12. BIA
Eiii como vocês tão? Eu sumi uns dias, precisava dar um tempo pra relaxar. Mas agora vamos seguir até o final!
Boa leitura, com amor, Rapha <3
Segunda de manhã não começou muito feliz, acordei às cinco horas com um frio de outro planeta, encarangando como dizem os mineiros. Com a minha alma de procrastinadora ao invés de me levantar e fazer algum útil para o mundo, puxei mais uma colcha para me cobrir. Depois disso não consegui voltar a dormir, então, só fiquei assistindo série com meu gato me julgando como sempre.
Próximo das nove, meu telefone começou a tocar incontrolavelmente, me fazendo xingar o meu eu do passado por ter escolhido Shake it off como toque. O número da tela não era conhecido, assim eu preparei meu melhor —pior —humor para atender o telemarketing. Para minha surpresa não era o telemarketing, mas sim um dos escritórios que tinha pegado meu currículo. Aquela ligação foi seguida de mais três, todas com a mesma intenção. Aparentemente, alguém do RH pegou o meu portfólio e leu meu texto no Buzzie, depois disso um falou pro outro e como resultado eu tinha quatro boas ofertas de emprego, com um salário bom e com o mínimo de respeito pelo meu trabalho.
Qual a primeira coisa que você faz quando recebe uma ótima noticia? Você conta para sua mãe, assim eu fiz.
—MÃE!!!!! Você não vai acreditar no que aconteceu! Eu acabei de receber TRÊS ofertas de emprego aqui em São Paulo! Todos com uma ótima proposta! Eu tô tão feliz! —soltei de uma vez, antes dela falar alguma coisa.
—Que ótimo, filha! Eu sempre soube que você era capaz!
—Obrigada, mãe!
—Só espero que você não descarte a oferta de BH logo de cara. Rodrigo fez um grande favor ao conseguir esse trabalho pra você. Seria ótimo ter você pertinho de novo.
Bem assim, não dá pra se espantar. Eu trabalho duro e tudo que a minha mãe quer é que eu volte para BH e, embora ela tente esconder muito mal a intenção, volte a namorar com Rodrigo. Ela não se importa nem um pouco com o que eu quero, com o que eu conquistei, pra ela eu sou apenas uma menina que não sabe nada da vida e que, simplesmente, surtou no fim do ano porque estava chateada por não cumprir as metas do inicio do ano.
Como uma boa biscoiteira que sou, mandei mensagens para Letícia e Lis na esperança de encontrar pessoas que iriam ficar genuinamente felizes por mim. Logo as duas responderam me dando o biscoito que eu queria, Leticia disse que teve um pequeno surto no trabalho. Só de lembrar do meu antigo chefe a ânsia surgiu, se eu tivesse um pouco menos de vergonha, apareceria lá com as minhas propostas de emprego pra jogar na cara dele.
Lis também ficou muito animada por mim e como boa festeira que era, me chamou para mais uma noite de bebedeiras na Augusta. Sim, Lis estava me chamando para a bebedeira em plena segunda-feira, isso era tão fora da minha caixinha que eu nem sabia que as baladas abriam no dia mais odiado da semana. Minha alma de menina tímida do interior não me permitiria tal atitude de jovem sem problemas ou responsabilidades.
Normalmente, iria me manter na minha primeira resposta, nunca o universo me veria numa balada segunda à noite. No entanto, minha mais nova amiga mostrou mais uma vez a ótima lábia e, depois de alguma manipulação, com um drama de que só podia sair nos dias que não fazia lives, ela me convenceu a ir. Acredito que se eu não tivesse concordado, ela teria arrombado a porta do meu apartamento e me levado arrastada. Lis estava pronta pra festas as 10 da manhã de uma segunda feira. Esse era o tipo de pessoa que eu estava me envolvendo. Minha mãe com certeza ficaria horrorizada.
~*~
Para minha surpresa, a Augusta estava muito mais movimentada do que eu imaginava que estaria no inicio da semana. Diferente da última vez, a rua não estava lotada de filas, mas um publico alternativo preenchia as calçadas e os barzinhos, várias pessoas estavam com roupas de escritório e alguns músicos tocavam nas calçadas.
