Vigésimo Primeiro
Uma pequena multidão começara a se juntar. Felizmente para Mark, maior parte das pessoas que tinham comparecido à festa de Erick, não estavam a surgir naquela. Mas o que lhe estava a causar mais ansiedade, era o facto de finalmente poder voltar a ver Amelia. Estava sentado na área de refeições do NewScot e conseguia observar todos os que entravam. A festa começava às nove por isso Mark decidira jantar às oito.
Todos os que entravam tinham querido aparecer mais cedo, seja para jantar, ou para passar o tempo. Como o NewScot era pequeno, vinte pessoas podiam já ser uma multidão, mas naquele dia a festa ira se dividir pela cave onde, pelos vistos, existiria karaoke, e pelo andar geral, onde se poderia beber à descrição.
Parecia que a receita do álcool misterioso de Erick era secreta, pelo que ira fazê-la naquela noite no bar para quem quisesse. Isso tinha feito Mark comprar uma garrafa de whiskey e mantê-la escondida perto dos bancos onde iria estar naquela noite. Ao menos, assim, não teria de interagir com Erick. Rosie também não ficara feliz com a presença do ruivo, mas teria de o aguentar, porque toda a gente queria bebidas onde o álcool realmente funcionaria para os vampiros.
Rosie e Caleb tinham decidido ir para o NewScot mais cedo, pois Richard fora passar a tarde com Amelia. Quando entraram na pensão, Mark observou-os a aproximarem-se.
- Como está tudo desde há três horas atrás? - perguntou Caleb com um sorriso enquanto ele e Rosie se sentavam ao pé do filho.
Mark passara grande parte dos dois dias anteriores em casa de Rosie e Caleb, conhecendo algumas histórias da sua família e ouvindo-os a falar dos vampiros, embora Mark já soubesse quase tudo, graças aos livros de Hans. Como não era suposto falar aos pais que andara a falar com o líder do clã, eles também não tinham ideia que Mark já conhecia toda a história, até algumas coisas que os pais não lhe contaram, como a história dos puros. Mas Mark estava a deixar esse livro para último, então ainda não sabia muito do assunto.
- Tudo bem, aproveitei para dar a volta ao mundo duas vezes - gracejou Mark.
Caleb e Rosie gargalharam e entreolharam-se.
- Temos uma coisa para te perguntar - começou Rosie, suprimindo um sorriso com dificuldade.
- Nós esperamos que aceites - continuou Caleb, como se tivessem ensaiado.
- Até porque tens passado estes dias em nossa casa.
- Então pensamos que seria melhor para ti.
Mark olhava para os pais como se estivesse a ver um jogo de ténis.
- Perguntem lá! - pediu, curioso.
- Bom, temos um quarto a mais na nossa casa, queres ficar connosco? - acabou por perguntar Rosie, ansiosa.
Mark abriu a boca, sem saber o que dizer. Sabia que os pais se perguntavam quando tempo ele ficaria em Southward, mas o próprio Mark não sabia... Convidá-lo para ficar em sua casa, era tentador de mais. Rosie e Caleb iam embora depois do casamento de Amelia e Richard, mas até lá poderia ficar com eles. E não precisava de pensar no que tinha à sua espera quando voltasse para os Estados Unidos. Isto se quisesse voltar.
- Sim, quero - acedeu Mark, sorrindo.
Nesse momento, a porta do NewScot abriu-se deixando Amelia entrar, seguida por Richard. Naquela noite, ela parecia ainda mais bonita, se tal fosse possível. Quando os seus olhos se cruzaram, Mark sorriu instintivamente.
Caleb e Rosie viraram-se para trás e viram os noivos.
- Adivinhem só? - perguntou Caleb ao casal - Ele disse que sim.
Richard e Amelia puxaram umas cadeiras e sentaram-se. Amelia certificou-se de que ficava alguém entre ela e Mark e evitou olhar para ele.
- Sim ao quê? - perguntou Amelia, olhando para Caleb.
