A montanha de Gion
Petroni levantou naquele dia ensolarado juntamente às outras crianças moradoras de Gion. Levantando-se de sua cama, aquela confortável folhagem que o cobria ao anoitecer, Petroni foi encontrar seus colegas de equipe: Valdevin e Pristas. Estavam todos muito empolgados em continuar conhecendo a montanha onde moravam. Era assim que os seres de Gion evoluíam, por meio do conhecimento pleno da montanha.
Todavia, o que para alguns era uma grande curiosidade, para outros era uma terrível angústia. Isso porque o processo de evolução por meio da exploração de Gion se dava de maneira vagarosa, logo, era vagaroso o crescimento das crianças, o que causava impaciência em algumas. Porém, não era assim com Petroni, seu amigo Valdevin e a querida Pristas, eles transformavam essa vontade de crescer rápido em disposição para serem os melhores na exploração de Gion, para, assim, terem uma excelente evolução.
Ora, as explorações em Gion aconteciam logo cedo e as crianças eram separadas em equipes. Petroni e seus dois colegas faziam parte de uma equipe de cinco crianças, na qual Muquim era o instrutor. Muquim, gionita alto, de pele escura e com as suas orelhas pontudas, era extremamente rígido quanto às regras de Gion. Com isso, sempre que encontrava a equipe, repetia metodicamente:
— Em Gion é proibido a violação da vida! Vocês estão aqui para cuidar da montanha, não para violá-la. Além disso, vocês devem respeito aos três magos que fundaram e governam Gion. Respeitem, também, o processo de evolução. Não queiram pegar atalhos para conhecer Gion e, assim, crescerem mais rápido. Por conta dessa violação, muitos em Gion maltrataram a terra e o seu próximo. Por fim, crianças, saibam que todas essas regras se baseiam em uma principal: relacionem-se de maneira saudável com tudo o que tem vida aqui na montanha!
As crianças da equipe de Muquim ouviam isso todos os dias antes de começarem a exploração, o que as faziam não mais prestarem atenção em alguns detalhes: Muquim sempre mencionava as consequências a quem violasse as regras. O instrutor fazia questão de mencionar Obi e seus associados: seres que tentaram violar o processo de evolução para se tornarem magos. No entanto, o resultado foi o oposto. Ao tentar se tornar um mago, Obi tomou as folhas de Oglã e as consumiu exageradamente, tornando-se um terrível vampiro que agora morava na região baixa da montanha, onde a plantação era seca e havia pouca vida. Seus associados eram uma mistura da figura dos instrutores com a figura fantasmagórica de Obi
Com isso, era visível que tentar acelerar o processo de evolução fazia com que muitos moradores de Gion se tornassem, na verdade, seres assustadores, o que contrastava com a beleza da parte alta da montanha, onde estavam os três magos. Tanto Obi quanto seus associados eram a prova viva de que pular as etapas da evolução causava um resultado deturpado. As folhas de Oglã era a parte final da evolução em Gion. Logo, não era permitido as consumir desmedidamente e fora de seu tempo.
Mas, deixando um pouco de lado as rebeldias dos seres de Gion, voltemos ao dia daquelas crianças. Naquela manhã, Muquim separou Petroni, Valdevin e Pristas para lhes dar um recado particular:
— Crianças, as estratégias de Obi para tomar Gion e tirar os magos do poder continuam afligindo nossa sociedade. Posto a dedicação de vocês, venho chamá-los para dar uma pausa na exploração e enfrentarem os associados de Obi, uma vez que, se não os pararmos, logo a montanha terá a sua vida sugada pela presença assombrosa daquele vampiro.
— Muquim, a exploração já me cansa o suficiente, não estou muito a fim de uma aventura, não — disse Valdevin com a sua voz descansada. Valdevin era inteligente, mas carregava consigo uma terrível preguiça para novidades.
— Eu não veria problema, desde que a nossa exploração continue! — respondeu Pristas animada. Ao contrário de Valdevin, a gionita era ativa em tudo.
— Não, Muquim, não podemos! — apontou, por fim, Petroni, o gionita que mais ansiava a evolução. A ideia de parar a exploração trouxe a ele e aos seus colegas o temor de atrasarem o seu crescimento em Gion.
