A festa
Eu estava distraída com algo no fundo da mercearia, e nem percebi que alguém tinha entrado. Tinha sido um dia parado, e eu tinha ido organizar o estoque do fundo. Quando cheguei no balcão, percebi a figura de um homem ali, parado. A impressão que tive logo de cara foi de que ele era realmente bonito, com aqueles olhos claros e o cabelo castanho! Ele estava com uma blusa branca social dobrada no braço e carregava um terno. Era o típico homem de negócios. Seu cheiro de colônia se espalhava no ambiente. No momento em que nosso olhar cruzou, um arrepio subiu no meu corpo! Ele começou a falar algo, mas estava tão atordoada com sua presença que tive que me concentrar muito para entender o que ele dizia. Sua fala carregada de sotaque indicava que ele não era da região. Tampouco italiano. Ele contou que o carro que estava, tinha quebrado e precisava de ajuda para chegar no centro da cidade. Sem pensar muito, ofereci ajuda e depois me peguei pensando o que eu tinha na cabeça para dar carona a um estranho. Mas já tinha oferecido, e no fundo eu queria passar mais um tempo com esse estrangeiro. Algo nele prendia toda minha atenção.
Peguei as chaves do carro de minha tia e no caminho ficamos em silêncio. Senti os olhos dele percorrendo meu corpo e aquilo me fez sentir um calor enorme! Fiz de tudo para não olhar para ele e me concentrei na estrada. Quando ele resolveu puxar assunto! Falou algo sobre a paisagem e uma loja. Mas eu estava muito concentrada e não rendi muito assunto.
Chegamos ao nosso destino muito rápido, eu conhecia a cidade como a palma da minha mão. O hotel que ele estava era do tipo quatro estrelas, que hospeda gente importante e artista. Eu já tinha passado por ali umas duas vezes, e feito entregas de vinho nesse mesmo hotel. Mostrei para ele onde era o lugar, e ele sacou a carteira para me pagar. An? Preferia esse sujeito quando ele estava calado. Não acreditei que ele achou que eu estava oferecendo ajuda por dinheiro! Típico pensamento de empresário que acha que o dinheiro paga tudo. Recusei com toda seriedade que pude. Essa gente não sabe o que é um gesto de gentileza? Na hora que ele desceu, acelerei o carro com raiva daquele homem!
Quando cheguei em casa, notei uma agitação fora do comum. Estavam todos se arrumando, e um corre-corre de gente. O festival! Hoje começava a semana festiva de comida e bebida típica. Centenas de famílias se reuniam nessa semana e montavam barracas para divulgar seus negócios e celebrar nossa cultura. E a minha família era uma delas. Nosso conhecimento e tradição no mercado de vinho fazia de nós participantes ativos, e todo ano estávamos lá, expondo nosso produto. Estava todo mundo se preparando quando a minha irmã passou correndo, quase esbarrando em mim.
- Você não vai se arrumar não? Já está atrasada! - ela passou ofegando, pegando a minha mão no caminho.
Eu deixei ela me conduzir para o meu quarto, onde havia um vestido estendido na cama escolhido a dedo para mim.
-Fran! - eu exclamei, maravilhada.
O vestido era simples, longo e com uma abertura na perna! Era um tom azul marinho, com um decote nas costas. Sorri em aprovação para minha irmã e fui tomar um banho quente. Sai do banheiro renovada e me vesti. Passei um pouco de maquiagem e prendi meu cabelo em um um coque desfiado. Me olhei no espelho e gostei do que vi. O vestido era realmente lindo e eu tinha que me lembrar de agradecer a Fran depois! Sai de casa carregando milhares de coisas que minha mãe me fez levar, coloquei tudo dentro da caminhonete, e me dirigi à feira.
A festa estava realmente animada. O centro da cidade estava todo iluminado, com várias barracas de comidas diferentes! Tinha muitas pessoas de fora, o lugar ficava lotado nessa época. Demorei um tempo cumprimentando todos. Mas enfim cheguei na barraca da minha família, e já estava quase tudo pronto. A Mi tinha feito um trabalho e tanto no designer da nossa barraca, mas não era nenhum trabalho para ela. Ela adorava decoração e design e sempre deixava tudo bem organizado. Alguns dos meus sobrinhos corriam por todo lado e eu me sentia em casa diante de tanta confusão. Entreguei para o Enrico as várias sacolas que minha mãe me pediu para levar e aproveitei que estavam todos trabalhando para olhar as demais barracas. Havia uma banda local tocando e um grupo de jovens estavam apresentando danças típicas italianas. Fiquei ali parada um tempo observando. Até que comecei a sentir um olhar na minha direção e procurei para ver de onde vinha. Quando eu encontrei, quase não pude acreditar. Não era possível. Era ele! Desviei meu olhar para concentrar na dança, mas senti que ele permanecia me encarando. Ele desconhecia limites? Antes que eu perdesse a cabeça, resolvi voltar para a barraca porque já estava na minha hora de substituir algum dos meus irmãos. Cheguei lá e comecei atender os clientes que vinham saber os preços dos vinhos e pedir informações. Já os que queriam negociar compras mais altas, meu pai ficou por conta de atender. Mantive minha cabeça ocupada, explicando sobre vinhos, harmonização e plantio. Assim não pensava naquele homem que por alguma razão me tirava do sério. E mexeu comigo de uma forma que eu não sabia explicar.
Depois de um tempo atendendo, o fluxo de pessoas ficou menos intenso, então decidi conferir o estoque em baixo do balcão. Estava contando e anotando, quando ouvi alguém chamar.
- Com licença! - não era possível.