- A se mudar para casa deles - respondeu Richard, com um sorriso. Virou-se para Mark - O teu quarto vai ficar perto do meu, então não te espantes se de manhã ouvires música muito alta, porque essa é a única forma que eu consigo acordar.
- Desde que não acordes cedo, por mim tudo bem - concordou Mark, contendo a vontade de rir.
Ainda não decidira o que pensar sobre Richard. Sentia que este estava a ter a vida que Mark poderia ter tido, ao crescer com Rosie e Caleb, namorando com Amelia e estando atualmente noivos. Não conseguia evitar odiá-lo um pouco por isso. Por outro lado, era o seu irmão, mesmo que não fosse de sangue, e quase da sua idade. Queria se dar bem com ele.
O NewScot começava a encher e cada vez mais pessoas passavam pela mesa deles, seja para congratular Richard e Amelia, seja para conhecer Mark. Elisabeth entrou no NewScot quando já eram quase nove da noite, olhando em volta, aproximando-se da mesa quando os viu.
- Olá a todos - cumprimentou, procurando um lugar para se sentar.
Rosie começou a olhar em volta, tal como Amelia, bastante espantadas. Vendo-as à procura de Hans, Elisabeth riu-se.
- Eu vim sozinha - explicou.
- Uau! - exclamou Rosie, mas fazendo mais nenhum comentário.
- Não estava mesmo a ver o meu pai a aparecer neste tipo de festa - disse Amelia, com uma gargalhada constrangida.
Um silêncio instaurou-se na mesa. Não estavam habituados a conversar com Elisabeth sem esta ter Hans ao pé dela. Até Caleb, que passara a ter uma relação mais distante com a irmã, não sabia o que lhe dizer. Richard acabou por quebrar o silêncio.
- Onde está Bella? - perguntou, olhando em volta - Ainda não a vi hoje.
- Acho que a vi perto do bar.
- Sim, deve ser porque o Erick está a fazer aquelas bebidas esquisitas dele - supôs Amelia.
Rosie, querendo mudar de assunto, olhou para o relógio, percebendo que já eram nove da noite. Olhou em volta, procurando por Charles ou Harry. Nenhum deles estava à vista.
- Charles! - chamou ela, gritando e assustando todos os que estavam à sua volta.
Poucos segundos depois, Charles aproximou-se da mesa deles.
- Credo mulher, não sabes falar como uma pessoa normal? - perguntou, com uma gargalhada.
- Uma pessoa normal já teria reparado que eram nove e encaminhado a multidão para a cave - reclamou Rosie - Daqui a pouco parecemos sardinhas enlatadas.
Charles olhou para o seu próprio relógio e percebeu que Rosie tinha razão. Começou a caminhar e bateu palmas, chamando a atenção para ele. Como tinha uma voz grave e profunda, todos o ouviram falar.
- Pessoal, o salão de festas vai abrir agora, se quiserem descer - avisou Charles.
Todos se levantaram e a maior parte das pessoas que estavam no NewScot, seguiram Charles que começara a descer as escadas até à cave. Quando abriu a porta do salão, as pessoas começaram a se sentar, seja nos sofás, ou nas mesas disponíveis. Caleb, Elisabeth, Richard, Amelia e Mark, sentaram-se nuns sofás perto de um palco improvisado. Na verdade, nem se podia se chamar assim, pois ficava ao mesmo nível que o resto da sala, mas aquele ponto, com uma máquina de karaoke e um ecrã de televisão, era o mais iluminado.
Rosie caminhou para o palco e bateu palmas, esperando que todos se sentassem e calassem. Mark reparou no quão confortável ela se sentia na frente de uma multidão.
- Antes de abrirmos as hostilidades e iniciarmos uma das típicas festas com o meu selo de qualidade - começou Rosie, piscando um olho - Temos uma pequena surpresa para os noivos. Um pequeno vídeo que fizemos.
Rosie pegou num pequeno comando e o ecrã de televisão atrás de si acendeu-se. Mark aproveitou a oportunidade para pegar na garrafa de whiskey que tinha escondido debaixo do banco, desenroscando-a e dando um gole. Para passar aquela noite, apenas com bebida. Um vídeo cheio de montagens com fotografias de Amelia e Richard começou a passar pelo ecrã, acompanhado de um música um tanto ou quando lamechas de um cantor atual.
