Capítulo 48
E, hoje, só porque ouvi dizer que anda por aí gente ansiosa, tem capítulo duplo kkkkkkk
Encosto-me à parede fria do corredor.
De vez em quando, passam por mim caras conhecidas. Cumprimento-os a todos. Alguns tentam manter uma conversa trivial sobre a enfermaria. Outros são mais ousados e perguntam como tenho andado. Mas as minhas respostas são tão breves e concisas, que todos desistem ao cabo de, no máximo, dois minutos.
Finalmente, o Salvador aparece. Atravessa a porta e caminha descontraidamente. Sorri quando me vê encostada à parede, quase colada à primeira porta deste longo corredor.
Dou um passo na sua direção, mas ele acena negativamente com a cabeça. Paro, sem perceber o que ele quer. Num gesto subtil, faz-me sinal com a mão para me manter quieta.
Olho ao meu redor e percebo que não estamos sozinhos. Duas mulheres conversam, em frente a uma das portas, não muito longe do sítio onde me encontro. Parecem não reparar na nossa presença, mas suponho que o Salvador não queira arriscar.
Vejo-o passar por mim, depois pelas duas mulheres, que não desviam os olhos uma da outra e mantêm a conversa, como se nada se estivesse a passar. Pergunto-me se serão simplesmente distraídas ou tão egocêntricas que mais nada lhes importa. Curiosa, tento procurar pela minha memória o rosto de cada uma delas.
A mais alta e de cabelo grisalho é Branca Vaz, a avó da Olívia, constato ao recordar-me da última consulta que lhe fiz. Entra e sai sempre da enfermaria a falar da neta, no orgulho que tem em ter alguém na família a trabalhar no laboratório de saúde. Não a recriminaria, se ela não fizesse questão de salientar constantemente que o trabalho da neta é mais digno e importante do que fazer análises e medicar as pessoas da comunidade. "Não leves a mal, é só que não é preciso ter um grande talento para se fazer aquilo que vocês fazem aqui", comentou comigo numa das vezes. Senti-me tentada a sugerir que trocasse de lugar comigo, e tentasse ela mesma interpretar os resultados das suas análises, já que era assim tão fácil. Mas não o fiz. Não o fiz, porque tenho perfeita consciência de que nenhuma profissão está acima de outra. Cada um tem um papel importante à sua maneira. Se não existisse ninguém na enfermaria durante meses, acredito que ela seria das primeiras a entrar em pânico: "E agora quem vai tratar da minha saúde?!". Confesso que o meu lado mais perverso, ia adorar testemunhar essa cena. Contudo, não seria capaz de deixar ninguém na mão, nem mesmo a própria da Olívia.
A outra, mais jovem e de cabelos negros sem brilho, é Graça Aguiar, que, pelo tamanho e posição da sua redonda barriga, será mãe pela sétima vez dentro de poucos dias, concluo. Pobre criança, que vem ao mundo só para que a mãe se sinta melhor com ela própria. Tem filhos para mostrar que contribui para o desenvolvimento da comunidade, não que se importe grandemente com eles. Há dois anos, durante o parto do seu sexto filho e entre contrações dolorosas admitiu que as crianças não passam de criaturas hediondas que Deus criou para provarmos um pouco do que é viver no inferno. Mais, enquanto segurava o novo ser que acabara de trazer ao mundo, teve a coragem de perguntar à minha mãe se existia algum medicamento para colocar os bebés num estado vegetativo durante algumas horas para que ela pudesse descansar como deve de ser durante, passo a citar, "o pesadelo dos primeiros meses". Claro que não assisti a esta cena, ainda não trabalhava na enfermaria. Contudo, a minha mãe estava tão chocada que me contou a bizarra história detalhadamente, recordando-se minuciosamente das palavras e frases que mais lhe marcaram.
Deste modo, percebe-se como é que estas duas mulheres são amigas e se dão tão bem. E, claramente, só não notam tudo o que se passa à sua volta, porque estão demasiado centradas em si próprias.
Volto a concentrar a minha atenção no Salvador que entra na quarta porta à esquerda. Sem demoras, avanço também eu nessa direção sem me preocupar com as duas mulheres por que passo.