A princípio, Muquim não insistiu em seu convite. Juntou as demais crianças de sua equipe e partiram para a exploração. No entanto, quando Petroni, Valdevin e Pristas seguiam a equipe, Arcalom, um dos três magos, apareceu diante das três crianças. Petroni abaixou o rosto rapidamente, Pristas apenas contemplou a beleza do mago e Valdevin reclamava o susto que tomara.
— Crianças, Muquim já falou com vocês a pedido meu e, apesar de ser uma notícia inesperada, venho aqui reforçá-la a vocês três. Vocês puderam perceber o quanto a montanha tem sofrido com os ataques de Obi: o vampiro que vive nas regiões baixas de Gion tem trago uma morte gradativa ao nosso lar. Precisamos da ajuda de vocês para tirar das mãos dele as folhas de Oglã que ele roubou da parte alta da montanha. Ele as possuiu na esperança de se tornar um mago, mas a ausência dela de seu devido lugar tem causado a morte das demais plantações. Portanto, venho pessoalmente lhes enviar a essa missão, dando a minha palavra de que auxiliarei vocês — A voz mansa, porém firme de Arcalom era quase irresistível. Dessa vez, as crianças não tiveram como recusar.
Naquele mesmo dia, à tarde, as três crianças foram equipadas por Muquim e Arcalom para descerem até as regiões baixas da montanha para tomar as folhas de Oglã das mãos de Obi e seus associados. O envio das crianças se deu porque a presença delas seria dificilmente notada, ao contrário da presença dos magos e instrutores, que eram percebidos à distância pela altura e brilho que possuíam. Foram, pois, as três a caminho da caverna de Obi.
Para a segurança de Petroni, Valdevin e Pristas, os magos lhes deram pequenas pedras iluminadas, tanto para guiá-las no caminho quanto para afastar os associados de Obi. Assim, descendo em direção à caverna, as crianças conversavam:
— Eu estou cansado — resmungou Valdevin.
— Se pararmos, será ainda mais demorada a viagem — afirmou Pristas.
— Sinto que estamos sendo seguidos — disse Petroni, o que assustou as demais crianças.
Decidiram parar um pouco para observar ao redor e ver se havia algum associado de Obi planejando alguma emboscada contra elas. Pararam, olharam ao redor e não encontraram nada. No entanto, quando iam seguindo o caminho, sentiram mãos ásperas segurando seus braços. Pela primeira vez, viam de perto como era a imagem de um ser que havia se revoltado contra as regras dos magos. Ao contrário dos instrutores que tinham a pele escura e cheia de brilho, esses seres tinham o rosto opaco e demasiadamente claro, talvez pelo tempo que se escondiam do sol e da luz dos magos.
— O que fazem por aqui? — perguntou um dos associados de Obi com a voz grave e arrastada. As crianças não responderam. Estavam as três em estado de choque.
— Vieram perturbar Obi a essa hora? A hora que ele sai à procura de alimento? — disse o outro associado em seguida. Com isso, arrastaram a força as crianças até a parte baixa da montanha.
Chegando na caverna, o choque das crianças foi ainda maior. Estava sentado em uma rocha Obi, uma criatura sem beleza alguma. Era alto, mas não tão alto como os magos, tinha os olhos diferenciados, mas não eram brilhantes como os de Arcalom, na verdade, eram extremamente sombrios. Via-se que o seu plano de evoluir rapidamente à imagem de um mago havia trago a Obi a aparência de um vampiro que se alimentava de sangue.
— Ora, ora, que surpresa agradável — disse Obi com sua voz rouca.
As crianças logo perceberam que a única coisa que indicava vida e beleza naquela caverna era as folhas de Oglã, que estavam postas ao lado da rocha onde Obi se assentava. Olharam entre si e puderam entender que não seria tarefa fácil retirar as folhas da posse de Obi.
— Até quando os magos vão continuar enganando essas pobres crianças? Já não está óbvio que as regras deles são autoritárias e ninguém pode opinar contra elas? — As palavras de Obi soavam sempre muito persuasivas.
