Capítulo VI: Confiança
— Casa?! Mas aqueles homens devem estar atrás da gente, não podemos simplesmente voltar... — Mia questionou, confusa com a ideia.
— Olha Mia, eu sei que não parece uma ideia boa, mas a gente não tem outra opção. Vamos correr riscos em qualquer lugar, então eu acho que o melhor é voltar. — Explicou Max, ainda firme com o pensamento.
— Mas... E se eles forem machucar não só a gente... E se... Também matarem as nossas famílias? Não acha que só ficarmos juntos é uma opção melhor? — A garota repontou, dessa vez preocupada e falando mais baixo que o normal.
*Inglês* — Sobre o que vocês estão discutindo? — Finn perguntou, querendo mais detalhes, mas recebeu apenas um aceno de Mia para que esperasse e um olhar de relance de Max.
— É... 'Cê tem razão. Ainda assim somos um grupo de vinte, sem sequer um adulto pra tomar conta. — O garoto comentou com um tom pensativo na voz, voltando seu olhar para Mia.
— Entendo onde quer chegar... Mas você tá com cara de quem já pensou nisso. — Disse Mia, notando que Max teve um brilho repentino nos olhos.
— Vamos voltar! E vamos explicar a situação pros pais de quem tivermos levado, a partir daí a decisão é deles se vem junto ou não. — Disse o jovem, pontual.
— Mas, mesmo que eles venham junto... Aquelas pessoas vão continuar atrás da gente. — Mia argumentou desesperançosa.
— Eu sei. Mas considerando as circunstâncias, ainda acho melhor termos familiares por perto. Quer dizer, não vai ser legal pros outros "viver um mundo" tão estranho e assustador sozinhos. — Max respondeu com uma expressão pensativa, ao mesmo tempo que entristecido.
— Eu... Eu não tenho nenhuma ideia melhor, então acho que vai ter que ser isso... — A jovem disse chateada, cruzou os braços.
— Falando assim, parece até que não gostou da ideia. — Comentou o moreno com uma expressão sem graça.
— É que não é uma ideia muito viável! Você ouviu? Tem muita gente atrás da gente, não parece... Sei lá... Real... Fora que desse jeito os nossos país vão ter que mudar totalmente de vida, por nossa causa... — Mia começou à se explicar desesperada.
— A gente vai dar um jeito, mas ficar isolados agora é uma opção pior ainda, mesmo porque eu nem sei com o quê a gente tá lidando. Além disso, sobre nossos pais, aposto que mudar de vida não é nada comparado à perder um filho. — Retrucou em um tom firme, o que ao menos aliviou um pouco alguns dos receios de Mia sobre. — Meu Deus, eu tô podre, que cheiro horrível! Eu tenho que tomar um banho! Onde fica o banheiro? — Ele exclamou após sentir o odor sudorífico e gorduroso emanado por sua pele, coberta por sangue seco.
— É aquela porta ali. E toma isso, são as roupas do Alexander, de ontem. — Mia respondeu, jogando levemente um saco preto em sua direção e apontando para uma porta próxima de Haja, que estava sentado em cima do frigobar.
— Valeu... Caramba, ele é grande pra ter onze anos, né? É literalmente um sueco gigante. — Max soltou uma sincera gargalhada.
— Ha! Vou dizer isso a ele. Apesar de que a altura atual de todo mundo aumentou uns vinte centímetros depois do soro. — Mia devolvia o sorriso.
— Deve ser efeito colateral, nada pra se preocupar. Mas olha, eu já vou. Depois a gente discute isso. — Max finalizou se dirigindo ao banheiro, mas foi interrompido por Mia logo antes de entrar.
— Ahh, mais uma coisa, depois de tirar as roupas, bote elas pra fora do banheiro, que eu vou botar pra lavar. —
— Tudo bem... Valeu. — O garoto ensanguentado agradeceu.
Em instantes, Maxwell acabara de entrar, e então botou suas roupas sujas para fora. As quais foram levadas à lavanderia do hotel, rapidamente, por Mia, que em seguida, concomitante ao banho do cicatrizado, passou a explicar o plano para todos, quando a jovem acabou, ninguém discordou do plano, no entanto...
*Hindi* — Não sei... Podiam ter perguntado pra gente antes de decidir, né? — Comentou Kabir um pouco frustrado.
*Francês* — Eu sei que ele salvou a gente, mas tem aquela história das presas e garras... Você tem certeza que é uma boa ideia confiar nele? — Arrazoou Chloé, um pouco receosa.
*Francês* — A Chloé está certa, eu não acho legal ter um "demônio" com a gente. — Disse Alexander em um tom forte.
*Inglês* — Você realmente confia nele, Mia? Ele salvou a gente, mas parece pior que os caras que nos sequestraram. Já fizemos o suficiente trazendo-o até aqui, devíamos seguir por conta. — Harry se manifestou um pouco irritado.
*Inglês* — O Harry tem razão! Vocês três podem ter conseguido fazer tudo aquilo ontem. Mas eu tava com medo na hora. Eu chutaria a bunda de todos eles agora. — Finn afirmou orgulhosamente confiante.
*Japonês* — Aquele moço era tão assustador. Eu achei que ele estivesse lá pra machucar a gente, mas depois ele tirou a gente de lá e até fez um plano pra gente voltar pra casa juntos, então eu acho ele legal agora. Acho a ideia dele boa. — Boquejou Aki um pouco tímido.
*Alemão* — A Evelyn queria dizer que o Max parece a melhor fonte de segurança que podemos pedir, mas também eu não gostei muito da história das presas e garras, e não quero um monstro vindo junto. — Disse Heidi.
