05.
Roy e Bex se soltaram um tanto envergonhados quando viram o médico entrar, o homem desviou o olhar para o chão, pensando que flagrara algo mais sério que um abraço.
— O senhor Queen está bem, o tiro foi de raspão — o médico esboçou um meio sorriso, olhando a ficha eletrônica de Roy. — Todavia, ficará um pouco sonolento devido aos remédios para dor, apenas durma para descansar.
— Obrigada, doutor Paul. —Bex sorriu tímida.
O médico assentiu e deixou a sala, Roy se levantou, as mãos de ambos se encostaram lentamente, apenas deram um sorriso sem graça.
— Vamos voltar para a nave, conversamos lá. — Rebecca deixou a sala antes que ele pudesse falar algo.
O ex-contrabandista procurou por seu sobretudo preto, era estranho estar sem ele. Teve que vestir mais devagar porque seu braço estava enfaixado, notou o furo no ombro esquerdo, revirou os olhos. Precisaria de um novo.
Sentiu seu corpo amolecer, como se tivesse dias que não tinha uma boa noite se sono. Era o remédio fazendo efeito.
Deixou a sala encontrando Rebecca conversando com Vox, sem nenhum sinal de Krent, até já sabia o que poderia ter acontecido.
Enquanto isso, Zia entrou na sala que Krent estava. Assim como o tiro que o ex-contrabandista levou, esse também foi de raspão. A garota se aproximou do velho amigo um tanto mais cautelosa que de costume. Eram amigos há tanto tempo que já nem se lembravam mais o que significava ficar desconfortável do lado um do outro.
Krent a lançou um riso sem graça, Zia também riu e cruzou os braços.
— Já te adianto que estou bem, foi só um susto. — O homem ergueu as mãos em sinal de rendição, ela assentiu.
— Sei disso, falei com Vox, parece que a tarefa foi mais complicada para todos nós. — Zia sentou ao lado dele na maca, ficaram colados, mas eles não se importavam. Proximidade não era algo que assustava na relação deles.
— Queen também se feriu? — Krent perguntou, até porque, era estranho eles acabarem de chegar e Zia já estar lá. Provavelmente, alguém também tinha se machucado e se ela estava com ele, Roy estaria em outra sala.
— Sim, foi de raspão também. Só estamos esperando liberar você para que a gente volte para a nave. Bex quer conversar. — Zia explicou, ele concordou com a cabeça.
— Mais problemas? Ainda nem resolvemos o primeiro. — Krent encostou na parede, olhou para o teto branco. Sentia sono.
— Deve ser, ela não deu detalhes, mas talvez nem fale agora, você e Roy vão precisar dormir. — Zia também encostou as costas na parede, fechou os olhos. O cansaço era grande.
— Você acredita que tem mais de um ano que batemos a nave em uma fonte e conhecemos aqueles três? Parece que foi ontem. — Krent riu, devia ser o efeito do remédio, pois se sentia nostálgico.
— Verdade. Quem iria imaginar o que aconteceria depois, certo? Nossas vidas nunca mais foram as mesmas. — A garota deu de ombros, e também encarou o teto.
— Ainda bem.
Os dois agentes não falaram mais nada.
Não precisa falar, só a companhia um do outro já estava bom.
O silêncio não era desconfortável.
Logo, Vox apareceu os chamando para ir à nave. Krent mal conseguia manter os olhos abertos, esses remédios eram bem fortes.
Bex resolveu dizer sua nova decisão apenas quando eles descansassem, devido os últimos acontecimentos, ela se lembrou de sua última missão sendo agente da O.R.
"Rebecca adentrou o corredor praticamente em chamas, sentia a fumaça invadir seus pulmões, o calor fazia tudo ficar mais assustador, a estrutura do prédio velho começou a cair em sua frente. A garota subiu as escadas, desviando dos destroços, ouviu a voz de um dos seus colegas da O.R, ele pedia por ajuda. Sem pensar duas vezes, Bex correu para seu auxílio.
Chutou a porta com uma força que nem sabia que tinha, encontrando seu colega embaixo de uma parte do teto quebrado.
— Jordan! — Gritou, o homem mal conseguia falar, apenas tossiu devido a fumaça. Rebecca se abaixou, tentando pensar em uma maneira de tirar ele dali.
— Bex? — Balbuciou, entre a tosse e a respiração ofegante, a dor que sentia era insuportável. Rebecca segurou uma parte do destroço, tentando levantar. — Bex, o que você está fazendo aqui?
— Eu estou tentando te ajudar. — Rebecca empurrou uma parte, o que fez aliviar a dor de Jordan. Bex segurou ele pelo tronco, apertando seus braços ao redor de seu corpo. Juntando suas últimas forças, puxou o garoto, arrastando seu corpo para o lado.
— Não acredito que conseguiu. — Ele riu, era de dor com alívio. Jordan segurou Rebecca pelos seus ombros, os dois saíram o mais rápido que seus corpos permitiram, entretanto, uma parte da escada caíra. Os dois agentes se encaram e viraram o outro corredor, tentando desviar das chamas e do que caía em suas frentes.
