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Oito

“Há uma força misteriosa. Ela afunda suas garras em mim e me puxa para
mais perto de você.”
Alexandra Savior | Cupid

03 de novembro de 1997,
segunda-feira.

          Amarro meus fios ruivos em um coque bagunçado, retirando minha mochila dos ombros e largando os livros de física e química sobre a mesa redonda da biblioteca. Novembro chegou com tudo. Isso inclui os milhares de trabalhos, provas e apresentações. Eu sempre me saí bem em qualquer conteúdo da High Five Snakes, mas isso me exige muitas horas gastas sentada na cadeira desconfortável dessa biblioteca. Barrinhas de cereais e copos de café se tornam meus melhores amigos nessa fase, assim como livros e folhas de rascunho.

Solto uma lufada de ar, encarando a montanha de folhas espalhadas pela mesa. Coloco as mãos na cabeça, tentando me decidir por onde começar – ou se dá tempo de sair correndo para fora dessa escola e sobreviver vendendo artesanatos na praia. Uma grande verdade chocante sobre mim: não sou fã dos estudos. É, isso aí. Surpresos? Talvez um pouco, mas cá entre nós... tem alguém que realmente ame socar a cara nos livros todo santo dia? Eu acho que não. Faço isso porque sou obrigada. Conhecimento não cai do céu, muito menos o meu diploma na faculdade. Se quero ser uma grande Veterinária, preciso gastar horas do meu dia aprendendo conteúdos como Combustíveis Fósseis e a Frequência das Ondas Sonoras.

Irei utilizar algum desses conteúdos ao longo da minha vida? Provavelmente não, mas seguimos.

Decido começar por física, minha matéria preferida. Empurro química para longe – já que é a matéria que mais odeio –, e me concentro em colocar meus fones de ouvido, ligando o walkman. Desde que me conheço por gente, prefiro estudar com alguma música soando baixinha em meus ouvidos. Quinze minutos depois, a biblioteca está lotada. Tem alguns alunos sentados nos corredores, tão atolados de trabalhos quanto eu. Na mesa onde estou, tem apenas mais um lugar vago, que rapidamente é ocupado pela amiga de Scott – Helena Watson. A morena sorri para mim, abrindo um livro de história e anotando as coisas que lê em seu caderno.

Alguns instantes depois, sussurra:

— Quer uma barrinha de cereal? Você está quase dormindo — observa, vasculhando sua mochila de couro com lantejoulas cinza.

— Você salvaria a minha vida — sopro de volta, sorrindo também.

Assim que ela me alcança uma barrinha de chocolate com granola, agradeço baixinho e devoro-a em alguns segundos, para logo em seguida voltar toda a minha concentração para os livros. Uma hora mais tarde, ainda estou na biblioteca resolvendo as questões de química. Não tem mais ninguém aqui além de mim e do Jimmy – o senhorzinho carrancudo que monitora o fluxo de alunos dentro deste espaço. Helena saiu daqui há pouco mais de trinta minutos, me desejando boa sorte com tudo isso. Agradeci, desejando o mesmo para ela.

Meus neurônios estão quase prendendo fogo quando a porta da biblioteca é aberta. Meus olhos são atraídos até ele. Scott Summer parece ainda mais bonito esta manhã; calça jeans surrada, uma blusa branca por baixo da grossa jaqueta de couro preta com pelinhos na lapela e os cabelos loiros espetados para cima. Não o vejo desde sexta-feira, no Halloween. O loiro simplesmente sumiu da festa com Emma, e hoje não o vi pelos corredores em nenhuma das vezes em que cruzei com o mar de alunos na troca de períodos.