*Alemão* — Ei! Não precisava ser tão rude! — Sussurou Evelyn, apenas para Heidi ouvir.
*Africâner* — Mia... Quer mesmo ele aqui? Eu nem sei porque você quis trazer ele depois de saber o que houve. Não lembra das histórias que eu te contei sobre canibais? — Perguntou Jawari, respeitosamente.
*Chinês* — Mia, eu acho que todo mundo aqui te seguiria. Afinal desde que você apareceu, tem sido mais fácil lidar com... Bom, com tudo aquilo. Eu, pessoalmente, acho o plano uma boa opção, mas ninguém aqui conhece aquele cara, e você viu o estado em que ele estava, viu a carnificina que ele~ — Comentou Yan com pesar na voz, porém foi interrompido.
Mia, sobrecarregada com tantas posições e implicações, além de todas as línguas diferentes que colapsavam em seus ouvidos, e se traduziam em seu cérebro, soltou um berro enfurecido:
— CHEGA! — Gritou em sua primeira língua, o português. — Sei que alguns de vocês não confiam nele. O Maxwell apareceu do nada todo ensanguentado e com uma cara de assassino, mas... Ele se esforçou pra tirar a gente daquele lugar... É por causa dele que estamos aqui... — Mia se manifestou alternando entre as línguas, decepcionada com o grupo.
*Chinês* — Mia~ — Disse Yan em uma falha tentativa de acalmar a garota.
*Chinês* — Principalmente você, Yan! Vocês dois lutaram juntos ontem! Tem certeza de que ele é assim tão ruim?! — Mia o interrompeu e fez o questionamento, o que deixou Yan um pouco triste.
*Chinês* — Não é como se eu o visse como um inimigo, quando eu lutei com ele eu pude sentir que ele era um bom homem... Mas eu também senti crueldade nas ações dele, senti uma raiva enorme que não parava de crescer... Por mais que ele seja capaz de dar a vida por nós, eu acredito que ele vá preferir uma matança se ele arranjar um bom motivo. Isso pode ser um problema para todo mundo. — Argumentou o monge, triste e pensativo.
*Chinês* — Yan... Você viu o que acontecia lá, não acha que ele tem motivos pra isso? — Mia questionou após ler as entrelinhas da fala de Yan.
*Chinês* — N~Não é como se fosse esse o caso. Ainda assim ele é um guerreiro, não é certo ceder aos seus impulsos primitivos se você treina para suprimi-los, de tanta... Violência. — Yan disfarçou nervoso.
*Chinês* — Yan, isso é egoísmo e você sabe. — Mia disse.
*Chinês* — Correto. Mas mesmo que eu o queira com a gente, os outros ainda não confiariam nele. — Yan concordou com Mia, mas lembrando à ela de outra questão que ressoava pelo grupo.
*Inglês* — Mia, você ainda não me respondeu. Você confia ou não nele? — Harry interrompeu, ainda irritado.
*Inglês* — Eu não posso dizer que confio nele, mas acho que o Max realmente queira ajudar. — Mia esclareceu de forma calma, observando o menor.
*Inglês* — Então, nesse caso, tente falar com ele. Quando terminar, pode nos dizer se confia ou não. — Sugeriu Yan com um brilho nos olhos.
*Inglês* — Você fala Inglês também?! — Harry indagou surpreso ao entender as palavras que saiam da boca do monge.
*Inglês* — Sim. — Yan respondeu seco.
*Inglês* — Hum! Tudo bem, eu converso com ele, mas que fique claro, quero ele com a gente desde ontem. — Mia, ignorando o assunto adjacente, cruzou os braços, séria, e então deu sua resposta a respeito de Max.
*Inglês* — Como se a gente fosse esperar menos de você. — Comentou o monge, soltando um ínfimo riso.
Assim, Mia traduziu a conversa para quem foi deixado de lado e todos assentiram, depois cada um foi para seu canto tentar se distrair com alguma coisa. Mia e Yan começaram a discutir o país por onde começar, e alguns minutos depois Max saiu do banheiro, ele estava vestido apenas com uma calça branca levemente apertada, e secava o cabelo, todos puderam ver seu corpo coberto por cicatrizes, e todos ficaram assustados, mas ninguém teve coragem de dizer uma palavra.
Max estava com a camisa em sua mão esquerda, mas era possível ver como seu corpo estava, coberto por tantas cicatrizes, que algumas até se mesclavam uma a outra. Suas mãos tinham cicatrizes até nas palmas e na extensão dos dedos, o mesmo vale para os pés, em suas costas haviam algumas marcas de queimaduras e outras claramente de açoites, em seu peito tinha uma grande e larga marca de corte, junto a outras bem menores espalhadas por seu abdômen, se destacando uma que se estendia horizontalmente logo abaixo de seu umbigo.
Também haviam várias cicatrizes nos seus antebraços, onde se notavam marcas de correntes tão tênues que se faziam praticamente invisíveis ante as outras cicatrizes sobrepostas. Apesar de tudo, a maior parte das cicatrizes eram de cortes e perfurações.
Contrastando com suas cicatrizes haviam seus músculos. Com seus ombros brutos, bíceps inchados, tríceps marcados, peitoral fibrado, abdômen trincado, costas impecáveis, trapézios notoriamente desenvoltos, coxas definidas e panturrilhas tonificadas, todos os seus músculos estavam esculpidos como um dos conjuntos escultóricos de Bernini, e hipertrofiados de modo a pouco se distanciar de uma musculatura natural. Apesar de tudo, Maxwell manteve um porte muito parecido com seu antigo, se comparado em equivalência com sua antiga estatura, dezessete centímetros menor.