O tempo total do vídeo não era muito, apenas dois minutos, mas pareceu a Mark uma eternidade enquanto toda a gente deitava interjeições e comentavam o quão bem eles pareciam juntos. Nesses dois minutos, um terço do whiskey desapareceu. Por sorte, estavam todos tão concentrados no vídeo, que ninguém reparou nele. Voltou a esconder a garrafa debaixo do banco.
Rosie voltou a aproximar-se do palco quando o pequeno vídeo acabou e todos batiam palmas.
- Acho que agora todos estão prontos para iniciar esta festa. Normalmente sou eu que começo, mas como esta não é uma festa qualquer, acho que quem deve começar são os noivos não é?
Começaram todos a bater palmas e a chamar por Richard e Amelia, enquanto ela abanava a cabeça. Richard insistiu e acabou por a convencer a levantar-se enquanto ela se sentia a morrer de vergonha. Rosie deu-lhes espaço para se colocarem atrás da máquina de karaoke. Amelia não estava à espera de cantar logo no início, apenas esperava lá para o meio da festa, quando estivesse toda a gente já a conversar e as atenções desviadas deles.
- O que queres cantar? - perguntou Richard, verificando as músicas que existiam.
- Alguma coisa leve - pediu Amelia, olhando para as pessoas, notando que a maioria das pessoas já não lhes prestavam muita atenção, pois estavam a tentar escrever o nome delas na lista que passava pelas mãos de todos, para serem os próximos a cantar - Pode ser esta - acabou por escolher, vendo uma das suas músicas favoritas a surgirem.
Quando as batidas iniciais de "Africa", da banda Toto, começaram a tocar, o nervosismo aumentou, especialmente por ter os olhos de Mark pregados nela. Felizmente, ela e Richard cantariam ao mesmo tempo, por isso ninguém ia prestar muita atenção na sua voz, que de outra forma pareceria uma cana rachada.
Mark pensava em procurar novamente a garrafa de whiskey quando sentiu alguém a tocar-lhe no braço. Olhou para o lado e viu Rosie, que se sentava a seu lado, falando de forma a que ele a conseguisse ouvir por cima da música.
- Se quiseres te inscrever, é melhor ires agora, porque acho que até há pessoas a colocarem os nomes duas vezes - avisou ela, sorrindo. Sentia um orgulho imenso das festas que organizava.
- Ah não, não é muito a minha cena - recusou Mark, sorrindo.
- Vá-la, eu até posso cantar contigo - insistiu Rosie.
- Vou pensar então - prometeu Mark, não querendo recusar, mas também não querendo dizer que sim.
Esperava conseguir se escapar àquela lista durante o resto da festa. Nunca pensou ver uma coisa daquelas: vampiros cantores. Parecia algo saído de uma série adolescente.
Voltou a prestar atenção à atuação de Richard e Amelia. Eles até se estavam a sair bem. Não eram os melhores cantores do mundo, claro, mas Mark já ouviria muitas coisas piores em outros bares de karaoke a que Wally o forçara a ir. Iluminada pelas luzes coloridas que balançavam por cima deles, fazendo o cabelo branco de Amelia brilhar, Mark não pode deixar de se lembrar dos sonhos que havia tido com ela.
A música acabou sem que Mark percebesse e várias pessoas bateram palmas, as quais Mark acompanhou. Quando vieram se sentar, Richard ficou perto dele. Rosie e Caleb levantaram-se os dois.
- Agora vais ver uma coisa que nunca esperarias - comentou Richard, para Mark.
- O quê?
- Quando dizem que a nossa mãe é uma ótima cantora, não estão a mentir - explicou Richard, embora Mark nunca tivesse ouvido tal coisa - Já vês.
Ficara interessado. Nunca ouvira aqueles rumores, mas ficara curioso. Os dois escolheram a música bastante rapidamente, parecendo até já a terem treinado. Isso na verdade não era de admirar, Rosie parecia bastante focada naquilo que lhe interessava.
