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Aceitação

Eu tive que ir ao médico ao sair da casa da Giovanna e constatei que  havia quebrado a mão. E sinceramente, eu não estava ligando. Desde aquele dia que acordei na cama da Jessica eu me sinto a pior pessoa do mundo. Estava indo tudo tão bem. Pela primeira vez, eu não me sentia vazio. As semanas que passei com a Giovanna foram diferentes de tudo. Eu chegava em casa e ela sempre me esperava com um sorriso no rosto. Eu não me sentia abandonado e nem precisava de bebidas ou mulheres. Ela me ouvia e me fazia sentir completo. Eu conseguia dormir direito e as coisas faziam sentido.

Agora estou aqui no hospital com meus tios e irmão falando algo que eu não conseguia entender. O Miguel, como sempre, estava calado no seu canto e eu sabia o tanto que ele me odiava nesse momento. Eu havia encontrado um sentido para tudo e agora estava mais perdido que antes. Nenhum perdão consertaria a burrada que eu fiz. E eu sabia disso melhor que qualquer um. Eu havia prometido para ela que tentaria ser diferente e ali estava eu, novamente.  Havia feito ela chorar e essa imagem não saia da minha cabeça. 

O Miguel chegou perto de mim e me deu um soco no braço fazendo todos olharem para ele assustado. Ele disse:
- Isso é pra você acordar! Estão todos aqui preocupados com você e você em outro mundo. Não sabemos o que aconteceu. Só recebemos uma ligação para vim ao hospital. O que deu em você?
Encarei ele por um tempo e o abracei com toda a força que eu tinha. Deixei as lágrimas inundarem tudo como nunca fiz e disse:
- Eu sinto muito! Não soube lidar com o abandono e acabei me afastando de vocês. Já perdi tanta coisa por não conseguir superar isso. Eu era uma criança. Tinha que cuidar de vocês e falhei!

Ele me agarrou mais forte e disse:
- Você não precisa cuidar de nós, Henri, e sim de você. Nós amamos você, mesmo com tudo. Eu tive raiva  por muito tempo e não quero ter isso comigo mais. Somos irmãos e por mais que o babaca do nosso pai não tenha reconhecido o sentido de família, ainda assim. Somos uma.
Meu tio chegou perto de nós e nos abraçou. Todos estavam em prantos quando minha tia chegou, enxugando as lágrimas, colocou a mão na cintura e disse:
- Pode me explicar o que aconteceu? Porque que eu saiba todo mundo sabe que não se deve socar uma parede.
O Miguel completou:
- Olha, que já soquei uma e sei que dói muito.
Assim que eu ia falar, minha irmã chegou ofegante e disse:
- Você é louco? Tem algum problema? Sabia que eu estou grávida de gêmeos e não posso ficar me estressando. Essa família só tem loucos. Só pode!
Minha tia foi acalmá-la, enquanto o Rodrigo chegou com a farda e com cara de alguém que saiu de um incêndio. Ele me olhou e disse:
- Do jeito que a Ari falou pensei que você estava morto já.
Eu olhei para ele e disse:
- Só foi um soco na parede. Nada demais.
Ele cruzou o braço e disse:
- E por que diabos você estava competindo com uma parede?
Todos rimos do seu comentário e eu disse:
- Não precisam se preocupar, ok?  Só foi um momento de raiva e eu me descontrolei.
O médico chegou com a receita de alguns medicamentos para dor e me liberou para ir pra casa. Minha tia, depois de muito me xingar, me convenceu a ir para a casa deles. E no fundo achei melhor. Não ia consegui lidar com meu apartamento vazio agora e precisava me recompor diante de tudo que tinha acontecido. Fui para casa da minha tia e tomei um banho gelado. Porque precisava sentir algo, mas nada vinha  além do vazio. Tentei dormir e nada. Me levantei, fui na cozinha tomar um copo de água e encontrei meu tio sentado em uma cadeira de balanço do lado de fora. Sentei ao lado dele e ficamos um tempo em silêncio, até ele falar:
- Depois que eu casei com sua tia, tentamos de todas as formas para que ela engravidasse e nada deu certo. Até chegar vocês aqui em casa e alegrar nossos dias. São nosso filhos desde do dia que entraram por essa porta e nada pode mudar isso. É por isso, meu filho, que eu sei que você não está muito bem. Aconteceu algo e se quiser falar estarei aqui.
Respirei fundo, olhei as estrelas e disse:
- Tio, nesses dias eu senti coisas das quais nunca senti antes. Depois que aquele homem nos deixou, a minha única preocupação eram meus irmãos, o senhor e minha tia. Eu trabalhei duro para que isso acontecesse e faço isso até hoje, mas esses dias ela apareceu e mudou a minha rotina. As coisas ficaram leves com ela, e eu não me sentia vazio, tio. Eu não sei explicar o que ela causou em mim só que era bom.
- Ela?
- Sim... Eu tinha planos em apresentá-la para vocês, mas fui muito idiota pra isso. Acabei com todas minha chances com ela e mais uma vez deixei meu passado me influenciar.
- Nunca imaginei que se apaixonaria assim.
- Nem eu tio! Mas isso agora não importa. Ela não quer me ver nem pintado de ouro, e eu já me conformei com isso.
Ele me olhou e novamente ficamos em silêncio contemplado as estrelas. Várias lembranças surgiram. Até que resolvi entrar e tentar dormir um pouco. O sono não veio e achei melhor assim. Vi o sol nascer pela janela e percebi que precisava voltar a minha vida. Cumprimentei todos na hora do café e depois de conversar com meus tios fui para o apartamento. Ao chegar e destrancar a porta, lá estavam as cortinas, tapetes e todas as mudanças feitas por ela. Meu coração apertou. Joguei a chave em cima da mesa e fui para o meu quarto, vesti o primeiro terno que eu vi e fui para o único lugar que não me permitiria pensar: a empresa.

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