XXVII. Home
Henry terminou de fotografar Anne e Julio, os dois dançavam animados no tablado de madeira em meio à chuva que descia sobre eles, a cerimônia havia terminado bem a tempo das primeiras gotas começarem a cair do céu. As cadeiras foram recolhidas as pressas, assim como o tapete e boa parte da decoração. Os convidados estavam espalhados pela casa, onde esperavam a volta dos dois em um ambiente quentinho e protegido do vento. Henry sentiu um calafrio percorrer seu corpo e seus dentes tremerem um pouco, estava com frio, mas só precisava de mais uma foto dos dois e poderia deixá-los ali e entrar.
Julio havia contratado outro fotógrafo, o qual tirava fotos dentro da casa; porém queria dar algo mais pessoal de presente para Anne e quando Piper mostrou seu trabalho, havia encontrado o que tanto queria, palavras dele. Henry ficou contente pela melhor amiga de Charlotte se lembrar dele, mas achava que a ruiva tinha um plano por trás de tudo além de um trabalho para ele. Acenou para os noivos que quase não perceberam seu distanciamento, os dois dançavam colados em meio à chuva, perdidos em um mundo só deles.
Resolveu não entrar pela porta da frente e nem pela dos fundos, a sala deveria estar lotada assim como a cozinha. Caminhou pela varanda lateral e encontrou Charlotte sentada em um banco almofadado. Ela olhava fixamente para a paisagem borrada pela chuva, mas se voltou para ele quando escutou seus passos. O Hart se aproximou e aceitou a toalha que ela lhe estendia, entregou sua câmera para ela enquanto retirava o máximo do excesso de água que conseguia.
- Eles ainda vão ficar muito tempo aqui fora?
- Acho que não, a chuva está começando a engrossar e a temperatura está caindo ainda mais. - respondeu, notando que ela franziu o cenho meio preocupada. - O Julio não vai deixar que a Anne fique doente no dia do casamento deles.
- Ele vai ter que literalmente arrastar ela pra dentro de casa. - comentou rindo, porém Henry sentiu que tinha algo que a entristecia.
- Vou trocar de roupa e podemos conversar.
- Claro. - concordou quando ele já se preparava para entrar. - Vê se toma um banho quente, não quero passar a noite com você espirrando do meu lado.
Riu ao dar às costas para ela, por mais que Charlotte tentasse por vezes parecer que não ligava, ela procurava cuidar de todos que conhecia. Esse excesso de cuidado se estendia a quem às vezes não precisava, por isso ela sentia mais do que deixava transparecer. Entrou por uma sala que parecia ser um escritório e saiu para o corredor que dava nas escadas. Por mais que a casa não parecesse tão grande vista de fora, por dentro possuía muitos cômodos, poucos quartos, mas um número considerável de espaços. Correu escada acima para tentar afastar o frio que parecia estar impregnado em seus ossos.
◇ ◇ ◇ ◇ ◇
Charlotte estava sentada com as pernas cruzadas abaixo do corpo, as mãos unidas sobre o colo e o olhar novamente perdido. Henry sentou calmamente ao seu lado, em suas mãos trazia um prato de mini comidas e uma garrafa de vinho.
- Char? - chamou cuidadosamente, esperava que ela estivesse mais animada após toda a tarde que teve com sua família. Não obtendo resposta, tentou novamente. - Baby?
- Oi, meu amor. - ela respondeu meio distante.
Por mais que tivesse sentido seu coração parar por alguns milésimos pelo apelido carinhoso, não conseguia falar nada em relação à ele com a Page parecendo tão desanimada. Colocou o prato ao seu outro lado, o vinho no chão e se aproximou mais dela. Virou de frente para ela e cobriu as mãos de Charlotte com as suas, ela olhou para ele e abriu um sorriso hesitante. Henry esperou, a viu desviar a atenção para suas mãos unidas e retirou uma de debaixo das dele, a levou até seu pulso e começou a fazer círculos com o polegar em sua pele.
- Estava pensando nos meus pais. - contou, em uma voz baixa que o fez aproximar a cabeça para tentar ouvir melhor. - Eles estão viajando e se estão juntos é porque estão tentando novamente. Não estou triste por eles, só estou magoada por não ter sido informada, parece que não sou importante o suficiente pra ter sido avisada.
Soltou uma risada sem humor que o fez se sentir mal. Henry passou os braços ao redor dela, Charlotte descruzou as pernas e as passou sobre as dele, apoiando a cabeça em seu ombro enquanto ele a apertava o máximo possível em um abraço.
