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Capítulo Quinze (Há veneno em meus cortes)


I fall to pieces

Each time someone speaks your name.

— Fall To Pieces, Patsy Cline.


🦋


Roseville, 1996.


O correr das horas parecia estranhamente lento conforme a bagunça em meu peito se ajustava depois da implosão de sentimentos da noite passada, não lembrava em que momento tinha chegado até a cama ou removido os sapatos, a ressaca sentimental ainda provocava uma miopia temporária em meus sentidos.

Um traço borrado da máscara de cílios marcava uma sequência riscada no tecido floral do travesseiro, era a prova do choro, — assim como o inchaço visível e a vermelhidão indisfarçável no rosto —, a linha negra marcada em minhas bochechas como riscas articuladas de um fantoche quebrado.

Abri os olhos com cautela, observando a claridade invadindo o espaço, a luz lambendo o chão e as partículas de poeira, suspensas no ar, acompanhando os raios de sol em uma dispersão coloidal até minha visão se ajustar aos formatos e objetos conhecidos. As informações se adequando como a camada de uma nuvem que paira em um mapa meteorológico.

Aquela altura já passava das duas horas da tarde.

A dor excruciante do coração, até então anestesiada pelo sono, retornou em sua dose fulminante. O corpo inteiro sentia o peso do arrependimento, a vergonha correndo por cada centímetro da pele, ardendo em cada canto, o sangue nas veias parecia mais espesso — as mesmas veias tocadas em um beijo indireto que não envolvia lábios nos lábios, — e cada segredo de Jungkook que jurei ser unicamente partilhado a mim soavam como mentiras premeditadas de um roteiro elaborado.

Me sentia estúpida e minúscula, como se tivesse me exposto de uma maneira indevida para alguém cuja confiança entreguei de olhos fechados, uma parte tão secreta e minha que provavelmente seria o motivo do riso alheio. Tão patética ao ponto de acreditar cegamente na ideia de que algo entre Jungkook e eu poderia, de fato, acontecer. Rá! Que idiota!

Era tola o bastante para achar que o que quer que tivesse deduzido sozinha, ali, alimentando os outros cenários trágicos em minha cabeça, era suficiente para comprovar a tese de que Sharon Marie e Jungkook teriam reatado, ou quem sabe, nunca teriam sequer terminado. Os sinais estavam ali o tempo todo, entre eles, com seus risinhos trocados, suas mãos dadas e sussurros ao pé do ouvido. A cumplicidade secreta dos dois me corroía por dentro.

Talvez pensasse que o pior, entre todas as possibilidades ruins, era saber que havia esperado, tão cheia de uma certeza infundada, o que nunca foi confirmado, que não tinha sequer existido, a ideia inocente de que ele poderia ao menos olhar para mim com amor. Tudo não havia passado de uma fantasia. Jeon Jungkook se divertiu às minhas custas, ciente de tudo que havia provocado. E acabaria entrando para sua lista ridícula de colecionador de cabaços como um troféu de aposta ganha.

Estúpida, estúpida, estúpida!

Rolei para fora da cama em um impulso ressentido, tocando os pés no chão superaquecido pelo Sol da tarde. Puxei para fora do seu esconderijo a caixa de souvenirs, ainda mantida ali, como adornos de um altar provisório, e a joguei no lixo. Os cigarros de cheiro forte, o bilhete mentiroso e todos os seus objetos tiveram o mesmo destino. Tudo parecia uma grande quantidade de aparatos de um ator medíocre, um farsante, e quanto mais me mantivesse atada a psicometria de seus pertences, tudo que havia passado pela cavidade de suas mãos de feiticeiro, emanando um pouco dele, me manteriam presa ao seu encanto.

As pelúcias amontoadas na poltrona ao lado da janela foram as vítimas do meu ódio direcionado. Um coala cinza, de olhos amorosos, foi decapitado sem nenhuma misericórdia. Uma boneca de cabelos avermelhados arremessada pela janela, aterrissando segura no jardim antes de ter suas tranças cortadas com uma tesoura de papel. Tão cega de ciúmes que estava pronta para destruir alguma coisa, aniquilar qualquer existência material, nem que fosse a mim mesma. Uma sensação histérica, precipitada se alastrava por dentro, e só queria parar a dor sem sentido que apertava meu coração em um tranco. Nunca havia sentido nada parecido. Tudo parecia assustadoramente inédito.

