04
Jimin observava em silêncio enquanto Minjeong vagava pela festa de fim de ano letivo da sua fraternidade. Estava confusa, porque tinha certeza que ela não pertencia a aquele lugar.
Depois do que aconteceu no corredor, Jimin a viu procurar por Ning Yizhuo, o que a surpreendeu ainda mais. Ningning era uma dessas alunas populares e sorridentes de quem todo mundo gostava. Meio que o oposto da garota reservada que ficava em um canto bebendo refrigerante.
Não era a presença dela que incomodava Jimin. Todo mundo estava bêbado demais para perceber que Minjeong não era de nenhuma irmandade, e sempre deixavam que amigos de amigos fossem a essas festas.
O que incomodava Jimin era que seus olhos não paravam de procurar por ela. Toda vez que ia para outro cômodo ou pegar uma bebida, Minjeong estava lá. Quase sempre, de pé no canto. A postura dela era indiferente, como se não notasse os olhares desconfiados que recebia de vez em quando. Como se não se importasse por se destacar.
Mas ela vira aqueles olhos belos e azuis de perto. Vira a cautela neles. Minjeong se importava mais do que deixava transparecer.
Jimin também vira aqueles olhos azuis ficarem quentes e nebulosos.
Droga.
Em que ela estava pensando quando tocou nela daquele jeito? Tinha bebido umas cervejas, mas não estava nem um pouco bêbada a ponto de se sentir atraída por uma ruiva baixinha e reservada. Mas, por um segundo, Jimin sentiu alguma coisa. Ficou um pouco alerta quando o corpo dela fora jogado contra o seu. Sentiu isso também quando trombou com ela no corredor dias antes.
Não fazia sentido. Minjeong era o completo oposto das garotas com quem saia.
Talvez ela despertasse o seu interesse por causa disso.
Jimin escutou alguém chamar seu nome à sua esquerda e nem precisou virar para saber que era Somi. A morena só estava naquela festa porque ela praticamente a arrastara de seu apartamento.
— Você viu o Christopher? — Perguntou Somi, olhando para trás de Jimin como se ela estivesse escondendo o anfitrião da festa.
— Não o vejo desde que fui cumprimentá-lo — respondeu ela, mantendo a voz neutra. — Provavelmente está curtindo com alguma garota por aí.
Somi assentiu enquanto passava os olhos pela sala.
— Você já viu como aquela garota é linda? — Perguntou ela, olhando devagar de cima a baixo uma pobre garota que provavelmente ia ser mais uma das vítimas da loira.
— Tem garotas lindas por todo lugar — murmurou Jimin, entediada com a cena.
— Não como aquela — disse ela, apontando com o queixo.
Dando-se por vencida, Jimin olhou na direção da tal garota apenas para confirmar se tratar de Minjeong. Era óbvio que Somi iria notá-la, a ruiva se destacava sem fazer esforço.
Mas essa percepção também a irritava.
Tinha algo de frágil no jeito como ela tentava ser durona. E, Jimin não conseguia esquecer de como seu coração acelerou quando sentiu o corpo dela em cima do seu, todo cheio de curvas suaves e cheirando a sabonete.
— Deixe ela em paz — murmurou ela para Somi.
A loira lançou-lhe um olhar surpreso.
— Você conhece a Minjeong?
— Estamos fazendo um curso de inverno juntas — disse Jimin, finalmente
desistindo da cerveja, deixando-a em uma mesa lateral já cheia de copos e garrafas abandonados.
Quando olhou de volta na direção de Minjeong, ela já havia desaparecido. A morena deveria ter ficado aliviada por ela, já que significava que não ia ter que lidar com o lado sedutor de Somi.
Em vez disso, ela só ficou mal-humorada.
— O que você tem hoje, Jimin? — Perguntou Somi, exasperada.
— Como assim?
— Normalmente você é a vida dessas festas. A primeiro a tomar cerveja de um novo barril, mas também a primeira a mandar embora quem estiver bêbado demais. Hoje você tomou tipo meio copo e ficou irritada com todo mundo que tentou falar com você.
