Décimo Oitavo
Após ter dado uma volta na floresta, aproveitando para relaxar um pouco no miradouro, Amelia decidiu voltar para casa. No dia anterior tinha viajado com Richard até Castle Cove, tentando encontrar alguém que os ajudasse a resolver a situação da rede de telemóvel e internet pendente. No Vale havia pelo menos telefone fixo, mas em Southward nem isso existia... tentar modernizar aquele lugar era um trabalho mais difícil do que ela julgara.
Quando estava a subir a rua para a mansão, encontrou Bella a descer, com uma expressão fechada e dando passos fortes no chão como se quisesse esmagar alguma coisa.
- O que aconteceu? – perguntou Amelia quando Bella passou por ela.
- Pergunta ao teu pai e ao mais novo amigo Mark – gritou, sem parar de caminhar.
Amelia parou, estupefacta. O quereria ela dizer com aquilo? Mark e Hans andavam a encontrar-se? Qual era o interesse do seu pai em Mark? Ele, que tinha sido um dos principais fatores que levara Rosie a se separar do filho. Não valia a pensa falar com Hans, este nunca lhe diria nada. Teria que optar por outra estratégia: ir falar diretamente com Mark. E se fosse necessário contar-lhe a sua história, não havia problema. Tinha que avisar Mark do perigo que Hans era.
Rodou os calcanhares e mudou o seu rumo para conseguir chegar ao NewScot o mais rápido possível. Abriu a porta da pensão, com uma expressão preocupada no rosto. Charles, que estava de serviço no bar, chamou-a.
- Está tudo bem? – perguntou, quando Amelia se aproximou dele.
- Mark continua a dar-se com Hans – explicou Amelia, nervosa.
- E então? Ele é um tipo intragável, mas duvido que fizesse qualquer coisa a Mark – disse Charles, colocando ao ombro o pano com que havia estado a limpar o balcão.
- Isso é porque não o conheces como eu – afirmou Amelia, suspirando, preocupada – Apenas estar perto dele é o suficiente para mudar a mente de uma pessoa.
Charles franziu o sobrolho e baixou a voz, aproximando-se mais de Amelia. Tinha-lhe ocorrido uma ideia não muito agradável.
- Achas que ele o está a persuadir? – arriscou Charles.
Amelia não disse nada, sentando-se num dos bancos em frente do balcão. Essa ideia já lhe passara pela cabeça.
- Honestamente, não faço ideia – confessou – Mas todos sabem que o meu pai não é uma pessoa confiável. Sei lá quais são as intenções dele.
- Já falaste com o Hans? – quis saber Charles.
- Não – disse Amelia, esperando que Charles não a recriminasse por isso – Mas ele não me iria responder. Por isso vim falar com Mark.
Charles acenou, olhando para cima, para o local onde o quarto de Mark se encontrava.
- Por falar em Mark – começou Charles, esperando que o tema não acrescentasse mais stress a Amelia – Eu acho que ele não está muito bem.
- Como assim?
- Não sei, desde que cheguei, tenho a impressão de que está alguma coisa errada. Não consigo dizer o quê – Charles observou Amelia, adivinhando o que ela estava a pensar – Não penso que tenha nada a ver com o Hans. Ele ontem foi a uma festa que havia em minha casa. Pelo que soube, Erick convidou-o.
Amelia apoiou os cotovelos no balcão e escondeu a cara nas mãos. Suspirou e voltou a encarar Charles. Eram sempre as mesmas pessoas a causar confusão...
- Erick... O que é que aconteceu?
- Só ouvi rumores – explicou Charles – Mas como só os amigos do Erick estavam lá na altura em que supostamente aconteceu qualquer coisa, não consegui que alguém me explicasse.
- Não acredito nisto! – exclamou Amelia, levantando-se de repente – Aquele Erick só sabe causar problemas! E se a Rosie sabe? Agora é que ela acaba com ele!
Charles apertou os lábios, não sabendo o que dizer. Amelia despediu-se do amigo e começou a subir as escadas. Porque é que só encontrava problemas? Parecia que nos últimos dias tudo vinha ter com ela. Logo com ela, que tinha tudo menos jeito para lidar com aquelas questões.