A ideia da promessa surgiu como uma solução imediata enquanto tentava me livrar do broche idiota ainda preso ao meu cabelo. Sentada diante do espelho, chacoalhando os cabelos como um pássaro de penas eriçadas, a borboleta pendurada na metade da mecha, enroscada aos fios; o pequeno cupido ardiloso que decorava a penteadeira, erguendo seu arco e flecha em minha direção, com bochechas suspensas como as de um bebê sorridente e os lábios rosados, feito cerejas ao marrasquino, — as mesmas que eu costumava surrupiar do balcão no Pink's e mergulhá-las nos torrões de açúcar das mesas vazias —, me lembrava que o caminho menos árduo e mais desesperado entre todos, era me apegar à fé, como havia sido ensinada uma vida inteira por mamãe, pelas freiras da escola e pela vida cristã que reconhecia como minha rota desde nascida. Estava colhendo os sinais que me direcionaram a redenção e aquela parecia uma saída segura.

Sentia um intenso desejo de odiá-lo, como se o contrário daquele sentimento dilacerando o peito fosse a vingança da bondade; mostrando a Jungkook que não me renderia jamais.

Uma outra face seria oferecida. Tola ao ponto de pensar que poderia lutar contra o meu próprio coração.

O sentimento que passeava entre a confusão e a dor, o medo de encarar que outra vez seria a garota que restava; por um breve e feliz período, havia agarrando o mundo inteiro com as pontas dos dedos, em uma facilidade que deveria ser o sinal de alerta do erro de tudo, alguém me via, no entanto, chances assim não surgem de nuvens descuidadas que deixam cair desejos bons demais para parecerem reais.

E os sentimentos continuavam sendo estrangulados e castigados por existirem como se a autopunição para a minha ingenuidade me desse algum mérito. Seria minha maior inimiga. Uma grande cretina em outras palavras. Sangraria sozinha no fim das contas. Mas resguardaria a virtude de que lutei até o fim, não fui cúmplice dos atos de escárnio.

Queria girar a chave mágica e me encher de um ar de superioridade, ativando todas as válvulas de defesa em meu corpo. Provocar em Jungkook alguma dor, fazê-lo sentir algum remorso por tudo e assisti-lo sangrar por saber que pouco me importei com o fato dele estar ou não com outro alguém. Contudo, o esforço para parecer tão alheia a ele, era, por si só, minha maior acusação.

A impotência de ser sempre a preterida ainda era capaz de me ferir, apunhalar a fenda de uma armadura delicada diretamente em meu ponto mais sensível. O desejo de ser amada e somente amada.

A verdade é que teria que competir para ter de volta às partes minhas que dei somente a ele, embora continuasse em uma batalha comigo mesma, fingindo que não havia importância alguma, meu coração era essencial demais para que pudesse atuar com uma indiferença desdenhosa. O céu mentiroso que cintilava em cumplicidade na minha direção, mantinha as estrelas cadentes distantes nas horas que eu ansiava por um pequeno milagre. E a parte mais desesperadora de estar ferida, era ansiar que a cura para a dor que sentia fosse justamente o causador dela.

Se Jungkook se equiparava ao meu Johnny Marr, com sua jaqueta de couro, vagando pelas ruas sujas de uma Manchester vulgar como um Rolling Stone, eu era seu introvertido, apaixonado, triste e sempre à espera, Steven Morrissey. As lágrimas inundaram meu rosto outra vez, incontroláveis. Me encolhi no tapete macio do meu quarto, abraçada aos joelhos, e então, chorei.