Mark reconheceu a música rapidamente, pois era uma das que parecia que nunca iria desaparecer das rádios: "Perfect". Quando Caleb começou a cantar a parte que pertencia a Ed Sheeran, Mark percebeu que o pai até nem cantava nada mal. Mas nada se comparava a Rosie.
Quando ela começou a cantar, todos bateram palmas e Mark também ficou com vontade de o fazer. A voz de Rosie não poderia ser explicada, não em comparação à de Beyoncé, mas era tão boa quanto. Era incrível! Mark não percebia como uma voz daquela estava escondida numa vila no meio do nada. Ou melhor, até percebia... A razão que os fazia a todos se esconderem: o facto de serem vampiros.
No final da música, todos se levantaram para aplaudir, fazendo um barulho estrondoso naquele lugar. Mark também se levantou, embora com o coração um pouco apertado. A sua mãe merecia mais do que estar fechada a cantar naquele sítio. O mundo deveria conhecer a sua voz. Mas isso nunca seria possível. Limitou-se a abraçá-la quando Rosie se aproximou dele.
- Isso foi fantástico! - exclamou Mark, quando se afastou de Rosie.
- Obrigada - agradeceu ela, sorrindo.
- Apenas mais um dia aqui em Southward - disse Richard, abraçando também a mãe.
Quando os abraços e felicitações acabaram, Rosie deu a mão a Caleb, que olhava para ela como se fosse a oitava maravilha do mundo.
- Vamos até ao bar, querem alguma coisa? - perguntou Rosie, sorrindo.
Amelia, Mark e Elisabeth negaram, mas Richard decidiu acompanhá-los. Enquanto isso, o próximo grupo havia começado a atuar, mas depois de ouvir Rosie parecia que mais ninguém era tão bom.
Uns minutos depois, Elisabeth levantou-se para falar com umas pessoas conhecidas, deixando Mark e Amelia sozinhos. Vendo uma oportunidade de finalmente falar com Amelia, Mark deslizou no sofá até se aproximar dela.
- Como estás? - perguntou Mark - Nunca mais te vi.
- Sim, tenho andando ocupada com os preparativos do casamento - respondeu Amelia, evitando olhar para Mark.
- Quando vai ser?
- O quê? - perguntou Amelia, cometendo o erro de olhar para Mark.
Cada vez que se encontrava com ele parecia que ficava mais atraente, como era possível? Olhar nos seus olhos, fazia-a esquecer do mundo em volta, nem ouvindo sequer a dupla desafinada que se encontrava a cantar no momento. Sabia que tinham sido aqueles olhos em Rosie, desafiadores e intrigantes, que teriam cativado Caleb e agora estava a perceber que estes em Mark estavam a ter o mesmo efeito nela.
- O casamento - explicou Mark, levantando as sobrancelhas.
- Ah, sim, não temos uma data fixada ainda - disse Amelia, concentrando-se e voltado a desviar-se do olhar de Mark.
- Hum.
Mark continuava a olhar para Amelia, sem saber o que mais dizer para puxar conversa. Esta voltara a olhar para o palco e quase nem pestanejava, sentindo-se bastante nervosa com a proximidade de Mark. Nesse momento, alguém os afastou, saltando por cima do encosto do sofá, sentando-se no meio deles. A pessoa afastou os braços, cada um rodeando os ombros de Mark e Amelia.
- Como vão os meus dois amigos? - perguntou Erick, apertando-os.
Mark e Amelia olharam bastante espantados para Erick, estranhando a sua audácia e boa disposição depois de tudo o que tinha acontecido. Amelia, ao olhar para os seus olhos, percebeu que ele estava um pouco embriagado. Pelos vistos, aquela mistela funcionava mesmo.
Mark sacudiu violentamente o braço de Erick de cima dele e Amelia imitou-o.
- Não tens que ir aturar os bêbados? - perguntou Mark, enfurecido, levantando-se.
- Então, porquê essa hostilidade?
- Sai daqui Erick - pediu Amelia após um suspirou exasperado.