Cá entre nós? Eu até agradeci por isso, já que uma parte de mim está chateada com ele. Não sei se é pelo fato de que eu estava ansiando por alguma mensagem no final de semana, ou se é porque ele sumiu da festa e nem sequer me deu uma carona de volta para casa. Scott tinha razão; ele não é a opção mais apropriada para ser o par de alguém. Aos poucos, estou me convencendo de que o loiro só me aturou por um mês por conta do trabalho. Que as piadinhas, comentários sarcásticos e brincadeiras eram só uma forma de deixar tudo menos entediante para nós. Eu falhei miseravelmente em tentar me aproximar de alguém que saísse da minha zona de conforto. Agora, tenho menos vontade ainda de conhecer pessoas novas.

É trabalhoso e decepcionante.

Pisco algumas vezes ao notar que Scott caminha em minha direção, as mãos enterradas nos bolsos da calça jeans. Seu olhar está sobre mim em todo o percurso, até ele arrastar uma cadeira e se sentar do outro lado da mesa, apoiando os braços no encosto dela. Espero que diga alguma coisa, mas o loiro nem sequer mexe os lábios. Pigarreio, desconfortável.

— Posso ajudar? — Questiono, batendo com a ponta da caneta azul no caderno. O barulho é irritante, mas me acalma ao mesmo tempo.

— Nosso trabalho é sexta-feira — me lembra. — Não esqueceu dos passos, né?

— Claro que não — respondo, soltando um suspiro e encarando os livros outra vez. — Era só isso?

— Por que está assim? — Indaga.

— Assim como? — Passo a língua no lábio inferior, tentando controlar a vontade de arremessar um livro em sua cabeça.

— Tá estranha...

— É para uma experiência — sorrio, lhe deixando ainda mais confuso. — Aprendi a tratar as pessoas como elas me tratam e descobri um fenômeno surpreendente chamado; por que você tá estranha?

Scott solta uma risada frouxa, mas não o acompanho. Ele se aproxima ainda mais com a cadeira, trazendo um cheiro de menta e cigarro consigo.

— Você não é assim. Passei um mês inteiro com você, todos os finais de tarde. Pode parecer que não, mas prestei atenção em seus detalhes, comportamentos e gostos. Sei que algo está te incomodando. O que é?

Não posso negar que estou surpresa, mas isso não ameniza o incômodo chato que preenche o meu interior. Ainda sinto vontade de grudar sua cabeça contra a parede.

— Você foi embora da festa, nem se despediu e o pior; não me levou pra casa de volta — despejo, sentindo um alívio invadir meu corpo ao jogar essa merda para fora.

— Você estava bem acompanhada — dá de ombros, indiferente.

— Eu entrei na droga da festa com você! Não era sua obrigação me levar de volta, mas esperava um pouco de consideração — solto a caneta na mesa, cruzando os braços. — E se eu não tivesse ninguém para me levar? Ou pior, se tivesse acontecido alguma coisa comigo? A culpa ia ser sua!

— Minha?! — Sua voz soa esganiçada.

— Sim! Eu era o seu par, mas você saiu da festa para transar com a sua amiguinha sabe-se lá onde e esqueceu completamente de mim — não consigo evitar a voz falha e a expressão chateada.

— Ah, entendi — ele ri, umedecendo os lábios. — Está com ciúmes?

Céus! — Coloco as mãos no rosto, sem acreditar no que acabei de ouvir. — Você fode quem quiser, Scott. Não tenho motivos para ter ciúmes de você.

— Será mesmo? — Estreita os olhos em minha direção, o que me faz perder completamente a paciência. Levanto em um rompante, a cadeira quase tomba para trás. Encaro o senhor sentado atrás da mesa de madeira e agradeço aos céus que ele esteja dormindo de boca aberta sobre os braços cruzados.

— Só estou apontando o seu erro, babaca de merda — rosno, atirando meu estojo dentro da mochila. — Quem sabe assim, você não repete com seu próximo par.

Estou prestes a colocar minha mochila nas costas, pegar os livros e sair daqui o mais rápido possível. Porém, Scott se levanta e segura meu pulso suavemente, me fazendo permanecer no mesmo lugar. Meus olhos se fixam nos seus, que estão mais escuros e tempestuosos agora. Se fosse em outra ocasião, eu estaria me sentindo intimidada pela intensidade que suas íris emanam sobre mim. Mas no momento, só consigo pensar na raiva que borbulha em meu sangue.

