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Perto do centro, distante de mim

Desde que nasci, vivi na periferia da maior cidade do meu país, um território pelo qual nutri amor e ódio ao longo do tempo. Por um lado, nutri amor pelo fato de meu bairro carregar uma linda história de conquista dos primeiros moradores e carregar, também, diversos símbolos e significados. Por outro lado, ódio pelo fato de essa mesma história ser carregada das desigualdades que uma grande cidade encarna.  Infelizmente, filha, a vida é assim. Alguns nascem confortáveis, outros nascem adaptáveis. Nós somos do segundo grupo. Cresci ouvindo frases sobre quem eu era em oposição às outras pessoas que moravam em bairros mais favorecidos.

Minha mãe sempre me ajudou a ressignificar, ou melhor, a me adaptar às diferentes situações que a vida me colocava. Herdei dela, portanto, um otimismo para encarar desafios dos mais diversos e, às vezes, esse mesmo otimismo fugia do limite e meu pai me trazia para a realidade, revelando-me que a vida era, sim, difícil e que por vezes eu teria de aceitar isso ou lutar para me mudar daquele bairro. Por conta de tudo isso, apesar do afeto que nutri pelo meu território, decidi aos 25 anos me mudar para outra propriedade mais próxima do centro da cidade. Gostaria de pelo menos experimentar morar em um lugar que não fosse distante de tudo e de todos, como era a minha casa na periferia. 

Contudo, desde que me inscrevi para concorrer à vaga para morar em um novo lugar mais perto do centro, os eventos e mudanças começaram a acontecer numa velocidade que eu não consegui acompanhar. Primeiro, recebi uma carta anunciando que eu estava dentro dos quesitos para ser condômina daquela propriedade privada. Depois, fui convidada para uma entrevista coletiva. Após isso, comecei a vivenciar um pesadelo. Comecei a provar a distância do meu território junto à distância do meu próprio ser. Eu realmente não sei como as coisas tomaram tal proporção. 

De um dia para o outro, eu estava em um quarto branco e amarrada a uma cama que me obrigava a olhar para um teto que, curiosamente, tinha um espelho, o que me fazia encarar o meu reflexo mesmo contra minha vontade. Por que ninguém me avisou que o processo de mudança era assim? Quanto tempo isso iria demorar? Enfim, como sempre prezei por manter o mínimo de otimismo, lutei contra mim mesma para pensar que aquilo poderia ser apenas um teste de resistência ou, talvez, uma preparação para possíveis imprevistos que poderiam ser vividos na nova propriedade. 

Nessa situação em que me encontrava, presa à cama, ouvi os passos de alguém se aproximando, mas como a cama estava localizada no centro do quarto e de costas para a porta, não consegui visualizar quem entrara no cômodo. Eu tinha apenas uma perspectiva da pessoa e, olhando para o espelho que estava no teto do quarto, notei que era um homem de cabelo raspado e roupas brancas. 

— Quem é você? — perguntou-me o desconhecido.

— Olá! Você pode me soltar? Eu sou um pouco claustrofóbica — respondi rindo, mas deixando claro o meu incômodo.

— Quem é você? — repetiu. 

— Bom, meu nome é Joana. 

— Resposta errada.

— Como assim? Por acaso esse teste me dá um nome fictício?

O desconhecido não me dirigiu nenhuma resposta, apenas buscou no bolso direito de sua calça algum objeto. Encontrou, assim, uma tesoura e, inesperadamente, cortou mais da metade do meu longo e cacheado cabelo. Essa ação me deu algumas palpitações e consumiu todas as minhas expectativas de ser apenas um teste para os novos condôminos. Que teste seria esse que permitia alguém violar o meu corpo? Senti-me completamente ameaçada e insegura. Não consegui nem ao menos protestar com o meu corpo, pois permanecia presa.

— O que é isso? Como assim "resposta errada"? — Apesar do meu tom alterado, mais uma vez fiquei sem resposta e a pessoa saiu do quarto. Dessa forma, não consegui mais guardar o meu otimismo e fiquei paralisada não apenas fisicamente. Assim, com o cabelo cortado, olhei-me no espelho acima de mim sem saber o que estava acontecendo e sem saber quem era o sujeito que tinha feito aquilo. A limitação na qual eu me encontrava me fez tentar movimentos bruscos para sair daquela cama extremamente desconfortável e desistir da minha vaga para morar na nova propriedade. A essa altura, eu já estava convencida de que preferia minha casinha simples e o meu bairro simples. A minha proposta era mudar de bairro, mas estavam mudando a mim. Isso era loucura! 