No fim da tarde, resolvi ir até a igreja logo após o questionário infindável de papai sobre os traços visíveis de choro recente em meu rosto, que foram precisamente ocultos com uma mentira barata sobre aquele período de sensibilidade feminina em uma época específica do mês que fez com que ele, tímido como era, respeitasse os meus limites. Papai era mais fácil de enganar do que mamãe. Enquanto ela conseguia ler a verdade nos meus trejeitos; na voz, no modo de tocar uma mão na outra ou um olhar mais inseguro, papai costumava ser facilmente ludibriado. E por um tempo, durante o ápice de minha paixão por Jungkook, sua confiança foi o meu maior álibi.

No caminho até lá passei pela casa de Taehyung, desviando por algumas ruas até a lateral do jardim dos Kim, pedalando na via íngreme que levava até a praia.

As janelas de seu quarto estavam fechadas e o carro do Sr. Kim não estava na garagem. Ele havia me dito, em algum momento no meio do caos da noite passada, que visitaria a universidade no primeiro dia útil da semana, finalmente conheceria seu colega de quarto e estava animado, um pouco assustado com as mudanças, por viver em uma cidade brilhante e cheia de pessoas tão diferentes dele. Me senti culpada por ter arruinado o nosso dia especial e me senti ainda pior por Taehyung ter sido a última de minhas preocupações, enquanto soluçava no chão do banheiro. Ele tinha todo direito de se sentir magoado, se fosse o caso.

Já esperava o pior e sabia que, de uma forma ou de outra, tinha deixado a razão escapar no meio da dor. Taehyung não tinha culpa alguma dos meus sentimentos.

Observei por um tempo confortavelmente longo a porta dos Kim. Não havia movimento algum na casa. E segui meu caminho até a paróquia.

Ainda parecia com o mundo que conheci, mesmo que por um segundo tivesse imaginado que tudo ao meu redor também estivesse alterado. Ao longe, vi a ponta do chapéu de feltro de Padre Stane cobrindo parcialmente os olhos. O avental verde-oliva de jardinagem parecia minúsculo atado ao redor de sua cintura, enquanto ele caminhava de um lado para o outro regando as plantas no canteiro. Flores silvestres eram tratadas com o mesmo amor de suas hortênsias, lírios, miosótis e os meus — amados e favoritos — girassóis. Um foco de luz solar rosada penetrava entre as nuvens com um aspecto de sonho cinematográfico, o Verão em Roseville trazia recortes bonitos em cenas inéditas, bastava olhar com atenção para ver um pouco de beleza amplificada no entorno e a encontraria.

O carro de Jungkook não estava estacionado no pátio, nem havia sinal de sua presença pelos arredores da casa nos fundos do terreno, observei com cautela antes de decidir entrar e Stane já acenava para mim com a mão enluvada. Deduzi pelo horário que ele ainda estava na oficina, eu pensava. Estaria lá até às seis.

— Sua bênção, Padre.

— Deus te abençoe, filha. — Stane ergueu-se de sua posição, retirando as luvas bicolores — Que carinha triste é essa?

Me senti amuada somente pela pergunta, a percepção aguçada dele era inevitável, questionamentos amáveis de quem estava disposto a me fazer o bem em todas as vezes que se mostrava necessário.

— Não me sinto muito bem — respondi, secando as lágrimas com as mangas do casaco. — Pensei que poderia ficar por aqui um pouco.

— Venha, colocar a mão na terra será bom para você. — Stane disse, indicando o ancinho ao lado do canteiro para mim. — Essas flores te amam.

Caminhei até lá, observando o estado das gérberas que haviam florescido. As pontas dos meus dedos deslizavam pela textura macia das pétalas amontoadas, o perfume sufocante dançando em minhas narinas, uma ao lado da outra como em comerciais de fragrâncias francesas importadas, Trésor de Lancôme em uma fotografia rosada enquanto Isabella Rossellini desviava pelas ruas em busca de um homem misterioso provido de encantos mágicos. Stane estava certo. Me sentia amada no jardim dos sonhos.

— Pretende me contar por que está triste? — Não havia pressão na pergunta, nenhum tipo de intimidação velada para me tirar um motivador, mas uma preocupação amiga, de quem temia que algo pudesse ter me machucado profundamente.

— Não sei se posso. — Meus dedos afundaram na terra macia, movimentando um punhado de minhocas reunidas em sua colônia, que furaram novos buracos na terra e desapareceram.

