Black and Red
Os rastros de energia – resíduos de auras anexados nas correntes de ar – o direcionavam a diferentes localidades, sem designá-lo a um único lugar. Por não ter grande afinidade com magia, sendo que nunca fora sua especialidade – ao contrário de suas parceiras que possuíam mais experiência nesse departamento –, o feitiço que utilizava provou-se ineficaz diante de sua incapacidade em conjurá-lo com maestria conforme Eryna lhe instruíra em outra época. Ainda assim, conseguia distinguir precisamente a presença de Diva em meio a diversidade de auras fragmentadas misturando-se e dissolvendo-se pela refrescante brisa que o recepcionou.
Geralmente havia uma quantidade razoável de civis perambulando pelas ruas, um fluxo imparável de seres humanos, e que sua aterrissagem seria motivo de susto independente de onde, mas não tinha muitas pessoas e estavam tão absorvidas em preocupações mundanas que nem repararam na criatura demoníaca os sobrevoando. Com tantas notícias pessimistas e tragédias sucessivas, os humanos aparentavam estar a ponto de quebrarem.
A constante ameaça de guerra, as mortes e tudo decorrente a isso, tornava as cidades um foco bem notório de depressão – a própria atmosfera carregava uma pressão difícil de tragar. O infame sentimento cujo sabor azedo experimentara e que, até nos dias atuais, não digeriu. Retornando a sua forma humana, trafegou pelas ruas com discrição, observando cada estabelecimento e quem passava por ele portando algo familiar. A frustração rastejou furiosamente pelo seu corpo tenso, correndo contra o relógio, concentrou-se para rastrear o pouco que sobrou da sua bússola energética, eliminando da sua linha de captação outras irrelevantes – embora pudesse se guiar pelo seu irmão também, porém conformou-se unicamente com Diva.
Correu ao sentir a essência que tanto procurava dentre tantas e a perseguiu, parando em uma casa comum, bonita em sua fachada inglesa e sua coloração clara e bem cuidada. Viu a porta abrir e uma jovem sair com feições perdidas e assim que o olhar de ambos se cruzou, seu rosto iluminou-se em um largo sorriso e amigável.
– Vergil! Vergil! – gritou agitando as mãos para chamar sua atenção.
Dante franziu o cenho com a evidência de que estava indo no caminho certo.
Acenou de volta, pensando em encenar para agir conforme seu irmão, o que seria trabalhoso por seu gêmeo ser sua dicotomia na questão de personalidade.
Para começar... Vergil nunca faria tal gesto para chamar alguém, então não foi um bom primeiro passo.
A garota animadamente encurtou a distância que os separava, ofegante pela corrida.
– Caramba! Achei que tinham ido embora para sempre! Podiam ter esperado um pouco mais... A Diva não se recuperou totalmente e... Cadê ela? – olhou atrás do mestiço para ver se Diva não estava escondida ou bloqueada por aquele homem tão corpulento.
– Diva está ferida? – perguntou abandonando logo o disfarce, a seriedade estampada em seu semblante, fazendo a jovem recuar com a mudança de clima e tom de conversa.
– Você não é o Vergil...? – questionou incerta, contudo, não sentiu nenhum tipo de perigo irradiando dele. Quase como se seus instintos mais primitivos lhe avisassem que esse homem era de confiança.
– Não, sou o irmão dele, Dante.
– Oh! – sua boca se abriu num o de espanto. – Você é o ex da Diva!
Ex? Oficialmente não sabia definir a relação dos dois, mas essa expressão não empregaria para isso.
– Que coincidência. Olha – respirou fundo, tão frustrada quanto o meio-demônio. – Se tivesse chegado mais cedo, talvez os pegasse antes de irem... Eles provavelmente estão com o propósito de chegar na Organização Ifrit... Bem, eu não sei muito... – exclamou com visível consternação.
– Obrigado. – adiantou-se, preparando-se para partir.
– Espere! – berrou, parando Dante em seu quase voo. – Não é muito da minha conta e não conheço bem a história, mas... Diva ainda gosta de você.
O mestiço fitou a menina surpreso, não evitando o sorriso.
– Eu sei, por isso preciso achá-la.
– Diga que a Lucrécia mandou um beijo pra ela! – pediu, acenando.
Seria uma longa busca, no fim, valeria cada minuto.
Dante pisou firme ao entrar na lanchonete, sua entrada atraindo atenção dos poucos clientes presentes que o moravam com curiosidade típica. Acomodou-se em uma das cadeiras próximas ao balcão na qual o atendente veio prontamente atendê-lo com a simpatia que espera-se de funcionários treinados, segurando um bloco de notas e a caneta a postos para anotar o pedido. Sem mais delongas, com um pouco mais de pressa que o habitual para estas ocasiões, pronunciou em bom som para que não houvesse dúvidas:
– Quero um sundae de morango, parceiro. – o rapaz que claramente tinha menos idade, arqueou ligeiramente a sobrancelha, intrigado com o que lhe fora ordenado. Para maior parte das pessoas que defrontava quanto ao seu gosto peculiar e diferenciado para um homem de meia idade, aquilo certamente era estranho de início. – Algo errado?
– Não! – respondeu com um rubor tingindo suas bochechas cheias de sardas. – Vou trazer seu sundae, senhor.
O meio-demônio observou de soslaio a movimentação do recinto, fixando-se no casal da mesa do canto que dividiam um refrigerante. Eles exalavam pura e genuína felicidade de poderem desfrutar da companhia um do outro, algo que transformou-se em um artigo de luxo devido aos acontecimentos e a taxa exponencialmente alta de homicídios causados por Espectros – o que atribuíam também aos demônios.
Seu sundae não demorou tanto quanto pensou, o que lhe economizou um bom tempo: deu uma colherada na sobremesa quando ouviu uma batida na superfície polida da mesa – a mesma na qual o casal encontrava-se. Continuou degustando o doce, tentando ignorar as vozes que enchia o ambiente, fazendo o possível para deleitar-se completamente da saborosa aquisição. Não tinha razões lógicas para atentar-se a uma discussão de dois estranhos, embora fosse curioso a mudança de clima entre os dois. Depois de poucos minutos, a mulher levantou-se e saiu bufando com lágrimas molhando-lhe a face. O acompanhante permaneceu lá, imóvel como uma estátua, não aparentando estar abalado com a acalorada briga.
– Tsc. – crispou os lábios irritadiço com sua contrariedade de opinião, desacordando consigo mesmo. Sem nenhuma cerimônia, sentou-se no banco frente ao rapaz. – Não nos conhecemos, mas um conselho de alguém mais velho e experiente: vai falar com ela. Não perca essa chance, porque pode acabar se arrependendo.
Não querendo estender o diálogo, pagou pelo sundae e seguiu viagem.
– Quem diria... Dando conselhos amorosos – gracejou, rindo. – Talvez eu devesse seguir mais isso.
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