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IX. 𝐂𝐨𝐧𝐟𝐢𝐬𝐬𝐨̃𝐞𝐬 𝐧𝐨 𝐭𝐞𝐫𝐫𝐚𝐜̧𝐨

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LILIAN ESTAVA SONHANDO, PELO MENOS era isso que ela achava.

Não era um sonho, era uma lembrança.

A garota de dezesseis anos estava de pé em uma estufa familiar… era a estufa da sua antiga casa na Austrália.

O lugar era abarrotado de plantas de diversas espécies e de árvores de pequeno porte… era seu lugar preferido de toda aquela casa.

Lily se aproximou e viu seu pai vestindo suas roupas largas e terrosas com um avental de couro sintético, luvas cinzas em suas mãos enquanto ele podava uma roseira, cantarolando uma música do Elvis Presley. Do outro lado, ela pôde ver uma garotinha de uns seis anos de idade, tinha cabelos castanhos, olhos verdes e usava um vestido com estampa de lírio.

Era seu eu passado, alguns meses antes dela ter seu encontro com a professora que era um monstro e antes dela ser mandada para o acampamento meio-sangue. Lily foi até a menina e sorriu, ela era tão inocente e tinha um sorriso radiante e a garota mais velha sabia que hoje ela só era um reflexo do que havia sido.

A menina tratava as plantas com tanto carinho enquanto as regava com seu regador azul. Charlie olhou de relance para a filha e arregalou os olhos, largando a tesoura e correndo para tirar o regador de sua mão.

━ Não, querida… não precisa jogar muita água ━ ele falou com a voz mansa ━ assim a plantinha vai se afogar.

━ Mas ela não é um peixinho. ━ Lilian falou com sua voz juvenil.

Charlie riu, empurrando os óculos.

━ Não, elas não são um peixinho, mas as plantinhas precisam de ar além de água.

A garota assentiu e olhou para a mudinha e a terra encharcada de água, com dificuldade para absorver o líquido.

━ Desculpa plantinha ━ ela falou timidamente, passando levemente seu dedinho pela folha ━ eu não queria te fazer mal.

Charlie sorriu de admiração mais uma vez.

━ Bom, eu acho que ela desculpa você, florzinha.

━ Você acha? ━ os olhos dela brilharam cadê ansiedade ━ eu não quero que ela me odeie.

━ É impossível odiar você, querida, ninguém odeia flores.

Um sorriso nasceu no canto de sua pequena boca.

━ Eu acho que já chega de trabalho por hoje, vá para o banho que eu vou preparar o jantar.

A menina gemeu, escondendo suas mãos sujas de terra.

━ Sem reclamação ━ Charlie ergueu o dedo e fez sua cara de pai sério.

Lily assentiu e se virou para os vasos de plantas.

━ Tenho que ir, amiguinhas, mas eu prometo que amanhã eu volto.

Então ela saiu saltitando e Charlie riu, balançando a cabeça.

Ah, como ele amava tanto seu pequeno lírio.

A imagem mudou, Lily agora estava parada no meio do seu antigo quarto de infância. Tinha algumas estantes com ursos de pelúcias, brinquedos educativos e bonecas de pano com olhos de botão. No canto ela podia ver uma tendinha com o teto de tecido triangular da cor azul e vermelho, a frente e atrás eram vazados e umas pequenas luzes de fada desligadas enfeitavam o local.

Na cama estava seu pequeno eu, já vestida com seu pijama de ovelhinhas e Charlie sentado na beirada da cama afagando os cabelos castanhos da garota.

━ Conta uma história! ━ a menina exclamou com um sorriso que poderia convencer todos de seu desejo.

━ Ok, mas só uma, depois a senhorita vai dormir. ━ Charlie disse e beslicou o nariz da filha.

━ Eu prometo. ━ ela falou animada, se desvencilhando das cobertas. ━ Mas tem que ser na tendinha.

━ Na tendinha? Por que não na cama?

━ Lá é mais legal, papai.

Charlie suspirou, sabendo que ela estava ligada no 220. Ele pegou a tendinha e levou para o meio do quarto, colocando em cima do tapete felpudo rosa e jogou algumas almofadas no chão, ligando as luzes de fada.

Lily saiu da cama correndo e entrou na pequena tenda.

━ Qual livro você quer? ━ Charlie perguntou, parado em frente a prateleira de histórias clássicas.

━ O de sempre. ━ ela mostrou seu sorriso banguela e esperou seu pai entrar na barraca.

Os dois se deitaram de bruços e apoiaram o peso nos cotovelos e as pernas de Charlie passavam da tendinha. Ele colocou a versão ilustrada de Alice no País das Maravilhas aberta entre eles os dois.

A versão mais velha de Lilian sorriu e ela sentou de pernas cruzadas em frente aos dois, escutando com atenção enquanto seu pai contava a história.

A garotinha interrompeu diversas vezes para fazer as perguntas mais absurdas possíveis que eles até começavam um debate de vez em quando.

━ Papai, quem você acha que eu seria desse livro? ━ Lily perguntou, olhando para os olhos castanhos do homem.

Ele fez uma cara pensativa.

━ Acho que a Alice.

━ E por quê? ━ ela mudou de posição, ficou de lado e apoiou a cabeça na mão.

━ Bom, porque vocês duas tem um instinto de curiosidade e resolvem seguí-lo sem pensar nas consequências… mas também lutam até o fim para serem escutadas e se revoltam com as injustiças.

Ela fez uma careta como se estivesse assimilando aquelas palavras complicadas para sua mente.

━ E você? Quem você seria papai? ━ ela perguntou.

━ Acho que o chapeleiro maluco.

━ Hum-Hum ━ ela negou com a cabeça.

━ Não? E quem você acha que eu seria?

Ela sentou e começou a vasculhar o bolso do casaco de seu pai, fazendo Charlie ficar confuso.