Era verdade. Jimin não estava sendo ela mesma.
Em geral, ela estaria aproveitando a festa ao máximo. Mas naquele dia, só se sentia... indiferente.
E essa sensação a deixava muito irritada.
Alguém chamou seu nome, e ela viu o seu grupo de amigos apontando para o barril. Todos estavam bêbados demais para perceber que ela não estava nem um pouco interessada.
Jimin fez um gesto para eles indicando que já ia, então deu um tchau para Somi e seguiu na direção do banheiro. Não porque precisasse ir, mas porque precisava de um minuto sozinha. O problema era a fila quilométrica, formada principalmente por garotas com pouca roupa. Uma morena alta e magra pegou suas mãos quando ela passou. Jimin Não tinha como não notar o jeito como seus dedos roçaram suas palmas de maneira totalmente desnecessária.
— Oi, Yena — disse Jimin, fazendo um leve aceno com o queixo, já indo embora.
— Ouvi dizer que veio sozinha — disse ela, sem soltar sua mão.
Jimin não ficou surpresa por ela saber disso. Yena era uma das melhores amigas de Chaewon. Mas lhe surpreendia o tom sugestivo em sua voz, porque ela era uma das melhores amigas de Chaewon.
— É, e pretendo continuar assim — disse ela, se recusando a secar seu corpo de modelo. Yena era bonita, mas de jeito nenhum Jimin ficaria com uma amiga da sua ex. Podia estar irritada, mas não era uma completa babaca.
— Ah, Jimin, para com isso — disse Yena, tentando puxaá-la para perto e se inclinando um pouco para a frente. — Vou fazer você se sentir melhor.
Aquela abordagem direta voltada para a ex-namorada da melhor amiga era brochante, então ela deu um sorrisinho rápido e saio pela porta dos fundos. O lado de fora estava bem mais frio do que lá dentro, mas, a não ser por alguns casais se pegando, estava muito mais agradável.
Ela sentou em uma mureta de tijolos, se perguntando o que ainda estava fazendo ali. Normalmente a noite estaria apenas começando, mas só conseguia pensar em voltar para seu apartamento com aquecedor, onde não precisaria falar com ninguém.
Por outro lado, ficar sozinha implicava mais tempo para pensar, e ela não tinha certeza de que queria isso.
Jimin passou a mão na nuca e mexeu a cabeça para relaxar quando a viu. Estava a poucos passos de distância, mas, com sueter, jeans claros e tênis brancos, ficava fácil encontrá-la na escuridão da noite.
— Kim — disse Jimin.
— Yu — ela respondeu, no mesmo tom indiferente.
As duas permaneceram em silêncio por alguns minutos, e a morena percebeu que era agradável estar com alguém que não esperava que ela fosse de um determinado jeito.
— Só para registrar, gosto mais dessa versão — disse Minjeong por fim.
— Oi?
De canto de olho, Jimin viu-a levantar um ombro.
— Suas personas. Tem aquela irritantemente charmosa do primeiro dia. A carrancuda do corredor de agora há pouco. E essa aí. Quieta e meio triste. Gosto mais dela.
Jimin virou a cabeça para olhar para ela.
— Você me prefere triste? É mesmo uma garota diferente.
Ela levou a mão a orelha e não pareceu nem um pouco perturbada pelo seu comentário.
— Bom, não quero uma versão suicida ou nada assim. Só prefiro quando não está se esforçando tanto.
Jimin nem sabia do que ela estava falando.
— E o seu rosto? — Perguntou, mudando de assunto.
— Tudo bem.
Ela estreitou os olhos e a avaliou. Seu tom era indiferente. Embora Minjeong de fato parecesse bem — seu rosto não ficara vermelho nem formara uma mancha roxa —, Jimin tinha a sensação de que ela diria isso mesmo se não estivesse bem. Como se pensasse que ninguém se importaria com a resposta.
— Desculpa por... lá dentro — disse ela, quebrando mais uma vez o silêncio desconfortável. — Eu não queria te machucar.
Minjeong se aproximou e abriu um enorme sorriso falso, como quem dizia: Viu? Estão todos aqui ainda.
