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O bosque da borboleta azul

Estou internada e um mês já se passou. Da janela do quarto, vejo um colorido jardim. Davi e os meus pais, apesar da distância, me visitam todos os dias. Da Fazenda Jatobá até o centro da cidade são 111 km. Meu quarto é coletivo e não é permitido acompanhante, porém não me sinto sozinha. As minhas colegas de quarto são bem-humoradas e gostam de ler. Temos muitos livros, dos mais variados gêneros e temas. Fizemos um clube de leitura, "Garotas Pacientes", e espero que sobreviva além da nossa estadia. 

O sol está se pondo, e recebo a notícia de que serei liberada amanhã. A minha rápida recuperação surpreendeu a todos. Não me lembro do que aconteceu, mas sei que foi grave. O médico e a psicóloga me aconselharam a não pressionar a minha mente. Na opinião deles, a memória virá aos poucos. Tenho insônia e, quando pego no sono, imagens confusas se misturam e brincam comigo. 

Na saída do hospital, uma borboleta azul passa por mim. Não é a primeira vez que isso acontece. Uma senhora me pede uma informação, e eu sinto um aperto no coração. Davi percebe a minha inquietação e diz:

— Paola, você está branca que nem papel! O que te aflige?

— Não se preocupe. O pior já passou. Estou bem.

No caminho, conversamos sobre as novidades da fazenda. A maior delas é o retorno do Rogério com os filhos, mas sem a esposa. Segundo os "fofoqueiros de plantão", a Lila não aguentou as traições do marido e pediu o divórcio. Eu não acredito nessa história, o pessoal tem a língua afiada. É bem provável que ela tenha preferido ficar mais tempo no exterior. 

O céu está limpo e estrelado. Minha mãe larga o prato na mesa e me abraça. O cheiro de lavanda me envolve. Ele me remete ao aconchego, colo de mãe. Como é bom estar em casa! Meu pai liga a televisão, e o Davi exclama:

— Paola, essa não é a senhora que falou contigo na saída do hospital?

— É ela. Que coisa mais brutal. Como pôde esquartejar o marido e enterrá-lo no quintal da própria casa?

— Sabia que tinha algo de errado. O que você viu?

— Eu a vi cortando o companheiro com ira e violência. O pior de tudo foi perceber a sua destreza e frieza. Dessa vez foi diferente, mais claro e assustador. Tive a impressão de estar no local do crime em tempo real. 

— Querida, acalme-se. A mulher foi presa e não fará mais mal a ninguém. 

— O assassinato foi tão violento que não sai da minha cabeça. Conto com isso e espero que ela se arrependa do que fez. 

Deito-me na rede, e o balanço tem o mesmo efeito de uma meditação. Evito fechar os olhos para não dormir. Os meus sonhos são perturbadores e parecem reais. O odor da violência fica impregnado na minha pele como uma tatuagem de muito mau gosto. O sangue vivo e quente é sentido na minha boca. A água que utilizo para me banhar e para beber é incapaz de me purificar. Contudo, não sei se o esforço para me manter acordada vale a pena: as visões aparecem em qualquer momento, com os olhos abertos ou não. O Davi tem razão quando comenta que sempre fui intuitiva. Acontece que essa habilidade está mais apurada e não sei lidar com isso. Um frio toma conta de mim e o meu corpo arrepia quando alguma notícia é desastrosa. Isso me afasta das pessoas, não quero enxergar desgraças e ser aquela que anuncia a morte. 

Davi me oferece um leite quente com canela. Ele me conhece como a palma da mão dele. Eu não preciso falar, ele lê a minha alma e o meu coração. Esse dom dele não é só comigo, mas com todas as pessoas com quem convive. É um privilégio tê-lo ao meu lado. Nós somos leitores: ele da essência do ser humano e eu dos eventos trágicos que o rodeiam. A sorte dele é não enxergar além disso. A ignorância acerca do futuro é uma bênção, por isso a maioria dos indivíduos o desconhece. Viver o presente é complicado ... não vejo utilidade em prever o que acontecerá ou saber o que já aconteceu. Ser uma mera espectadora, sem poder interferir no curso das tragédias da vida, é angustiante. 

É difícil me olhar no espelho. Estou com o rosto inchado e com a cabeça raspada. Ainda bem que tenho as orelhas bem-feitas. Vou dar uma caprichada nos acessórios: lenços, chapéus e brincos. O meu cabelo cresce rápido e logo poderei prendê-lo num belo coque. Como a minha mãe fala: "Na vida dá-se um jeito para tudo, menos para a morte." E ela, com sabedoria, complementa: Enquanto o anjo da morte não vem, vivemos, um dia de cada vez, com fé e esperança."

O relógio carrilhão badala a meia-noite. O som me transporta para um tempo que não vivi. Outros objetos antigos, como a calculadora solar e a máquina de escrever, são o meu elo de ligação com o que passou. Fico imaginando o que eles viram, ouviram e sentiram. O que eles me contariam? Esse relógio, por exemplo, era do meu tataravô. Seria genial saber um pouco sobre ele e os demais ancestrais. Qual o conselho que me dariam? A borboleta azul interrompe o meu "momento nostalgia" e descansa em cima do relógio. Só posso estar delirando... perguntei para ela o que tem a me dizer. Isso já faz uns cinco minutos. Desconfio que é melhor eu esperar pela resposta sentada. 

Amanhece e uma neblina cobre o horizonte. Estou na dúvida de qual lenço usarei na cabeça. O Davi me presenteou com vários deles e todos são maravilhosos. Esse floral, em tom pastel, combina com a minha pele. O café da manhã, com cheiro de roça, abre o meu apetite. Hoje é dia de encontrar com a psicóloga. Pego o meu casaco e, na saída de casa, o Davi me detém:

— A senhorita planeja ir à cidade sozinha?