Ela voltou com um objeto redondo e prateado. Era um relógio de bolso que pertencia à família Anderson.

━ Você tem um relógio e usa óculos igual ao Coelho branco.

━ Então só por que eu tenho um relógio e uso óculos a senhorita acha que eu seria o Coelho? ━ Charlie perguntou com um sorriso.

━ Não só por isso, mas você tem todo o tempo do mundo e sempre chega atrasado.

Charlie soltou uma risada vibrante, lembrando de que ele havia sido demitido do seu emprego de engenheiro florestal pelos seus atrasos absurdos.

━ É, talvez você esteja certa, florzinha… eu sou o Coelho branco e você é a minha Alice.

Lily riu, olhando para o relógio que tinha a gravação do nome se seu bisavô, avô e seu pai… um dia seria seu nome a estar lá.

Charlie saltou sobre a garotinha e a agarrou, fazendo cócegas até que ela estivesse implorando por liberdade.

A Lilian mais velha sorriu, sabendo que tempos assim nunca mais voltariam depois do que faria.

PERCY ESTAVA DOLOROSAMENTE preocupado com Daisy.

Ele agarrou Will Solace, do chalé de Apolo, e disse a seus irmãos que continuassem procurando Michael Yew. Os dois pegaram uma Yamaha FZI de um motoqueiro desacordado e seguiram para o Plaza a uma velocidade que teria provocado um ataque cardíaco em Sally.

No trajeto, ele notou que muitos pedestais que normalmente exibiam estátuas estavam vazios. O plano vinte e três parecia estar funcionando.
Os dois levaram apenas cinco minutos para chegar ao Plaza ━ um hotel antiquado, revestido de pedras brancas e com telhado azul de duas águas, no canto sudeste do Central Park.

Taticamente falando, o Plaza não era o melhor lugar para um quartel-general. Não era o edifício mais alto da cidade, nem o mais central. Mas tinha o estilo old school e havia atraído muitos semideuses famosos ao longo dos anos, como os Beatles e Alfred Hitchcock, então deduziu que estavam em boa companhia.

Ele acelerou a Yamaha por cima do meio-fio e parou junto à fonte diante do hotel.

Will e ele saltaram. A estátua no topo da fonte falou:

━ Ah, certo, suponho que também queiram que eu vigie sua moto!

Tratava-se de uma estátua de bronze em tamanho natural, de pé no meio de uma tigela de granito. Usava um tecido de bronze em torno das pernas e segurava uma cesta de frutas de metal.

━ Você é Deméter? ━ perguntou Percy.

Uma maçã de bronze passou rente à sua cabeça.

━ Todo mundo me toma por Deméter! ━ queixou-se. ━ Sou Pomona, a deusa romana da abundância, mas por que você se interessaria? Ninguém liga para os deuses menores. Se ligassem, não estariam perdendo esta guerra! Três vivas para Morfeu e Hécate, é o que eu digo!

━ Olhe a moto ━ falou o filho do mar.

Pomona praguejou em latim e atirou mais frutas, enquanto Will e Percy corriam na direção do hotel.

Na verdade, Percy nunca estivera no interior do Plaza. O saguão impressionava, com os candelabros de cristal e aquelas pessoas ricas desacordadas, mas não prestou muita atenção a isso. Algumas Caçadoras n
os indicaram os elevadores, e subiram para as suítes da cobertura.

Os semideuses tinham ocupado completamente os andares superiores. Campistas e Caçadoras estavam jogados nos sofás, lavando-se nos banheiros, arrancando cortinados de seda para usar como atadura em seus ferimentos e servindo-se de lanchinhos e refrigerantes dos frigobares. Alguns lobos bebiam água nos vasos sanitários.

━ Percy! ━ Jake Mason bateu em seu ombro. ━ Estamos recebendo relatórios…

━ Mais tarde ━ disse Percy. ━ Onde está Lilian?

━ No terraço. Está viva, cara, mas…

Passou por ele com um empurrão.

Em outras circunstâncias ele teria adorado a vista do terraço. Dava para o Central Park. A manhã estava clara e resplandecente ━ perfeita para um piquenique, uma caminhada ou qualquer outra coisa, exceto lutar contra monstros.

Lilian estava deitada em uma espreguiçadeira. O rosto pálido e pontilhado de suor. Embora estivesse debaixo de cobertores, ela tremia. Silena Beauregard enxugava sua testa com um pano úmido, Cosmos segurava sua mão enquanto roía as unhas e Annabeth tirava uns fios de cabelo molhados do rosto dela.

Will e Percy abriram caminho em meio a uma multidão de filhos de Deméter. Will tirou as ataduras de Lilian para examinar o ferimento e Percy teve vontade de desmaiar. O sangramento havia parado, mas o corte parecia profundo. A pele em torno do corte tinha um tom esverdeado horrível.

━ Daisy … ━ sua voz falhou.

Ela recebera a facada em seu lugar.

Como pôde deixar que isso acontecesse?

━ Tinha veneno na lâmina ━ murmurou ela. ━ Bem estúpido da minha parte, não?

Will Solace soltou o ar, aliviado.

━ Não é tão ruim, Lily. Mais alguns minutos e estaríamos em apuros, mas o veneno ainda não passou do ombro. Fique deitada imóvel. Alguém me dê um pouco de néctar!

━ Não precisamos nos preocupar tanto… filhos de Deméter são imunes a diversos tipos de veneno… vou ficar bem. ━ ela falou fracamente.

Percy lembrou de quando ela tinha sido picada pela cobra venenosa de Equidna, ele ficou morrendo de medo mas depois riu quando ela foi fazer fotossíntese.

Will limpou o ferimento com a bebida divina enquanto Percy tomou o lugar de Annabeth e segurou a mão direita de Lilian.

━ Ai ━ ela gemeu. ━ Ai, ai!... os vilões deveriam parar de mirar no meu… ai! ai!... ombro, antes que ele apodreça.