Erick levantou os braços em sinal defensivo e ergueu-se, indo embora. Mark bufou e voltou a sentar-se, retirando debaixo do sofá a garrafa de whiskey, aproveitando para beber uma parte.
- A cara de pau daquele tipo. "Porquê essa hostilidade?" - imitou Mark, afinando a voz - Como se ele não soubesse...
Amelia olhou-o, não respondendo, e tirou de seguida a garrafa de whiskey das suas mãos.
- Não vais beber isto tudo, pois não? - perguntou, olhando para o rótulo.
- Porque não? Isto não é uma festa?
- Porque se fores beber cada vez que algo te incomoda ficas sem bebida a meio da noite.
Mark sorriu, vendo sentido nas palavras de Amelia. Voltou a pegar na garrafa, tocando ao de leve nos seus dedos. Permaneceram os dois naquela posição durante alguns segundos, até que Amelia a largou, constrangida. Enquanto Mark se virava para voltar a esconder a garrafa, Amelia respirou fundo. Tinha de se acalmar, permanecer o mais serena que pudesse, antes que alguém começasse a reparar.
Alguém se aproximou deles, entregando a Mark uma prancha onde estava preso um papel repleto de nomes. Parecia-se com a lista onde as pessoas se estavam a inscrever no karaoke. Rosie, que estava a chegar naquele momento, acabou por ver Mark pegando na lista e bateu palmas, feliz da vida.
- Sim, eu sabia que tu ias te inscrever! - exclamou, assustando Mark que não a vira próximo dele.
- O quê, eu não...
- Onde é que está a caneta? - perguntou Rosie olhando em volta, após reparar que faltava algo na prancha. Não ligou aos protestos de Mark - Quem já me tirou a caneta?
Enquanto Rosie partia à caça da caneta perdida, Mark olhou para Amelia que desviou o olhar, tentando não se rir. Mark apertou os lábios, sem saber o que dizer. Fora apanhado. Devia ter acabado com a garrafa de whiskey enquanto pudera.
* * * * *
Durante a noite, Rosie fizera algumas atuações surpresa, cantando todos os seus géneros favoritos desde jazz a rock. Mark fizera de tudo para escapar à sua vez de ir ao palco, mantendo-se ocupado grande parte do tempo e ficando principalmente no andar superior. Mas tinha a certeza que Rosie não se ia esquecer dele.
Amelia decidira se afastar de Mark o resto da noite, contudo, cada vez que o encontrava, reparava na presença de algumas mulheres que falavam com ele cheias de sorrisos. Mark parecia não notar. O que se passava com os homens daquela família que nunca pareciam perceber nada do que se passava mesmo à frente dos seus olhos? Revoltada, não pôde deixar de evitar de sentir um pouco de ciúmes, mesmo que não o admitisse para si própria.
Depois de um grupo de três rapazes ter cantado "My Sharona", Rosie apressou-se a pegar o microfone. Começaram todos a bater palmas, pensando que ela ira cantar de novo.
- Calma, não sou eu que vou cantar - avisou Rosie - Ainda...
Foi nessa altura que Rosie chamou Mark, que desejava um buraco para se enterrar. Felizmente estava pouca gente no salão naquela altura e metade não estava nem a prestar atenção. Rosie pegou na guitarra que trouxera de casa, começando a tocar alguns acordes da música. Mark aproximou-se dela e pegou num dos microfones.
- Juro que se não cantares comigo, eu morro aqui - avisou Mark.
- Estou a guardar-me para o refrão.
Amelia sentou-se numa das mesas, querendo prestar atenção no que iria acontecer. Pelos acordes, parecia que Mark ia cantar "Hotel California", dos Eagles. Uma vez que começou a cantar, Amelia ficou surpreendida. Mark cantava muito bem, claramente saíra à mãe. Richard aproximou-se de Amelia, sentando-se ao seu lado.
- Canta bem, não achas? - perguntou Richard - Podia era ter escolhido uma música menos assustadora.
