ disse Lily. ━ Estamos em uma busca.
Os olhos do homem estreitaram-se.
━ Meios-sangues, hein?
━ Como é que você sabe... ━ Percy começou, mas Annabeth pôs a mão em seu braço.
━ Sou Annabeth, filha de Atena. Este é Percy, filho de Poseidon, Lilian, filha de Deméter, Grover o sátiro, Tyson o...
- Ciclope ━ completou o homem. ━ É, isso eu posso ver. ━ Ele olhou para Percy, furioso. ━ E eu conheço meios-sangues porque sou um, filhinho. Sou Euritíon, o vaqueiro deste rancho. Filho de Ares. Vocês vieram pelo Labirinto como o outro, suponho.
━ O outro? ━ Lilian perguntou. ━ Está falando de Nico di Angelo?
━ Recebemos muitos visitantes do Labirinto ━ disse Euritíon, sombrio. ━ Não são muitos os que saem daqui.
━ Uau ━ Percy disse. ━ Agora me sinto muito bem-vindo.
O vaqueiro olhou para trás, como se alguém estivesse observando. Então baixou a voz.
━ Só vou dizer isso uma vez, semideuses. Voltem para o Labirinto agora. Antes que seja tarde demais.
━ Não vamos embora - insistiu Annabeth. ━ Não até vermos esse outro semideus. Por favor.
Euritíon grunhiu.
━ Então não vai me restar outra escolha, senhorita. Terei de levá-los para ver o patrão.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro