V. Maybe
Charlotte apertou a mão de Henry em busca de conforto, estava nervosa, não fazia a mínima ideia do motivo que levara Siren a querer conversar com ela a sós. Não sabia o porque, mas não conseguia tirar da cabeça que Bianca estava envolvida de alguma forma naquilo, se o sorriso pretensioso que ela esbanjava era a prova de algo.
Prendeu a respiração quando chegaram em frente a porta que dava acesso à cozinha, não havia prestado atenção em nada do que Henry e Noah conversavam, nem em como Bianca havia se mantido calada e só dava pequenas observações para prender a atenção de Henry. Deveria conversar com ele depois e informar que se ele quisesse manter o passado deles longe do conhecimento de sua família, era melhor parar de encarar Bianca a cada dez segundos e esconder a irritação em seu rosto a cada vez que ela falava.
- Vou logo. - informou ao pararem completamente. - Já volto.
Soltou a mão de Henry antes que ele tentasse entrar com ela, não precisava que Siren pensasse que ela tinha medo dela ou algo do tipo. Por mais que ela estivesse mesmo meio assustada com uma conversa que ainda nem tinha sido iniciada, a mulher não precisava saber. Beijou a bochecha de Henry rapidamente, recebendo um pequeno sorriso em troca, deu às costas para o Hart e entrou na cozinha.
Era um lugar quente e colorido, os armários eram em um azul cor céu, a geladeira era em um amarelo claro e na mesa se encontrava um grande arranjo de flores diversas. Sirius dormia ao pé do fogão, sua respiração fazia uma bolinha que estava em frente ao seu focinho se afastar a cada segundo. Ele era tão fofo, mesmo que não se sentisse tão à vontade com cachorros, queria ter encontrado o animal antes, porém, ele havia passado por uma cirurgia e o remédio que tomava o deixava sonolento. O local cheirava a torta de maçã e aconchego. Era totalmente diferente da cozinha de seus pais, que contava com um cozinheiro particular que era trocado a cada dois anos, sua mãe sempre encontrava um defeito nos coitados.
- Olá, Charlotte.
Abriu um sorriso meio tímido para Siren e puxou uma cadeira para sentar à mesa, ficando de frente para ela. Cruzou as mãos por baixo da mesa de madeira escura e esperou que ela iniciasse a conversa. O semblante meio hesitante dela a fez acreditar que algo deveria ter acontecido para ela estar a encarando daquela maneira, algo ou alguém.
- Noah disse que você queria conversar comigo. - decidiu que deveria ser mesmo a primeira a falar, com a voz mais firme que conseguia.
- Bom. - começou, inspirando fundo e olhando para qualquer lugar menos para ela, enquanto soltava o ar lentamente pela boca. - Eu sei que você e o Henry estão juntos a pouco tempo, mas eu não pude deixar de notar algumas mudanças nele.
- Como assim? - indagou confusa.
- Ele está mais distante da família, inventa desculpas para não participar dos almoços ou jantares, há tempos não passa o final de semana na casa da avó onde costumava ir sempre que podia. - tamborilava as unhas em uma xícara que se encontrava por perto. - Na verdade, faz muito tempo que ele nem a visita e ela sente muito a falta dele.
Charlotte franziu o cenho intrigada, Siren a encarava em expectativa após terminar o relato e em seus olhos brilhava uma leve acusação que fez a Page se sentir imediatamente desconfortável.
- Você por acaso está dizendo que a culpa do Henry estar afastado da família é minha?
- Não, não, querida. - tratou logo de negar, se inclinando para pegar a mão direita dela nas suas. A apertou levemente e continuou de maneira firme. - Não estou dizendo que você é a culpada, mas a maneira como ele está agindo essa noite me deixou inquieta. Ele está estranho e não sei se está assim desde que vocês se conheceram ou desde muito antes, até porque eu não sei realmente há quanto tempo vocês estão juntos e isso meio que se juntou a todos os meus outros pensamentos. - parou em busca de ar antes de continuar. - Não quero que se sinta desconfortável ou culpada, ele é meu bebê, meu filho mais novo. Só estou preocupada, Charlotte.
Encarou a mulher sem saber como reagir, obviamente Siren falava muito e rápido quando estava nervosa. Pensou cuidadosamente em como respondê-la, não sabia como Henry estava nos dias anteriores, até porque o conhecia a menos de um dia, mas sentia que precisava dizer algo para acalmar Siren. Cobriu as mãos dela com a sua livre e tentou transmitir toda a segurança possível quando falou.
- Posso lhe garantir que ele está bem, agora ele está bem. - recebeu um olhar confuso e preocupado. - Ele passou por alguns momentos desgastantes por conta do trabalho e não queria preocupar vocês, mas ele está ficando bem e eu não vou sair do lado dele até tudo isso passar.
Não sabia de onde havia vindo a mentira ou a promessa, mas ao ver Siren visivelmente ficar mais relaxada, soube que tinha feito o certo. Provavelmente não a veria mais, então precisava informar à Henry a necessidade de pelo menos conversar um pouco com sua mãe. Charlotte podia ver e sentir o quão preocupada e carinhosa Siren era, Henry não poderia deixar uma mãe como aquela sem o carinho de um filho. A Hart beijou as mãos de Charlotte, que riu sem jeito pelo gesto tão carinhoso e repentino.
- Por favor, não faça eu me arrepender por lhe dar esse voto de confiança.
Charlotte sabia que por trás do tom doce se escondia uma pequena ameaça, era uma mãe pedindo por seu filho e não queria imaginar o que Siren seria capaz de fazer caso soubesse que o motivo de toda a confusão na vida e no coração de seu filho mais novo estava na sala abraçada ao seu filho mais velho. Abriu um sorriso firme para ela e balançou a cabeça em sinal de que havia entendido o que ela queria falar, a Hart pareceu satisfeita e deu leves tapinhas na mão de Charlotte antes de soltar suas mãos.
◇ ◇ ◇ ◇ ◇
Conseguiu finalmente respirar aliviada quando chegou em casa, não contou todos os detalhes da conversa para Henry porque tudo o que queria era chegar logo em seu apartamento e dormir até esquecer aquele dia estranho. Quando abriu a porta de entrada, deu de cara com Piper conversando com alguém através dos fones enquanto fazia alongamento. Fechou a porta e retirou os saltos, suspirou aliviada quando sentiu o piso frio e seus preciosos pés finalmente livres, o próximo passo era tirar o vestido e o sutiã infernal que havia colocado porque era o único que ficava bem com o vestido preto, e lindo, que Piper a havia dado de presente.
- Não, Lucy, eu não vou viajar pra Escócia só pra fazer um estúpido comercial de dez segundos de escova de dente pra cachorro. - a voz irritada de Piper preencheu o apartamento, ela só deu um leve aceno em reconhecimento à Charlotte antes de voltar a ligação. - Por quê? Ora, não sei, talvez seja porque eu morro de medo de voar?!... Sim, eu sei que se eu quiser ser uma grande atriz eu tenho que viajar na porcaria de um avião! Mas eu não vou pro outro lado do mundo dentro daquela máquina programada pra cair só pra fazer um comercial de dez fodidos segundos!... Eu grito sim porque estou completamente irritada!
Charlotte riu sabendo que aquela discussão duraria o resto da noite, mas no fim sua amiga iria se entupir de vinho e comprimidos, uma combinação altamente perigosa, e viajaria o mais rápido possível para a Escócia. Tinha pena da pobre Lucy, Michael sempre a deixava responsável por convencer Piper a fazer as viagens e só não desistia dela porque ele a via como uma das grandes promessas da nova geração de atrizes.
Torcia sempre por sua amiga, se conheciam desde crianças e cresceram com quase o mesmo ambiente de criação, os pais da Manchester se recusaram a pagar o curso de Artes cênicas de Piper e não a ajudaram em nada relacionado ao início da carreira dela, mesmo tendo uma grande base financeira para tal. Porém, mesmo tendo o apoio de seu tio Ray, ela não voltou atrás e saiu de casa. Conclusão, Piper se recusou a fazer um grande curso “renomado” que eles tanto queriam, e ainda querem, e passou a trabalhar em um café perto da faculdade.
Assim que Charlotte terminou seus estudos, as duas começaram a morar juntas e a Manchester ainda lutava por seu lugar no Olimpo, o local da fama como a mesma chamava. Era difícil ver ela tentar não desmoronar a cada não, mas finalmente parecia que a sorte estava mudando e pelo visto o trabalho na Escócia era um indício maravilhoso dessa mudança. Por mais que ela quisesse seguir com a carreira de atriz, ainda se via dividida sempre que um trabalho como modelo aparecia. Esperava que Piper pudesse se encontrar e focar todas as sua energia em algo que realmente a fizesse bem.
Retirou o vestido por cima da cabeça, o vento frio que vinha da janela entreaberta de seu quarto era uma sensação bem-vinda sobre sua pele. Jogou o tecido em cima de uma poltrona junto com o sutiã, vestiu uma blusa velha e pegou seu celular antes de se jogar em sua cama. Afundou sobre o colchão macio e abraçou uma almofada antes de colocar seu celular sobre a mesinha de canto, não queria conversar com mais ninguém naquela noite e logo desligou o wifi para que não fosse perturbada, se quisessem falar urgentemente com ela poderiam simplesmente ligar.
Inspirou fundo sentindo um cheiro diferente na almofada que abraçava, era um perfume amadeirado com um toque cítrico, claramente um perfume masculino. Sua mente viajou para Henry e para o fato dele não ter praticamente largado aquela almofada durante o dia, o perfume dele era muito bom e era o mesmo que havia usado no jantar. Rolou de barriga para cima e com um grunhido frustrado jogou a almofada para longe, tudo o que menos precisava naquele instante era dormir abraçada a algo que tivesse o cheiro dele.
- Só um dia, Charlotte. Você só passou um mísero dia ao lado dele, mulher. - sussurrou frustrada para si mesma. Fechou os olhos com força e levou a mão à têmpora, sentia o pulso acelerado e sabia que se não fosse dormir logo iria acordar com uma imensa dor de cabeça. - Isso é só atração, uma atração estúpida, é completamente normal e tem explicação científica. Só uma atração desnecessária, só isso.
Continuou a repetir para si mesma enquanto se enrolava em seu cobertor, mas logo lembrou da janela que estava aberta, chutou as cobertas irritada antes de levantar-se para fechar com força a janela e voltar para debaixo de sua proteção do mundo novamente. Torcia para ter uma noite sem sonhos, planejava dormir o domingo inteiro e se alienar no tempo restante antes de começar a se preparar para o jantar de sua mãe. Não queria ter que pensar na loucura que iria ser.
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