Amelia assentiu. Maior parte das pessoas considerava aquela canção como fazendo parte do grupo de músicas com um sentido oculto que muitos achavam amaldiçoado. Mas cada um interpretava a letra à sua maneira, existindo vários significados. Amelia não pôde deixar de a associar ao que Mark passara nos últimos dias.
As outras pessoas que se encontravam na sala não pensavam naqueles pormenores e apenas escutavam a sua atuação. Algumas das mulheres que tinham rodeado Mark durante a noite pareciam bastante atentas ao ouvi-lo cantar.
Quando a atuação finalmente acabou, Mark saiu o mais rápido que pôde da frente dos olhares de todos e voltou a sentar-se no sofá, repensando todas as escolhas que fizera na sua vida. Não que não tivesse gostado de cantar com Rosie, porque gostara, só não o apreciava ter feito em frente de outras pessoas. Ainda bem que naquele lugar não havia internet. Rosie aproximou-se, sentando-se perto de Mark.
- Mais estes e depois fecho a noite - declarou, com um sorriso de satisfação, referindo-se às pessoas que se aproximavam do palco - Saíste-te bem.
- Obrigado - agradeceu Mark - Mas isto não é bem...
- A tua cena, sim tinhas dito. Mesmo assim, cantas muito bem.
Rosie colocou uma mão no seu ombro e levantou-se. Mark suspirou. Por muito bem que ele cantasse, não gostava de o fazer em frente de pessoas que não conhecia. Com certeza não herdara a veia artística de Rosie.
Decidiu manter-se sentado e calado durante tempo suficiente para que as pessoas se esquecessem do que acontecera. Só que isso não impediu que uma mulher que ele não conhecia se sentasse ao seu lado.
- Olá - disse, cumprimentando-o com um sorriso misterioso.
Possuía um cabelo comprido, escuro e muito liso, além de uns olhos bastante pretos. Contrastando, a sua pele era profundamente branca, fazendo Mark pensar se não teria a própria Branca de Neve à sua frente. Quando falou, Mark percebeu um leve sotaque que pensou ser do leste da Europa.
- Cantaste muito bem, adorei - elogiou-o ela.
- Oh, obrigado - agradeceu Mark com um pequeno sorriso.
- Eu chamo-me Valeska - apresentou-se.
- Sou o Mark.
- Sim, eu sei. Acho que todos aqui sabem - lembrou Valeska enquanto olhava em volta - Fico feliz que tenhas reencontrado a tua família após tanto tempo.
Mark ainda não se habituara ao facto de todos o parecerem conhecer antes de ele próprio conhecer as pessoas. Essa era uma das desvantagens de a sua família viver num local tão pequeno e remoto. Não havia mais nada para fazer, ao não ser se meter na vida dos outros.
Valeska sacudiu os seus cabelos escuros, sorrindo.
- Ouve, estive a pensar. Se quiseres, um dia destes podemos nos encontrar e beber qualquer coisa - sugeriu, enquanto continuava com o seu sorriso sedutor - Podia levar-te a conhecer partes de Southward a que ainda não foste. Duvido que tenhas já tenhas saído aqui da praça. Pode não parecer, mas Southward é maior do que isto.
Valeska estava mesmo a convidá-lo para sair? Mark queria recusar, mas, por um lado, queria conhecer mais de Southward, por outro, gostaria de tirar Amelia da sua cabeça. E tinha de admitir, Valeska era bem bonita.
- Sim, quer dizer, claro, podemos fazer isso um dia destes - concordou Mark, não resistindo a sorrir de volta.
- Ótimo - disse Valeska, com uma pequena gargalhada.
Aproximou-se de Mark e beijou-o na face, partindo depois com um sorriso nos lábios. Quem não ficara satisfeita com esse encontro fora Amelia. Tinha os ouvido falar desde que Valeska se aproximara dele. Se algum sangue corresse nas suas veias, ele teria fervido naquele momento. Por isso, limitou-se a dobrar tanto uma pequena colher nas suas mãos que ficara a parecer uma bola.