Antes de abrir a porta, olho para o nome presente na pequena placa digital incrustada na parede: "Nicolau Andrade". Disto é que eu não estava à espera! Agora que penso nisso, foi desta porta que o vi sair naquele primeiro dia em que fui assistir à sessão de anedotas. Na altura, estava tão afetada que nem me lembrei de verificar a placa da porta. Além disso, tendo em conta que é o mensageiro não é de estranhar que entre em qualquer um dos quartos da nave. Mas agora sei que não é a serviço que faz esta visita ao Sr. Nicolau.
Dentro do quarto, vejo o Sr. Nicolau deitado sobre uma grande cama, que ocupa uma vasta área central. Do seu lado direito, encontra-se o Salvador sentado na berma da cama, com as pernas para fora, voltadas para a cabeceira. Nenhum dos dois olha para mim quando fecho a porta.
− Nico, já falámos sobre isso − profere pacientemente o Salvador. A forma como se dirige a ele causa-me alguma estranheza. Devem ser bastante próximos, penso. − Não podes deixar a medicação.
− Olá − cumprimento, a medo. Sinto-me uma intrusa, que acaba de estragar o momento íntimo entre dois amigos. Mas se me limitasse a ficar calada, seria muito mais constrangedor.
− Ah! Aurora – o Salvador volta o rosto para mim, mantendo-se sentado na mesma posição. – Vem cá, − pede gentilmente. Obedeço e, sem pressa, aproximo-me dos dois. – Nico, quero que conheças a Aurora. Ela é minha... É uma grande amiga minha.
O homem idoso ergue a cabeça na minha direção.
− Eu já a conheço − informa. Sem saber bem o que fazer, paro e deixo-me ficar de pé a um braço de distância dos dois homens tão dissemelhantes que me fitam. – É a jovem da enfermaria. Mas eu já fui fazer as análises deste mês. Acho... − acrescenta duvidoso, desconfiado das suas próprias memórias.
− Sim, o senhor esteve lá ainda nesta semana. Salvador, − murmuro, − eu e o Sr. Nicolau já nos conhecemos. Para que serve isto tudo?
− Promovi este encontro para que conheças um grande amigo da minha família. O Nico foi o melhor amigo do meu avô durante muitos anos, inclusivamente antes de embarcarem.
− Não sabia disso − confesso.
− O Nico e o meu avô trabalharam juntos na construção desta nave. O Nico foi o engenheiro aeronáutico responsável por toda a estruturação e funcionamento da nave e o meu avô trabalhava para ele. No entanto, nunca tiveram uma relação de patrão-empregado. Como deves calcular, passaram muito tempo juntos e entendiam-se como ninguém.
− Ele é muito dedicado. O teu pai também − comenta o Sr. Nicolau. Não me passa despercebido o uso do presente para descrever o avô do Salvador. Suponho que sejam os medicamentos a suprimir a memória dolorosa do conhecimento da sua morte.
− Sim, porque eu não sou − diz o Salvador num tom, claramente, irónico. Não parece nada ofendido, muito pelo contrário, parece achar piada à não associação propositada do seu nome à característica em causa. – Não tenho culpa que a comunidade raramente precise dos meus serviços.
− Ambos sabemos que podes não ser dedicado à tua profissão, mas consegues sê-lo nas coisas que verdadeiramente importam − defendo-o. Não é que ele precisasse de defesa, mas senti que seria justo se o fizesse. Ele dedicou toda a sua vida à missão de cuidar e proteger todos os habitantes da sala secreta. Ainda continua a fazê-lo. E isso não é pouca coisa.
− O Nico também o sabe, mas faz questão de se fingir de esquecido.
− Sabe? – questiono confusa. Se ele não sabe da sala secreta, como é que ele o pode saber? Ou será que sabe? Sinto vontade de acrescentar que, devido à medicação, o Sr. Nicolau não pode dissimular sentimentos ou pensamentos. Ser irónico ou sarcástico, ou sequer detetar quando os outros o estão a ser. Mas decido que isso não é relevante para o caso. E, provavelmente, sabe-o tão bem quanto eu, tendo em conta que são tão próximos.
− Aí é que está. Ele sabe. Não sabe tudo, mas sabe o principal.
− Que parte é que ele sabe? – Sinto-me estranha por estar a falar duma pessoa como se ela não estivesse presente. Mas o facto do Sr. Nicolau mal se manifestar, contribui para isso. Não é só por não falar, a sua expressão facial e corporal tão pouco revelam alguma coisa. É como se nem percebesse do que estamos a falar, mas também não se sentisse minimamente interessado em descobrir.