Uma vez em frente da porta do quarto de Mark, respirou fundo e bateu duas vezes. Era a terceira vez que se encontrava sozinha com Mark e só esperava conseguir controlar-se como fizera nas duas primeiras. No entanto o seu sorriso fazia sempre as pernas de Amelia tremerem e sentir um aperto no estômago.
A porta abriu-se e um Mark espantado recebeu-a. Não estava nada à espera de a encontrar, muito menos que fosse a própria Amelia a bater à sua porta.
- Bom dia – cumprimentou-a, sorrindo – O que estás a fazer aqui?
- Tenho que falar contigo sobre uma coisa importante – revelou, entrando no quarto e deixando Mark fechar a porta.
Viu-o esconder a mão esquerda num bolso do suéter, mas antes Amelia reparou que o seu pulso estava um pouco inchado. Quando Mark caminhou para a frente dela, tentou puxar a sua gola o mais para cima possível, mas Amelia impediu-o.
- Espera, o que aconteceu? – perguntou, enquanto colocava á vista algumas nódoas negras recentes à volta do pescoço.
Mark afastou as suas mãos suavemente.
- Não te preocupes – disse.
- Preocupo-me sim – exclamou Amelia – O que é que o Erick fez?
- Estou a ver que ele é o bode expiatório cá do sítio – concluiu Mark, rindo-se.
- Não brinques com isto! – pediu Amelia, não escondendo a preocupação no tom da sua voz – O que é que aconteceu?
- Nada!
- Mark, se aconteceu qualquer coisa tens que me dizer! – insistiu Amelia.
- Porquê?
Amelia abriu a boca, mas não soube o que responder. Não estava à espera daquela reação por parte de Mark. Permaneceu em silêncio durante alguns segundos. O que podia ela fazer?
- Eu... eu falo com o Erick – acabou por dizer.
- E ia mudar alguma coisa? – perguntou Mark, calmamente.
Amelia suspirou, sem saber o que lhe dizer. Sentou-se na beira da cama de Mark.
- Provavelmente não – confessou Amelia. Ele tinha razão – Mas eu também não posso ficar sem fazer nada. E o Erick não se pode safar desta. Não outra vez.
Mark aproximou-se de Amelia e encostou-se na parede que ficava na sua frente.
- Ouve, o melhor é ninguém saber que isto aconteceu – sugeriu Mark – Pronto, descobri a maçã podre de Southward, de agora em diante nunca mais falo com ele.
- Isso vai ser difícil – explicou Amelia – Ele é uma espécie de namorado da Bella.
Mark inspirou lentamente e olhou pela janela. Lembrou-se do momento em que vira Bella a sair da casa de Erick no momento em que ele chegara. Perguntou-se se não deveria mesmo contar a Amelia o que sucedera na noite anterior.
- Bom, eu também posso tê-lo provocado um bocado – confessou.
Amelia olhou para Mark com um ar interrogativo. Ele rebolou os olhos e decidiu contar uma parte do que acontecera.
- Erick estava a ser um completo idiota. E pronto, eu...
- Sim? – insistiu Amelia quando Mark fez uma pausa – O que aconteceu?
- Tentei bater-lhe. Quer dizer, eu fervo em pouca água e ele estava a ver se me provocava – explicou Mark – Aproveitei a deixa e ele arranjou uma desculpa para fazer o que fez.
Amelia deixou escapar uma pequena gargalhada incrédula.
- Eu não acredito – acabou por dizer.
- O quê?
- Quero dizer, isso é uma reação mesmo à Rosie – explicou Amelia estupefacta – É incrível.
- Não foi incrível na altura – disse Mark, um pouco magoado.
- Eu sei, desculpa – lamentou Amelia – Deixa-me só expressar o meu choque por um segundo.
Mark acabou por rir e Amelia, sem querer, imitou-o. Sentou-se perto dela, mas mais uma vez tentou se apoiar no pulso que tinha ferido. Ela reparou e pegou na sua mão.
- Provavelmente devias pôr gelo nisso – avisou Amelia, observando o pulso – Está um bocado vermelho.
- Sim, depois faço isso – prometeu Mark.
- Tens a certeza de que eu não posso fazer nada? – voltou a insistir Amelia – Acho mesmo que devia falar com o Erick.
- Não, ia só criar problemas, não vale a pena.
- Se o dizes.