Ainda assim, seu corpo estava muito diferente do que fora um dia, com exceção de um certo membro não visível, que já se encontrava desenvolvido o suficiente, e de seu rosto, que sempre teve feições fortes, e mais do que nunca, agora sua face estava quase intrinsecamente refinada com a cicatriz que percorria de sua testa, passava por seu olho até próximo do canto da boca.
No final seu corpo era o conceito de um monumento, e suas cicatrizes eram sua história, mas como qualquer obra de arte, o que mais chamava a atenção não passava o que os olhos podiam ver.
Enquanto terminava de desumedecer seu cabelo, o jovem, perdido, pensava no que tinha visto ao se admirar no espelho:
— "Caramba, eu tô realmente inteiro! E sem buracos de balas... É, não posso reclamar, posso?... Só que eu podia jurar que meus olhos estavam brilhando, será que era só coisa da minha cabeça?" —
Ao terminar de se secar, Maxwell colocou a camisa e fitou, com seus originais olhos castanho-escuros, os olhares curiosos que o encaravam temerosamente.
— Que foi gente? — Max indagou, franzindo o cenho.
— Ah~ Nada, é que... Que... E~Essa roupa não ficou meio apertada em você não? Tá tipo babylook. — Mia disfarçou, nervosa e corada com a paisagem, que ao mesmo tempo que assustadora, também era... Animador.
— Bocadinho, mas por enquanto vai servir. — Max admitiu, alongando o tronco junto aos braços de um lado para o outro.
De repente um som estrondoso ecoou pelo quarto, quase como o ronco de um grande homem bêbado, perturbando as noites da própria casa e dos vizinhos.
— Que barulho foi esse? — Mia fitou a barriga do maior, tendo encontrado a origem do som.
— Foi a minha barriga. Já tem um tempinho que eu não como. — Max esclareceu coçando a nuca sem graça.
— Não temos comida no frigobar. Mas tem um restaurante barato aqui perto, se você quiser ir. — Mia sugeriu.
— E vamos pagar como? — Max ponderou.
— Já conseguimos. Tom~ — Mia ofereceu dinheiro à Max, porém foi demasiadamente interrompida.
*Chinês* — Vai com ele! Você não come faz dois dias. — Yan havia se intrometido, e com razão, tendo ciência do que estava acontecendo. *Chinês* — E além disso, vai ser bom pra você saber se ele é confiável ou não. —
*Chinês* — Tudo bem. — Mia assentiu.
— O que ele queria? — Questionou o cicatrizado.
— Falou pra mim ir com você. É que, assim, meio que eu também não como há um tempinho. — Mia respondeu sem jeito, virando o rosto constrangida enquanto escondia as mãos por trás de seu corpo.
— Ele entende português? — Max perguntou arqueando a sobrancelha.
— Não, mas acho que ele entendeu o que tá acontecendo. — Mia apontou fitando de relance o mestiço chinês.
— Saquei. Vamo' então. — Max finalizou e se dirigiu às cortinas que cobriam as janelas, para se despediu com um sinal de que voltaria e então abriu as cortinas e a janela logo depois saiu do quarto, seguido por Mia.
Quando ambos saíram do quarto puderam ver alguns carros passando e outras pessoas caminhando, e ainda o céu azul, profundamente limpo de qualquer nuvem por vários quilômetros. Então sem mais demora, Mia tomou rumo ao restaurante, com Max atrás, incomodado com as pessoas por quem passavam encararem seus braços com uma nítida expressão de pavor.
No entanto, este incômodo não duraria muito tempo.
— Engraçado, não 'tava o maior temporal ontem? — Max arrazoou, começando uma conversa que tiraria a atenção de ambos dos olhares alheios.
— Pois é, no jornal estava dizendo que a tempestade se formou do nada e se dissipou do mesmo jeito, parece que foi alguma anomalia temporal, ou algo assim. — A garota, sem peso, soltou a informação.
— Do nada, é? — O jovem questionou de modo descontraído, apenas por curiosidade.
— Mais ou menos no mesmo horário que a gente fugiu... Falando nisso, você tinha dito que aquilo poderia acabar numa guerra... — A jovem engoliu seco, fitava o rapaz com temor.
— Pior que eu falei isso, mas na real, eu acho que ainda vai demorar um pouco pra chegar nesse ponto. — Max esclareceu em meio a devaneios especulativos.
— Hm? —
— Vamos dizer que consigam provar que foi o México. Ainda vai ser difícil de explicar porque tinha um porta-aviões maior que o USS Gerald R Ford circulando em águas internacionais, em outras palavras, é mais provável que segurem o título de culpado pra encobrir ou resolver o máximo de problemas que puderem, e evitar repercussões e rumores desfavoráveis. Isso, e se a minha teoria dos super-soldados estiver certa, duvido que o soro já esteja pronto. — Max se alongava enquanto explicava, com os braços esticados para o alto.
— O que é esse USS Gerald-sei-lá-o-quê? E que teoria é essa de super-soldados? — Mia, que andava mais a frente, se virou num caminhar inverso e, com atenção direta a Maxwell, questionou.
— USS Gerald R Ford, é de conhecimento internacional que esse é o maior porta-aviões do mundo, além do fato de ser da classe nimitz, ou seja, nuclear. Só que o comissionamento desse navio aconteceu em 2017, essa foi a última notícia que tivemos de um porta-aviões tão grande, ou seja, a existência de um maior já operante é, no mínimo, estranha, não acha? —
— Não sei. Não entendo muito dessas coisas, mas você deve ter razão. — Concordou sem graça por ter entendido tão pouco. — Mas e esse negócio de super-soldados? — A jovem completou com sua outra questão.