— Que tal parar de apontar os meus erros e enxergar os seus, huh? — Ele arregala os olhos, as pupilas dilatadas enquanto se aproxima. — Eu saí por um minuto e você estava dançando com aquele playboyzinho de merda. Você era o meu par, por que não dançou comigo?

— Você não pode estar falando sério — rio, descrente. — Não compare com o que você fez. Eu dancei com o meu amigo, você me deixou na festa sem se preocupar se eu teria como voltar.

— Ele podia te dar uma carona, não podia? — Scott cruza os braços, arqueando as sobrancelhas. — Vocês são amigos.

— Quer saber? Foda-se — dispenso com a mão, sem querer prolongar a discussão. — Você errou, mas não sou seus pais para te ensinar o que é certo e o que é errado. Se na sua cabeça você é o certo da história, acredite nisso e vá para o inferno.

Seguro firmemente os livros contra o meu peito, esbarrando propositalmente em seu ombro ao passar por ele. Scott faz menção de se meter na minha frente outra vez, mas acaba desistindo quando Jimmy acorda e pigarreia.

Sempre gostei do escritório da mamãe; as janelas de vidro vão do teto até o chão, permitindo uma vista incrível de toda a cidade de Snowdalle. O prédio tem cerca de setenta e dois metros, equivalente a vinte e quatro andares. Isso significa, que consigo ver todo o Snowdalle National Park do outro lado da rua, a Misty Mountain pronta para esconder o sol atrás de si e o trânsito agitado lá embaixo. Minha mãe está concentrada analisando os tons de jeans sobre sua mesa extensa, enquanto beberico aos poucos meu café na minha xícara vermelha escrita "melhor secretária do mundo". Foi um presente de papai.

— Você está calada, aconteceu alguma coisa? — Marina para de analisar os tecidos, cruzando os braços em frente ao corpo e me estudando minuciosamente.

— Não — forço um sorriso, alisando a saia preta colada até os joelhos que compõe o uniforme da empresa. — Não aconteceu nada.

Mamãe tomba a cabeça para o lado, apertando os cílios em minha direção.

— Ana, eu sou sua mãe. Te carreguei por nove meses na barriga e convivo com você há dezessete anos. Se tem alguém nesse mundo que lhe conheça tão bem, esse alguém sou eu.

Meus ombros relaxam e a vontade de chorar se torna presente. Sinto o nó na garganta me sufocar, deixando o ar que circula em meus pulmões limitado. De repente, me vejo como a garotinha assustada de anos atrás, que ouvia um barulho ao lado de fora da janela do quarto e corria para a cama dos pais. Não sei por que a droga daquela conversa de mais cedo com Scott me deixou tão afetada. Quero me agarrar na hipótese de que meu período menstrual está perto, por isso minhas emoções estão tão ampliadas. E não pelo fato de que estou sentindo falta da convivência diária que havíamos criado nas últimas semanas.

— Briguei com um amigo — me esforço para não soar tão aborrecida. — Vamos ficar bem.

Eu vou ficar bem.

— Christopher? Scott...? — Ela chuta, colocando os cabelos ruivos para trás dos ombros e se aproximando de mim.

— Scott — engulo a bola de saliva presa em minha garganta, respirando fundo. — Mas como eu disse, vai ficar tudo bem — tomo um gole de café, casualmente, tentando transmitir justamente o que digo.

— Você tem certeza? Sabe que pode conversar comigo sobre essas coisas, né? — Assinto, recebendo um abraço apertado. — A vida às vezes dá uma pane, mas depois volta tudo ao normal. É só uma questão de tempo até vocês se acertarem, não fique remoendo isso. Só lhe fará mal.