Ela apertava tanto seus dedos que ficaram roxos, mas Lily continuou imóvel, como Will pediu. Silena murmurava palavras de encorajamento. Cosmos choramingava e Annabeth esfregava as costas do namorado. Will colocou uma pasta prateada sobre o ferimento e cantarolou em grego antigo ━ um hino a Apolo. Então, cobriu o local com ataduras limpas e levantou-se, trêmulo.

O processo de cura devia ter consumido grande parte de sua energia. Ele estava quase tão pálido quanto Lily.

━ Isso deve bastar ━ disse. ━ Mas vamos precisar de alguns suprimentos dos mortais.

━ E de sol. ━ Percy falou. ━ Para ela fazer o lance da fotossíntese.

Will franziu o cenho.

━ Ela absorve raios solares para se auto-revigorar e suprir sua fadiga. ━ Cosmos explicou ━ coisa de filho da terra.

Will assentiu e pegou um pedaço de papel de carta do hotel, fez algumas anotações e o entregou a Miranda

━ Tem uma Duane Reade na Quinta Avenida. Normalmente, eu nunca roubaria…

━ Eu sim ━ ofereceu-se Travis.

Will fuzilou-o com o olhar.

━ Deixe dinheiro ou dracmas, o que você tiver aí, mas isto é uma emergência. Tenho a sensação de que vamos ter muito mais gente para tratar.

Miranda assentiu e puxou seu irmão Collin com ela.

Ninguém discordou. Não havia praticamente nenhum semideus que já não estivesse ferido… exceto Percy.

━ Venham, caras ━ chamou Travis Stoll. ━ Vamos dar espaço a Lilian. Temos uma farmácia para saquear… quer dizer, visitar.

Os semideuses voltaram para dentro do quarto. Jake Mason agarrou o ombro de Percy quando estava saindo.

━ Vamos conversar mais tarde, mas está tudo sob controle. Estou usando o escudo de Annabeth para ficar de olho nas coisas. O inimigo retirou-se ao nascer do sol; não tenho certeza do porquê. Temos um sentinela em cada ponte e em cada túnel.

━ Obrigado, cara ━ falou Percy.

Jake assentiu.

━ Descanse.

Cosmos olhou para Lily e depositou um beijo em sua testa.

━ Me chame se precisar de algo.

Ela assentiu.

Cosmos levou Annabeth e fechou as portas do terraço ao sair, deixando Silena, Lily e Percy sozinhos.

Silena passou o pano úmido na testa de Lilian.

━ A culpa é minha ━ disse ela.

━ Não ━ disse Lily, sem forças. ━ Silena, como pode ser culpa sua?

━ Nunca servi para nada no acampamento ━ murmurou ela. ━ Ao contrário de você ou de Percy. Se eu lutasse melhor…

Sua boca tremeu. Desde a morte de Beckendorf ela vinha piorando, e sempre que Percy a olhava sentia novamente a raiva pela morte dele. A expressão dela o lembrava vidro ━ como se pudesse quebrar a qualquer momento. Percy jurou a si mesmo que se um dia descobrisse o espião que causara a morte do namorado dela, ele o daria à sra. O’Leary como brinquedo de mastigar.

━ Você é uma excelente campista ━ disse Percy a Silena. ━ É a melhor amazona de pégasos que temos. E se dá bem com as pessoas. Acredite, qualquer um que consiga ser amigo de Clarisse tem talento.

Ela o olhou como se ele acabasse de lhe dar uma ideia.

━ É isso! Precisamos do chalé de Ares. Posso falar com Clarisse. Eu sei que posso convencê-la a nos ajudar.

━ Ah, Silena. Mesmo que você conseguisse sair da ilha, Clarisse é muito teimosa. Quando está zangada… eu sei por experiência própria. ━ Lilian falou.

━ Por favor ━ disse Silena. ━ Posso pegar um pégaso. Eu sei que consigo voltar ao acampamento. Deixe-me tentar.

Percy trocou um olhar com Lilian. Ela assentiu levemente.

Talvez mandá-la de volta ao acampamento lhe desse algo em que se concentrar.

━ Muito bem ━ falou Percy. ━ Não consigo pensar em ninguém melhor para tentar isso.

Silena o abraçou. Em seguida, afastou-se, constrangida, olhando para Lily.

━ Hã, desculpe. Obrigada, Percy! Não vou decepcioná-lo!

Assim que ela se foi, Percy se ajoelhou ao lado de Lily e pousou a mão em sua testa. Ainda estava queimando, mas parecia estar diminuindo.

━ Você fica uma gracinha quando está preocupado ━ murmurou ela. ━ Suas sobrancelhas ficam juntas e franzidas.

━ Você não vai morrer e me deixar lhe devendo um favor ━ falou ━ Por que levou aquela facada?

━ Você teria feito o mesmo por mim.

Era verdade. Ele achava que ambos sabiam disso. Ainda assim, ele se sentia como se alguém estivesse cutucando seu coração com um frio espeto de metal.

━ Como você sabia?

━ Sabia o quê?

Ele olhou à volta para ter certeza de que estavam sozinhos. Então chegou mais perto dela e sussurrou:

━ Meu calcanhar de aquiles. Se você não levasse essa facada, eu teria morrido.

O olhar dela estava longe. Seu hálito era de morangos, talvez por causa do néctar. Ela pensou na fisgada em sua coluna.

━ Não sei, Percy. Eu simplesmente tive a sensação de que você estava em perigo. Onde… onde é o ponto?

Ele não deveria contar aquilo. Mas ela era Lily. Se ele não pudesse confiar nela, não poderia confiar em mais ninguém.

━ Na base da minha coluna.

Ela ergueu a mão.

━ Onde? Aqui?

Ela pôs a mão nas suas costas e a pele dele formigou. Percy conduziu seus dedos ao ponto que o conectava à sua vida mortal. Mil volts de eletricidade pareceram percorrer seu corpo.