— Isso somos nós, no caso somos só cobaias, mas se acertarem o soro, não vai demorar pra algum assassino com força pra fazer o que eu fiz ontem venha atrás da gente. — Max parou a explicação pensativo.
— E o que impede de aparecer algum agora? — Mia o pressionou curiosa.
— Ontem tinha um cara que usou o soro, era um adulto, mas ele tava fraco demais, quer dizer, ei pelo menos, matei sem dificuldade. Então duvido que cheguem a usar o soro pra valer se os efeitos estiverem reduzidos assim. — Respondeu indiferente ao fato de ter tirado a vida de um homem.
— AHN! Bem, talvez o soro funcione melhor em pessoas mais novas. — Mia se espantou com a informação, não era natural ouvir alguém dizer tão casualmente que havia matado outra pessoa, mas logo se recompôs e começou a desenvolver suas próprias teorias.
— O quê? —
— Gente mais nova, sabe, adolescentes, crianças... — Mia explicou novamente gesticulando em círculos.
— Eu entendi, mas como assim? — Max queria compreender o que a fez chegar naquela conclusão, afinal ele sempre desconfiou da faixa etária das vítimas do Gritante.
— Como eu posso explicar... Corpos mais jovens geralmente tem a capacidade de se adaptar melhor do que corpos adultos, então talvez o soro funcione melhor em crianças e adolescentes do que em adultos por causa disso, eu não sei se você reparou, mas~ — Mia esclarecia, dessa vez virada para frente de novo, com foco mais nas palavras.
— Acho que faz sentido, mas esse processo demorou um pouco comigo, tiveram que aplicar o soro várias vezes, várias... — Max a interrompeu contando um pouco de sua experiência, relembrando o que passou, quase deixando um olhar amargo a fitar de repente.
— "Aplicaram o soro só uma vez na gente..." — Mia pensou.
— Esse é o restaurante? É pertinho mesmo. Foi só virar a esquina. — Max riu ao ver uma placa escrito "Jimmy's Food" e algumas pessoas sentadas em mesas postas do lado de fora do local.
— Não é? Vamos então. — Mia, animada, já saiu entrando.
Então os dois entraram no restaurante, que basicamente era uma varanda, cujo o teto de telhas de alumínio e o portão de madeira eram sustentados por uma pequena parede de concreto na faixada, tendo o exterior o complemento de bambus secos apoiados por tábuas até o teto.
E então, escolheram uma mesa atrás da parede, ainda com vista para a rua. Instantaneamente ao se sentarem, uma garçonete os abordou, entregando o cardápio, e sem demora pediram dois pratos de macarrão ao molho de tomate e pimenta biquinho. E finalmente, ignorando todos que encaravam o moreno com medo e desconfiança, continuaram sua conversa.
— Quantas vezes aplicaram o soro em vocês? — Maxwell apoiou o queixo no punho, escorado a mesa.
— Só uma. Vai ver a gente é mais apto do que você, haha! — Mia brincou, tentando descontrair dos olhos sérios e inclementes do rapaz.
— Seria uma ótima teoria. — Max comentou sem perder a seriedade.
— Como assim "seria"? — Mia perguntou fechando a cara.
— Quanto tempo vocês ficaram lá? —
— Quem ficou lá por mais tempo foi o Alexander, por um mês e meio, o resto de nós chegou praticamente junto há um mês. — A garota remoía o gritante com a voz embargada.
— Pois é, eu fiquei lá por três meses, e nesse tempo eles injetaram o soro em mim um monte de vezes, fora que os efeitos começaram a aparecer periodicamente, e ainda precisava de... um certo procedimento... pra aplicar o soro. Em outras palavras, é possível que tenham aplicado um soro diferente em vocês, um feito a partir de mim. — Comentou Max.
— Procedim... Espera! Quando exatamente você chegou no estágio superior?! — Mia quase saltou da cadeira, com um ar de quem tinha acabado de ter uma ideia.
— Eu estava desmaiado quando aconteceu, mas acho que foi ontem. — O moreno afirmou.
— Desmaiado? Isso tem a ver com aquele procedimento que você falou? — Mia perguntou receosa.
— QUE?! — Max exclamou surpreso.
— HAN?! — Mia tremeu, confusa.
— Na~Nasa, digo, nada! Era só uma administração médica... — O jovem desviava os olhos, mesmo com a voz estranhamente tranquila, porém engrossada, disfarçando o clima árido que fora deixado em sua garganta. — Enfim, qual... Qual era a cor do soro que aplicaram em vocês mesmo? — Max de repente apenas mudou o assunto seguindo a conversa.
— Ahh sim, era laranja e estava brilhando. — Mia respondeu se sentando novamente. — "O que foi isso? Ele mudou de assunto de propósito...? Talvez ele não goste falar sobre isso." — Mia pensou.
— "O que foi isso?! Porque eu mudei de assunto tão desesperado?!... Acho melhor não pensar nisso." — Maxwell refletiu. — É, eram soros diferentes. O meu era amarelo. — Afirmou o garoto.
— Então, nesse caso, nosso soro é mais utilizável, porém o seu é mais forte. — Concluiu Mia com uma expressão esclarecida.
— Exatamente. —Max fez uma careta de impressionado ao ouvir a garota.
*Espanhol* — Aqui está o pedido do casal. — Invadiu a garçonete segurando uma bandeja com dois pratos de macarrão e dois copos de suco de laranja.
*Espanhol* — Não somos um casal! Somos... A gente é amigo, né? — Max corou disfarçadamente, direcionando-se à Mia, com a voz amarga.
