XV. All I want
Charlotte não sabia há quanto tempo estava ali, havia deixado seu celular sobre a bancada da cozinha e seu relógio de pulso estava parado há meses. Abraçou as pernas e apoiou o queixo no topo do joelho, o mar à sua frente se revoltava a cada segundo, era como se o tempo espelhasse seus sentimentos. Estava com tanta raiva, raiva de sua mãe por ter expulsado seu pai, de Bianca e Noah por estarem deixando Henry pensar que havia traído o irmão, raiva de James que a abandonou, de Elliot por fazê-la acreditar que nem na família se podia confiar, raiva de si mesma por sentir que destruía qualquer relacionamento que tentava construir e por sentir medo de mais de seus sentimentos que acabava deixando a esperança escorrer por entre seus dedos.
Mas acima de tudo, estava cansada. Parecia que não podia passar um dia sem sentir de mais. Só queria que o tempo parasse e com ele tudo o que sentia. Queria ser somente uma professora do secundário que organizava aulas, ia para a escola, voltava para casa e terminava o dia em frente à TV maratonando séries. Uma vida sem grandes acontecimentos, uma vida pacata e regrada em momentos previsíveis. Só por um tempo, mesmo que curto. Somente por um tempo.
Lágrimas quentes escorriam por seu rosto em uma temperatura diferente do vento que balançava seus cachos. Inspirou profundamente sentindo o cheiro da maresia, era um aroma que a acalmava e por mais que estivesse sentada em uma areia úmida no meio de uma tarde, ali se sentia bem. Esperava que Noah já tivesse conversado com Henry, que tivesse esclarecido tudo e que ela não precisasse se intrometer ainda mais na vida do Hart. Se sentia uma intrusa no meio daquela família amorosa, que possuía seus segredos como toda família, mas que claramente se amava como todas deveriam se amar.
Henry Hart merecia ser feliz, ainda sofria por Bianca, mas ao contrário do que ele pensava não era um amor eterno, era amor, mas um daqueles em que se podia guardar as boas lembranças se a pessoa quisesse e Henry definitivamente era esse tipo de pessoa. A Page resolveu que ficar remoendo suas angústias não iria fazer bem, levantou-se com calma e limpou a parte de trás da calça com a mão, olhou ao redor percebendo que ainda estava sozinha e ao olhar para cima encontrou um céu fechado com nuvens escuras. Iria cair uma chuva forte e achou melhor voltar para a casa de Sofi, com toda a certeza ninguém havia sentido sua falta e poderia ajudar com o que precisassem sem ouvir perguntas sobre o motivo de seu sumiço.
◇ ◇ ◇ ◇ ◇
Henry desceu as escadas correndo, havia procurado por todos os quartos do andar de cima novamente e conversado com sua família, ninguém havia visto Charlotte e isso o estava enlouquecendo um pouco.
- Cara, nós vamos encontrar ela. - Jasper afirmou, tentando passar uma segurança que ele claramente não estava tendo.
O Dunlop estava a um ponto de enlouquecer junto com Henry, ele não parava de repetir que Piper iria matá-lo se algo acontecesse com a Page. Os dois saíram para fora da casa, Siren ainda guardava todas as cadeiras na cozinha da melhor maneira que conseguia, Noah ajudava seu pai a desmontar o altar da cerimônia e Bianca estava trancada no quarto de hóspedes desde que o sumiço de Charlotte foi anunciado.
- Será que ela saiu pra passear?
- Ela não conhece nada daqui, seria loucura ela ter saído sem mim. - Henry respondeu, seguindo os passos do amigo que andava em direção à rua.
O céu se fechava a cada segundo, nuvens escuras se faziam presentes e um vento forte e frio era um anúncio do temporal que estava para cair. Henry abraçou o próprio corpo, resmungava consigo mesmo por não ter escutado sua mãe e trocado o fino casaco por um suéter grosso. Ao seu lado, Jasper olhava para os dois lados da rua sem aparentar sentir o vento frio, estava vestido dos pés a cabeça com peças de roupas que vó Sofi tricotou para ele. Algumas vezes Henry achava que a velha senhora tinha um neto preferido e não era nenhum dos dois Hart.
- Será que ela saiu pra pensar e acabou dormindo em algum lugar? - Jasper indagou, parando perto de um cruzamento que no momento se encontrava deserto.
O Hart não duvidava de todos na pequena ilha terem feito a escolha mais inteligente e procurado abrigo dentro de suas casas quentinhas. Ele queria fazer o mesmo, mas Charlotte parecia não colaborar e seu medo de que algo ruim tivesse acontecido com ela compartilhava lugar com sua irritação. Como uma manhã poderia ter dado uma virada tão grande?
- Ela não faria isso. - e torcia para estar certo.