━ Você me salvou ━ falou Percy ━ Obrigado.

Ela tirou a mão, mas ele continuou a segurá-la.

━ Então você está me devendo ━ disse ela, fraca. ━ Conte-me uma novidade.

Eles ficaram observando o sol elevar-se sobre a cidade. O trânsito àquela hora já deveria ser intenso, mas não havia carros buzinando, nem a multidão alvoroçada nas calçadas. Lily fechou os olhos e absorveu os raios solares que beijavam sua pele.

A distância, ela podia ouvir o alarme de um carro ecoar pelas ruas. Uma coluna de fumaça negra espiralava em direção aos céus em algum ponto do Harlem. Lily imaginou quantos fogões teriam sido deixados ligados quando o feitiço de Morfeu sobreveio; quantas pessoas teriam adormecido enquanto preparavam o jantar. Logo, logo haveria mais incêndios. Todos em Nova York estavam em perigo ━ e todas aquelas vidas dependiam deles… será que Charlie estava entre os dorminhocos?

━ Você se perguntou por que Hermes estava furioso com Annabeth e eu? ━ disse Lily.

━ Ei, você precisa descansar…

━ Não, eu quero lhe contar. Isso me incomoda há muito tempo. ━ Ela se encolheu ao mexer o ombro. ━ Annabeth me contou que ano passado, Luke foi lhe ver em São Francisco.

━ Pessoalmente? Ele foi até a casa dela?

━ Isso foi antes de entrarmos no Labirinto, antes… ━ Ela relutou, mas Percy sabia o que queria dizer: antes de ele se transformar em Cronos. ━ Ele foi com uma bandeira branca. Disse que só queria cinco minutos para conversar. Ela disse que ele parecia assustado, Percy. Luke contou que Cronos ia usá-lo para dominar o mundo. Disse que queria fugir, como nos velhos tempos. E queria que ela fosse com ele.

━ Mas Annabeth não acreditou.

━ É claro que não. Ela pensou que fosse um truque. Além disso… bem, muita coisa tinha mudado desde os velhos tempos. Annabeth disse a Luke que não havia a menor chance. Ele ficou furioso. Disse… disse que então ela devia tentar derrotá-lo ali mesmo, porque aquela seria sua última oportunidade… pois ele iria lhe tirar tudo… ele… ele mandou os monstros para me matar na Austrália… destruíram minha casa… Luke não se importa mais comigo, eu me arrependo amargamente de tê-lo chamado de irmão.

O suor brotou novamente em sua testa. A história estava consumindo grande parte de sua energia.

━ Está tudo bem ━ falou Percy ━ Tente descansar um pouco, absorva o sol.

━ Você não compreende, Percy. Hermes tinha razão. Se eu tivesse prestado mais atenção no comportamento de Luke, talvez eu pudesse tê-lo mudado… eu não sei.

━ Tê-lo mudado? ━ Percy completou. ━ Você sabe que isso não daria certo.

Ela fechou os olhos, bem apertados.

━ Luke disse que Cronos iria usá-lo como um meio de vencer. Foram estas as palavras dele. Cronos usaria Luke e se tornaria ainda mais poderoso.

━ Foi o que ele fez ━ disse ele. ━ Ele se apossou do corpo de Luke.

━ Mas e se o corpo de Luke for apenas uma transição? E se Cronos tiver um plano para se tornar ainda mais poderoso?

Ela suspirou.

Percy acariciou suas bochechas, admirando a constelação de sardas.

━ Não se culpe, Margarida… não se destrua dessa maneira.

Os olhos de Lilian estavam tristes, mas ele estava disposto a mudar isso.

━ Eu voltei para você, como prometido… talvez eu devesse ganhar algum tipo de recompensa.

Um sorriso mínimo enfeitou os lábios dela.

━ E o que quer, grande herói?

━ Você sabe o que quero. ━ os olhos de Percy transmitiam puro desejo.

Ambos se perdiam em seus olhos cor de mar e de matas, descansando os olhares um no outro… sentindo o universo todo se expandir em seus peitos, como uma constelação.

A melodiosa essência da garota… seu cheiro doce, cristalino e mélico de uma sobremesa gostosa e adocicada… desnorteava o olfato de Percy.

Os dedos dele percorreram a pele lisa, nívea, acetinada e delicada… seu fino toque de porcelana aguçava ainda mais seus sentidos.

Lily não conseguia mais resistir a Percy, estava rendida, atada, e seus sentimentos transbordaram através de sua visão, tato e olfato.

Sucumbida ao charme irresistível do garoto, Lily ergueu a mão direita na direção de seu rosto e delicadamente passou a acariciá-lo, escorregando os dedos de modo suave por suas marcas, descendo por seu queixo.

Com os rostos próximos, ambos os narizes se encontraram no meio do caminho, num toque delicado e carinhoso… e através dos olhos semicerrados de Percy, ele viu um sorriso brotar nos lábios dela.

Os dois estavam completamente aconchegados, com as respirações se misturando,  sentindo que o melhor silêncio que existia, era aquele no espaço de tempo que antecedia um beijo.

A luz fraca do sol subindo, o frio matinal, o som dos pássaros… quando se está apaixonado parece que o mundo todo dançava romanticamente ao seu redor.

Lily sorriu  ainda mais e puxou Percy para um beijo apaixonado.

Percy iniciou o beijo com calma, ansioso por saborear mais uma vez aqueles lábios róseos tão apetitosos… porque Lilian tinha um gosto tão afável que era muito fácil se perder.

O encontro de suas bocas fluía muito suave, porém intenso… como quem regressava para casa depois de ter emigrado cem anos antes… um fogo doce, onde tudo ardia…

Aquele era o beijo mais carinhoso de todos os beijos que compartilharam… algo parecido com chocolate derretido… que se desfazia em suas papilas gustativas… algo que os teletransportava para longe, onde não havia gravidade… e tudo simplesmente flutuava.