*Espanhol* — É... Somos amigos. Obrigado, moça. — A jovem também corou, de vergonha, principalmente por não saber dizer se era verdade.
*Espanhol* — Obrigado. — Max agradeceu com um sorriso, e de seu modo, galante.
— E~Então você fala espanhol... — Mia comentou, nervosa.
— E Inglês... E um pouquinho de Latim. — Max se exibiu de maneira quase ameaçadora.
— E~E eu achando que era a única poliglota do grupo... — Mia comentou tentando disfarçar o nervosismo.
— É né! Quem diria que eu e um certo monge saberiam falar outras línguas. — Max gargalhou com uma palma, fazendo com que Mia perdesse a compostura.
— C~Como você sabe que o Yan~ — Mia questionou nervosa e surpresa.
— Fala sério, dava pra ouvir tudo do banheiro, e mesmo que não desse, com a nossa audição dá pra escutar até os cochichos dos vizinhos, pô. — Max a interrompeu com um tom gravemente irriquieto.
— Olha... M~Max não pense mal deles, eles só~ — Mia tentou se explicar atrapalhadamente, mas foi interrompida novamente.
— Tá de boa. — Disse Max.
— O quê? — Mia perguntou surpresa.
— Tá de boa, não me ouviu? — Max questionou tranquilamente.
— Mas você salvou a gente... Não se importa que as pessoas que você salvou não confiem em você? — Mia questionou, arrependida e confusa.
— Se eu me importo não vem ao caso, mas pô, é foda. Cês não me conhecem, viveram um inferno, e quem aparece pra ajudar é um maluco coberto de sangue e vísceras. Até me incomoda, mas não dá pra julgar, né? — Esclareceu Max, desviando o olhar, claramente sentido pela exposta desconfiança e inquietude em relação a si próprio.
— Acho que você tá certo... Mesmo assim, se você não vai se importar com a nossa confiança... Com o que você se importa? — Indagou Mia, ainda desentendida.
— Levar vocês de volta pra casa... É o que eu quero. Já vi criança demais morrendo. — Max a encarou, sério, pesado, triste... E então desviou o olhar áspero.
— Olhando pra você agora, não parece exatamente uma vontade altruísta... Você quer mesmo fazer isso? Ou se sente obrigado? — Mia interrogou, duvidando dos motivos do garoto.
— Honestamente, eu não sei... — Ele fitou o nada.
— Como assim não sabe? —
— Eu não sei te responder... É diferente... Salvar vocês... Foi como um instinto, eu acho. O que eu sei, é que eu não podia, e não posso, deixar vocês perdidos por aí. — Max tentou se explicar.
— Você... Sentiu? — Mia perguntou com uma expressão nostálgica, porém ainda demonstrando lampejos de medo do lado agressivo de Max, que pelo visto não tinha vergonha de se mostrar.
— Isso. — Disse o jovem de maneira natural, logo antes de comer uma garfada do macarrão em seu prato. — "Esse gosto... É tão diferente de sangue... Tão bom... A massa parece que tá derretendo na minha boca, e essa pimenta misturada no azeite... Ressalta o sabor do queijo. Que delícia." — Max pensou quase entrando em êxtase com a textura consistente, mas não menos macia daquele macarrão, derramando lágrimas internas apaixonado pelo sabor.
— E agora? Ainda sente isso? — Mia quis confirmar, ela queria ver o rosto que Max quando respondesse, de forma clara.
— Agora o que eu sinto, é que eu tenho que levar vocês pra casa, custe o que custar. E que eu nunca provei um macarrão tão bom. — Respondeu Max, recuperando a compostura perdida pelo sabor verdadeiro da comida que já não batia seu estômago há meses.
— Entendi... Hm, que bom. — Disse Mia, num tom animado, abaixando a cabeça disfarçando um leve sorriso de felicidade, usando uma garfada de macarrão como disfarce. — "Meu Deus... Que delícia... Isso é tão bom... A massa parece que derrete na boca... E esse azeite, hm, que gostoso!" — Mia pensou com o mesmo sentimento de Maxwell ao provar o macarrão.
— Olha Mia, essa conversa não vai dar em nada. Você não vai passar à confiar em mim em um almoço, e nós temos que nos apressar, se continuarmos aqui, vão nos achar logo. Sugiro que a gente coma, busque a galera no hotel e meta o pé. — Max sugeriu dando mais uma garfada.
— Tá certo... Humm que delícia! — A garota comeu mais um bocado, e não sentiu menos prazer ao se deleitar da comida servida. — Melhor comer antes que o macarrão esfrie. — Concordou garota, seguindo Max no limpar do prato.
Assim ambos comeram a comida e beberam seus sucos, o fizeram com todo o prazer do mundo, como se fosse a melhor comida de suas vidas. Quando acabaram, Mia novamente puxou conversa com Max.
— Ahr, tava uma delícia... Aqui, Max, você disse que eu não cofiaria em você... — Mia arrazoou em um tom manso.
— Sim, tava. E sim, eu disse isso, porque? — Max indagou curioso com a fala de Mia.
— Eu acho que... Você estava errado. Até porque, você também não deveria confiar em mim... Mas acho que somos amigos agora, né? — Mia explicou com interesse.
Ele travou por um momento, mas logo seu peito lhe deu a resposta.
— Claro! Mas é que você também me salvou, não foi? Ninguém lá confiava em mim ou me queria por perto, menos você. Eu não teria acordado naquela cama se não fosse por sua causa, não é? — Max respondeu a olhando com ternura.
— B~Bom... S~Sim... — A morena disse ainda mais constrangida. E logo baixou a cabeça, derrotada pelo sentimento do cicatrizado.