— Bom, não precisa dizer a situação, se não quiser, só me diga o que sente e talvez eu possa ajudar.

Meu medo de levantar suspeitas me fez repensar cada palavra dita, se em alguma brecha de uma fala impensada havia dado uma pista do que a situação se tratava e do seu motivador. Mas nada havia sido revelado, tudo acontecia somente aqui dentro, com meu coração entoando a verdade oculta.

— Padre, você já se apaixonou? — A pergunta pairou entre o cantarolar de Stane e o ruído metálico de sua tesoura de jardinagem, insolente e enviesada. — Digo, antes de tudo, do seminário, da vida eclesiástica.

O arranjo do questionamento era somente para sondar o assunto, Stane não me julgaria pois não fazia parte do seu feitio de bondade, era muito moderno para um mundo que ainda se mostrava obsoleto, e nem todos eram capazes de acompanhar o seu ritmo de interpretação. Questionar trivialidades a um pároco parecia o tipo de heresia por deslize; uma vida passada não deveria ser mencionada, Irmã Christine dizia, ela foi jogada no limbo do esquecimento. Alguns moradores mais antigos diziam que Irmã Christine costumava dançar em um clube adulto no início dos anos 80, mas teve sua oportunidade de resignação. Não havia nada de errado sobre seu modo de ganhar a vida, pensava muito mais nas consequência de felicidade, Irmã Christine havia entrega-se a fé porque nada mais no mundo foi capaz de lhe dar esperanças de novo.

— Certamente. — Padre Stane sorriu, o chapéu de feltro sombreou o rosto. — Eu ainda sou um homem feito de carne e ossos, não sou?

Aproximei a gérbera contra meu nariz, inundando-me do perfume. Uma cadeira de praia estava aberta na lateral do jardim, ao lado do banco de apoio com uma bíblia e um rádio a pilha que tocava Amor, My love do Ennio Morricone.

— Mas eu era só um menino e outros sentimentos podem ser confundidos com o amor quando se é jovem.

— Então como você soube que estava realmente apaixonado?

— Acho que é justamente neste ponto que está a diferença. O amor verdadeiro é sempre um sim absoluto, não há espaço para um talvez ou um quem sabe. É decisivo. — Suas mãos tocaram com carinhos os lírios, desejosos, como se amparassem uma necessidade silenciosa. — Poderia comparar com o amor divino, essa certeza inegável de que é amado quando se sente protegido por Deus, mas somos limitados demais.

Empurrei as pedrinhas com a ponta do sapato, antes de ocupar o espaço na mureta do canteiro para me sentar.

— Eu me sinto estúpida por ter confiado em alguém, me sinto traída também e me sinto... ingênua, acima de tudo. Mesmo que nada tenha sido prometido a mim, eu acho que só acreditei no que eu achava que estava vendo. — Puxei as mangas do meu cardigã para cobrir as mãos depois de bater os resquícios de terra em meus dedos, o pôr-do-sol já se via no horizonte e o vento frio, arrastado pela brisa marítima, dava as caras.

— Sabe, é o risco que se corre para viver algo.

— O que quer dizer?

— Existe risco em tudo, em cada decisão tomada, em cada passo dado. Por exemplo, ter aceitado o chamado do Senhor e ter escolhido viver uma vida com Deus foi um risco, eu sabia do que estava abrindo mão, sabia que muito precisaria ser deixado para trás e que boa parte do que ficou no caminho me faria muita falta. Mas aceitei o risco.

— Então de que vale o risco se está consciente de que pode se ferir tanto? — A voz anasalada do rádio substituía o silêncio temporário com letras em um espanhol elaborado que misturava trechos em um inglês de sotaque forte. — Não estou dizendo que a vida eclesiástica foi uma má decisão, o Senhor ajuda tanta gente, Padre, só não consigo enxergar como aceitar o sofrimento pode ser algo positivo.