Ela experimentava o herói a beijando com calma, mas ao mesmo tempo com uma pitada de desespero… não sentindo suas pernas, nem a dor em seu ombro… presa em um mundo onde somente os dois existiam.

E era exatamente isso que Percy desejava… queria fazer Lilian se sentir em outra dimensão e cobri-la com um beijo que tivesse gosto de felicidade em meio ao caos.

Tudo soava de forma apaixonante.

Ele a beijava… quente… doce… macio… suave. Lily se sentia cada vez mais unida a ele… juntos… no mesmo objetivo… no mesmo ritmo…. Num entrelaçar de almas… num encaixe perfeito.

Percy sentia o infinito nos lábios dela, com aquele beijo tão deleitoso e desejava que a garota lhe acompanhasse naquele caminho tão perfeito.

O beijo se tornava cada vez mais úmido, suas respirações arfavam, perdidos no ritmo… no compasso.

Ambos sorviam a respiração um do outro de forma íntima, enquanto suas tímidas línguas se confundiam, num encontro inesperado, partindo para a exploração mais inerente.

Lilian Anderson era sua inspiração, que o enlevava nas suas mais belas imagens, com suas nuances coloridas… como uma mística aurora e o crepúsculo do sol… num espetáculo inigualável daqueles raios solares.

Ela era seu feixe de luz em meio aquela escuridão.

Ambos juntos eram uma perfeita combinação e quanto mais Percy se dava conta, mais beijava os lábios dela com fervor, passeando em suas esquinas, sentindo seus poros em explosão.

Ainda o deixando conduzir, a garota sentia que Percy não apenas a beijava, mas lhe ensinava o caminho para casa, ele não a abraçava, mas causava abstinência por terem passado tanto tempo longe um do outro.

Percy quebrava o beijo por um instante apenas para murmurar em seus lábios.

━ Não consigo parar de te beijar… ━ Percy confessava em um rouco sussurro.

━ Então continue.

Então o filho do mar tomava os lábios da filha da terra, desesperado por seu toque.

Ele queria saborear intensamente o doce gosto dos lábios dela, atear, mimar, degustá-la até desmaiar… porque era impossível não se sentir tão estremecido diante da textura macia, quente e suave.

Desatinada e completamente zonza, Lily se movia no ritmo dele… lento, meigo e manso… encontrando-se rendida no entrelaçe daqueles lábios, que se moldaram deliciosamente aos seus, se surpreendendo em experimentar o gosto intenso, honorário e poderoso.

Ela soltava um suspiro, procurando por ar… deuses, Percy Jackson lhe deixava fora de órbita.

Eles abriram os olhos… lentamente.

Ambos olhares se cruzaram semicerrados… em silêncio.

Percy encarava o rosto enrubescido de Lilian, que se encontrava totalmente desnorteada.

Ele mantinha o rosto muito próximo do dela, apreciando quando a morena respirava e inspirava suavemente em sua pele.

━ Sua boca tem gosto de sobremesa. ━ Percy falou em um sussurro macio.

━ E qual sobremesa… Herói? ━ ela perguntou extasiada.

━ Fondue de chocolate com morangos.

━ E pelo visto você quer ficar com diabetes. ━ ela falou com um sorriso divertido.

━ Eu não me importo, fondue agora é a minha sobremesa favorita… docinho.

Ela  corou diante daquele apelido.

Lilian tinha tantas coisas engarrafadas em sua garganta, que talvez fosse a hora de começar a ser completamente sincera e expor tudo o que seu coração guardava.

━ Se você continuar me chamando por esses apelidos carinhosos eu vou ficar envergonhada, mas muito feliz…

━ E você tem alguns outros em mente? ━ Percy indagou, acariciando o rosto dela com os dedos.

━ Se me chamar de docinho, vou açucarar ainda mais sua vida….se me chamar de moranguinho, me apaixono ainda mais… se me chamar de princesa, eu derreto… se me chamar de anjo, vou te proteger como um… se me chamar de linda, farei da sua rotina ainda mais deslumbrante… se me chamar de Julieta, deixarei você ser o meu Romeu e se me chamar de minha… eu serei somente sua.

Percy sentiu seu coração pular dentro do peito após ouvir aquelas palavras tão apaixonadas… o que dizer da expressão encantadora de Lilian Daisy Anderson?

Por Afrodite …. Ela era tão linda, tão radiante… tão esplêndida.

━ Obrigado. ━ Percy disse.

━ Obrigado? Pelo o quê?

Percy se encontrava totalmente hipnotizado… ele ficava tão completamente vulnerável diante daquelas palavras, muito atraído pela expressão daquele rosto belo.

━ Obrigado por tudo, obrigado por estar comigo quando eu precisei e principalmente quando eu achei que não precisava de ninguém. Fez toda a diferença você estar lá nesses momentos. Mesmo que distante, você ainda estava lá, e eu sou grato todos os dias por ter pessoas como você na minha vida.

Lily piscou freneticamente, seu coração bombeava com tamanha intensidade.

━ Eu sempre imaginei encontrar uma pessoa que me trouxesse conforto e paz e que me aceitasse do jeito que eu sou ━ ela continuou ━ Aí eu te conheci, Cara de Peixe e você não era nada disso! Ao invés de paz você trouxe um monte de novidades para a minha vida, ao invés de conforto você trouxe um novo modo de pensar. Ao invés de me aceitar como eu sou você me fez descobrir que eu poderia ser muito melhor. Nós somos muito diferentes, mas somos diferentes de um jeito que eu acho perfeito, porque a gente se completa. Você é tudo o que estava faltando na minha vida e eu espero ser o mesmo para você. Somos terra e mar vivendo em uma mesma harmonia.

Percy exalou totalmente surpreso, ninguém nunca tinha dito coisas tão bonitas para ele antes.