− Foi o Nico que deu a planta da nave ao meu avô, para que ele estudasse o melhor sítio para construir a sala. Então, ele sabe que existem pessoas a viver clandestinamente dentro da nave e o porquê, só não sabe onde.
− Porquê?
− O Nico não queria saber demais, temia que se fosse pressionado pelo 1º comandante, acabaria por revelar toda a verdade, inclusivamente a localização da sala, se isso lhe salvasse a face. O Nico sempre foi muito egoísta e valorizava a vida mais do que tudo. Acho que foi por isso que acabou por nunca chegar a casar e, na verdade, ter filhos nunca fez parte dos seus planos. Ele não queria sentir que existiam pessoas que dependiam dele. Não queria ter de se preocupar com mais ninguém, senão com ele próprio. O meu avô foi uma pequena exceção a essa regra. O Nico sabia que todas as noites o meu avô trabalhava em segredo na construção da tal sala e nunca conseguiu evitar sentir-se preocupado. Isso deixava-o extremamente furioso, porque ia contra todos os seus instintos de sobrevivência.
− Eu consigo compreende-lo − admito. – É um peso enorme teres de lutar não só por ti, mas também por todos aqueles que amas.
− Sim, mas acho que no caso dele houve um fator que contribuiu para ele continuar a pensar dessa forma. Nunca se chegou a apaixonar. Se ele tivesse amado alguém profundamente, teria percebido que valeria a pena. Que vale a pena, − acrescenta ao esticar o braço para mim e agarrando-me na mão, − colocar a vida de um outro ser que amamos à frente da nossa própria vida.
Limito-me a acenar afirmativamente com a cabeça. Estou demasiado comovida com as suas palavras para conseguir responder à altura. Além do mais, as caricias que me faz na mão com o polegar não ajudam em nada.
− Eu não preciso da medicação − comenta o Sr. Nicolau num tom de voz factual. Olho para ele e vejo-o concentrado na mesinha de cabeceira mais próxima. Sob o metal gelado repousa uma grande caixa transparente recheada de cápsulas vermelhas.
− Mas ele não aguentou − continua o Salvador ignorando a intervenção do Sr. Nicolau. – A pressão, a culpa, de saber de tudo, mas nunca ter feito nada para ajudar realmente... Isso foi destruindo-o, aos poucos, por dentro.
Raios! O primeiro surto do Sr. Nicolau! Ele estava a falar com as pessoas da sala secreta. A sua mente criara essa realidade para ele. Era a voz deles que ele ouvia. "Calem-se. Não, eu não vos posso ajudar!", gritou desesperado nessa noite. Agora tudo faz sentido. Não que eu ache que isso tenha provocado a sua doença, mas certamente que o fragilizou. Quem sabe se isso nunca tivesse acontecido, o Sr. Nicolau não viesse a ter de tomar estas estúpidas cápsulas vermelhas que o colocam num estado quase vegetativo.
− Eu não preciso da medicação.
− Nas últimas semanas, não para de repetir essa frase − explica o Salvador. – Fiquei com medo que deixasse simplesmente de a tomar, mas, felizmente, continua a fazê-lo.
− É um dos efeitos − digo com os meus olhos fixos novamente na grande caixa transparente que se encontra na mesinha de cabeceira. – Ele sente-se compelido a fazer aquilo que os outros o mandam fazer. É como se não tivesse vontade própria. Ou melhor, até pode ter vontade, mas não passa disso. E ser capaz de expressar essa vontade, já é uma grande coisa. Pensei que também isso fosse inibido pela medicação.
Ouço um pequeno bip estridente, que se alonga no tempo por mais do que seria suportável. O som não é muito alto, mas é suficientemente agudo para ser notado por qualquer ouvido humano. Talvez até durante o mais profundo dos sonos.
Uma curta saliência vai-se destacando na base da caixa, num movimento subtil. Tem a forma de um cubo com não menos do que dois centímetros de aresta, constato assim que tanto o movimento como o som cessam. Dentro da pequena e nova forma, que parece ter surgido magicamente, é visível uma redonda e achatada cápsula vermelha do tamanho da íris de um olho humano.
− Está na hora da medicação − informa o homem que continua a agarrar-me a mão como se tivesse medo de cair, apesar de ser ele quem está sentado numa cama confortável que facilmente lhe ampararia a queda.