Ainda com a mão de Mark apoiada nas suas, observou o seu pulso avermelhado. Ela sempre fora vampira, então não sabia como era ter feridas que podiam durar dias ou semanas. Se partia um braço ou uma perna, curava-se em uma ou duas horas. Uma pequena ferida regenerava-se em poucos minutos.
- Então, o que viste aqui fazer? – perguntou Mark, curioso, observando Amelia.
Nesse momento, Amelia percebera que retera a mão de Mark mais tempo do que seria considerado normal e largou-a. Mark colocou-a com cuidado no bolso do suéter.
- Hum, eu vim falar sobre um tema um pouco complicado – explicou Amelia.
- Hoje é o dia para isso – comentou Mark com um sorriso.
Amelia olhou em volta, pensando em como começar a conversa. Reparou nos livros na mesa de cabeceira de Mark e reconheceu os seus nomes. Um particularmente, onde viu o nome do seu pai como autor. Levantou-se e pegou nele, abrindo-o.
- Como é que conseguiste isto? – perguntou, olhando para Mark.
- Hans emprestou-mo.
- Ele emprestou-te? – perguntou, incrédula – Todos estes livros também?
- Sim – disse Mark, estranhado a reação de Amelia.
Amelia franziu o sobrolho. Porque carga de água o seu pai emprestara aqueles livros a Mark? Ele, que nem deixava Amelia se aproximar da sua biblioteca secreta, emprestara um dos seus livros mais importantes a Mark. Qual era o jogo? Pousou o livro em cima dos outros.
- Estou preocupada. Tu não podes confiar no meu pai! – quase implorou Amelia.
- Porque não?
- Porque nunca se sabe o que ele quer – explicou Amelia, começando a levantar a voz – Hans não é o tipo de pessoa que faz coisas pelos outros pela simples bondade do seu coração!
- Honestamente, eu não sei em quem é que eu posso confiar – confessou Mark, começando a ficar inquieto com a reação de Amelia. Qual era o problema com Hans? – Cheguei aqui de paraquedas, revelaram-me um monte de coisas que eu nem sabia sequer serem reais. O teu pai ajudou-me a fazer algum sentido disto tudo. Emprestando-me estes livros, explicando-me sobre os vampiros e os puros...
- O quê? – admirou-se Amelia, boquiaberta – Ele falou-te sobre os puros?
- Sim, o que é que tem?
- Esse é o problema, eu não sei! Podes ter a certeza de que se ele te está a explicar sobre tudo isso não é apenas para te ajudar a integrar. Ele tem algum objetivo – dizia enquanto fazia vários gestos com as mãos. Era naquelas alturas que a sua veia italiana começava a aparecer.
- Sou a última pessoa que pode questionar as relações entre pais e filhos, mas porque é que dizes que ele não é confiável? – insistiu Mark. Se não podia confiar em Hans, pelo menos queria saber quais as razões para isso.
Amelia suspirou, abanando a cabeça. Voltou a se sentar perto de Mark. Não havia outra hipótese.
- Está bem – concordou Amelia, engolindo em seco – É uma longa história. Se tiveres paciência, conto-te tudo.
* * * * *
Nasci em finais do século dezoito. Hans não esteve presente nos meus primeiros anos de vida, por isso vivi até por volta dos onze anos com a minha mãe, Helena. Ela era italiana, por isso cresci em Florença. Não pertencíamos a nenhum clã. Na altura, sabia que, antes de eu nascer, a minha mãe pertencia aos Médici, mas por alguma razão decidiu sair.
Tínhamos uma vida normal, dentro do possível. Um dia, cheguei a casa e encontrei a minha mãe... morta. Algumas pessoas disseram ter visto a sair de nossa casa uns vultos com longas capas azuis que cobriam o seu corpo e face. Descrição clássica dos Médici, pois estes sempre se vestiam daquela forma quando saiam para a rua.
Como tínhamos poucos amigos, passei a viver na rua, pois não queria ir para nenhum convento viver entre outras crianças. Elas não sabiam quão perigosa eu poderia me tornar. Como a minha mãe já me tinha explicado o que aconteceria na adolescência, preferi ficar sozinha.
Acontece que Hans soube que a minha mãe tinha morrido e que esta havia deixado uma filha. Uma filha de onze anos de cabelos brancos. Ao que parece, ele não sabia da minha existência. Viajou até Florença e encontrou-me na rua. Como não tinha para onde ir e estava assustada com o que poderia acontecer comigo nos próximos anos, decidi que partir com qualquer vampiro já era sair a ganhar, desde que não fossem os Médici.