━ Você é tudo isso e muito mais Daisy, você curou minhas feridas e me deu motivos para sorrir mesmo em dias ruins. Você é uma garota incrível e eu tenho muita sorte de te ter comigo, te ter na minha vida, os meus sentimentos por você são mais verdadeiros e intensos do que eu consigo demonstrar… Lilian Anderson… eu te-

━ Percy. ━ Pólux chegou. ━ A sra. O’Leary acaba de voltar com Grover. Acho que você deveria falar com ele. Atrapalhei alguma coisa?

━ Não.. não… ━ Lilian falou sem jeito.

━ Simmmm! ━ Percy murmurou.

Pólux arregalou os olhos e saiu envergonhado.

━ A gente se fala depois, docinho. ━ Ele falou e ela sorriu ━ Descanse.

Ele deu um último beijo em sua testa e saiu.

GROVER ESTAVA FAZENDO UM LANCHE na sala de estar. Estava vestido para combate. Usava uma camisa blindada feita de casca de árvore e fios torcidos, com o porrete de madeira e a flauta de bambu pendendo de seu cinto.

O chalé de Deméter havia preparado um bufê completo nas cozinhas do hotel ━ tudo, de pizza a sorvete de abacaxi. Infelizmente, Grover estava comendo a mobília. Ele já mastigara o estofado de uma elegante cadeira e agora roía o descanso de braço.

━ Cara ━ disse Percy ━ só tomamos este lugar emprestado.

━ Bé-é-é! ━ Havia enchimento espalhado por todo o seu rosto. — Desculpe, Percy. É que… são móveis Luís XVI. São deliciosos. Além disso, eu sempre como a mobília quando fico…

━ Quando fica nervoso ━ completou ele. ━ É, sei disso. Então, o que houve?

Ele bateu os cascos.

━ Já soube de Lilian. Ela vai…?

━ Ela vai ficar bem. Está descansando.

Grover respirou fundo.

━ E você estava descansando com ela? Pelos seus sentimentos, parecia que estava bastante agitado. ━ Grover sorriu acusatório.

Percy corou furiosamente.

━ Não se preocupe. Mobilizei a maior parte dos espíritos da natureza na cidade… bem, os que me ouvem, pelo menos. ━ Grover esfregou a testa. ━ Eu não tinha a menor ideia de que bolotas de carvalho podiam ser tão dolorosas. De qualquer forma, estamos ajudando como podemos.

Grover contou sobre os combates que tinham visto. Eles haviam coberto principalmente a parte alta da cidade, onde não tínhamos semideuses suficientes. Cães infernais haviam aparecido por toda parte, viajando nas sombras para dentro das linhas, e as dríades e os sátiros haviam se incumbido de combatê-los. Um dragão jovem tinha aparecido no Harlem, e uma dúzia de ninfas do bosque morrera até que o monstro finalmente fosse derrotado.

Enquanto Grover falava, Thalia entrou na sala com duas de suas tenentes. Fez um gesto severo com a cabeça na direção de Percy, saiu para dar uma olhada em Lily, voltou e ficou ouvindo Grover completar seu relatório ━ os detalhes cada vez piores.

━ Perdemos vinte sátiros para alguns gigantes em Fort Washington ━ contou ele, a voz trêmula. ━ Quase a metade dos meus parentes. No fim, os espíritos do rio conseguiram afogar os gigantes, mas…

Thalia pendurou no ombro seu arco.

━ Percy, as forças de Cronos continuam se congregando em todas as pontes e túneis. E Cronos não é o único titã. Uma de minhas Caçadoras avistou um homem imenso com uma armadura dourada reunindo um exército no litoral de Jersey. Não sei quem é, mas ele irradia poder como somente um titã ou um deus seria capaz.

━ Ótimo ━ Percy falou. ━ Alguma notícia boa?

Thalia encolheu os ombros.

━ Vedamos os túneis do metrô para Manhattan. Minhas melhores especialistas em armadilhas cuidaram disso. E mais: parece que o inimigo está esperando para atacar esta noite. Acho que Luke… quer dizer, Cronos ━ ela se corrigiu ━ precisa de tempo para se regenerar após cada combate. Ele ainda não está confortável em sua nova forma. Grande parte de seu poder está sendo consumida na desaceleração do tempo em torno da cidade.

Grover concordou.

━ A maior parte de suas tropas é mais poderosa à noite também. E vão voltar depois que o sol se puser.

━ O.k. Alguma notícia dos deuses?

Thalia sacudiu a cabeça.

━ Sei que Lady Ártemis estaria aqui se pudesse. Atena também. Mas Zeus ordenou que fiquem ao lado dele. A última notícia que tive foi que Tifão estava destruindo o vale do Rio Ohio. Deve alcançar os Montes Apalaches ao meio-dia.

━ Portanto, na melhor das hipóteses ━ ponderou Percy ━ temos mais dois dias até ele chegar.

Jake Mason pigarreou. Jake estivera ali tão silencioso que ele quase havia se esquecido de sua presença.

━ Percy, há mais uma coisa ━ disse ele. ━ O fato de Cronos ter aparecido na Ponte de Williamsburg, como se soubesse que você ia para lá. Além disso, ele desviou as tropas para nossos pontos mais fracos. Assim que nos posicionávamos, ele mudava de tática. Ele mal tocou no Túnel Lincoln, onde as Caçadoras eram fortes. Atacou nossos pontos mais vulneráveis, como se os conhecesse.

━ Como se tivesse informações confidenciais ━ disse Percy. ━ O espião.

━ Que espião? ━ perguntou Thalia.

Percy contou sobre o pendente de prata que Cronos havia o mostrado, o aparelho de comunicação.

━ Isso é ruim ━ disse ela. ━ Muito ruim.

━ Poderia ser qualquer um ━ afirmou Jake. ━ Estávamos todos lá quando Percy deu as ordens.

━ Mas o que podemos fazer? ━ perguntou Grover. ━ Revistar cada semideus até encontrarmos um pendente em forma de foice?