- Nunca mais diga isso. - pediu de maneira firme. - Nunca mais diga que não é importante porque você não sabe o quanto marca a vida de cada um que está ao seu lado. Caramba, Charlotte, eu não menti quando disse que o seu sumisso mexeu comigo, parecia que faltava algo nos meus dias e era você. - a escutou soluçar e fechou os olhos para tentar se concentrar e não acabar chorando. Siren sempre dizia que ele havia nascido com uma facilidade para se emocionar que havia herdado de sua avó. - O que está acontecendo entre seus pais não é culpa sua, a forma como eles escolhem para seguir a vida não vai passar por você e isso pode parecer injusto, mas é a realidade. Eu sei que você os ama, aos dois, mas nesse momento você também tem que se dar um tempo, Char.
- Sou péssima nisso. - afirmou, com a voz levemente embargada e abafada por estar com o rosto escondido na curva de seu pescoço. Henry fechou novamente os olhos com força quando os sentiu arder em anúncio às lágrimas. - É muito difícil não pensar no que pensam de mim, ter que ficar parada vendo eles passarem por cima de tudo enquanto tentam consertar suas próprias vidas esquecendo de quem está ao redor. Eu ainda sou a filha deles, e-eu ainda me preocupo, ainda sinto saudades e... eu ainda quero eles por perto.
A abraçou mais forte quando a sentiu tremer pelo choro, beijou sua têmpora e continuou abraçado à ela até senti-la começar a se acalmar. Charlotte ainda soltava alguns suspiros trêmulos, porém logo afastou a cabeça e o olhou de maneira agradecida. Ela começou a acariciar seu rosto com o nó dos dedos, atenta a cada movimento próprio, Henry sentiu seu coração esquentar quando Charlotte começou a contornar sua boca, o contorno de seu rosto e seus sinais com o polegar.
Os olhos castanhos da Page transbordavam de sentimentos não ditos, percebeu que ela possuía certa dificuldade em externar o que sentia para a causa de suas emoções. Porém seus gestos sempre deixavam claro, por mais que ela tentasse mascarar, sua linguagem corporal dizia o que não conseguia falar. Se Henry ainda tivesse dúvidas, elas caíram por terra naquele instante, não havia mais como ignorar o quanto ele estava louco por Charlotte Page. Ela fixou a atenção em seus lábios e depois subiu o olhar lentamente até encontrar o seu. A Page piscou lentamente, recuando um pouco como se tivesse se dado conta de algo e se afastou mais um pouco, colocando uma distância mínima entre eles.
- Então. - arranhou a garganta quando sua voz saiu rouca. - Como vai a sua exposição?
Henry a encarou confuso por alguns segundos, mas resolveu seguir com a conversa, talvez ela tivesse seus próprios motivos para precisar mudar de assunto.
- Está indo bem, ela vai acontecer na próxima semana e espero que você não falte.
- Nunca passou pela minha cabeça não ver meu pequeno artista. - fez uma voz manhosa ao apertar sua bochechas, Henry revirou os olhos sentindo seu rosto esquentar quando ela gargalhou. - Você é tão modesto.
- Eu não sou um artista.
- Alguém acabou de me dizer que somos mais importantes do que pensamos ser. - apontou, usando suas palavras contra ele.
- Ok, pumpkin, você tem um ponto. - provocou, a ouvindo gemer inconformada com o apelido.
- Sério mesmo que você não pode me chamar de outra coisa? - perguntou em uma falsa desolação.
- Poderia, mas não quero. - garantiu, abrindo um sorriso travesso que lhe rendeu um leve soco no peito.
- Sorte sua que eu gosto de você.
Riu ao vê-la com um bico infantil e aproximou seu rosto do dela.
- Sorte só minha?
Charlotte arqueou uma sobrancelha e o encarou tentando parecer séria, mas logo um sorriso se abriu em seu rosto quando ele se afastou.
- Como está indo o seu projeto?
- Vovô Mabel me concedeu outra reunião amanhã, ela não trata de negócios em eventos de família. - informou, se recostando contra o apoio do banco, as pernas ainda esticadas sobre as de Henry. - Ela disse que o projeto possui muito potencial, mas quer conversar com todos os principais envolvidos para dar uma resposta.
- Ela parece ser uma mulher bastante eficiente. - comentou, inconscientemente levando uma mão ao joelho dela e fazendo círculos com o polegar sobre a pele desnuda.
- E ela é, só que às vezes não controla a língua e acaba sendo bem venenosa. - falou, arregalando os olhos assustada quando se deu conta de onde estava e virando a cabeça por medo dela estar à espreita. - Nunca se sabe onde a vovó está, é um super poder bastante assustador.
- A Anne havia me comentado na festa de sua sobre uma tradição... - Suspirando alto, assentiu em afirmação para ele prosseguir. - Você está fora da competição? - indagou brincando.