Questionar suas motivações parecia ainda pior que o destempero que havia me trazido até aqui, um método melhor de entender minhas questões projetando-as em outras pessoas, tentando fazê-las entender a minha perspectiva limitada e fatalista do mundo. Do amor. Das escolhas. Não era proposital, mas o modo como havia aprendido a ver a vida parecia limitado, enfiado em uma pequena caixinha de expectativa do que poderia apenas desejar.

— É o preço que se paga para encontrar algo pelo qual valha a pena lutar. Qual seria o intuito de viver se não valesse o risco? — Stane prontamente respondeu. — Veja bem, é como o pecado se apresenta diante de nós, ele é o risco. Mas a salvação é o motivo pelo qual vale a pena arriscar todo o resto. As dores terrenas são inevitáveis, porém são temporárias. Minha querida, não sei do que se trata essa questão afligindo seu coração, mas eu sei que Deus tem planos para todos nós, e acredite, os planos dEle são maiores que os nossos.

Encostei os cotovelos contra os meus joelhos, puxando as linhas soltas na base do tricô do cardigã branco.

— Só queria não me sentir tão... burra.

— E por quê você seria burra? Quem quebrou sua confiança destruiu algo muito precioso. Mas a culpa não é sua.

Sua mão tocou de leva o topo da minha cabeça.

Bem...Por gostar de alguém que não está interessado em mim é um motivador. — Os olhos de infinito azul de Stane fitaram os meus, amorosos.

— E o que sente por esse alguém? — A onda de vergonha outra vez inundou o peito, as bochechas foram as primeiras delatoras do meu circuito de timidez.

— Não importa mais, ele não gosta de mim de qualquer forma.

— Mas você gosta dele, isso não lhe vale de nada? — Stane respirou fundo. — Viver sem amor seria um castigo, acredite. A vida é bonita porque alguém nos amou primeiro e também porque nos deixou amor nesta Terra, de que adiantaria permanecer se não pudéssemos olhar nada através das lentes desse grande e superior amor?! Nem mesmo uma única coisa!

Havia algo romântico sobre o modo como Stane enxergava o amor, algo pessoal e apesar de muito associado a sua vida clerical, algo passeava pelo campo empírico, além de amar as almas, de resguardar as ovelhas como sua missão nesta Terra. A inflexão envolvia o seu coração inteiro, de homem e de padre.

— Padre, do que estamos falando exatamente?

Ele sorriu, dando batidinhas em meu ombro.

— Você sabe o que quero dizer. — disse, empurrando um punhado de areia para dentro do canteiro. — Não tenha medo do risco, nem do amor. Ele é seu. E o que é seu não pode ser tomado ou tirado de você assim. 

Stane caminhou na direção oposta, recolhendo as ferramentas de jardinagem soltas ao redor da cadeira de praia.

— Padre, o senhor acha que uma promessa pode me ajudar?

— Com o quê, exatamente, minha querida?

— A esquecer essa pessoa, tirá-la do meu coração... Não sei, a não pensar mais nisso.

Stane observou o entorno, checando as flores com seu olhar amoroso. O colarinho destacando-se através do tecido do avental, um peso maior e mais sufocante do que apenas a ideia do que parecia. Eu viria a entender tudo isto muito tempo depois daquela conversa.

— Talvez. Mas acho que a pergunta na verdade seria: você teria fé o suficiente para fazer isso?

Como um sábio, Stane me deixou sustentando as dúvidas, uma velha canção de letra chiclete em modo repetição, enquanto afirmava que precisava se ocupar com os preparativos da missa na próxima hora, Roy não havia aparecido, por isso ele mesmo precisaria tocar o sino naquela noite, assim como os comentários sobre as programações noturnas no Pink's quando, nas segundas-feiras, era servido do seu hambúrguer e milk-shake favoritos como um presente ocasional de Taylor, que adorava-o.

— Ficará bem aqui? — perguntou ele.

— Sim, senhor. Obrigada por me ouvir, Padre. — Stane depositou um beijo em minha testa, antes de desviar pela porta lateral da paróquia e desaparecer.