— Por isso. Amigos... Aliás, já que eu falei, você ainda não me explicou o que exatamente aconteceu ontem depois que eu desmaiei... Eu queria saber. — Max mudou de assunto novamente, querendo informações sobre o desfecho da empreitada noturna.
— Ahh, sim, claro. — Mia se ajeitou na cadeira, de maneira a dizer: Senta, que lá vem história.
Então ela começou a contar o que acontecera na noite anterior, e o jovem não poupou atenção...
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Mia
Alcançamos a rua logo após subirmos as pedras entre o mar e a cidade, a chuva se destacava com a iluminação dos postes, cobrindo tudo que não brilhasse a poucos metros, mesmo com uma fina neblina. O incêndio do porta-aviões cintilava a uma caminhada de distância, assim como as janelas das casas mais distantes.
Yan, e Maxwell principalmente, pareciam esgotados. O moreno parrudo mal se aguentava de joelhos. As crianças, ao notarem a quietude do ambiente, abafada pelas gotas se precipitando, se jogaram ao chão no que seus músculos relaxaram, e eu não pude ficar de fora.
— Sua ideia funcionou! — Soltei ao me deitar no confortável e seguro asfalto, rindo de nervosismo, feliz, no entanto não houve reação. — Max? — O fitei ainda deitada, porém não obtive resposta. Foi então que me levantei, notando seu semblante desacordado.
Não poderíamos ficar lá muito tempo, eu sabia, logo decidi tentar acordá-lo.
*Chinês* — Yan! Me ajuda aqui! — Chamei, balançando o corpo do cicatrizado.
O monge deu leves tapinhas no rosto dele, porém, como antes, Maxwell sequer deu sinal de vida.
Num reflexo, me concentrei podendo ouvir seus batimentos, os quais se mostraram normais, o que significava apenas que ele havia desmaiado, provavelmente de cansaço. Mas, sabia que tinha que tirá-lo de lá.
*Chinês* — EI, EI, EI Mia! O que você tá fazendo? — Yan indagou nervoso, me segurou pelo ombro.
*Chinês* — Não podemos deixá-lo aqui. — Confrontei indignada enquanto o erguia até a cintura, queria carregar o Maxwell nos ombros, como nas técnicas dos bombeiros.
*Chinês* — Espera! Mia, não sei se devíamos trazer ele. Quando a gente estava no barco... De repente ele ficou pálido, a cor do cabelo dele mudou, os olhos ficaram vermelhos e... Não sei, ele virou uma criatura selvagem... Perigosa. — Yan me largou, mas manteve o tom preocupado.
*Chinês* — Yan todos nós estamos... "diferentes", talvez seja só uma particularidade dele. — Sugeri, ainda que não tivesse entendido direito o que ouvira.
*Chinês* — Mia, ele DEVOROU pedaços inteiros daqueles homens! — O monge berrou, irritado, abrindo os braços com força.
Foi quando escutamos sirenes se aproximando.
*Chinês* — Eu não ligo! Ele salvou a gente, então ele vem. — Puxei Maxwell para o ombro, ignorando o aviso de Yan.
Maxwell... Depois de tanto tempo acorrentada, encarcerada, maltratada, segurando as pontas o melhor que podia... Sorrindo, mesmo sem esperança, repetindo que ficaria tudo bem, dizendo sem certeza, garantia ou mesmo um vislumbre de uma vida pra viver se tudo aquilo acabasse, me vi colocar uma máscara... Ser alguém que eu não era... Coragem?... Não fazia parte de mim, e do mesmo jeito, foi assim que agi. Aos poucos me sentia estilhaçada, engolindo um medo que não poderia cuspir. Quando o Maxwell apareceu, pela primeira vez em muito tempo eu vi um pilar, forte e sólido, onde poderia me segurar, sem medo de cair... Eu não o deixaria em um lugar qualquer, de modo algum, não depois do que ele fez.
Yan percebeu que eu não desistiria, então tomou Max de meus braços, dava pra entender facilmente que ele apenas queria me aliviar.
Assim, chamei a atenção das crianças. Já deveríamos ter ido embora de lá. Apesar dos claros olhares de desaprovação, todos logo se levantaram e vieram. Todos, menos Pablo, que ficou sentado, e lá encolhido... Tremendo e chorando.
*Espanhol* — Pablo você está bem? Porque está chorando? — Perguntei em um tom manso ao me aproximar.
*Espanhol* — Eu~Eu t~tô com med~do, Mia, Eu quero... Eu quero o pa~papai e a mamãe. — Ele respondeu aos soluços enquanto despejava lágrimas entre o catarro do rosto.
*Espanhol* — Calma, você já vai ver eles, tá? Pode ficar tranquilo, eu prometo que tudo vai ficar bem. — Acariciando seu rosto, de novo eu fiz... Aquele tom de esperança... Sem certeza nenhuma. Mas dessa vez, ao menos, havia uma possibilidade conosco.
Pablo me abraçou num pulo, e se apoiou em meu ombro enquanto fugava o nariz. Eu o peguei no colo e voltei em direção à Yan. Não trocamos nenhuma palavra, pois ele mesmo não sabia como agir, então logo seguimos à cidade e começamos a procurar por um lugar para passar a noite.
Após isso os raios que iluminavam os céus foram se acalmando, juntamente à chuva, que foi estiando paulatinamente. O processo durou longos minutos até a tempestade se desfazer por completo, foi quando encontramos o Hotel Bluebeach, onde resolvemos nos hospedar.
Yan deixou Maxwell comigo, e pegou um dinheiro, sabe-se lá de onde e então, sozinho, pagou a estadia de um dos quartos, para apenas uma noite, enquanto eu e os outros esperávamos escondidos na esquina. Honestamente, ouvi cada palavra durante o check-in, e me surpreendi com o quão bem ele falava espanhol, parecia um nativo.