Jimin revirou os olhos. Mas, ao mesmo tempo, sorriu de leve. Ela era tão diferente de todo mundo que conhecia. Notou que seu humor estava melhorando.
— Como te arrastaram pra essa festa? — Perguntou ela, apontando para a casa que começava a ficar barulhenta.
Minjeong olhou para a frente, de novo mexendo na orelha.
— Vim com uma amiga. Ning Yizhuo. Ela é uma de vocês.
— Uma de nós?
— Você sabe. Bonita. Popular. Perfeita.
— Você é bonita — Jimin se pegou dizendo.
A ruiva virou a cabeça, e seus olhos azuis pareciam interessados.
— Você é boa nisso.
— Do que você está falando? — Perguntou ela, com uma curiosidade genuína.
— Em flertar com garotas — respondeu Minjeong, sentando em cima de uma perna e virando para encará-la. — Eu vi você lá dentro. Faz parecer tão natural.
Apesar de surpresa, Jimin sorriu, porque era a primeira vez que conversava com uma garota tão aberta a sinceridade como aquela.
— Não sei o que poderia responder a você — disse ela, surpresa que sua mão tenha se erguido para puxar uma mecha de cabelo dela.
Minjeong pareceu um pouco assustada com o gesto, mas seus olhos aparentaram se abrandar um pouco e ela se esforçou para sorrir.
— Eu andei pensando e... Tenho uma proposta para você — ela disse de forma repentina, encarando-a com um olhar surpreendentemente direto. — Exigiria comprometimento... pelos próximos meses, imagino. Eu gostaria... que você me ajudasse com algo. Se tiver disponibilidade.
— O que tem em mente?
— Me diga primeiro se tem disponibilidade, por favor.
— Eu trabalho algumas vezes por semana, mas apenas no período da manhã.
— Você teria os próximos meses livres, então? — Ela insistiu.
— Depende do que estiver propondo.
Minjeong colocou alguns fios de cabelo atrás da orelha e jogou os ombros para trás
— Sou péssima em... nisso que você faz. Mas quero melhorar. Acho que seria bom ter alguém para me ensinar. E gostaria que fosse você.
A compreensão foi atingindo Jimin em ondas surreais. Ela se considerava péssima. Com garotas. Queria ter aulas para melhorar. E que a morena fosse sua professora.
Como poderia ensinar alguém a se relacionar?
— Acho que você está se equivocando. Garotas como você não precisam de algo assim, porque têm namorada. Você precisa esquecer essa ideia.
Uma raiva pulsante pareceu fervilhar em seu corpo, deixando-a imobilizada.
— Isso não é verdade. Garotas como eu intimidam e afugentam namoradas. Garotas como eu nunca são chamadas para sair. Garotas como eu precisam encontrar sua própria solução, inventar seu próprio destino. Precisei lutar para conseguir tudo na vida, e vou lutar por isso também. Vou aprender a me relacionar, e finalmente atrair a pessoa certa para mim.
— Minjeong, não é assim que as coisas funcionam. Você não precisa dessas aulas.
— Discordo. Mas se não estiver inclinada a aceitar, você poderia... me apresentar... uma amiga que acha que poderia me ajudar?
— Você quer mesmo ir em frente com essa maluquice das aulas?
— Não é maluquice. E, sim, pretendo ir em frente. — Ela se esforçou para encarar as feições esculpidas dela, respirando fundo. — Se pensar um pouco, talvez se lembre de alguém que seja...
Jimin se inclinou na sua direção, mexendo a boca sem emitir som antes de dizer:
— O que vai fazer se eu não indicar ninguém?
Ela deu de ombros.
— Posso tentar encontrar alguém com disponibilidade pelo campus.
— Você sabe quantas malucas existem por aí? Não é seguro. — Jimin ergueu
a mão para tocá-la, mas cerrou o punho e recolheu o braço.
— Então talvez eu devesse voltar para a festa e tentar encontrar alguém.
Jimin soltou um grunhido de frustração e passou os dedos nos cabelos.