Afastei a bicicleta, empurrando-a pelo guidão em direção a porta frontal da igreja. Estava vazia. As velas das promessas, reluzentes, brilhavam ao redor da Virgem Maria projetando sombras em seus pés e na barra de suas roupas sagradas. Um pacote de velas novas pendia na base da escada que dava acesso ao altar, e acendendo a vela com a chama de outra, ajoelhei-me diante da Virgem Santíssima, implorando:

— Por favor, tire Jungkook do meu coração. Por favor, tire Jungkook do meu coração. Por favor, tire Jungkook do meu coração. Eu posso abrir mão de qualquer coisa!

A cada doce repetição da ferida aberta que seu nome fustigava, minha mente era inundada por ele outra vez. Seus lábios. Seus olhos. Seu sorriso. A linha de sua mandíbula adoravelmente masculina movendo-se conforme sua boca úmida devorava minha pele. Seus instintos místicos de um Romeu sombrio, lutando contra minha própria mente para calar sua voz chamando-me em sua direção, sussurrando em meu ouvido. Seu nome ainda iria me ferir de morte. As três vogais e quatro consoantes cravejadas em meu peito. Nas linhas das minhas mãos como a irrevogável nódoa do destino. Estávamos marcados com sangue, suor e lágrimas no livro da vida. O ardor consumia a cera esbranquiçada em gotas de parafina que selavam o pacto final.

— Por favor, tire Jungkook do meu coração.

A labareda dançante parecia um desafio pessoal, uma comunicação entre Céu e Terra. Não havia mais ninguém no espaço sagrado; nem mesmo as beatas rodeando a paróquia por aquelas horas da tarde, ou as carolas insaciáveis, como ouvia os garotos da escola chamarem.

 Era somente eu e a imagem da Virgem mirando a minha direção.

De olhos fechados, implorei com ainda mais devoção. Por favor! Por favor! Mas por puro milagre ou providência divina, percebi a resposta imediata que silenciou a oração de fé morta, sem brisa, corrente de ar ou outra alma vivente no entorno, todas as velas ao meu redor se apagaram.

Minhas mãos unidas diante da face despencaram com a mesma força gravitacional dos cantos de minha boca, do desespero de minhas lágrimas, das certezas inegáveis que não podiam ser alteradas.

A tendência era proteger o meu coração de qualquer mal, de qualquer possível dano, como se pudesse evitar o sofrimento por vontade própria. Mas estava apaixonada. E gostar de alguém que foi feito para adorar, machuca. Era como amar um santo, uma divindade, que está limitado sempre e para sempre ao altar e a oração, ao toque das bordas de suas vestes. Cuja imagem, inocente, carregava um ar de insolência, distinção e frieza. E embora Jungkook não fosse capaz de me machucar em sua distância beatífica, os seus milagres ao meu redor feriam-me de morte.

 Eu vislumbrava o seu Paraíso de deus falso sem poder herdá-lo.

E enquanto outras preces chegavam até o seu recanto sagrado, as minhas interseções sinceras pairavam limbo do esquecimento. Sentia-me renegada e invejosa como um Caim marcado e talvez o silêncio para minha promessa fosse a resposta que tanto busquei, bem ali, nas entrelinhas do meu clamor: eu era só uma mulher de pouca fé.



❀ ༄ ઼° ○ ❀ °○ ❀ ༄ ઼°○ ❀


 A tag é #garotosmiths no Twitter.


N/A:  Feliz Páscoa! 🐰

Finalmente tivemos anúncio de uma data para o comeback, ainda tentando absorver a informação por aqui! Haha.

Obrigada a todes que tiraram um tempinho para ler, comentar e votar no capítulo, eu fico tão feliz que vocês sigam acompanhando, a próxima atualização, devo dizer... Melhor não dar spoiler, né? Mas se preparem! 👀

Essa conversa com o Stane será importante no futuro também, por isso dediquei um capítulo inteiramente a ela.

Peço desculpas por qualquer possível errinho e já sabem, revisarei outra vez durante a semana.

Passando para avisar também que tenho postado muitos conteúdos sobre Badlands lá no IG: (@/vestigiosdesaturno), inclusive farei uma live para falar sobre Badlands, escrita, personagens e tirar dúvidas de vocês! 

Uma ótima semana para vocês, até qualquer hora.

— Com amor, Sô.

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