Viajámos dia e noite até que chegámos ao clã de Hans, que fica mais ou menos onde a Hungria existe atualmente. Esse clã chamava-se "Renegaten", os renegados. Era para pessoas de outros clãs que tinham sido expulsas ou saído por vontade própria. Pela descrição, já se consegue ver o tipo de gente que ali existia.
Vivíamos numa pequena casa, mas na maior parte das vezes o meu pai estava fora, sei lá onde e a fazer sei lá o quê. Quando fiz dezasseis anos é que realmente descobri os objetivos daquele clã: trazer de volta os puros. A minha mãe raramente se referira a esse assunto, mas eu sabia o que significava: resumindo, o fim dos vampiros como raça livre.
Quando os puros reinavam, o pânico era geral. Especialmente pouco depois de Antícero ter começado a distribuir o veneno por todos os que conhecia e achava dignos. No início, os puros moviam-se juntos, criando verdadeiros massacres por onde passavam. Os que não matavam, inevitavelmente transformavam-se em vampiros, por conta do seu veneno que não conseguiam controlar.
Chegou o tempo em que a personalidade destrutiva dos puros começou a causar a sua autodestruição. Matavam-se uns aos outros por conta das coisas mais insignificantes. Foi mais ou menos na altura em que começaram a viver sozinhos, mas fazendo-se acompanhar de vampiros aos quais controlavam todos os passos. Basicamente, os puros faziam dos vampiros gato-sapato.
Os vampiros começaram a tornar-se mais numerosos do que os puros. Apesar de maior parte se submeter ao poder dos poder dos puros, alguns queriam vingança. Assim, começaram a se organizar. Juntos, eram capazes de prender puros, mas não era suficiente pois não conseguiam matá-los.
Foi depois de Pompeia que perceberam que a lava conseguia destruir os puros. Aí foi o começo do fim. Nos séculos seguintes a população de puros começou a diminuir e, graças à sua dificuldade de transformar outros em iguais, não tinha como se propagar.
O clã a que Hans pertencia tentava recriar o veneno original, o que transformara Antícero. Mas tal era praticamente impossível, pois não tinham todos os ingredientes ou as quantidades. Dizia-se que o próprio Antícero enlouquecera, passando os seus séculos finais a tentar desvendar o mistério, até que desistiu, atirando-se para dentro de um vulcão ativo. Claro que havia quem dissesse que isso era mentira, dizendo que Antícero e muitos mais permaneciam escondidos, à espera da volta do tão esperado veneno.
Essa obsessão era o que movia o clã e era o que mantinha o meu pai acordado todas as noites. Esquecia-se de tudo e todos, precisava de descobrir como trazer de volta a "grande raça de vampiros", tal como costumava dizer.
Saí de casa assim que pude e vivi sem rumo os anos seguintes. Até àquele momento, Hans fora apenas um pai ausente, nada que de que pudesse me queixar, na verdade. Fora melhor do que viver na rua.
Quando tinha quarenta e poucos anos, estava no Egipto quando ouvi rumores pelo clã local de que "Renegaten" tinha caído. Um pequeno grupo de pessoas tinha deposto, ou melhor dizendo, assassinado o líder do clã, e um novo líder tinha sido nomeado: John Southward, um inglês. O clã mudara-se para a Escócia, onde Southward tinha terras. Quem tinha sido contra a formação do novo clã fora morto.
Nesse momento, decidi viajar para a Escócia para perceber o que se estava a passar e saber se o meu pai continuava vivo. Quando cheguei, qual foi o meu espanto quando percebi que não só Hans estava vivo, como era o braço direito de Southward. Ele traíra o seu antigo clã! Foi nessa altura, que comecei a me perguntar coisas que nunca me perguntara antes.
Como Hans e minha mãe se tinham conhecido? Porque fora expulsa dos Médici? Porque passado tanto tempo eles tinham voltado e assassinado a minha mãe? O que acontecera no passado? Agora desejava nunca ter buscado essas respostas.
Passaram vários anos até descobrir a verdade. Infiltrei-me nos Médici, embora com dificuldade, pois eles eram muito fechados. Não podia dizer o meu nome, pois tinha medo que me associassem à minha mãe. Descobri que era um clã virado para a ciência, não para descobrir como trazer de volta os puros e sim para descobrir como melhorar a vida atual dos vampiros.