— Obrigada, mãe — agradeço pelo seu texto curto, porém significativo para mim. Nessas horas, me pergunto por que é sempre mais fácil conversar com Francis sobre essas coisas do que com meus próprios pais. Medo de não ser levada a sério? Talvez.

— Quero ver um sorriso nesse seu rostinho bonito — sorri, me incentivando a fazer o mesmo. — Isso! Agora me ajude a escolher os tons de jeans desta coleção.

Pelas próximas cinco horas, me concentro em ajudar minha mãe com a coleção de inverno. Levo chás e cafés para o meu pai, anoto algumas encomendas e marco reuniões. Tento me manter o mais focada possível em tudo o que faço, impedindo que qualquer resquício de Scott Summer permaneça em meus pensamentos. Afinal, a única coisa que nos liga é o trabalho de artes e quando este for apresentado, não restará mais nada.

Retiro a armação preta e quadrada do meu rosto, guardando-a na caixinha do óculos em minha mochila. Respiro aliviada quando cruzo as portas duplas da empresa, sendo recebida pela brisa fria de Snowdalle. Desço os pequenos degraus até minhas sapatilhas preta estarem na calçada. Olhar para este par de sapatos me traz um lembrança não muito distante – de um mês atrás –, mas que parece de um ano. Talvez, se eu não tivesse calçado essas belezinhas e optasse pelos tênis antiderrapante, eu teria apenas esbarrado no loiro e seguido o meu caminho sem me importar com o encontrão. Mas infelizmente, o universo possui formas astutas de bolar algumas ciladas em nossas vidas.

Abraço meu corpo em todo o percurso até a parada, me sentando sobre o banco de ferro. Deveria ter colocado outro blusão, pois agora estou tremendo de frio trajando apenas uma blusa cinza de mangas compridas com a estampa do Timão & Pumba escrito em letras cursivas "Hakuna Matata" e uma jaquetinha jeans escura por cima. Estou analisando o Snowdalle National Park do outro lado da rua, quando um carro vermelho para em minha frente. Rapidamente reconheço as listras brancas sobre o capo e controlo o instinto de revirar os olhos. Scott sai do carro, fechando a porta e caminhando em minha direção. Está com a mesma roupa de mais cedo, exceto pela camiseta que agora é preta. O loiro se senta ao meu lado, curvando o corpo para frente e entrelaçando os dedos entre as pernas.

— Eu errei — sua voz é um fio, tanto é, que quase não a escuto. — Eu te convidei para a festa e era para ter saído de lá com você. Fui uma péssima pessoa.

Solto um barulhinho nasal, sem retirar os olhos do parque em nossa frente.

— Que bom que você reconheceu o seu erro.

— Eu estava um pouco chateado e acabei descontando em você — observo de soslaio quando Scott umedece os lábios, passando as mãos nos cabelos. — Desculpe — engulo em seco, finalmente desviando o olhar e fixando meus olhos em seu rosto marcado. Scott não está sorrindo, nem faz menção de me provocar. Ele parece chateado consigo mesmo. Realmente espero que esteja. — Quero recompensar — diz, ajeitando a postura. — Estou de folga hoje, posso te levar no meu trabalho.

Uno as sobrancelhas.

— Aquele bar dos universitários quase no fim da cidade?

— Esse mesmo. Vai por mim, ruivinha. Você vai adorar o lugar — completa rapidamente, após analisar minha careta de reprovação. — Estou falando sério.

Aos poucos, a angústia que assola meu peito se dissipa. Sinto vontade de sorrir, mas não quero deixar evidente a minha mudança de humor somente com a sua presença e meia dúzia de palavras trocadas.

— Não sei, não. Ainda sou menor de idade, esqueceu? — Scott sorri, negando com a cabeça.

— Não esqueci, mas você entra pela porta dos funcionários. Lá dentro não tem nenhum policial infiltrado e o Kevan é gente boa — explica, me encorajando. — O que me diz?

— Isso é tipo; vamos tentar ser amigos? — Questiono, esperançosa.