Quando largou o objeto, olhou para ele, espantada. Nem tinha reparado no que estava a fazer. Pegou na pequena bola de metal e guardou-a num bolso, antes que alguém fizesse perguntas. Amelia tinha de avisar Mark sobre Valeska. Queria levantar-se e falar com ele no mesmo momento, mas nessa altura começou a entrar mais gente na sala. Era altura da última atuação de Rosie.
Todos os membros da família regressaram aos lugares originais. Nessa altura, até Bella se lhes juntou. Elisabeth sentara-se perto de Mark, sorrindo-lhe simpaticamente. As pessoas continuavam a juntar-se, mas Rosie ainda não tinha chegado de onde quer que ela tivesse ido. Mark olhou de esguelha para a tia, morto de curiosidade para lhe perguntar algo.
- O Hans não veio porque toda a gente tem algo contra ele? - perguntou de caras.
Elisabeth engoliu em seco, mas não se recusou a responder a Mark.
- Também fez parte da razão - confessou. Olhou em volta e virou-se para Mark, baixando a voz - Ouve, ninguém gosta dele, mas por coisas que ele fez há muito tempo, no passado. Mesmo assim, nada é como o que te contaram, seja o que for. Ele é muito fechado e nunca explica o que faz, ou porque o faz, mas Hans é uma boa pessoa. Se algum dia descobrires o homem por detrás daquela fachada, vais entender.
Mark ficou sem saber o que dizer. Apenas assentiu, enquanto ao mesmo tempo irrompia uma salva de palmas para Rosie que se aproximava com uma guitarra em mãos. Mark também bateu palmas, tal como Elisabeth, mas embora esta o fizesse de forma menos entusiástica. O que ela dissera intrigara Mark. Muito. Podia Elisabeth estar apenas cega quanto ao homem com quem tinha casado, ou as suas palavras tinham algum sentido?
Não conseguiu prestar muita atenção a atuação de Rosie, que cantara alguma música do Bryan Adams e ficou apenas a pensar no discurso de Elisabeth. Aquela história ainda não estava bem explicada e Mark tinha de descobrir mais informações.
* * * * *
Uma vez no final da festa, Mark decidiu subir para o seu quarto. Aquela seria a última noite que ali passaria, sendo que no dia seguinte se mudaria para casa dos pais. Abriu a porta e, como o sono não veio, começou a reunir todas as suas coisas na mochila, incluindo os livros de Hans. Ainda não o visitara desde que descobrira todas aquelas coisas sobre o seu passado, mas teria de o fazer num futuro próximo.
Deixou-se cair em cima da cama e suspirou. Ainda ouvia movimentações no andar de baixo. Ele devia vestir um pijama para dormir, mas a vontade faltava-lhe, até porque com o frio que estava naquele quarto, tinha medo de congelar assim que se despisse.
Sentia a sua cabeça a girar levemente, graças ao álcool. Não acabara de beber a garrafa de whiskey, mas esta ficara no mesmo sítio. Mark esquecera-se de a trazer para o quarto. "Que desperdício", pensou. Amanhã iria buscá-la.
Ouviu batidas na porta do quarto, mas decidiu ignorá-las, esperando que fosse engano. Mas após mais umas batidas insistentes, Mark levantou-se e bufou. Quem seria àquela hora? Abriu a porta de rompante e viu Amelia na sua frente.
- Desculpa incomodar-te, mas temos de falar - disse, entrando no quarto, disfarçando o seu nervosismo.
- Claro, entra - resmungou Mark baixinho.
Voltou a fechar a porta e voltou-se para Amelia. Não que não a quisesse ver, o problema era o que aconteceria se ficassem sozinhos novamente.
Amelia também pensara no mesmo, mas acreditara que o tinha para lhe dizer era mais importante do que uma atração ridícula. Esperava se conseguir controlar.
- Eu vi-te a conversar com Valeska - explicou ela, indo direta ao assunto.
- E então?
- Não te podes encontrar com a Valeska, ela pertence ao grupo de amigos de Erick - revelou Amelia, levantando as sobrancelhas e cruzando os braços.
- Eu vou sair com a Valeska, não com o Erick - explicou Mark, cruzando também os braços - Aliás, como é que sabias que eu me ia encontrar com ela?
