Um duelo entre dois cavalheiros atravessam a correnteza do rio. Celeste fingiu que nem os viu, mas uma dama de dentro da carruagem a confundiu com uma princesa e a chamou para perto do confronto.

̶ Princesa Leonor do condado de Trento Di Fiore, venha cá e junte-se a nós nesse piquenique de verão! – acenou uma das miladys.

Não entendera muito bem o que estava acontecendo, mas ao ouvir a palavra princesa, não pensou duas vezes em por o anel em seu dedo. Timidamente tentou aproximar-se, atravessando a ponte de pedra que ficava sobre a cascata. Alguns chuviscos caíram sobre seu rosto, molhando seus cabelos vermelhos de fogo. Isso por certo, fez desviar a atenção de um dos príncipes do jogo de esgrima.

̶ Che bella donna, chi è quella donzella?

̶ Em guarda, touchée Felipe!

̶ Hahaha, assim não vale Ricardo, me pegou distraído!

̶ A moça ruiva fez com que vós perdêsseis a vossa honra?

̶ Hein, vocês dois, não estão a reconhecendo?

̶ Perdoe-nos a ausência de lembrança, eu a conheço?

̶ Não! Quer dizer sim! – disse a bruxa.

̶ Perdoe-me a indiscrição de meus irmãos. É claro que vocês a conhecem, ao menos já a viram de vista. Ela é a princesa Leonor Trento Di Fiore, filha caçula do rei Giordano V do Castello di Trento. Somos da realeza britânica, estamos a convite do conde de Montenegro para o baile dos vinhedos.

̶ Leonor Di Fiore? Seus trajes estão um pouco desgastados. – reparou a dama de companhia.

̶ Eu estava a passeio pela floresta e resolvi banhar-me no rio e parei para colher algumas flores. Meu vestido deve ter rasgado em algum arbusto...

̶ É claro, muito prazer. Eu me chamo Margaret de Evans Green, princesa do palácio de Glamyood da Inglaterra. Esses são meus irmãos: Felipe e Ricardo de Evans Green.

̶ Muito prazer vossa alteza de beleza tão exótica. Perdoe-me a indelicadeza de meu irmão caçula, eu lhe estou ensinando a arte da esgrima. (Beijou-lhe a mão).

̶ Ensinando-me? Mas eu ganhei o confronto Felipe, touchée, lembra?

̶ Modéstia a parte, eu estava distraído, mas até que leva jeito!

̶ Mas Felipe...

Margaret piscou para Ricardo, convidando-o para comer uma fatia de torta de nozes e brioches de maçã, enquanto Celeste e o príncipe Felipe conversavam à beira do rio:

̶ Estamos quase em meados do Outono, não estás com frio?

̶ Para mim a brisa do vento ainda é um tanto abafada!

̶ Gosto do seu sorriso, da sua risada, seus olhos combinam com a pérola de seu anel e seus cabelos apesar de meio embaraçados são macios e perfumados, aprendestes com a Rapunzel? (Risos).

̶ Gosto de caminhar e olhar o céu à noite. Parece que a beleza dessa escuridão faz parte de mim, da minha alma e do meu coração.

̶ E os cabelos?

̶ Os cabelos são um segredo da minha tia... (Risos).

̶ Tia? Você tem uma tia?

̶ Sim, quer dizer, não! Talvez eu deva ter..., mas você estava falando sobre o que mesmo?

Por alguns instantes, Celeste parece ter ficado pensativa e seus pensamentos foram além de sua presença física. Ela pensara em sua tia Sarah Serafina, que a criara desde menina. Antes mesmo de seu décimo aniversário, seus pais já haviam falecido, diante de um enorme perigo. Tudo aconteceu muito cedo. Por muito tempo, tal assunto foi mantido em segredo, mas quando Leste completara seus treze anos de idade, Fina lhe contara toda a verdade sobre o acidente com a carruagem. Os cavalos que transportavam seus genitores em uma viagem foram surpreendidos por uma rocha que despencou sobre a montanha. O cocheiro de muita coragem, até tentou encontrar um desvio na paisagem, mas a carroça não suportou o impacto submetido pela pedra e capotou sobre o abismo. Um dos cavalos sobreviveu ao acidente e foi dado à Celeste de presente no seu décimo quinto aniversário. Mas ela jamais soubera da procedência do animal. Sua tia levou isso como um gesto de bondade. Assim, sua sobrinha preservaria a memória de seus pais, e teria a oportunidade de construir uma amizade com lealdade. E assim aconteceu. O cavalo cresceu junto aos sonhos de Celeste. Crepúsculo era seu nome, devido a sua pele amarelada. A posição solar quase se encontrava ao meio-dia e os dois jovens continuavam a conversar, envolvidos de muita empatia:

̶ Você sabe cavalgar princesa Di Fiore?

̶ Sim, eu amo cavalos!

̶ Poderíamos combinar uma cavalgada em alguma manhã de verão ensolarada, se a senhorita assim desejar, estás convidada.

̶ Eu adoraria, é claro, agradeço a vossa gentileza.

̶ Leonor, Felipe! – gritou Margaret.

̶ O que foi minha caríssima irmã?

̶ Meu estômago já está dando sinais de que precisa almoçar! O castelo de Belmonte, onde estamos hospedados fica a algumas léguas daqui. Gostaria de nos acompanhar princesa Leonor?

̶ Não sei se devo.

̶ Ora e por que não? Seria uma honra compartilhar um saboroso banquete em sua doce e bela presença. – salientou o príncipe Felipe de Evans Green.

̶ Se eu fosse você, eu aceitaria. Não pode apresentar-se dessa forma, com esses trajes ao rei e à rainha de Trento Di Fiore. Por gentileza, aceite o convite, por certo devo ter algum vestido que possa servir-lhe, ajustando-se em sua silhueta fina.

Ela se preocupava em aceitar o convite, afinal a sua tia, há tantas horas, já deveria estar preocupada. Só que não! Serafina havia assado o bolo com amoras e depois havia adormecido. Trocara o chá de hortelã por cogumelos do sono quase eterno. A pessoa somente poderia acordar com um beijo de um duende amarelo.

Celeste decidiu-se por subir na carruagem com certa ansiedade em seu coração. Porém, o que poderia lhe acontecer de ruim? Uma vida de princesa lhe aguardava e ela também tinha muitas expectativas!