Devo dizer que o tempo que passei nos Médici, foi o tempo mais bem gasto da minha vida. Aprendi segredos incríveis que nunca pensei descobrir. E soube da história da minha mãe.
Ao que parece, a família dela pertencia ao conselho dos Médici. Estes não possuem um líder de clã e sim um conselho de doze vampiros que discute as leis, regras e todo o tipo de coisas dentro do clã. Existe a lenda de que uma vez houve um líder de conselho, mas este desapareceu, ficando assim para sempre uma cadeira honorária vazia numa das pontas da mesa de reuniões.
A minha mãe crescera naquela comunidade fechada e pouco sabia da vida fora dela. Até que um dia chegou ao clã um estrangeiro, um alemão de cabelos brancos. Ele era muito versado na história vampírica, por isso entrou no clã com uma certa facilidade.
Ela apaixonou-se quase imediatamente, mas Hans não lhe prestava muita atenção. Até que finalmente viu uso nessa relação. Como Helena tinha ligação aos mais altos níveis do clã, sabia de certos segredos que mais ninguém conhecia. Eles começaram a se encontrar, mas a minha mãe tinha muita facilidade em dar a volta aos homens, conseguindo também que Hans falasse com ela mais do que devia.
Um dia, certas pesquisas e livros desapareceram da biblioteca dos Médici. Pesquisas valiosas sobre o tempo dos puros. Com elas, também Hans desapareceu. A minha mãe desesperou e saiu do clã, procurando-o por toda a Itália, mas nunca o encontrou. Meses mais tarde, descobriu que estava grávida. Nessa altura, não viu sentido em voltar para os Médici.
Descobri que a família da minha mãe sempre a procurou, desesperada. Alguns anos depois do seu desaparecimento, encontraram-na em Florença. Ela recusou a voltar, mas também não lhes contou que tinha uma filha. A próxima vez que ouviram falar dela foi quatro anos depois, quando descobriram da sua morte, supostamente sobre membros dos Médici. Mas, segundo eles, nunca fizeram tal coisa.
Isso intrigou-me, pois eu sabia existia uma lei dentro dos Médici, "nunca mentir, sempre dizer a verdade aos seus irmãos". Eles nunca me mentiriam e sabia que não teriam coragem de matar um dos seus, pois mesmo tendo ido embora, ela continuava a ser assim considerada.
Decidi contar-lhes a verdade, quem eu era. Acreditaram em mim, após eu contar algumas histórias sobre a minha mãe na minha infância. Expliquei-lhes depois sobre o tempo que passei com Hans e percebi que estes ainda o odiavam. Sabiam há muito tempo o que este fizera no seu antigo clã, mas acharam que não valia a pena se preocuparem com as pesquisas roubadas. Já eu, prometi que se algum dia as encontrasse, as devolveria.
Apesar de me pedirem para lá continuar, decidi sair dos Médici. Tinha de descobrir o resto da história. Quem matara a minha mãe? Apesar de recear a resposta, viajei para Southward. Comportei-me junto de Hans como habitual. Foi junto de um membro um pouco mais influenciável que conheci o resto da história. Este pertencia ao clã desde a altura do Renegaten e era a boca de trapos do grupo.
Hans entrou no Renegaten praticamente na altura da sua fundação. Um dia, decidiu sair quando viu a oportunidade de entrar nos Médici. Quando roubou as pesquisas voltou a entrar no seu clã e com isso ganhou muito prestígio. O membro do clã com quem falei sabia de um rumor de que Hans havia falado de mais com alguém dos Médici.
Supostamente, Hans mandara uns indivíduos da sua confiança vigiar os Médici, tentando encontrar essa pessoa. Descobriram assim que a minha mãe fugira e que os Médici tentavam a todo o custo encontrá-la. Passaram a seguir os seus movimentos.
Um dia chegou a notícia de que tinham encontrado Helena, que esta não estava mais nos Médici e, pelo que parecia, soubera manter a boca fechada. Mas Hans não queria correr riscos, por isso... mandou alguém tratar do assunto.
A mando do meu pai, dois vampiros mascararam-se de membros de Medici, para ninguém desconfiar, mas o que não contavam era descobrir que Helena tinha uma filha, eu. Filha essa que também era filha de Hans.