Aquela questão deixou Amelia sem palavras. Metera os pés pelas mãos. Gaguejou antes de conseguir dizer alguma coisa.
- Eu... adivinhei - acabou por dizer - Uma mulher linda como ela a interpelar alguém tão...
Amelia interrompeu-se antes de terminar. Estavas prestes a dizer que Mark também era bastante bonito, mas não teve coragem de o admitir diante dele.
- Tão quê? - perguntou Mark, sorrindo e aproximando-se dela, descruzando os braços.
- Tão... ingénuo - improvisou Amelia, embora não estivesse a dizer nenhuma mentira - Sim, porque um humano não se pode envolver assim com um vampiro pode até ser perigoso.
- A sério? Quem diria que estavas noiva de um humano...
- Mas nós nunca fomos além de nos beijar - explicou Amelia, afastando-se de Mark e começando a gesticular, tal como fazia quando estava nervosa - Depois disso, tudo é perigoso! Um vampiro consegue controlar quando se transforma, excepto em certas situações...
- Quer dizer que tu e o Richard... - começou Mark, mas sendo interrompido por Amelia.
- Nunca! É demasiado perigoso! Um humano e um vampiro não se podem envolver dessa forma - avisou Amelia.
- Então como é que o Caleb é filho de uma humana e um vampiro? - perguntou Mark, duvidando daquela teoria.
- Isso não significa nada. John Southward andava sempre pelo mundo a fazer sabe-se lá o quê. Provavelmente das primeiras vezes que tentou acabou por matar alguém ou nessa altura teve apenas sorte...
Mark fungou, quase deixando escapar uma gargalhada.
- O que é que foi? - perguntou Amelia, espantada, parando para olhar para Mark.
- Viste Valeska vir falar comigo, ouviste o que estávamos a dizer, combinando um simples encontro... - disse Mark, voltando a aproximando-se perigosamente de Amelia - Mas vieste até aqui preocupada com o facto de eu poder ir para a cama com ela.
- Eu não ouvi...
Mark continuava a observá-la de uma forma bastante intensa e Amelia não conseguiu continuar. Reparou que agora estavam bastante perto um do outro, de forma a que Amelia conseguisse sentir a respiração dele no seu rosto.
Colocou uma mão no seu ombro, querendo afastá-lo, mas não chegou a fazer tal movimento, conseguindo apenas retribuir o seu olhar. Mark colocou a sua mão por cima da dela, percorrendo lentamente todo o seu braço e corpo até parar na cintura. Nessa altura, eles apenas miravam os lábios um do outro, pensando se deveriam beijar-se.
Naquele momento em que estavam sozinhos, não conseguiam ouvir mais nada. Não perceberam as vozes de pessoas naquele andar, abrindo as portas dos seus quartos. Não ouviram uma pequena discussão no andar de baixo. A única coisa que ouviam, era a respiração acelerada de um do outro.
Amelia acabou por fechar os olhos, aproximando os seus lábios dos de Mark, mas não chegando a beijá-los. Ficaram naquela posição alguns segundos, nenhum querendo dar o primeiro passo. Como podia algo ser tão errado, se parecia tão certo? Assim, não aguentando mais, Mark começou a beijar Amelia. Esta sabia que não podia se deixar levar, mas não resistiu.
Mark colocou as suas mãos na cintura de Amelia, puxando-a para perto de si, enquanto Amelia apoiou os seus braços em volta o pescoço dele, entrelaçando os dedos no seu cabelo. Como podia ter passado tanto tempo sem nunca ter feito aquilo?
Os dois só queriam que aquele beijo fosse eterno, queriam ficar presos naquele momento. Desejavam que ele nunca acabasse.
Mas o tempo não para.
* * * * *
Nota da Autora:
Posso dizer com total propriedade que este é o capítulo mais cliché que escrevi em Barbastella. Talvez a ideia funcionasse melhor em série, ou filme, mas não podia deixar de a escrever, porque este capítulo soa incrivelmente bem na minha cabeça. Só não sei se o consegui escrever tal como o imaginei. Espero que não tenham sentido muita vergonha alheia ahah
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