Após entrar no quarto, Yan abriu a janela, de frente para onde estávamos, e chamou minha atenção para que também nos abrigássemos no quarto.
O cômodo era quadricular, tinha as paredes beges, uma cama de casal simples, com lençóis e travesseiros brancos, um frigobar no canto da parede, ao lado da cama, não muito longe da porta do banheiro, contraria à janela por onde entramos. E por fim, na parede de frente para a cama, a saída do quarto, com um guarda-roupa no canto esquerdo.
Então entramos. Eu fui primeiro e deixei Pablo perto do guarda-roupa, para descer novamente e levar Max para dentro. Só então me apoiei na janela e auxiliei os outros a entrar, um por um, não que precisassem da minha ajuda. Em seguida fechei a janela, e cuidadosamente ocupei a cama com o corpo desacordado de Max, que mesmo dando um belo mergulho continuava repleto de sangue, o suficiente para manchar os lençóis.
Curiosa, observei o homem havia me salvado, chocada com a aparência bela de alguém capaz de tanta violência e brutalidade, quer dizer, não que eu tivesse achado ele bonito... Creio. Mas nesse ato, acabei notando algo cravado em seu pulso, e ao remover, tomei vista de um prego, com escritas em hebraico, de um brilho verde quase místico, "prisão" elas diziam, e vai saber o que significavam, talvez Maxwell soubesse.
*Chinês* — Mia, acho melhor trocarmos de roupa. A gente chama muita atenção, e com roupas iguais piora. — Yan comentou, abrindo a janela novamente.
*Chinês* — Beleza, a gente só não tem dinheiro pra comprar tanta roupa. — Apontei com sarcasmo.
*Chinês* — Em primeiro lugar eu peguei um pouco mais quinhentos dólares de um dos soldados do navio, deveria dar sim, para roupas barata. E em segundo, não vamos comprar nada, vamos roubar. — Ele esclareceu com rigidez.
*Chinês* — R~Roubar! Isso é errado, Yan! — Neguei irritada.
Podíamos fugir de gente ruim, estar com medo, com fome, molhados e surrados, mas roubar? Isso era um mal para alguém que sequer sabia disso, que não tinha culpa... Então por passarmos dificuldade, pisotearíamos outras pessoas para sobreviver? Isso é errado, e não nos tornaria diferentes das pessoas que nos perseguiam.
*Chinês* — Eu sei, mas na nossa situação vamos ter que usar dinheiro só se for NECESSÁRIO. Um lugar para dormir ou algo para comer também, se possível. — Argumentou.
*Chinês* — Mas se fizermos isso não vamos poder chamar a polícia! — Soltei, na busca de algo que o fizesse desistir daquela ideia imunda.
*Chinês* — Polícia?! Caso não se lembre do que aquele soldado barbudo disse, eles tem controle de tudo aqui fora! Estamos por conta própria. — Yan apontava para a própria cabeça, como se dissesse "pensa, Mia!".
*Chinês* — Você realmente acredita nisso? — O encarei com decepção.
*Chinês* — Não acreditei no início, mas depois de ver onde a gente estava... — Ele apoiou a cintura cabisbaixo.
— Droga! Não posso discordar... — Aceitei um fato. — MAS NÃO IMPORTA! Roubar é muito errado, nós não vamos! — Berrei, negando com veracidade. E eu negaria até o fim de minha vida, se necessário...
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Alguns minutos depois
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*Chinês* — Tá de sacanagem! Como foi que acabamos assim?! — Perguntei em voz alta enquanto procurávamos lojas que pudéssemos atacar sem muita dificuldade.
*Chinês* — Acabamos assim porque depois de analisar a situação qualquer um perceberia o que era necessário a ser feito. — Yan respondeu ríspido, me fitando de canto por caminhar na minha frente.
*Chinês* — Tá bom, mas e se pegarem a gente? — Questionei com fraqueza na voz.
*Chinês* — Nesse caso a gente usa o rádio pra falar com o Harry e fugimos, não é como se a polícia fosse nos tratar como civis de qualquer forma. A única coisa que me preocupa é você ter escolhido o Harry pra ficar tomando conta deles ao invés do Alexander ou do Kabir, que são mais velhos. — Yan resmungou.
*Chinês* — Não precisa se preocupar tanto. Eu conheço o Harry desde que ele era um bebê, ele é muito responsável e inteligente, além de ser literalmente um gênio, vai ficar tudo bem. — Eu o acalmei.
*Chinês* — Se você acredita nisso, eu confio em você... Enfim, ao todo encontramos doze lojas até agora. Acho que podemos começar. — Soltou se virando para mim.
E eu concordei. Não que eu fosse discordar se fossem menos, claro.
Yan e eu com um simples salto, pegamos impulso ao telhado de uma casa, na esquina da rua da primeira loja, e Yan começou a explicar seu plano.
*Chinês* — Nós precisamos de um jeito de distraí-los, e eu acho que o seu "flash" é perfeito pra isso. Então vamos fazer assim: Eu entro na loja e escolho as roupas, depois que eu tiver escolhido, eu jogo alguma coisa pra fora de lá usando meus poderes, aproveitando essa ventania, e no que eu fizer isso você usa um dos seus "flashes" na rua pra mantê-los distraídos, ok? — Ele explicou apontando os lugares onde deveríamos estar no ato.
*Chinês* — Tudo bem... Mas eu acho que estou aprendendo a disparar esses "flashes" ainda, e você... A ventania está aqui fora, tem certeza que consegue controlar o vento tão bem assim? — Indaguei desencorajada.