— Não posso garantir nada, ruiva. Não tenho controle sobre o futuro, somente do presente. E agora, neste momento, quero sair e beber umas cervejas com você.

Torço os lábios para o lado, ponderando minhas opções – até porque meu ônibus está dobrando a rua neste exato instante. Posso recusar e entrar no transporte público ou me acomodar no banco do passageiro do carro de Scott. Encaro o loiro mais uma vez, tomando a minha decisão.

Uma fileira com seis copinhos de vodka está em nossa frente. O senhor atrás do balcão conta até três e em seguida, sinto o líquido ardente escorrer dentro da minha garganta. Viro as cinco doses rápido demais, mas não tanto quanto Scott Summer que bebe as seis. Aceito minha derrota, afinal, ele trabalha nesse bar e deve estar acostumado com essas competições. Faço uma careta ao beber a sexta dose, mas acabo cuspindo a vodka dentro do copo novamente. Urgh! Esse troço é horrível.

Gargalho alto ao encarar o loiro, mas não o suficiente para sobressair a música country que treme o chão do Red Snakes através de uma jukebox. O bar está lotado, mesmo que em plena segunda-feira. De repente, me sinto estranha por fazer parte disso tudo assim tão do nada. Nunca me imaginei virando doses de vodka no início da semana. O ambiente não é tão grotesco quanto eu tinha imaginado. Apesar do cheiro forte de perfume masculino, cigarros e bebidas alcoólicas, tudo aqui dentro é bem limpo. O bar tem a decoração rústica, luzes vermelhas espalhadas por todos os lados, mesas redondas e cadeiras de madeira. Acho que esse lugar acabou de se tornar um dos meus preferidos.

Estamos sentados nas banquetas dispostas ao redor do balcão – também de madeira –, rindo de algo que o chefe de Scott conta sobre o loiro. O cara parece ser mais velho que o meu pai. Fios brancos enfeitam sua barba e os cabelos do homem simpático que se chama Kevan.

— Quando seu pai me ligou e disse que estavam se mudando para cá, eu quase não acreditei. Até demiti um dos meus funcionários para abrir um vaga pra você — o senhor revela, enxugando o canto dos olhos. Pelo que entendi, Kevan e Kennedy já se conheciam há muitos anos.

Scott também ri, negando com a cabeça como se não pudesse acreditar. Estou ocupada demais observando o sorriso do loiro, mal posso acreditar que estamos tendo um momento de paz, sem provocações. Nos últimos trinta minutos, tive uma certeza; Scott Summer bêbado é muito mais legal e divertido que o Scott Summer sóbrio. Quando Kevan se afasta para atender uma cliente, Scott se inclina sobre o balcão e pega uma lata de cerveja, virando-se na minha direção. Ele abre o lacre, dando um longo gole e a oferecendo para mim. Recuso.

— Por que você tá me olhando desse jeito? — Questiona, tombando a cabeça para o lado. O gesto é tão inocente, que sinto vontade de apertar seu rosto em minhas mãos.

— Você é legal — admito, analisando os detalhes de seu rosto. Paro por alguns instantes na tatuagem da cruz invertida abaixo de seu olho esquerdo. — Deveria ser assim o tempo todo.

— Você também fica mais interessante quando está alterada — imito seu gesto, sorrindo. — Suas bochechas ficam coradas e seus olhos parecem mais brilhantes. Além de que não me irrita tanto.

Empurro de leve seu braço, rindo. Ele me acompanha. Meus olhos vasculham o local novamente, parando no pequeno palco de madeira cerejeira montado no canto do bar. Aponto o indicador naquela direção, chamando a atenção de Scott para o mesmo ponto.

— Tem shows ao vivo aqui? — Pergunto.

— Ah — ele sorri. — Temos karaokê aos sábados e domingos. Às vezes algumas bandas locais fazem algum "show", mas é raro — faz aspas com os dedos.

Minha alma se ilumina.

— Vamos cantar!

— Você me ouviu? Karaokê é só aos sábados e domingos — reforça, bebendo sua cerveja.