Todos olharam para Percy, à espera de uma decisão. Ele não podia se dar o luxo de mostrar que estava em pânico, ainda que parecesse não haver esperanças.

━ Vamos continuar lutando ━ falou. ━ Não podemos ficar obcecados por esse espião. Se começarmos a desconfiar uns dos outros, vamos nos destruir. Vocês todos foram incríveis na noite passada. Eu não poderia querer um exército mais bravo. Vamos estabelecer um revezamento para a vigilância. Descansem enquanto podem. Temos uma noite longa pela frente.

Os semideuses murmuraram, de acordo, e se separaram. Foram dormir, comer ou consertar as armas.

━ Percy, você também ━ disse Thalia. ━ Vamos ficar de olho nas coisas. Vá se deitar. Precisamos de você em boa forma esta noite.

Ele não discutiu muito. Encontrou o quarto mais próximo e desabou em uma cama de dossel.

LILIAN TINHA DESMAIADO DE EXAUSTÃO e agora estava presa em um sonho.

Ela viu Nico di Angelo sozinho nos jardins de Hades. Ele acabara de abrir um buraco em um dos canteiros de flores de Perséfone, o que imaginou que não fosse deixar a rainha muito feliz.

Nico despejou um cálice de vinho no buraco e começou a entoar uma melodia.

━ Que os mortos provem o sabor novamente. Que se ergam e recebam esta oferenda. Maria di Angelo, apresente-se!

Uma fumaça branca condensou-se. Uma figura humana se formou, mas não era a mãe de Nico. Era uma garota de cabelos escuros e pele azeitonada, com o traje prateado de uma Caçadora.

━ Bianca ━ disse Nico. ━ Mas…

Não evoque nossa mãe, Nico, avisou ela. Ela é um dos espíritos que você está proibido de ver.

━ Por quê? O que nosso pai está escondendo?

Dor, disse Bianca. Ódio. Uma maldição que remonta à Grande Profecia.

━ O que você quer dizer? ━ perguntou Nico. ━ Eu preciso saber!

O conhecimento só vai feri-lo.

Lembre-se do que eu disse: guardar rancor é um defeito fatal para os filhos de Hades.

━ Eu sei disso ━ afirmou Nico. ━ Mas eu não sou o mesmo de antes, Bianca. Pare de tentar me proteger!

Irmão, você não entende…

Nico passou a mão pela névoa, e a imagem de Bianca se dissipou.

━ Maria di Angelo ━ ele tornou a dizer. ━ Fale comigo!

Uma imagem diferente se formou. Era uma cena, não um único fantasma. Em meio à névoa, Lily viu Nico e Bianca ainda criancinhas, brincando no saguão de um hotel elegante, correndo em torno de colunas de mármore.

Uma mulher estava sentada em um sofá próximo. Usava vestido preto, luvas e chapéu também preto com véu, como uma estrela de cinema dos anos 40. Tinha o sorriso de Bianca e os olhos de Nico.

Em uma cadeira ao lado dela sentava-se um homem corpulento, de pele oleosa, de terno risca de giz preto. Com um susto, reconheci Hades. Ele se inclinava na direção da mulher, movendo as mãos enquanto falava, como se estivesse agitado.

━ Por favor, minha querida ━ disse ele. ━ Você precisa ir para o Mundo Inferior. Não me importo com o que Perséfone pensa! Posso mantê-la a salvo lá.

━ Não, meu amor. ━ Ela falava com sotaque italiano. ━ Criar nossos filhos na terra dos mortos? Não farei isso.

━ Maria, me escute. A guerra na Europa pôs os outros deuses contra mim. Uma profecia foi feita. Meus filhos não estão mais em segurança. Poseidon e Zeus me forçaram a um acordo. Nenhum de nós deve ter mais filhos semideuses.

━ Mas você já tem Nico e Bianca. Certamente…

━ Não! A profecia adverte sobre uma criança que completa dezesseis anos. Zeus decretou que os filhos que tenho agora devem ser levados para o Acampamento Meio-Sangue para treinamento adequado, mas eu sei o que ele quer dizer. Na melhor das hipóteses, eles serão vigiados, aprisionados, doutrinados contra o pai. E o mais provável é que ele não vá se arriscar. Não vai permitir que meus filhos semideuses cheguem aos dezesseis anos. Vai encontrar uma forma de destruí-los, e eu não vou correr esse risco!

━ Certamente ━ disse Maria. ━ Vamos ficar juntos. Zeus é um imbécil.

Lily não pôde deixar de admirar a coragem dela, mas Hades olhou para o teto, nervoso.

━ Maria, por favor. Eu lhe disse que Zeus me deu um prazo, que era semana passada, para entregar as crianças. A ira dele será terrível, e eu não poderei escondê-la para sempre. Enquanto você estiver com as crianças, também estará em perigo.

Maria sorriu, e de novo era sinistro o quanto ela se parecia com a filha.

━ Você é um deus, meu amor. Vai nos proteger. Eu não levarei Nico e Bianca para o Mundo Inferior.

Hades apertava as mãos.

━ Então existe uma outra opção. Conheço no deserto um lugar onde o tempo não passa. Posso mandar as crianças para lá por um período, para a segurança delas, e poderíamos ficar juntos. Vou construir um palácio dourado para você, à margem do Estige.

Maria di Angelo sorriu delicadamente.

━ Você é um homem gentil, meu amor. Um homem generoso. Os outros deuses deveriam vê-lo como eu vejo, assim não o temeriam tanto. Mas Nico e Bianca precisam da mãe. Além disso, são só crianças. Os deuses não os machucariam de verdade.

━ Você não conhece minha família ━ retrucou Hades, sombrio. ━ Por favor, Maria, não posso perdê-la.

Ela tocou-lhe os lábios com os dedos.

━ Você não me perderá. Espere enquanto pego minha bolsa. Olhe as crianças.