− Não! – Agarro firmemente a mão do Sr. Nicolau antes de esta chegar a tocar no sinistro cubo mágico.
É estranho o contraste que sinto. Na mão direita, a pele suave e quente do Salvador acalma-me. Na mão esquerda, a pele enrugada e enregelada do Sr. Nicolau entristece-me. Quem entrasse agora neste quarto acharia, de certo, que sou a ancora que suporta estes dois homens e os impede de caírem nas águas profundas que nos rodeiam. Mas poderia ser ao contrário, não podia? Eu podia ser a embarcação que se fixa a duas rochas para fugir dos perigos do mar e voltar para terra. Ulisses ensinou-me que há tantos ou mais perigos no mar do que aqueles que existem em terra. Será que nesta nave os perigos não ultrapassam aqueles que podemos encontrar lá fora, em espaço aberto? Sim, mais facilmente seria eu a agarrar-me a eles, e não o contrário.
– Sr. Nicolau, não precisa de tomar a medicação. – Utilizo o meu tom de voz mais persuasivo, porque sei que o que digo tem de ser entendido como uma ordem. Tal como fazemos com as crianças quando lhes dizemos para não mexerem em algo. A diferença é que a probabilidade de as crianças seguirem uma ordem que lhes é dada não é de 99%. Os pais bem que gostariam que isso fosse assim tão fácil.
Sinto a mão do velho homem afrouxar. Largo-a e olho para o rosto dele, mas continua sem me transmitir nada. O Sr. Nicolau recolhe a mão e pousa-a sobre as mantas que cobrem a sua barriga ligeiramente proeminente.
− Tens a certeza, Aurora? – pergunta o Salvador. – Isso não lhe vai fazer mal?
− É só por um dia, ele já está medicado há anos. Não me parece que surta qualquer tipo de efeito. Nem negativo, nem positivo. E se isso o fizer sentir melhor, nem que seja apenas um pouco melhor, já é alguma coisa.
A verdade é que não tenho a certeza. Como poderia, se sou uma simples enfermeira? Mas tenho de admitir que é o vasto conhecimento que adquiri ao longo deste ano e meio a trabalhar na enfermaria, que me leva a concluir que o organismo dele já aprendeu e se habituou a "pensar" da forma como a medicação o induziu a fazer. Não é que ele possa abdicar do tratamento para o resto da sua vida, porque ninguém sabe se os surtos seriam travados dessa forma. Mas um dia? Que mal tem um dia?
− Suponho que tenhas razão. – O Salvador reclina-se à minha frente e, com a mão que tem vazia, pega na pequena cápsula vermelha, que se tinha limitado a ficar ali, quieta e abandonada, como se já não valesse nada. Vejo o pequeno cubo vazio a ser engolido pela caixa transparente, que desta vez decide não emitir nenhum queixume audível. − Se eu soubesse, já te teria trazido aqui mais cedo. – O Salvador ocupa de novo o seu lugar e deposita a forma vermelha arredondada no bolso direito das calças largas, que traz hoje vestidas. − Ele pode não estar a sorrir por fora, mas estará certamente a fazê-lo por dentro.
Eu gostava de poder concordar com o Salvador. Gostava de, por momentos, esquecer tudo o que sei e agarrar-me a essa visão romantizada do estado deste pobre homem. Porém, não consigo. A verdade, nua e crua, é que o Sr. Nicolau não revela ou expressa qualquer emoção, simplesmente, porque não a sente.
− Gostei de o conhecer um pouco melhor, Sr. Nicolau − admito comovida. O homem idoso nem olha para mim, tem o olhar preso no teto do quarto. Sei que me ouviu, porque os seus ouvidos não foram danificados ou alterados, mas o cérebro impede-o de processar muitas das mensagens que os seus órgãos sensoriais recebem constantemente do exterior. – Hei de cá voltar outras vezes.
− Comigo, espero – sinto-me derreter ao ouvir tal desejo por parte do Salvador. Sei que estamos separados, que ontem tivemos a nossa primeira discussão, mas eu gosto tanto deste homem que me olha como se eu fosse a única estrela do Universo.
− Até à próxima, Sr. Nicolau. Adeus, Salvador.
Aproveito a reação estupefacta do Salvador para me ver livre da sua mão quente e meiga.