— Se você pedir para o Kevan… — sorrio, praticamente lhe implorando com o olhar.

— Sem chances — responde de imediato. — Meu chefe não é os seus pais que fazem todas as suas vontades.

Bufo, mordendo minhas bochechas.

— Tudo bem — pego minha mochila atirada no chão, procurando minha carteira. Assim que a encontro, puxo duas notas de cinco dólares.

— O que está fazendo?

— Talvez seu chefe libere o karaokê hoje se eu lhe oferecer dinheiro — pisco em sua direção, procurando por Kevan. Scott segura minha mão, largando a lata sobre o balcão e revirando os olhos.

— Guarda seu dinheiro — murmura. — Eu peço para ele liberar o karaokê pra você.

Sorrio vitoriosa, devolvendo as notas para dentro da minha carteira. Observo enquanto Scott entra atrás do balcão, atravessando as cortinas vermelhas e sumindo nos fundos do bar. Logo em seguida, a música que toca na jukebox cessa. Alguns murmúrios descontentes se elevam dentro do bar, mas assim que notam a pequena tela que se ilumina no palco improvisado, assoviam e gritam animados. Scott aparece instantes depois, apontando o palco em incentivo para mim. Sorrio, descendo da banqueta e levando minha mão de encontro com a do loiro. Ele fica rígido diante do meu toque, mas permite que eu o guie até o palco.

— Que música você vai cantar? — Questiona, me analisando passar pelas listas de músicas com o controle. Seleciono a playlist dos anos oitenta, procurando um cantor específico. — Foreigner, huh? Até que você tem um bom gosto musical — admite, sorrindo.

I Want To Know What Love Is — olho para Scott, ele está passando a mão no queixo, balançando a cabeça como quem diz "ótima escolha".

— Espero que sua voz seja boa e não estrague esse clássico — adverte, pronto para se afastar, porém, seguro seu cotovelo. — O que foi?

— Canta comigo — peço, observando suas íris azuis saltarem de um lado para o outro do meu rosto.

— Não sou bom nisso — declara, se desvencilhando do meu toque.

— Eu também não sou — insisto. — Podemos ser ruins juntos.

— Não vou cantar na frente de um monte de gente que não conheço.

Solto uma lufada de ar, pegando os dois microfones do suporte. Estendo um para Scott, tombando a cabeça para o lado.

— Eu tenho quase cem por cento de certeza que amanhã vamos agir completamente diferente um com o outro. Os comentários sarcásticos vão voltar, as piadinhas e provocações que nos deixam putos de raiva. No entanto, nesse momento, eu quero aproveitar esse Scott Summer que eu ainda não conhecia. Se for pra gente se arrepender de algo amanhã, quero que pelo menos tenha valido a pena hoje.

Summer encara o microfone estendido em sua direção, voltando o olhar para mim e o segurando entre os dedos. Quando acho que ele vai subir no palco junto comigo, devolve o microfone cinza para o pedestal e se senta nas cadeiras em frente ao palco de madeira. Minha boca fica entreaberta por alguns segundos, mas assim que outras pessoas se juntam ao lado dele para desfrutar do meu show, volto a realidade. O loiro me lança um sorriso encorajador, sibilando um "boa sorte" em seguida.

Seleciono a música escolhida na pequena tela ao meu lado, apertando com força o microfone cinza com ambas as mãos. A verdade, é que nunca cantei para tantas pessoas assim. A quantidade de olhos voltados em minha direção é assustadora e, de repente, percebo que isso não foi uma boa idéia. Sinto minhas palmas suarem e meu estômago embrulhar quando a letra da música aparece na tela. Meus amigos e eu fomos diversas vezes no karaokê aqui da cidade, mas é fácil me soltar com eles. Tudo é animado e não esperamos muito um dos outros. É por pura diversão – embora Christopher afirme com todas as letras que tenho potencial para cantar profissionalmente.

Fecho os olhos, aproximando o microfone até meus lábios.