Talvez fosse a falta de vontade de cometer um furto falando mais alto.
*Chinês* — Pode apostar que sim, olha. — Ele afirmou estendendo a mão.
E de repente o vento formou um círculo, antes de se ramificar em duas partes que retornaram ao seu estado normal, foi espantoso como Yan mostrou saber controlar seu poder depois de só um uso.
Entretanto, até mesmo eu, enquanto fingia lançar um "flash" para me preparar, percebi que podia diferir a intensidade com a qual ele viria, e escolhe-la. Talvez pudéssemos aprender mais rápido? Quem sabe.
Minutos depois, Yan entrou na loja e eu esperei o sinal, acho que ele perdeu um pouco o controle já que uma prateleira inteira saiu voando, mas deu tão certo que os funcionários saíram todos sem entender o que tinha acontecido e depois do meu "flash" não teve jeito, todos ficaram um bom tempo tentando descobrir o que estava acontecendo e até chamaram a polícia, mas quando chegou à isso Yan já tinha vazado. Repetimos esse procedimento nas doze lojas que encontramos, e em todas o plano funcionou com êxito.
Retornamos ao hotel e distribuímos as roupas para todos. Yan até pegou alguns salgadinhos das sacolas que ele usou para trazer as roupas. Onde ele arranjou? Havia passamos por uma loja de conveniência na volta, com pilastras cheias de pacotes de cheps ao lado do caixa... Yan na oportunidade, casualmente passou a mão.
Acabou que as crianças comeram... Menos eu. Eu não consegui, a sensação de ter tirado algo de alguém sem o mérito para isso, esmagando o esforço da pessoa para construir aquilo, me fez perder o apetite.
Eu sabia não era diferente para o Yan, mas ele entendia que o dinheiro era um recurso muito escasso, além de, aparentemente, já ter algum tipo de experiência com aquela situação, então ele não se sentia tão culpado quanto eu.
E ainda, para piorar meu discernimento aquela noite, Yan havia conseguido um par de algemas, com o objetivo para prender o Maxwell na cama... Nem me avisou, mas quando o fez, lembrei sobre a história de ele mudar radicalmente de aparência de modo repentino e agir como uma besta irracional que devorava homens.
Buscando uma segunda opinião, expliquei a Harry, também na tentativa de entender o que poderia ser, infelizmente, os outros escutaram, e pior, fizeram um tumulto para expulsá-lo. No fim, percebi o acalmar dos ânimos no quarto quando Yan pôs as algemas, então resolvi deixar.
E para finalizar a noite, fomos tomar banho, um a um, e vestir nossas novas roupas. As antigas deixamos em sacos plásticos. Após isso, não demorou muito para a adrenalina baixar e o sono pesar em nossos olhos, mesmo assim Yan ficou de guarda para o caso de nos encontrarem.
E eu, apenas tentei futilmente desacordar até de manhã... Maldita seja aquela noite...
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Presente
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Narrador
— Pelo menos vocês parecem melhores agora... Ver o céu de novo é bom. — Maxwell comentou, mórbido, com a expressão fechada como uma pedra.
— Bem, acho que sim... — Mia disse trêmula.
— Você está bem? — O garoto perguntou com os olhos bem abertos.
— Sim!... Ou melhor, quase, eu só não gosto muito dessa sensação, sabe? De ter feito algo errado. — Ela desviou o olhar ocultando seu rosto infeliz.
— Os roubos, né?... É uma droga. Normalmente, eu não teria tolerância pra esse tipo de coisa também, mas acho que por enquanto vai ter que ser assim, pelo menos até encontrar um jeito melhor de se virar. — Max soltou com desgosto.
— É... Mas vamos evitar de fazer isso o máximo que der, beleza? — Mia suplicou com pesar, cabisbaixa.
— Tá bem, a gente tenta lavar uns prato da próxima vez. — Max brincou, embora não sentisse o ar da graça.
Já Mia quase não segurou a risada, o que, por acaso, fez Max largar um sorriso, ao ver a expressão da morena subir de bom agouro, encarando de volta sua feição angelical. Porém logo frearam os olhos daquela entrevista, quando a garçonete, novamente, invadiu a mesa com a conta... Ao menos havia saído barato.
Então ambos pagaram e saíram do restaurante, rumando o hotel.
— Sobre aquele prego... — Max comentou na caminhada.
— O que tem ele? — Mia o fitou.
— Eu não posso dar certeza, mas eu acho que ele não te deixa morrer... Só que deve ter algum tipo de condição pra isso, ou sei lá. — O rapaz devaneou sem tirar os olhos da rua.
— Espera, quê? Como assim? — Mia, desentendida, o parou por um momento.
— Mia... Eu tenho uma hipótese... Mas agora, eu não sei se quero falar dela... — Max disse com raiva na voz, mascarada por sua expressão inerte.
— ... Tudo bem... Vamos entrar? — Mia assentiu, um tanto assustada.
Então a morena adentrou o quarto e estendeu a mão para Max.
— Pera ae! Você pode me emprestar aquele rádio? — Perguntou Max, mirando a fumaça do porta-aviões, a alguns quarteirões.
— Sim, mas pra quê? — Mia respondeu, já puxando o rádio da calça e entregando ao rapaz.
— Tem uma coisa que eu preciso ver antes de ir embora. — Ele soltou, pegando o aparelho e começando a andar em direção à praia, onde seguiria até o navio... O Gritante.
<--To be continued...
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O que será que o Max quer ver, hein?
Por favor se notarem erros de gramática/digitação me avisem para mim corrigir.
Espero que tenham gostado. Até mais.
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