Assim que me levantei encontrei com aquele para de olhos verdes me encarando. Sim, esse homem desconhece limites. Reuni todo meu autocontrole, e anos de experiência com atendimento ao cliente, e com toda calma do mundo, respondi:
- Pois não? - até eu fiquei surpresa com a neutralidade do meu tom de voz.
- Você... - eu mesma.
- Sim! Como vai? E ai, conseguiu resolver o problema do carro? - tentei soar despretensiosa.
- Consegui sim. Não sabia que trabalhava com vinhos.
Dei um sorriso de lado e provoquei:
- Tem muitas coisas que você não conhece de mim, moço. - como por exemplo o fato de que eu nunca dei carona a desconhecidos, mas ofereci a você.
Ele sorriu e chegou mais perto:
- Tipo o quê? - é impressão minha ou ele estava me provocando de volta?
- Que eu trabalho com vinhos! - disse prontamente. Eu não ia cair nesse jogo dele.
Ele segurou o olhar sobre o meu de maneira intensa, e riu:
- Vocês produzem? - disse voltando sua atenção para os vinhos.
-Sim! Minha família tem um vinhedo aqui perto. - recompus minha postura, voltando ao modo atendente.
- Hmmm! Então você é entendedora de vinhos?
- Sim...conheço praticamente todos! - respondi, meio que para me gabar, meio que para mostrar para ele que eu não era uma interiorana, como ele devia pensar.
- Mas qual o seu preferido? - era um teste?
- Você já está querendo saber de mais... Você gostaria de experimentar o nosso vinho? - mudei de assunto.
- Posso? - ele me olhou de forma intensa, um olhar penetrante.
-Sim! É amostra. - ofereci para ele.
Peguei uma taça e coloquei um pouco do vinho, entreguei para aquele homem, que me encarava descaradamente. Na hora que ele colocou a taça na boca, imaginei como seria tocar aqueles lábios, como pareciam macios e suaves...
O que será que estava acontecendo comigo? Nunca fui tão ousada assim antes. Antes que ele me pegasse encarando, sai dos meus devaneios e me recompus.
- E então? - perguntei, para preencher o silêncio. Manter ele falando talvez evitaria que eu ficasse pensando tanta besteira.
-Nossa! Muito bom... - respondeu em um tom aveludado.
Eu sorri em resposta.
- É o que eu sempre digo.
- Eu queria te pedir desculpas por hoje mais cedo. Não tive a intenção de ofender. - ele me olhou, esperando uma resposta.
- Tudo bem, já passou. - tentei soar indiferente.
Ficamos um tempo nos encarando, até que ele disse:
- Como sinal de bandeira branca, por que você não damos uma volta? Você pode me mostrar as melhores barracas, já que parece conhecer bem tudo aqui.
-Não posso. Como você está vendo, esse é meu turno aqui na nossa barraca, e eu tenho que terminar a contagem aqui. - tentei desviar.
- Eu espero. - ele insistiu. "Claro que espera", pensei comigo mesma.
- O senhor é um homem insistente, sabia? - rebati.
Ele me encarou novamente por uns instantes até dizer:
- Você não viu nada! - e ficou ali, esperando.
Fiquei atordoada por um momento, mas fui atender outros clientes. Quando olhei de volta, ele já não estava mais ali. Senti uma pontada de desapontamento, mas segui o resto da noite trabalhando! Assim que meu expediente acabou, eu estava exausta. Por um breve momento, tinha esquecido da conversa de mais cedo com o estrangeiro. Comecei a juntar as minhas coisas para ir embora, e estava já pronta, quando ele aparece com um sorriso de lado e as mãos dos bolsos da calça.
- Acho que alguém está tentando fugir de uma tour pela feira. - ele disse descontraído.
Quando me virei, vi que estávamos bem perto a ponto de eu poder sentir seu perfume dele me impregnar. Tomei uma certa distância e disse:
- Pensei que você já estivesse ido embora. - respondi com suavidade.
- Não sem antes fazer nossa tour.
- Olha, eu estou realmente cansada, e tudo que eu quero é só um banho e cama agora. - tentei desviar.
Ele me olhou de forma pecaminosa, e pensei no que eu havia dito. Mas rapidamente ele se recompôs e disse:
- Tudo bem então, eu te acompanho até a sua casa. - sugeriu.
Eu ri em resposta. Mas olhei para ele e percebi que ele não ia desistir. Então desisti e disse em resposta:
- Tudo bem! Mas é bem perto daqui.
Ele fez sinal para que eu fosse na frente. Pedi um minuto e fui até o Enrico. Pedi a ele que levasse o carro de volta com as coisas da feira. Ele me olhou com desconfiança, mas eu não deixei ele render. Peguei algumas sacolas, e o estrangeiro me ajudou a carregar. Fomos caminhando e conversando sobre assuntos banais. Quando eu fiz sinal para que ele parasse, ele obedeceu. Apontei para cima e disse:
-Olha para o céu.
Ele ficou confuso, mas obedeceu. Direcionou o olhar para cima, e não sei para qual direção, mas pareceu encantado demais com o que viu.
- Quantas estrelas! - ele disse maravilhado.
Eu respondi:
- Podem falar o que for, mas pra mim esse céu vai ser o mais impressionante e magnífico de todos! - eu disse.
Ele concordou e ficou encarando o céu um pouco até seguirmos até nosso destino. Pararmos na frente do vinhedo. Resolvi provocar um pouco mais e na hora de despedir, dei um beijo no canto da sua boca! Ele me olhou de forma tentadora e eu disse:
-Boa noite! - e me direcionei para a porta.
Ele balançou a cabeça, incrédulo com a minha iniciativa, e respondeu atordoado:
- Boa noite!
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro