Texto 7
O Conservatório
Passar por esses grandes muros sempre me arrepia, não importa quantas vezes eu já tenha passado por eles, toda vez me estremeço. Talvez seja porque essas grandes barreiras de concreto são as únicas coisas que nos separam das aberrações que habitam a nossa terra.
Não foi apenas uma doença, aquilo foi o inicio do fim da raça humana. Mas só hoje vemos que poderíamos ter mudado rumo da nossa história. E como se já não bastasse o contagio, as mortes, e todo o nosso medo, as mutações chegaram. E isso foi o que mudou de vez o nosso mundo.
A pior parte do meu serviço não é apenas sair buscar suprimentos. Mas sim ser responsável pelo meu esquadrão, pois a morte deles pode ser culpa das minhas ações.
Eu não poderia querer uma equipe melhor, mas hoje é diferente, além de Herick, Alessandra e Dominic, tenho um aprendiz.
Mas uma coisa me preocupa hoje, além do garoto. Ouvi alguns boatos. Quase nunca são verdadeiros, mas dessa vez algo está me incomodando.
— Ei Arthur, se quiser sobreviver lá fora, siga as minhas instruções, e então eu vou te trazer de volta vivo – falo em tom sombrio
—Sim, Capitão Halter – o jovem se dirige a mim com um olhar espantado
Respiro fundo, acho que ele entendeu o recado, ser duro é necessário pois é só assim que sobrevivemos quando se está lá fora.
As luzes da garagem mudam seu tom de amarelo para vermelho, e então o portão começa a subir, o motor ruge e Herick engata a primeira, acelerando o veículo, que sai em alta velocidade, sacudindo e se estremecendo.
— Mais um dia no inferno capitão – Alessandra grita em meio ao grande barulho, e apenas para me provocar
— Diz ai, qual é nossa missão hoje. Pelo visto vai ser bem tranquilo, pra trazer o novato junto – Dominic me questiona.
— Eu não o trouxe, o general Allen que o designou para vir junto. Ele não estava pronto para sair, mas as ordens são essas. – Tento minimizar minha raiva para continuar a falar
— Aqueles desgraçados querem algumas partes do telescópio no morro, além de fazer uma varredura pela área. Estão inventando histórias de novo, dizendo que tem um destroçador na área
O clima se fecha dentro do carro, e todos me olham atentamente sem falar nada. Inclusive Arthur, com um olhar de espanto.
É estranho que o tenham mandado em uma missão dessas. O Simples nome de um destroçador já é o bastante para fazer os melhores soldado se tremerem todo. E mesmo que seja apenas uma suspeita, não tira o perigo de uma incursão como essa.
Fecho os olhos, não para dormir, mas para meditar. A viagem será longa, e pensamentos aleatórios apenas consomem muita energia.
Algumas horas se passam, e meu smartwatch no pulso apita. Significa que estamos chegando.
— Herick, qual a situação da viagem? – Pergunto quase gritando, para que ele possa escutar, e para acordar aqueles que dormiram
—Chegaremos em dentro de alguns minutos capitão – Ele grita de volta como os olhos na estrada.
— Como vocês conseguem dormir com todo esse barulho – Arthur me questiona
— Eu não dormi seu idiota, só estava meditando, mas talvez alguém tenha dormido - Digo olhando de soslaio para Dominic.
— E quanto as aberrações lá fora? Não atrai nenhum deles? – Arthur continua a me perguntar
—Não garoto, o barulho muito alto espanta alguns deles, por isso modificamos o motor, para parecer uma besta gigante indo em direção a eles. Porem nem tudo são flores. Alguns deles não tem esse medo. Aliás, se prepare, já chegamos.
Começo a arrumar meus equipamentos e meu fuzil, além de verificar a minha munição.
O grande carro para, e as portas são destrancadas, mas antes de descer olho para o garoto e lhe entrego uma pistola automática, e uma faca
— Arthur, guarde isso como sua vida. Além de que se você as perder eu mesmo te mato, pois é meu equipamento – falo esperando que ele se equipe.