A ideia de ver Minjeong se envolvendo com alguma daquelas garotas da festa a fez ranger os dentes de raiva. Não tinha interesse em aceitar a proposta dela, mas tampouco queria assistir enquanto ela era usada e machucada por pessoas que claramente só queriam se divertir. Como ia conseguir se livrar da culpa em seus ombros sabendo que tinha sido a primeira pessoa a quem ela recorrera?
Sua amargura devia ter ficado evidente, porque a expressão no rosto dela se amenizou.
— Jimin, você não é obrigada a aceitar...
— Tudo bem. Posso ajudá-la enquanto fazemos o trabalho da faculdade — disse ela.
Minjeong demorou um instante para entender do que se tratava, então seu coração disparou, deixando seus dedos dormentes. Ela ia ajudá-la.
Com o corpo congelado pelo choque, ela só conseguiu dizer:
— Tá.
Jimin a observou, com o maxilar cerrado.
— Se a gente fizer isso, você precisa me prometer que não vai se apegar.
— Por quê? — Questionou ela, com um suspiro de frustração.
— Porque não sou a garota ideal para se ter como namorada. — Jimin sabia que essa era a única forma de evitar um sofrimento futuro. — Então me prometa que não vai surtar quando tudo terminar.
— Tá.
— É sério. Nada de me seguir, ligar, dar presentes. Não quero saber
disso. — Ela fechou as mãos em punhos enquanto esperava a resposta dela, com uma expressão bem séria.
— Tá.
Jimin a encarou em silêncio. Ela devia ter deixado o cérebro dela em pane, porque aquela parecia ser a única palavra que Minjeong ainda era capaz de dizer.
— É você, Jimin?
As duas viraram a cabeça quando alguém chamou seu nome, e ela reconheceu Christopher andando na direção delas. Ele tinha um olhar intrigado no rosto.
— Onde você estava? — Perguntou.
Jimin não culpava Christopher por estar confuso. Não era normal ela ficar no jardim enquanto lá dentro tinha uma festa.
Ele lançou um olhar curioso para Minjeong antes de estender a mão.
— Sou Christopher Bang, o anfitrião da festa.
— Legal — disse ela, indiferente, como se não se importasse com a presença dele ali.
— Então vocês... são amigas? — Perguntou ele.
Jimin sentiu um leve pânico. Como iria explicar isso? Não podia dizer que ela era só uma penetra com aparência incrível, porque isso indicaria que era perfeita para ser um caso de uma noite só — e Christopher não ia se segurar. E, se ela negasse que a conhecia, iria parecer uma babaca.
Jimin segurou o braço dela. Era tão magro que seus dedos davam a volta completa em seu bíceps.
— Esta é Kim Minjeong — disse ela, ignorando o fato de que a ruiva tentava se soltar. — Somos amigas.
Minjeong soltou um ruidinho estrangulado.
— Ai, meu Deus, não...
— Boas amigas — enfatizou Jimin, só para provocá-la.
— Hum... tá — disse Christopher, dando de ombros. — Bom, que tal você e sua amiga entrarem pra que a gente possa encerrar o semestre direito? A cerveja está esperando.
— Nossa, seria ótimo — disse Minjeong em tom baixo. — Mas preciso ir. Tenho uma porção te telas para finalizar esta noite.
Ela olhou de maneira incisiva para os dedos de Jimin no braço dela, e a morena percebeu como era ridículo segurá-la ali. Grosseiro até. Mesmo assim, demorou para soltá-la, deixando seus dedos acariciarem a pele macia da parte interna do seu pulso.
Jimin pensou ter escutado ela inspirar profundamente, mas devia ser coisa da sua cabeça, porque seus olhar continuou incomodado até ela se soltar e recuar alguns passos.
— Te vejo por aí, amiga — disse Minjeong, levantando a mão discretamente.
Jimin não conseguiu evitar. Sorriu.
E, de repente, os próximos meses não pareciam tão ruins, porque sabia exatamente como se manter ocupada durante o inverno inteiro.
Iria descobrir o que mexia com Kim Minjeong.
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