- Nunca quis estar nessa competição para início de conversa. - deixou claro, cruzando os braços enquanto franzia o cenho. - E agradeço por vovó ter acreditado quando falei que não estava noiva e que essa fofoca se trasnformou em algo maior do que era.
- Uma fofoca que você deu início?
- Calado.
Tentou acertá-lo com o pé, porem henry a impediu enquanto ria abertamente.
- Se estou dizendo os fatos. - se defendeu ainda sorrindo.
- Só fiz um controle de danos. - declarou altiva. - Agora, para todos os efeitos, só estamos namorando.
- Não lembro de ter escutado um pedido.
- Engraçadinho. - estreitou os olhos em falsa irritação. - Você me deu um anel, quer pedido maior que esse?
- Ah, mas não conta. Eu te entreguei um anel de noivado, noivado que você desmanchou. - apontou em um tom provocativo.
- Que eu me lembre quem terminou primeiro foi você. - rebateu, arqueado as sobrancelhas com uma expressão vitoriosa.
- Se formos nos atentar aos detalhes, pumpkim, você vai estar bem enrolada.
Ela somente sorriu, tombando a cabeça para o lado enquanto o observava com os olhos brilhantes, porém o leve franzido em seu cenho era o indício de uma preocupação.
- O que somos agora? - perguntou por fim, o observando atenta por uma resposta.
Henry inclinou a cabeça para trás, a apoiando na parede fria enquanto igualava seu olhar ao dela.
- O que você quer que sejamos?
- Não posso decidir sozinha. - declarou firme.
- Podemos ser somente Henry Hart e Charlotte Page por enquanto?
Esperou paciente por uma resposta. Conseguia notar no leve estreitar dos olhos castanhos de Charlotte, na forma como ela brincava com as contas de sua pulseira, assim como na inclinação dos lábios que ela estava pensando em sua proposta. Por fim, o canto de seus lábios subiram sutilmente, seus ombros relaxando enquanto ela o encarava diretamente nos olhos.
- Parece ótimo.
Henry sorriu e iria dizer algo, porém foram interrompidos por três crianças que apareceram correndo, elas certamente estavam dando voltas ao redor da casa pelo lado de fora. Não demorou para que uma das madrinhas aparecesse gritando com eles.
- Já falei para não correrem aqui! 'Tá caindo o mundo aqui fora e vocês podem se machucar!
Ela ainda estava com o vestido rosado de madrinha e segurava uma taça de champanhe na mão, ela era muito simpática e possuía o rosto redondo que combinava com os cachos loiros que caíam ao redor. Ela abriu um sorriso quando os viu e levantou a taça no ar para Charlotte, Henry virou o rosto e viu a Page devolvendo o gesto com a garrafa de vinho em mãos.
- Procurei vocês por toda parte, dona Mabel não quer sair da sala. - contou, olhando para dentro do escritório e puxando uma cadeira de rodinhas para sentar perto deles. - Acredita que ela me disse que eu deveria mudar o corte do meu cabelo porque estou parecendo uma dançarina burlesca e não de uma maneira boa? - soltou uma risadinha descrente. - Depois que ela toma uns goles parece que fica ainda mais insuportável. - levou uma mão rapidamente à boca quando percebeu o que havia dito. - Ah, não, desculpa, não queria ter falado isso.
- Tudo bem, Pêtunia. - Charlotte minimizou o comentário, o que não surtiu muito efeito já que a mulher estava visivelmente envergonhada. - Depois desse comentário dela nem tem como a defender.
- Fazendo uma reunião e nem me chamam?
A voz de Piper apareceu antes dela, a mulher saiu pelas portas do escritório com uma garrafa de champanhe nas mãos e empurrou Henry para ter espaço para sentar. O Hart pegou o prato antes que a Manchester devorasse tudo e sussurrou um "folgada" quando ela pegou um petisco dele. Piper somente revirou os olhos e o encarou com um sorriso presunçoso.
- Oie. - Anne apareceu logo depois, fazendo Julio ir arrastar uma poltrona de dentro do escritório para eles sentarem.
Ela estava radiante e olhava encantada para a chuva que ainda caía, de maneira mais fina, porém podia ser visto que o tempo ficaria fechado durante toda a noite. Henry então se viu preso entre parte da família de Charlotte, e quando Clair e Leo se juntaram à eles, percebeu o quanto eram loucos e animados. Se sentiu bem e acolhido, notou que Charlotte relaxou e aproveitou a companhia, mas nunca deixando de trocar carinhos com ele durante as conversas.
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Postei hoje porque amanhã o dia vai estar corrido, mas se tudo der certo tem capítulo amanhã a noite.
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