I gotta take a little time. A little time to think things over  — meu corpo está completamente estático ao cantar as primeiras estrofes da música, tenho medo de mover um músculo e acabar caindo como uma gelatina no palco. — I better read between the lines, In case I need it when I'm older.

Eu preciso achar um tempo. Um pouco de tempo para pensar sobre as coisas. É melhor eu ler nas entrelinhas, caso eu precise quando estiver mais velho.

Aos poucos, abro as pálpebras. Sou recebida por olhares contemplativos e curiosos, como se eu fosse uma atração rara passando por Snowdalle. Alguns caras se cutucam, balançando as mãos no ritmo lento e viciante da música. As mulheres presentes sorriem, fechando os olhos e aproveitando a melodia. Logo atrás das pessoas que estão sentadas me assistindo, noto quatro casais dançando uma valsa romântica. Acabo sorrindo.

Now this mountain I must climb. Feels like the world upon my shoulders. Through the clouds I see love shine, It keeps me warm as life grows colder — Scott analisa cada movimento meu com atenção, parecendo surpreso e admirado. Minha voz soa calma pelo bar, atingindo as notas mais graves sem nenhuma dificuldade.

Eu preciso escalar esta montanha. Parece que o mundo está sobre os meus ombros. Através das nuvens eu vejo o amor brilhar, ele me mantém aquecido enquanto a vida vai ficando mais fria.

Olhando para o loiro, consigo me soltar. Ele me incentiva, movendo a cabeça conforme balanço o corpo de um lado para o outro. Levo a mão esquerda ao peito, fechando os olhos novamente, mas desta vez, é para despejar toda a emoção que sinto ao cantar as seguintes estrofes.

In my life, there's been heartache and pain. I don't know If I can face it again. Can't stop now, I've travelled so far to change this lonely life.

Na minha vida, tem havido sofrimento e dor. E eu não sei se eu posso encarar isso de novo. Não posso parar agora, eu já fui longe demais para mudar esta vida solitária.

Afasto o microfone dos lábios, inflando meus pulmões com ar para atingir as notas mais altas do refrão. Ainda estou de olhos fechados quando uma voz masculina sobressai a minha, fazendo meu coração dar um salto sem a minha permissão e um arrepio alucinante percorrer cada centímetro do meu corpo.

I wanna know what love is. I want you to show me. I wanna feel what love is, I know you can show me. Aaaah woah-oh-ooh — a voz de Scott é como uma avalanche de sentimentos e emoções sem fim. O loiro segura o microfone com a mão direita, enquanto gesticula com a esquerda em minha direção. Não canto o refrão com ele, pois estou admirada demais com o timbre afinado, rouco e melodioso de sua voz, além de presenciar de perto o quão envolvido está ao cantar cada palavra da música. Ele sente as frases, passando isso para mim e para o restante das pessoas que nos observam.

Eu quero saber o que é o amor. Eu quero que você me mostre. Eu quero sentir o que é o amor, e eu sei que você pode me mostrar. Aaaah woah-oh-ooh.

I'm gonna take a little time. A little time to look around me — seu corpo esguio se posiciona atrás de mim, arrastando meus cabelos ruivos para o lado. Scott se curva um pouco para baixo, aproximando os lábios e o microfone até minha orelha. Sua voz é mais baixa e suave nessa estrofe. Meu corpo congela, recebendo toda a energia que emana do loiro. De repente, é como se estivéssemos sozinhos ensaiando nos finais de tarde. — I've got nowhere left to hide, It looks like love has finally found me.

Eu vou achar um tempo. Um tempo para olhar à minha volta. Não tenho nenhum lugar para me esconder, parece que o amor finalmente me encontrou.