A vista é linda daqui, todas as estradas, e cidades destruídas, e as grandes florestas que se estendem agora sem a ação humana.
—Dominic, Alessandra, Herick, contatem a base que chegamos, depois disso entrem no observatório pegar as peças, eu e o garoto vamos subir na torre ligar o rastreador para descobrir se tem alguma coisa viva aqui por perto – Os três assentem e começam o trabalho indo de um lado para o outro.
— Vamos, precisaremos andar um pouco ate chegar na nossa antena – digo me sem olhar para o Arthur.
Apenas ajeito meu rifle ao corpo e começo a caminhar rumo a torre.
— Cara, aqui é lindo. Eu nunca imaginei que seria tão bonito assim
— Realmente, tenho que concordar com você, aqui é perigoso, mas é muito diferente daqueles prédios cinzas imundos do Conservatório.
—Você se lembra de como era aqui antes da pandemia?
—Sim, me lembro, eu cheguei a visitar esse lugar algumas vezes. Mas posso dizer que está mais bonito agora. O desmatamento era muito severo com a natureza. A poluição era sufocante.
—E com era a vida antes? – ele continua a me perguntar quase já quase me irritando. Respiro fundo, mas continuo a explicar.
'— Era diferente. Nossa sociedade também era dividida, mas não nos moldes de hoje. Ninguém era obrigado a servir aqueles ratos nojentos que vivem na cúpula do conservatório. Embora precisássemos trabalho ainda para sobreviver e bancar o luxo de alguns poucos. Mas era bem melhor a vida nesse quesito. – Quase viajo lembrando da vida que tínhamos no passado.
— Chegamos – Falo indicando a grande torre a nossa frente
— Só precisamos subir, fazer um rastreio e levar de volta. Não tem segredo. – Explico para o rapaz, abrindo a velha porta e começando a subir os degraus.
— Este trabalho é simples. O difícil é voltar vivo para casa – Digo olhando para ele com um sorriso amarelo. Paro por um momento a subida, com uma dúvida, que acabara de se formar em minha mente.
— Ei, o que você aprontou para o general te mandar aqui nessa missão – perguntou voltando me dirigir para o topo.
—Bom, eu estava me envolvendo com uma garota da cúpula. Acho que isso chegou aos ouvidos dele – O rapaz fala sem graça
Deixo escapar um pequeno riso, mas volto a me concentrar nos últimos degraus, pois tinham musgo.
Vejo o velho aparelho de rastreio no meio da pequena sala, perto do corrimão da escada. Habilidosamente ligo o apetrecho que funciona com energia solar, e teclo a função de rastreio, além de colocar o armazenador de dados. Em alguns segundos o pequeno monitor exibe a leitura. Porem meu olhar casual se congela na tela. E minhas mãos soam. E então lutando para manter a voz firme, eu pergunto a Arthur.
— Quem era a garota? – falo ainda encarando a tela
— Tália – Ele fala sem entender
Minhas mãos tremem, e então olho para o rapaz, também sem jeito.
— Nos fomos mandados para a morte meu amigo. Acho que você não sabe, mas Tália é a filha do general
—Você quer dizer então que aqui tem...
— Não um, mas três destroçadores. Você foi mandado para nunca mais voltar para o Conservatório. E todos nós vamos ser sacrificados juntos. E pensar que passamos por uma grande doença para pessoas como Allen desperdiçar vidas por motivos tão banais como esse – Ainda penso no que acabara de ouvir.
Arthur me olha com um olhar perdido, e lagrimas começam a brotar em seu rosto. Quero fazer o mesmo que ele, porem eu tenho um dever ainda.
—Ei, me escuta. Eu vou nos levar de volta, você e a minha equipe. Vai ser difícil. Mas eu prometi que iria te levar de volta. – Olho em seus olhos e vejo, mesmo que pequena, uma fagulha de esperança, e então também me agarro a ela.
Me levanto, e agarro meu fuzil, e começo a descer as escadas, provavelmente rumo a missão mais difícil que já tive.
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