Maria beijou o Senhor dos Mortos e se levantou do sofá. Hades a observou subindo a escada, como se cada passo dela ao se afastar lhe causasse dor.

Um momento depois ele se retesou. As crianças pararam de brincar, como se também pressentissem algo.

━ Não! ━ exclamou Hades.

Mas até mesmo seus poderes divinos foram lentos demais. Ele só teve tempo de erigir uma parede de energia negra em torno das crianças antes que o hotel explodisse.

A explosão foi tão violenta que a imagem na névoa se dissipou. Quando voltou a entrar em foco, viu Hades ajoelhado em meio às ruínas, segurando o corpo destruído de Maria di Angelo. O fogo ainda queimava ao redor dele. Relâmpagos cruzavam o céu, e trovões ribombavam.

Os pequenos Nico e Bianca olhavam para a mãe, sem entender. A Fúria Alectó surgiu atrás deles, sibilando e batendo as asas coriáceas. As crianças pareceram não vê-la.

━ Zeus! ━ Hades agitava o punho na direção do céu. ━ Eu vou destruí-lo por isso! Eu a trarei de volta!

━ Meu senhor, isso não é possível ━ advertiu Alectó. ━ O senhor, de todos os imortais, é quem mais deve respeitar as leis da morte.

Hades irradiava ira.

━ Pegue-os ━ ele disse a Alectó, reprimindo um soluço. ━ Apague a memória deles na fonte de Lete e leve-os para o Hotel Lótus. Zeus não lhes fará mal lá.

━ Como quiser, meu senhor ━ replicou Alectó. ━ E o corpo da mulher?

━ Leve-a também ━ disse ele, amargamente. ━ Ministre a ela os antigos ritos.

Alectó, as crianças e o corpo de Maria se dissiparam nas sombras, deixando Hades sozinho em meio aos escombros.

━ Eu o avisei ━ disse uma nova voz.

Hades virou-se. Uma garota com um vestido multicolorido estava de pé ao lado dos restos fumegantes do sofá. Tinha cabelos pretos curtos e olhos tristes. Não devia ter mais de doze anos. Lily não a conhecia, mas ela lhe pareceu estranhamente familiar.

━ Você ousa vir até aqui? ━ rosnou Hades. ━ Eu deveria transformá-la em pó!

━ Você não pode ━ disse a menina. ━ O poder de Delfos me protege.

Com um calafrio, Lily percebeu que a garota que ela estava vendo era o Oráculo de Delfos, quando viva e jovem. Por alguma razão, vê-la assim era ainda mais sinistro do que vê-la como múmia.

━ Você matou a mulher que eu amava! ━ rugiu Hades. ━ Sua profecia nos trouxe a isto!

Ele se avultou diante da garota, mas ela nem se encolheu.

━ Zeus ordenou a explosão para destruir as crianças ━ disse ela ━ porque você desafiou a vontade dele. Não tive nada a ver com isso. E avisei a você que as escondesse antes.

━ Não pude! Maria não deixou! Além disso, elas eram inocentes.

━ Mas são seus filhos, e isso os torna perigosos. Mesmo que os esconda no Hotel Lótus, só estará adiando o problema. Nico e Bianca jamais poderão voltar ao mundo, para que não completem dezesseis anos.

━ Por causa da sua assim chamada Grande Profecia. E vocês me obrigaram a fazer um juramento de não ter outros filhos. Não me deixaram nada!

━ Eu prevejo o futuro ━ disse a garota. ━ Não posso mudá-lo.

Um fogo negro iluminou os olhos do deus, e Lily sabia que algo de mau estava vindo. Ela queria gritar para que a garota se escondesse ou corresse.

━ Então, Oráculo, ouça as palavras de Hades ━ grunhiu ele. ━ Talvez eu não possa trazer Maria de volta. Tampouco posso causar a você uma morte prematura. Mas sua alma ainda é mortal, e eu posso amaldiçoá-la.

Os olhos da garota se arregalaram.

━ Você não…

━ Eu juro ━ disse Hades ━ que enquanto meus filhos permanecerem proscritos, enquanto eu padecer sob a maldição de sua Grande Profecia, o Oráculo de Delfos jamais vai ter outro hospedeiro mortal. Você nunca descansará em paz. Ninguém vai tomar seu lugar. Seu corpo vai murchar e morrer, e o espírito do Oráculo ainda estará preso dentro dele. Você proferirá suas profecias amargas até se esfarelar e se transformar em nada. O Oráculo morrerá com você!

A menina gritou, e a imagem enevoada se desfez em fiapos.

Nico caiu de joelhos no jardim de Perséfone, o rosto branco com o choque. De pé diante dele estava o verdadeiro Hades, avultando-se em seu manto negro e olhando severamente para o filho.

━ O que exatamente você pensa que está fazendo? ━ perguntou a Nico.

Uma explosão negra tomou conta dos seus sonhos.

Lily acordou arfando, sentindo a dor em seu ombro triplicar, mas o sol lhe ajudou a se vigorar.

A menina limpou o suor do rosto e tomou um susto quando viu uma pomba branca dos olhos rosados lhe encarando sinistramente.

Lily sorriu sem graça.

━ Acho que você está feliz agora. ━ ela murmurou, acariciando pela primeira vez as penas brancas. ━ A profecia está se cumprindo… desculpe Lady Afrodite… imploro seu perdão.

A pomba arrulhou suavemente e recebeu as carícias afetuosamente.

━ E obrigado por tudo… Dite. ━ a menina sorriu mostrando os dentes.

A pomba partiu em direção ao sol e Lilian a observou. Seus olhos se focaram no horizonte e ela garantiu a si mesmo que eles sairiam vitoriosos.

Custe o que custar.

Dessa vez eu me superei, quem concorda levanta a mão 🤚🏼

Amaram?

Surto após surto... eu quase gritei escrevendo.

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