In my life, there's been heartache and pain. I don't know If I can face it again. Can't stop now, I've travelled so far to change this lonely life — cantamos em uníssono, fazendo um tipo de encenação enquanto o refrão desliza por entre nossos lábios. A conexão e a maneira como nossas vozes se completam é surreal de tão bom. Não gosto de me gabar por ter uma voz afinada para cantar, mas nossa harmonia é invejável para qualquer um. — I wanna know what love is. I want you to show me. I wanna feel what love is, I know you can show me…

Na minha vida, tem havido sofrimento e dor. E eu não sei se eu posso encarar isso de novo. Não posso parar agora, eu já fui longe demais para mudar esta vida solitária. Eu quero saber o que é o amor. Eu quero que você me mostre. Eu quero sentir o que é o amor, e eu sei que você pode me mostrar…

Cantamos o refrão mais algumas vezes, aumentando o timbre de voz sempre que necessário. Quando a música finalmente acaba, uma sequência de assovios e palmas ecoam pelo bar. Até Kevan parou para nos assistir e sorri admirado em nossa direção. Colocamos os microfones no suporte novamente, descendo do palco e rumando até os lugares que ocupavamos minutos atrás. Duas garotas sobem no palco agora, escolhendo Justify My Love da Madonna para cantar.

Caralho — o loiro murmura ao meu lado, sorrindo. — Por que não me contou que tinha uma voz tão foda?

Caralho digo eu — solto uma risada gutural, apontando para os meus braços que ainda estão com os pelos ouriçados. — Sua voz tocou o coração que eu nem tenho — ele ri, balançando a cabeça negativamente. — Por que mudou de idéia e resolveu cantar?

— Porque se isso for realmente apenas uma lembrança amanhã quando acordarmos, quero que seja uma das melhores que vou carregar pelo resto da vida — não há mais nenhum resquício de sorriso em seus lábios. Scott está sério, sem me olhar nos olhos. Kevan coloca duas garrafinhas de água gelada em nossa frente. Agradecemos, abrindo e tomando um longo gole. — Estava estudando o que hoje? — Muda o foco, se virando totalmente para mim.

— Física e química — reviro os olhos.

— Física? Eu odeio essa matéria — admite, secando as últimas gotas de sua água sem gás.

— É a minha matéria preferida.

— A minha preferida é química — passa a língua sobre o lábio inferior, estudando meu rosto antes de completar: — Principalmente a que rola entre a gente.

Solto uma gargalhada, escondendo meu rosto entre as mãos. A verdade, é que não sei bem como reagir diante de seu comentário, então a única saída que vejo é rir como se ele tivesse acabado de contar a piada do século. Já faz uns bons minutos que tomei aquelas cinco doses de vodka, mas o efeito está surgindo somente agora. Scott ainda está me fitando, um sorriso ladino repuxando seus lábios avermelhados para cima.

— Sua cantada é brega, Summer. Melhore.

— Sabe, eu sou péssimo em física — comenta, cruzando os braços sobre o balcão e ignorando completamente meu comentário provocativo. — Acha que pode me ajudar com isso?

— O que eu ganho em troca? — Abraço meu tronco, flexionando as sobrancelhas para cima.

— Qualquer coisa que você quiser — Scott não sorri. Ele está falando sério. Penso por um instante.

— Hambúrgueres e muffins todos os dias em que nós estudarmos — aponto. — Por sua conta.

— Justo — seus lábios se projetam para cima, satisfeito com a troca.

— Ah! E quero a bebida azul que aquela moça está tomando — Scott segue o meu olhar até a mesa da morena, me encarando de volta e revirando os olhos.

— Você está me dando prejuízo — comenta, estalando os dedos para o barman que acabara de entrar atrás do balcão. — Espero que faça valer a pena.

Sorrio, colocando uma mecha do meu cabelo ruivo atrás da orelha.

— Pode apostar que vai.

AUSHAUSHAUSH
já li esse capítulo um milhão de vezes e a sensação ainda é a mesma:
quentinho no coração. 🥰

O que estão achando da história?
O comentário de vocês é super importante pra mim, então não se limitem!!!

Não esquece da estrelinha e assistam
Julie And The Phantoms!!! ❤️

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