— O que você quer dizer com isso? Os magos sempre nos dizem o que é bom para a nossa evolução — retrucou Petroni.
— E você já questionou por que não há outro caminho?
— Nunca julguei necessário.
— Aí está o problema, ingênua criança. Nunca questionou! — A esse ponto, as crianças estavam confusas e já não sabiam se queriam enfrentar Obi. Porém, Petroni ainda estava de olho nas folhas de Oglã e, na primeira oportunidade, correu para a pedra para tentar pegá-las. Sua tentativa, como se imagina, foi frustrada. Obi se enfureceu ainda mais e fez com que os seus associados ficassem de guarda das crianças na parte lateral da caverna, bem distante das folhas, enquanto ainda planejava contra os magos.
— Esse será nosso jantar — disse Obi rindo.
— Burro — resmungou Pristas a Petroni.
— Para que essa pressa, Petroni? — também resmungou Valdevin.
— Alguém tinha que fazer algo, né? — Enquanto as três crianças discutiam, esquecendo-se da regra de Gion sobre relacionamentos, Obi refletia sobre como poderia usar as crianças para tomar a montanha de vez. Nesse meio tempo, Valdevin se lembrou das pedras que os magos haviam dado para eles. Pegou a sua pedra, escondido dos associados, e acenou para que Pristas e Petroni fizessem o mesmo. Ao juntarem as pedras, a claridade dos objetos juntos fez com que a escuridão da caverna se dissipasse. Obi e seus associados tentaram fugir da luz, indo para o fundo da caverna.
As três crianças aproveitaram a deixa, pegaram as folhas de Oglã e correram. Corriam como nunca. Para que ninguém se perdesse no caminho, Pristas deu a sua mão a Valdevin e pediu que ele fizesse o mesmo com Petroni que corria na frente. Claro que a estrada de volta não foi fácil. Já estava muito tarde e, consequentemente, muito escuro. Ainda por cima, as crianças discutiam no caminho para saber qual rota seria mais viável para se voltar.
No entanto, as crianças não haviam percebido que, enquanto corriam de mãos dadas, caíam das folhas de Oglã gotas de água que esverdeavam a parte baixa da montanha novamente. Nunca haviam falado sobre esse poder das folhas — ou esse era um novo poder que a folha não tinha antes e acabara de possuir pela unidade das crianças? Isso explicou o porquê de Obi não ter alcançado as crianças: a folhagem nova que surgia a cada passo afastava cada vez mais a morbidade da presença de Obi da montanha.
Quando chegaram, enfim, ao topo da montanha, encontraram Arcalom com o sorriso mais encantador que já haviam visto na vida. Não precisaram nem anunciar que o plano havia dado certo: os três magos já sabiam. Quando chegaram perto dos magos, estes sopraram sobre elas e as crianças tomaram a mesma forma dos instrutores. Terem auxiliado no socorro da montanha fez com que os três evoluíssem de maneira inesperada, todavia, sem violar a ninguém ou a nada da montanha, como havia feito Obi.
Daquele dia em diante, as três crianças se tornaram as guardiãs das folhas de Oglã e, vira e mexe, entravam em confronto com aqueles que ainda insistiam em roubá-las ou violar as regras de Gion. Dizem por aí que até hoje algumas facções tentam evoluir e tornarem-se magos por meios corruptos. Até houve o relato de seres que tentaram criar uma comunidade fora da montanha para instalarem suas próprias regras de liberdade, para não mais seguirem as regras dos magos. Todavia, os relatos são de que a tal sociedade, chamada Casulo, é uma verdadeira prisão.
Agora, Petroni, Pristas e Valdevin sabiam o porquê de obedecerem aos magos e em muitos momentos paravam para aconselhar as outras crianças repetindo diariamente que a violação e rebeldia transforma a mais bela criatura no ser mais sanguinário e horrendo. Sabiam na prática que nenhuma vida provinha da violação, mas sim do cuidado e respeito à montanha e aos magos. Sobre Obi? O vampiro não morreu, tampouco desistiu de seu plano. Porém, nunca mais atentou contra os magos, mas ouve-se que ele ainda paira nas regiões próximas no desejo insaciável por poder e sangue.
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