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O Curioso Caso de Dante, parte Dois

PODERIA DIZER QUE era uma manhã normal e tranquila, mas não. O pequeno Dante quebrou a mamadeira da Beatrice enquanto brincava na noite anterior e como estava sozinha em casa, porque o povo foi pro raio que os parta – tudo bando de oportunistas que não ajudam em nada. Menos o Nero, ele teve que ir trabalhar. E sem alternativa, levei as duas crianças na farmácia, visto que no mercado demoraria mais e Dante já resmungava sobre acordar cedo. Fui na sessão destinada a utensílios, pomadas e produtos para bebês, procurando uma mamadeira que fosse grande o bastante pra comportar a absurda quantidade de leite que a pequenina consumia – pra uma criaturinha minúscula, ela possuía um apetite voraz. Ao finalmente achar o que buscava, me dirigi ao caixa, satisfeita com a aquisição e por tudo ter dado certo. Dante surgiu entre as prateleiras carregando algo que não pude identificar a primeira vista até ele se aproximar com uma expressão tipicamente infantil: os olhos brilhavam de um modo fofo e difícil resistir.

– Diva... Compra essas balinhas? – ele estendeu a mão e, naquele momento, corei em todos os tons de vermelho possíveis ao ver uma variedade de preservativos nas mãozinhas do mestiço.

Olhei ao redor, desconcertada.

A moça do caixa tentava manter a compostura, mas era perceptível que estava se segurando pra não rir.

– Dante, meu fofinho, isso não é balinha – abri um sorriso sem graça. – Agora devolva isso pro lugar onde achou, sim?

O semblante – a artimanha – adorável para me convencer, murchou.

– Eu quero essas balinhas!

– Não são balas. São coisas de adultos e se... – pondo minhas engrenagens para funcionar, formulei a desculpa perfeita. – Pegar você vai ficar com a cara amarela cheia de pontinha azuis!

– Não! – gritou, assustado. – Minha cara não! Minha cara não! Mamãe! – dito isso, ele correu para devolver os preservativos pro lugar. Até como um menino de quatro anos, Dante tinha zelo com a aparência.

Recompondo-me, fitei a moça do caixa com meu melhor sorriso, fingindo que o constrangimento de antes não tivesse acontecido.

– Ah, essas crianças.

Voltando pra agência, deixei Beatrice na cadeirinha dela e Dante assistindo desenhos animados na TV. Fiz a mamadeira e a comida do Dante e, minutos depois, deparei-me com uma cena aterradora: Dante todo sujo com algo que, com toda certeza, não era chocolate e Bia quietinha babando na própria mão e rindo.

– Ah, céus... O que houve com você, Dante? – questionei num misto de horror e vontade de rir.

– Ela tinha feito caquinha – aponta pra bebê que emite ruídos animados. – E você estava ocupada, então como ficou impossível aguentar o cheiro... Eu mesmo troquei... Mas ela me sujou. Foi bem difícil. – explicou olhando o estrago. – A Bia é um bebê fedido

Desatei em uma gargalhada alta.

– Não diga isso, Dante.

– É verdade! – o encaminhei pro banheiro, rindo.

Nunca imaginaria Dante numa situação dessas.

Passando as últimas horas cuidando de duas crianças, sendo uma delas a versão criança do meu namorado, tentei distraí-los ao máximo até os demais chegarem.

– Espero que tenham trazido notícias boas, de preferência que traga de volta o Dante adulto – olhei para os três componentes do grupo.

– Claro que trouxe uma notícia boa – Maya gabou-se, sorridente.

– Desembucha.

– O efeito do feitiço é temporário, só que não sei quando vai passar – coça a nuca, meio sem graça.

– Já é um começo – Lyana comenta.

– Podem me fazer um favor?

Assentiram.

– Cuidem das crianças. Eu vou descansar um pouco. – bocejo. – Encham bem a mamadeira da Bia e não deixem o Dante comer pizza antes do jantar – avisei, indo pro quarto.

×××

Fuzilei as duas irresponsáveis com o olhar quando a notícia fora dada – praticamente uma bomba jogada no meu colo. Beatrice fez uns ruídos ao perceber a tensão.

– Com vocês perderam o Dante? – berrei, batendo na minha própria testa. – Ele é um menino de quatro anos! Quatro! Como ele foi mais espertos que duas pessoas com o triplo da idade dele?

– Em minha defesa – Maya começou em tom solene. – Na verdade, Dante é que tem o triplo da nossa idade, ele só virou crianças temporariamente.

Expeli fumaça pelas narinas com o comentário, rosnando.

– Lyana, a Diva tomou a vacina antirrábica né?

Estreitei os olhos.

– Só falta babar – Maya completou engolindo em seco.

– Achem o Dante!

– O que houve com o Dante? – uma voz feminina carregada de sensualidade inconfundível se pronunciou.

Olhei para Trish meio desconcertada, sem saber como explicar e se deveria recorrer a ajuda dela pra procurar Dante.

– O Dante desapareceu! – Maya guinchou, chorosa.

– É só isso? E qual o desespero todo com Dante sumir? Não é a primeira vez – deu de ombros, direcionando-se a cozinha.

– Bem... – Lyana pigarreou. – Dante voltou a ser criança

Trish virou a cabeça para nos encarar, rindo, mas parou ao ver que não estávamos brincando.

– Como isso aconteceu? – gritou.

– Nem nós entendemos – respondi.

– Já viram pela casa? – Trish questionou, batendo o pé.

– Sim. Menos no quarto da Diva – Lyana afirmou e, no mesmo instante, tivemos uma epifania. Sem perder tempo, corremos – comigo carregando uma Bia chorosa – até o quarto com Trish na frente liderando o grupo de malucas – incluindo eu mesma.

Cada uma se ocupou de vasculhar um canto do cômodo até ouvirmos a gargalhada contagiante de Trish preencher o local. Ela tirou, cuidadosamente, as cobertas da cama e revelou a pequena figura dormindo com uma expressão tão angelical que nem parecia um demônio. A caçadora se aproximou do menino que balbuciou sonolento e a abraçou.

– Que bom que voltou, mamãe.

Trish piscou confusa e tudo que pude fazer foi lançar a melhor expressão “segue o baile” que eu consegui, rindo da situação.

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