Mal terminei de digerir a situação, ouvi novos passos vindo em minha direção. Mesmo com os movimentos limitados, percebi pelo espelho no teto do quarto que não era o mesmo rapaz, uma vez que a pele deste era mais clara. Todavia, o cabelo curto e a roupa branca me permitiram deduzir que se tratavam de pessoas de uma mesma equipe ou grupo. Este rapaz que entrara agora carregava consigo uma mala, o que intensificou ainda mais a minha preocupação. 

— Não desejo mais a vaga para a propriedade. Pode me dispensar desse teste? Não estou me sentindo confortável — enunciei dirigindo-me ao rapaz antes mesmo de entender o seu objetivo com aquela mala. 

— Quem é você?

— Meu nome é Joana, tenho 25 anos e quero sair desse lugar imediatamente! — respondi dando uma resposta mais completa dessa vez, já que a anterior não tinha sido suficiente. 

— Resposta errada — respondeu o rapaz abrindo a mala e pegando uma tintura de cabelo. Sem exprimir nenhuma palavra ou explicar tal ação, o rapaz despejou um pote de tinta capilar sobre a minha cabeça. Nenhum grito meu ou o debater do meu corpo foi suficiente para que o rapaz interrompesse sua ação. Encarei-me no espelho e vi o meu cabelo tornando-se preto. Com essa nova imagem de mim mesma, vi-me interiormente fazendo a mesma pergunta que antes ouvira. Joana, quem é você?

— Você não tem o direito de fazer isso comigo! — gritei aterrorizada enquanto o rapaz continuava manipulando o meu cabelo agora curto e de outra cor. Entretanto, mesmo com o meu espanto exposto, fiquei mais uma vez sem resposta, assistindo pelo espelho do teto o indivíduo sair do quarto com a sua mala. Percebi, então, que a minha respiração estava ofegante, mas nenhum esforço fora suficiente para eu conseguir me desamarrar da cama. O único movimento possível era o virar de minha cabeça para a direita e para a esquerda. 

Ora, a esse ponto eu já não conseguia cogitar nenhuma possibilidade do que estava acontecendo. Como o processo de sair de uma parte da cidade para a outra poderia ser tão cruel? Senti algumas lágrimas de desespero escorrendo em meu rosto e o fato de não conseguir limpá-las fez com que o choro se intensificasse. Fiquei cerca de cinco minutos nesse estado de pânico e choro descontrolado, sem ninguém para me ouvir ou me responder, apenas me olhando no espelho do teto e duvidando de minha própria identidade.

Mais uma vez alguém entrou no quarto. Dessa vez, pude identificar pela fisionomia que era uma mulher. Tinha o cabelo curto como o dos demais. 

— Quem é você? — questionou-me. 

— Eu estou cansada. Tire-me desse lugar! Eu não quero participar disso. Por favor, se for alguma brincadeira, pare! Isso não tem nenhuma graça e eu não aceito essa violação com o meu corpo.

— Quem é você? — A essa altura, essa pergunta já me causava arrepios e eu simplesmente não respondi a ela, seja por talvez não mais saber a resposta, seja por uma raiva que consumia o meu corpo inteiro. Entretanto, a mulher insistia: — Responda-me! Quem é você? 

— Inferno! Eu já respondi! Meu nome é Joana, tenho 25 anos, moro na periferia da cidade, sou filha única e gosto de plantas. O que mais vocês querem saber? Tirem-me da merda desse quarto! — Foi a resposta que saiu da minha boca, sem mais otimismo, sem mais gentileza. 

— Resposta errada — retrucou a mulher retirando de seu bolso um objeto cortante. 

Nesse momento, entrou o primeiro rapaz que me abordara inicialmente. Ele se aproximou de mim e segurou a minha cabeça, de modo a estabilizá-la. Com isso, eu não hesitei em usar todas as minhas forças restantes para tentar sair da cama. Forcei os meus braços para tentar me desamarrar, agitei as minhas pernas rapidamente e gritei desesperadamente repetindo a mesma frase mais de cinco vezes: 

— Tirem-me dessa cama!