- Nós vamos encontrá-la.
Seu amigo o assegurou novamente e só então Henry percebeu o quanto seu corpo estava tenso. Esquecera a conversa com Noah, os olhares estranhos entre Charlotte e Bianca, o quase casamento, tudo o que pensava era ter a Page em segurança ao seu lado e voltarem para casa longe da chuva que se aproximava a cada segundo. Abriu um sorriso que torcia para ser confiante para Jasper e recomeçaram a andar, quando se preparavam para atravessar a rua em direção à outro quarteirão, viram de longe um pontinho laranja.
- Será que é...
Henry não ficou para terminar de escutar a fala de Jasper, reconheceria aquele casaco laranja e os cachos volumosos a quilômetros de distância. Quando deu por si já corria em direção à ela, Charlotte caminhava de cabeça baixa e por vezes olhava para cima.
- Char!
Gritou, tendo a atenção que queria. A mulher parou de repente e o encarou confusa, ele estava tão perto que poderia puxá-la para os seus braços e foi exatamente o que fez. Ainda bem que havia diminuído a velocidade de sua corrida ou teria derrubado os dois no chão. A apertou entre seus braços, enterrando a cabeça nos cachos que exalavam um suave cheiro de lavanda. Seu coração começou a desacelerar, parecia que um enorme peso havia sido tirado de suas costas.
- O que houve? - a voz dela saiu preocupada e abafada, mas mesmo assim a Page retribuiu o abraço fortemente.
- Você sumiu, Char. Foi isso o que aconteceu. - respondeu, afastando-se somente o suficiente para olhar em seus olhos. Eram de um castanho escuro que no momento transbordavam de culpa.
- Desculpa, não queria deixar ninguém preocupado. - afirmou, fechando os olhos quando ele beijou sua testa suavemente. - Achei que ninguém fosse perceber.
- Eu percebi.
- Desculpa. - pediu novamente, apertando os braços ao redor de sua cintura.
Henry sentiu no fundo de sua mente que ela não estava pedindo desculpas somente pelo sumisso, mas decidiu não falar mais nada por enquanto. Enterrou seu rosto ainda mais fundo em seu cabelo, os fios pinicando sua pele, mas a maciez o envolvendo. Seu coração batia acelerado e tinha a certeza de Charlotte poder senti-lo. Estavam tão absortos um no outro que não notaram a chegada de Jasper, o Dunlop também não fez menção nenhuma de os apressar, até sentir as primeiras gotas geladas caírem.
- Por mais que eu esteja amando esse momento, 'tá chovendo!
A voz de Jasper os fez retornar à realidade. Separaram-se, mas Charlotte logo pegou a mão de Henry e entrelaçou seus dedos, o Hart ignorou o calor suave que tomou seu corpo. Ao olhar para a Page a encontrou o fitando com receio, era como se ela esperasse alguma reação dele.
- Você conversou com seu irmão? - perguntou, começando a caminhar em sincronia com ele.
- Está chovendo! Vamos andar mais rápido, por favor? - Jasper pediu, alguns passos à frente deles, com as mãos na cintura e os encarando impaciente.
- Ainda não, mas acho que nós dois precisamos conversar primeiro. - ignorou o amigo, assim como o vento que aumentava e os pingos gelados que invadiam o leve tecido de sua blusa o fazendo estremecer.
Charlotte choramingou quase inaudível e apertou o passo para andar mais rápido, o que o fez quase correr para continuar ao lado dela. Jasper caminhava irritado pelo atraso dos dois.
- Eu não quero pegar um resfriado e nem quero que vocês morram de hipotermia!
- Podemos conversar quando estivermos secos e com uma xícara de chocolate quente em mãos? - pediu, o encarando com um quase bico infantil nos lábios.
Gotas de água escorregavam por seu nariz, outras se acumulavam em seus cílios antes dela piscar as fazendo caírem pelas bochechas. Ela estava irritantemente linda em meio a chuva e aquilo fez sua impaciência aumentar, era para ele estar com raiva por ela estar escondendo algo importante e não admirando a beleza de Charlotte Page.
- Pessoal! Eu sou enfermeiro e estou ordenando que comecem a correr agora! Que merda!
- Tudo bem. - aceitou o pedido dela, passando a mão sobre o rosto para tirar a água que retornara em questão de segundos a bloquear sua visão. Acataram a ordem de Jasper e começaram a correr o mais rápido possível para fugirem do frio.
*****
Capítulo pequeno, mas nos vemos no próximo. Tentarei postar esse fim de semana.
Obrigada por todos os comentários, vocês não sabem o quanto me sinto motivada a continuar. Principalmente porque pretendo terminar essa fic antes de dezembro, boa sorte para mim, tá complicado até agora kkkk
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