Quando me encontrei com Lis na porta da mesma balada da última vez, percebi que talvez devesse ter me arrumado um pouco melhor. Eu estava com muita preguiça, então ao invés de preparar um look bafônico, peguei meu vestidinho preto de anos, a botinha de verniz de sempre e maquiagem não muito elaborada. Nem capacidade de secar o cabelo eu tive, apenas o deixei secar naturalmente.
Por outro lado, Lis tava mais linda do que nunca, bem maquiada, bem penteada e muito bem vestida, um glow natural vinha dela. Talvez pessoas famosas tenham esse talento. Ela estava usando uma saia preta perfeita e um copped rosa que deixava todas as suas tatuagens a mostra, eram muitas e eu mal reconhecia os desenhos de algumas, talvez porque a maioria era relacionada a games e o meu conhecimento nesse tópico é bem baixo. Às vezes, eu queria fazer uma loucura e virar uma tatuada, mas nunca tive coragem, minha mãe me mataria se eu tatuasse uma pinta, quem diria o braço todo.
—Preparada pra repetir a dose? —ela perguntou apontando para o bar da balada assim que entramos.
—Segunda-Feira Lis, segunda-feira! Hoje eu só posso uma cerveja e refrigerante. —limitei a bebedeira. Na minha idade e com o meu sedentarismo, se eu bebesse muito mais que isso iria ficar de ressaca uma semana, eu tinha aprendido minha lição na última saída com Lis. Definitivamente eu não consigo acompanhar ela no quesito álcool.
Lis não pareceu ignorar o meu pedido, já que pediu ao bartender duas doses de tequila. Ela passou uma pra mim e disse: —Só uma tequila pra gente começar a comemorar!
Eu tomei, obvio que não devia. Minha garganta queimou e assim que eu virei o shot, senti minha cabeça girar e meu estômago querer devolver o presente.
Diferente da outra noite que nós duas estávamos no nosso mundinho particular, Lis estava muito mais sociável e acabou me puxando para sua peregrinação entre os vários grupos que estavam na balada. Primeiro, nós duas ficamos conversando e dançando com algumas drags que tinham elogiado a maquiagem da minha amiga, com razão, já que ela tinha arrasado na produção. Tenho que admitir que, apesar de estar pouco animada no inicio, eu me diverti logo no inicio da noite. A única coisa que passava na minha cabeça era: Eu, Beatriz, estou realmente curtindo uma balada na segunda-feira. Quem te viu, quem te vê!
Eu não tenho nem ideia de como, mas em um ponto da noite Lis e eu terminamos em uma mesa com alguns estagiários que estavam comemorando a entrega de um TCC. Eles já estavam bem bêbados, Lis não estava deixando eles para trás, mas eu continuava apenas com uma cerveja. No meio da bebedeira, uma das garotas da mesa sugeriu que nós jogássemos verdade ou desafio. Meu primeiro instinto foi negar, obvio, nunca joguei na vida, sempre fui a adolescente careta que fugiu toda vez que aparecia uma garrafa no meio de uma rodinha.
—Vamos Bia! Vai ser legal! Você precisa se jogar guria! A gente só vive uma vez! —disse Lis assim que eu abri a minha boca para negar, fazendo com que toda a mesa começasse a falar a mesma coisa.
—Vamos Bia!!! —Se a gente estivesse em qualquer lugar teria chamado atenção, 8 jovens bêbados gritando, mas no meio da balada ninguém ligou. Mesmo assim minhas bochechas ficaram vermelhas de vergonha, no fim eu acabei aceitando a brincadeira.
Em algumas rodadas eu já tinha ouvido coisas sobre eles que nunca ouviria em outra situação. Uma menina loira admitiu ter sonhos eróticos com o chefe deles, um menino que estava com a gravata amarrada na cabeça desde que chegamos, confessou ter pagado o professor para passa-lo em uma matéria e por ai foi.
Depois de algumas rodadas minha vez de responder chegou. A menina de cabelo vermelho e sotaque de carioca me fez a pergunta.
—Por que você terminou com seu último namorado? —falou, mas logo continuou. —Ou namorada?