Percorro o curto caminho que existe entre mim e a porta do quarto. Escuto passos atrás de mim e não preciso de me virar para saber de quem se trata. Decido ignorá-lo e limito-me a continuar a andar mantendo o mesmo ritmo. Ele não terá coragem de me seguir, quando estiver fora deste quarto.
Quando já estou a apenas um passo de abrir a porta, sinto um corpo pesado e quente sobre o meu. Num movimento rápido, o Salvador volta-me na sua direção e cola-me à superfície rígida da porta metálica. As suas mãos estendidas posicionam-se ao lado dos meus ombros de forma ardilosa. Os braços totalmente estendidos, dão a falsa impressão de que não estou totalmente presa. Mas sei que se tentasse escapar, ele não teria muita dificuldade em deter-me. Talvez por isso, deixo-me ficar totalmente imóvel, de cabeça erguida e com os braços esticados a ladear-me o corpo.
− Onde pensas que vais? – pergunta-me num fio de voz rouca. – Há uma coisa que eu ainda te quero mostrar.
− Ai sim? O que é, desta vez?
− Preciso mostrar-te que ainda gostas de mim. E muito.
− E como pensas fazer isso? Porque não me podes obrigar a fazer algo que não quero.
− A questão é que... − O Salvador flete os braços e todo o seu corpo se inclina na minha direção. Com o roçar do nariz na minha pele do rosto, traça, lentamente, uma linha invisível desde a minha orelha esquerda ao meu queixo, e do meu queixo até à minha testa, só para depois voltar a descer. Os seus lábios mantêm-se a escassos milímetros dos meus, mas são apenas os nossos narizes que se tocam. Sinto que o meu coração me vai sair pela boca. Fecho as mãos em punhos para impedir que ganhem vida própria e comecem a explorar o corpo do homem por que tanto anseio. – Tu queres, eu sei que sim.
A boca dele investe impetuosamente sobre a minha, que, um segundo depois, se abre para o receber. Estremeço de saudade, de desejo, quem sabe, de amor, enquanto o beijo se vai aprofundando cada vez mais. Com as minhas mãos puxo o corpo dele para mim e os nossos corações aceleram-se simultaneamente, pulsando sob o mesmo compasso.
− Salvador − digo ofegante ao afastar o seu rosto do meu. – O Sr. Nicolau está mesmo ali.
− Tens toda a razão. Peço desculpa, Nico − acrescenta ao voltar, brevemente, a cabeça na direção do amigo. – Mas não podia aguentar nem mais um segundo sem beijar a mulher mais bonita de todo o Universo.
− És tão exagerado! Tu não conheces, provavelmente, nem um terço delas.
− Importas-te de não contestar tudo aquilo que eu digo? – As mãos dele prendem as minhas à porta, um pouco acima da minha cabeça. – Se eu digo que és a mais bonita, é porque és. Nem te atrevas − acrescenta ao ver-me abrir a boca para lhe responder. Queria dizer-lhe que ele não é o dono da verdade, que apenas diz todas estas coisas para me amolecer e que, na verdade, pouco me importam os elogios. Porém decido manter a minha boca fechada, não porque ele me pede, claro, mas antes porque as minhas entranhas se agitam com o azul eletrizante que me fita intensamente. – Além do mais, precisava de te relembrar o motivo pelo qual aceitaste namorar comigo.
− Não foi pelos beijos que aceitei. Por muito bons que sejam − admito roborizada. – Foi pelo pacote inteiro. Por seres um homem altruísta, corajoso, protetor, determinado, maduro, e, até mesmo, pelo teu lado misterioso. O que pensas e o que sentes continuam a ser um verdadeiro mistério para mim, mas eu não desgosto disso. E mesmo quando és esquivo e frio, sinto vontade de te agarrar, e descongelar e abrir esse teu coração enorme. − Sinto vontade de colocar uma mão sobre o seu peito, mas o Salvador ainda me agarra firmemente pelos pulsos. – E irrita-me profundamente como consegues virar todas as situações a teu favor ou quando fazes coisas tão simples como olhar para mim e isso me deixa a incendiar por dentro.
− Se eu soubesse que só era preciso encostar-te a uma porta, para que confessasses tudo o que achas de mim, já o teria feito há muito mais tempo.
− Cala-te e beija-me!
O Salvador obedece prontamente e, sem me largar os pulsos, volta a beijar-me como se estivéssemos apenas os dois no quarto.
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