Eu saí de Southward jurando nunca mais voltar após o que descobri. Por isso mudei-me para Londres, onde vivi vários anos. Mas a minha vida voltou a dar outra reviravolta, trazendo-me de volta para este mesmo local.
Hans matou a minha mãe para que ninguém descobrisse os seus segredos, fossem eles quais fossem. Ele enganou um clã inteiro só para roubar as suas pesquisas secretas. Ele é perigoso. E quando o meu pai se interessa por algo... o melhor é ter cuidado pois é capaz de tudo.
* * * * *
Mark não sabia como encarar Amelia depois de esta lhe ter contado a história do seu passado. Colocou uma mão no seu ombro, apertando-o amigavelmente.
- Lamento muito pela tua mãe – acabou por dizer.
- Não faz mal, foi há muito tempo – destacou Amelia, colocando a sua mão por cima da de Mark e retirando-a suavemente de cima do ombro – Mas percebes o que te disse? Hans não é confiável.
- Eu entendo – concordou Mark, ainda atarantado pelo que Amelia lhe contara – Mas o que pode ele querer de mim?
- Esse é o problema, não é? – Amelia fungou, mascarando uma gargalhada triste – Não sabermos o que ele quer. Não te digo para cortares as relações com ele, mas tem muito cuidado cada vez que entrares naquela casa.
Amelia pensou durante alguns segundos, questionando-se se deveria contar mais um pormenor a Mark.
- Rosie também não gosta muito do meu pai – confidenciou – Não te posso contar a razão, mas se lhe perguntares, como quem não quer a coisa, ela to poderá contar. Mas se não quiser, não insistas. É difícil para ela.
- Obrigado – disse Mark, após uns segundos de silêncio.
- Por quê?
- Por te preocupares – Mark abanou a cabeça, sem saber como explicar o que sentia – Cheguei aqui e... não conheço ninguém, não conheço o lugar, quer dizer, nem estou no meu país, numa terra que nem tem rede de telemóvel ou internet. Sinto-me perdido.
- Conheço o sentimento – disse Amelia – A única coisa que te posso dizer é que isso passará com o tempo. Conhecerás melhor os teus pais, a tua família, e perceberás em quem podes ou não confiar.
- Sei de uma pessoa em quem posso confiar – revelou Mark, causando em Amelia um olhar interrogativo – Em ti.
Amelia não conseguiu evitar um pequeno sorriso e mais uma vez deu graças por não ter fluxo sanguíneo senão estaria vermelha como um pimento naquela altura.
- Bom, obrigada... Eu...
Vendo que estava a ficar atrapalhada e não queria que Mark percebesse, Amelia optou por uma opção que a fez se arrepender mal a realizou. Abraçou-o, ao que ele também retribuiu. Queria ter aproveitado a oportunidade para respirar fundo e pôr as ideias em ordem, mas percebeu que abraçar Mark estava a confundi-la ainda mais.
Mark, também surpreendido pelo abraço de Amelia, começava a ficar nervoso e a lembrar-se do sonho onde a beijara. Ela estava noiva do irmão, Mark não podia fazer aquilo. Por outro lado, era só um abraço e ela cheirava mesmo muito bem. Lavanda, talvez?
Após alguns segundos acabaram por se separar, um pouco atrapalhados, evitando cruzar os olhos. Amelia levantou-se e Mark imitou-a.
- Lembrei-me que... hum... tenho uma coisa... preparativos. Eu vou andando – declarou Amelia, saindo do quarto rapidamente.
Mark voltou a sentar-se e sorriu. Deixou-se cair em cima das almofadas da sua cama e fechou os olhos, para tentar manter presente a memória do abraço com Amelia. O seu perfume a lavanda... O som da sua respiração... Lembrou-se do cabelo branco escorrendo pelas suas costas e da forma como ela o abraçara.
Abriu os olhos e levantou-se repentinamente. Naquele momento, percebeu algo que poderia vir a mudar o rumo da história. "Merda", pensou, "Estou a apaixonar-me pela noiva do meu irmão".
Aquilo ia tornar a sua vida mais complicada do que estava atualmente.
* * * * *
Nota da autora:
O que acharam do passado de Amelia? Devo confessar que o que eu mais gosto de escrever são estas histórias sobre o passado dos personagens e clãs. E quanto a vocês, algumas teorias?
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