Ela, sem nem me conhecer, conseguiu fazer a pergunta da qual eu fugia desde Dezembro. Por que eu terminei com o Rodrigo? Era a pergunta de um milhão de dólares para minha mãe. O que aconteceu comigo? Por que eu fugi de tudo? Eu deveria voltar em algum momento?
Mesmo tendo se passado alguns meses, eu ainda penso nisso. Mesmo que eu goste da minha vida de agora, mesmo que eu goste de pensar que eu estou conquistando minhas coisas, eu ainda penso em voltar para minha antiga vida, tudo seria muito mais fácil. Além disso, faria minha mãe mais feliz.
Nós dois já tínhamos tudo planejado, o bairro que íamos morar, quantos filhos íamos ter, onde eles estudariam e quem os levariam para o inglês na segunda e na quarta. Tudo estava pronto, eu tinha uma carreira planejada e, provavelmente, bem sucedida. Mas eu larguei tudo isso e vim tentar um sonho, sem nada na sacola, sem nenhum plano B. Ou dava certo ou eu me afundava pensando que tinha perdido tudo. Na verdade, até poucos dias, eu pensava que tinha perdido tudo e que estava me arrependendo da minha loucura, do meu surto.
Mas naquele momento, minha vida estava tomando forma e meu sonho estava a um passo de se tornar realidade. Eu nunca tinha estado tão confiante, dizer aquela resposta em voz alta era libertador.
—Terminei com ele porque todo mundo achava que eu devia minha vida pra ele.
—Que privilegiada! —disse a menina de cabelo vermelho, ignorando completamente meu momento de revelação. —Eu terminei depois de um belo par de chifres. —completou provocando risadas de todo mundo, até de mim. Eu estava feliz, Lis tinha sido uma pecinha fundamental pra isso. Eu ainda estava em êxtase quando chegou a vez de Lis responder a pergunta do jogo.
—Quem dessa mesa você pegaria? —perguntou o garoto com a gravata na cabeça. Era óbvio que ele tinha uma intenção por trás da pergunta. Desde que nós duas tínhamos chegado na mesa, ele estava olhando de um jeito estranho para Lis.
Lis não ficou muito confortável com a pergunta, eu estava pronta pra intervir e mandar o menino pra onde ele merecia, quando Lis olhou pra mim com uma cara de "não precisa brigar", e olhou para a mesa como se analisasse cada uma das pessoas na mesa.
—Eu ficaria com a ruiva. —concluiu e fez com que o menino ficasse de boca aberta. Bom, ele não esperava essa nem em mil anos, uma puta pensamento preconceituoso. Eu sabia que Lis era lésbica, descobri a sexualidade dela mesmo antes de conhecê-la pessoalmente, já que as pessoas tem uma necessidade de discutir a sexualidade alheia na internet.
O menino começou a resmungar, o bebê chorão pensava que tinha alguma chance com ela. Triste ver expectativas se quebrando bem na sua frente, só que não, já que ele não era um indivíduo que inspirava empatia.
—Não fica chateado, o problema é que você não faz meu tipo! —brincou Lis.
—Não faço seu tipo? Eu sou o tipo de todo mundo! —disse indignado e irritado. —Vamos mudar de ideia?
—Segura essa bolinha meu querido. —eu disse e comecei a puxar Lis dali. —Você não é tudo isso não, você pode até ser bonitinho, mas a personalidade prejudica.
Enquanto nós duas saímos da mesa deles, tenho certeza que ouvi mais um comentário homofóbico e mais alguns machistas, era bem provável que eu voltasse e respondesse, acabando com o clima da noite. Mas resolvi deixar de lado porque Lis não ouviu e eu não queria que ela ficasse chateada por isso.
Tirei esse incomodo da cabeça e segui Lis para o meio da pista. A musica estava animada e ela também, eu nem precisava estar com a mesma quantidade de álcool no sangue para entrar no clima, Lis sempre foi muito contagiante. Nós duas estávamos dançando igual doidas no meio da pista, totalmente descoordenadas. Incrível como nós duas estávamos tão perto e, mesmo assim, não nós batemos, parecíamos loucas dançando em cenas de filmes ruins. Loucas, mas felizes.