Percebendo a agitação do meu corpo, a mulher desistiu do objeto cortante e buscou em seu bolso outro objeto. Então, retirou um pedaço de pano preto e com ele vendou os meus olhos. Não havia nada que eu pudesse fazer. Agora, além de amarrada a uma cama, eu não conseguia nem ao menos me enxergar no espelho ou encarar as pessoas que se aproximavam do meu corpo. Com a minha imagem alterada e de vendas nos olhos, não havia mais para onde recorrer para eu me lembrar de quem eu era. Eu não era mais a Joana dos cabelos longos. Eu não estava mais no bairro onde nasci. Eu não tinha mais os cachos castanhos claros que me caracterizavam. Eu não me via mais. 

Com esse terrível desastre após a minha tentativa de escape, senti o meu espírito completamente perturbado, a ponto de eu não conseguir colocar ordem em nenhum de meus movimentos ou pensamentos. Entretanto, mesmo com essas limitações, ouvi a terceira pessoa entrando no quarto e se aproximando de mim. Pelo que eu consegui sentir, estavam os três ao meu redor e, para o meu mais terrível assombramento, perguntaram todos juntos:

— Quem é você?

— Eu não sei! — respondi ensandecida. 

— Resposta errada. Quem é você? — Insistiram. 

— Eu sou só uma jovem procurando um lugar melhor para morar. É isso que vocês querem que eu responda? — gritei. 

— Resposta errada. Quem é você? 

Nesse instante, eu tentei recuperar aos poucos o fôlego por perceber que minhas respostas carregadas de amargura não estavam me ajudando. Apesar de ainda sentir meu espírito provando da pior angústia dessa vida, eu pausei os meus movimentos para tentar achar alguma resposta ou, então, render-me ao que aquelas pessoas desejavam de mim, por mais que eu não tivesse ideia do que elas, de fato, desejavam. Respirei fundo e respondi:

— Eu sou o que vocês quiserem. 

— Resposta razoável. Podem soltá-la — respondeu a mulher. 

Junto ao susto, senti alguém desamarrando as minhas pernas e o meu tronco da cama. Gradualmente, soltaram também os meus braços, porém não retiraram a venda. Uma das pessoas me levantou aos poucos da cama e começou a me guiar para algum outro lugar. Com isso, percebi que estavam me levando para fora do quarto ao sentir um vento fresco em meu rosto. Ainda, auxiliaram-me a subir algumas escadas e, por fim, ergueram-me até um ambiente superior. 

Finalmente, tiraram-me a venda dos olhos. 

— Bem-vinda à sua nova casa. Aqui nenhum condômino está vulnerável às doenças, pandemias ou perigos desse mundo — disse-me a mulher.  

Vendo-me livre das amarras que estavam pelo meu corpo e com a vista desimpedida, olhei para um condomínio separado por cabines, todas elas idênticas. Uma placa grande na entrada me chamou a atenção, estava grafado "Casulo, o lugar onde sua liberdade é prezada a todo custo". Fiz essa leitura ainda sentindo dores em meus pulsos e tornozelos pelo fato de há alguns minutos estar amarrada em uma cama. Tudo me parecia contraditório. Eu estava, finalmente, no meu novo lar, com novos vizinhos. Entrei na minha cabine e me deitei. 

Estando à mercê de um grupo que rejeitou todas as minhas autodefinições e que iriam, provavelmente, determinar a minha identidade a partir daquele dia, eu olhei pela pequena janela de minha cabine e vi outras ao horizonte. Notava como os meus novos vizinhos eram estranhamente semelhantes, todos com cabelos pretos e curtos. Teriam todos passado por aquela tortura? Sem encontrar respostas, fechei os olhos e apenas pensei: quero voltar para a minha periferia, quero voltar para quem eu sou. Relembrava meu passado no meu antigo bairro. Naquele meu bairro, éramos vulneráveis a muitas coisas, mas éramos nós. Naquele meu bairro, as casas e pessoas eram distintas uma das outras. Todavia, esgotada daquele dia e de pensar, adormeci longe do meu antigo bairro e ainda mais distante de mim.

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