— Acertou. A Ruth me espera e, infelizmente, não poderei ajudá-lo com a vacinação do gado. 

— Tudo bem. Falei com o seu pai e deixaremos essa atividade para amanhã. Você é a "expert" no trabalho. O gado nem sente a sua picada.

Perdi a chance de voltar a dirigir a caminhonete. Depois do acidente, há mais de dois anos, não me deixam pegá-la fora da fazenda. É uma insanidade que gerou várias brigas. Hoje, não travo batalhas perdidas. Ele abre a porta e me ajuda a entrar no carro. Não perde a oportunidade e me alfineta:

— Baixinha, me desculpe pelo lapso. Dessa vez esqueci de pegar o banquinho para auxiliá-la. 

— Poxa, que pena! Enganos acontecem, não é mesmo? Eu também marquei bobeira por não pegar a sua moto. 

Choramos de tanto rir. O ambiente leve fica ainda melhor com o convite que ele me fez para almoçarmos no meu restaurante predileto. A cidade está em festa pela comemoração do seu aniversário. A rua principal ganha um charme com os balões coloridos. A terapia é embalada pela música tocada pela banda do corpo de bombeiros. Sinto-me aliviada, é muito bom desabafar. Todavia, não vejo avanços no que mais me atormenta: o que gerou o acidente e por que não me lembro de nada?

O dia foi agradável, almoçamos comida italiana e assistimos um filme sensacional: "O Poço". Davi tirou o dia para me agradar: ele não gosta de massa e de thriller psicológico. Na volta para casa, ao passar pelo local do acidente, senti um aperto no coração. Tenho que dar um jeito de driblar o Davi e voltar à rodovia 202. 

Estou pregando e o calor me irrita. O gado está todo vacinado, missão cumprida! O banho gelado me desperta. No almoço, minha mãe comenta que irá à cidade com o meu pai e com o Davi. Ela não disse o motivo, mas eu sei qual é: a compra do meu presente de aniversário. Uma luz se acende e eu não vejo a hora de botar o meu plano em prática. 

Espero eles saírem. Pego a chave da moto e tenho uma surpresa: ela está com pouco combustível. Não é possível, só pode ser brincadeira de mau gosto! Coloco a cachola para funcionar e me dirijo até o galpão. O trator está disponível e, por sorte, a chave na ignição. Um calafrio percorre o meu corpo, fecho os olhos, respiro fundo e dou a partida. Afinal de contas, para tudo tem uma primeira vez. 

A rodovia 202 parece um imenso tapete verde coberto por frondosas árvores e animais. As fazendas são bem-cuidadas, dignas de um cartão postal. Estaciono o trator ao lado de um armazém abandonado. A paisagem é um colírio para os olhos, porém a energia do local é densa. Passo por um Jatobá e algo me prende. Piso em falso, e um lenço puído se enrosca no meu pé direito.  Uma cena vem na minha mente: um cavalo passa pela pista e, para não o atropelar, eu jogo o carro para à esquerda e trombo nesta árvore. E o lenço? De quem é? Eu não sou fã de lenço. Só passei a usá-los depois do acidente. 

Não estou sozinha. Sinto uma presença conhecida ao meu redor. Depois de um suspense, a borboleta azul aparece e me conduz até um bosque. As extremidades do meu corpo começam a formigar. Minha visão fica embaçada, ouço uma voz distante e trêmula seguida por um grito cortante. A borboleta rodopia em volta de mim sem parar. Eu entro num carrossel desgovernado que gira muito rápido. Vejo várias borboletas azuis dentro do brinquedo. A voz fica cada vez mais nítida e próxima a ponto de eu sentir um bafo quente na nuca. 

O carrossel para de forma ríspida. Prendo a respiração e quero correr, mas não consigo. Prendo o maxilar e tiro uma lasca da minha língua. O sangue é sutil e escorre pela minha garganta. Um filme de terror passa na minha mente: a imagem da senhora que assassinou o marido, o cortou em pedaços, e o enterrou na própria casa. Enquanto ela esquartejava o companheiro, o seu rosto permanecia impassível. Depois de feito o trabalho sujo, ela foi até a cozinha e preparou um sanduíche com mortadela e queijo. Em seguida, limpou a faca e a colocou na primeira gaveta do armário debaixo da pia. 

Uma mão fria e delicada toca o meu ombro. Eu me viro e vejo uma mulher nua, desfigurada, sem o braço direito e cheia de hematomas pelo corpo. Abro a boca, tento falar, mas a voz não sai. Ela pega nas minhas mãos e revela:

— Paola, não tenha medo. Eu te conheço a um bom tempo. Lembro-me do tempo em que trocávamos livros e debatíamos sobre eles. Você terminou de ler o livro "A Esposa Perfeita" da Karin Slaughter? 

— Lila, é você? O que aconteceu? Na fazenda, todos acham que você se cansou das aventuras do Rogério e deu um basta no casamento. Com o tempo, ele passou de vilão para mocinho. O homem abandonado pela esposa e responsável pelos filhos. 

— Como ele está? E o Guto e a Nina? 

— Eles sofrem com a sua ausência. O Rogério contratou detetives para te encontrar. Ele está acabado, mas cuida muito bem dos meninos. Os seus filhos estão seguindo a vida como podem. O tempo os ajudará a suportar a dor. 

— Por favor, conte tudo para o Rogério e para as crianças. Eu fui brutalmente assassinada pelo meu amante, o caseiro da fazenda. A verdade é sempre o melhor caminho. Você tirou um peso das minhas costas. Agora, posso descansar em paz. Ore por mim. Sempre que avistar uma borboleta azul, eu estarei por perto.

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