Várias músicas passaram e nós duas não saímos do lugar, estávamos dançando bem próximas e conversando aos gritos no ouvido uma da outra. Mesmo depois das doses de tequila, Lis ainda tinha o perfume meio ácido do inicio da noite, misturado é claro com o cheiro de álcool e cigarro da balada. Eu nem estava prestando atenção quando aconteceu. Nós estávamos muito próximas e quando percebi, a boca de Lis estava na minha.
Meus neurônios demoraram um pouco pra fazer a conta, a minha cabeça demorou alguns bons segundos para entender o que estava acontecendo. A Lis, minha amiga famosa, estava me beijando no meio da balada. Eu, que tinha beijado um total de 2 pessoas na vida, estava beijando uma menina. Eu mesma, filha da minha mãe e neta da minha vó, as duas que não tinham nada contra gays, até que eles aparecessem perto delas. Eu estava sendo beijada por uma garota. Beatriz Ribeiro beijou uma menina.
No meio da minha paralisia do Chaves, Lis parou o beijo e em segundos ficou sóbria. Eu não tinha tido tempo nem de pensar como foi o beijo, nem de se quer participar do beijo, só fiquei lá, igual uma estátua com pernas de borracha.
—Bia, me desculpa! Eu não devia ter feito isso, não pensei em você, só agi no impulso. —ela gritou para que eu pudesse ouvi-la, mas eu ainda não estava em órbita.
—Errr... eu... tá tudo bem Lis. Não precisa se preocupar com isso. —Foi o que meu tico e teco conseguiu montar. Tudo que eu queria era fugir dali, mas minhas pernas ainda não lembravam como fazer o trabalho delas. Queria fazer o que eu sempre faço, me esconder debaixo do meu edredom até esquecer o acontecido. —Mas eu acho que a gente precisa ir embora. —completei.
Todo nosso clima foi pro ralo, eu não tinha nem papo com ela. Lis tentava puxar alguns assuntos, mas quando eu via já tinha dado uma resposta curta e sem pensar. Por isso eu agradeci quando coloquei meus pés dentro do vagão que me levaria para casa e a figura de Lis ficou para trás na estação.
~*~
No meu habitat natural, pijaminha, cabelo pra cima e debaixo de camadas de edredom, eu não consegui dormir. Depois de muito rolar pela cama eu desisti de dormir, o beijo de Lis não saia da minha cabeça. Primeiro porque eu nunca tinha beijado uma garota, segundo, que eu não tinha odiado o beijo, demorei pra admitir essa parte, e por último, a garota que beijei era a Lis.
Desde o primeiro dia Lis tinha sido boa comigo, tinha sido uma boa amiga, se preocupava comigo. Eu nunca tive atração por nenhuma menina, mas desde a noite que ela largou tudo pra ficar comigo no veterinário, eu estava pensando nela de uma forma diferente. Doeu em mim admitir isso, admitir que eu tinha gostado de beijar uma menina e que talvez eu tivesse algum sentimento por ela.
Na minha cabeça nada fazia sentido, todos os acontecimentos estavam pedindo demais dos meus neurônios. Pensar não estava funcionando nem um pouco, então eu fiz o melhor que podia fazer: implorar para a Letícia que ela me desse um pontinho de luz. Talvez ela conseguisse me explicar o que estava acontecendo comigo.
Enviei uma mensagem com a bomba, mas não foi lida, com motivos é claro, o relógio marcava quatro da manhã. Ela estava no décimo quinto sono e só iria visualizar minhas mensagens desesperadas em algumas horas. Dormir também não era uma opção, então eu peguei o notebook e digitei bissexualidade no Google.
Tão vivos? Esse casal é real? O beijo na boca veio, Brasillllll!!!!!!!!!!
Eu enrolei, mas vim com a bomba.
Os comentários de vocês me ajudam demais a continuar postando, então por favor, me conte tudo que acharam, todos os comentários são de grande ajuda. Também me dá uma estrelinha, em nome desse beijo!
Até o próximo capitulo!
Com carinho, Rapha!
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