Rebecca abriu a porta da saída de emergência, a escada era pequena e os dois não iam conseguir ir juntos.
— Jordan, segura no corrimão... — A garota apontou o ferro, entretanto, Jordan segurou a mão dela.
— Você vai junto comigo, Bex, não pode ficar aqui. — Jordan continuava tossindo, ofegante e sentia que podia desmaiar a qualquer momento. Rebecca vendo que ele não conseguiria descer a escada sozinho, tratou de acompanhar seu colega degrau por degrau. Os dois, mesmo com muita dificuldade, conseguiram chegar no estacionamento.
Algo dentro de Bex dizia que era para sair o mais rápido possível do prédio, a garota segurou na cintura dele, Jordan passou os braços pelo pescoço dela. Os dois correram o máximo que suas pernas permitiram, antes deles atravessarem a rua, o prédio explodiu.
Rebecca se lembra do som de uma ambulância, a sirene alta e estridente. Seu corpo dolorido sob o asfalto frio e molhado devido à chuva que caía.
Ela olhou para os outros prédios, todos em chamas, alguns já abaixo, também explodiram, entretanto, Bex não percebeu, pois estava desacordada, e nem sabia o motivo de ter despertado, talvez a preocupação com seu colega que também estava sob o asfalto frio, um pouco mais a frente, debruçado.
Rebecca queria ter feito mais alguma coisa.
Queria ter ido até a sua nave pedir ajuda pelo rádio, porém, seu corpo doía tanto, sua mente estava tão embaralhada, que nenhum músculo reagia. Acreditava que tudo aquilo tinha sido sua culpa, levaria aquela noite pelo resto de sua vida.
A noite que perdeu tudo o que passou dez anos construindo.
A causa de sua demissão da antiga O.R.
E por um tempo, Rebecca ficou deitada na rua, deixando a chuva encharcar seu corpo, os pingos gelados caíam sobre seu rosto e ela nem se importava, olhava para o céu, Bex sempre se sentia melhor quando olhava para a imensidão do que existe sob nossas cabeças, era como ver a eternidade.
Entretanto, naquela terrível noite, a única coisa que a garota fez foi chorar.
Por achar que tinha sido sua culpa a morte dos outros agentes, Rebecca chorou como nunca havia chorado antes. Chorou por tudo o que aconteceu, lembrou de todas às vezes que a vida conseguiu a derrubar, mas agora, ela não fazia a menor ideia de como levantaria dessa."
— Bex?— Zia a chamou, a garota encarava a capitã Hantten, que fumava olhando a grande janela da parte superior da nave, Rebecca tinha se isolado para poder sofrer sozinha, enquanto se lembrava de todas as fases difíceis de sua vida.
— Oi, Zia. Desculpa, estava distraída. — Ela deu de ombros, tragou o cigarro mais uma vez antes de apagá-lo no pequeno pote de vidro ao seu lado.
— Eles já estão acordados, pode falar agora se quiser. — Zia explicou, Rebecca ergueu a sobrancelha.
— Eu já vou, pode ir na frente.
Zia concordou com a cabeça, deixou aquela área da nave mais rápido do que tinha entrado. Rebecca encarou a janela, vendo as estrelas e satélites que ficavam próximos a sua nave, o céu ainda a acalmava. Suspirou profundamente.
Quando a porta do escritório se abriu para ela, viu sua equipe espalhada pelo espaço, sentados nas pequenas cadeiras flutuantes postas na frente uma das outras. Bex deu um leve sorriso e ficou parada na frente deles.
— Equipe, algumas coisas me fizeram pensar sobre essa ideia de seguir a nossa investigação, vocês encontraram ótimas pistas, mas, ainda assim, me vejo na obrigação de encerrar por aqui. — Bex os encarou, e respirou fundo.
— Não vou parar a missão, é só uma pausa, estive com o conselho e vi que é melhor deixar os outros capitães, que estão aqui há mais tempo, investigando o caso. Vocês estão de folga agora.
A tripulação ficou dividida. Alguns como Zia, acreditava que é melhor dar uma pausa, já que a A.F.G.U. inteira está cuidando do caso. Vox compreende a preocupação de Bex, pois querendo ou não, a missão mal tinha começado e dois deles se machucaram. Krent, embora confuso sobre a decisão de Bex e intrigado sobre esse caso, resolveu acatar a ordem de Rebecca sem questionar. Entretanto, nem todos conseguiram ficar calados.
Roy é o primeiro a se manifestar.
— O que te fez mudar de ideia? — O ex-contrabandista levantou o olhar na direção da capitã, Rebecca deu de ombros, sabia que ele não conseguiria ficar quieto.
— Algumas coisas, mas nada que eu já não pensasse, está tudo bem agora, estão dispensados, por enquanto.— Ela sorriu gentilmente para sua tripulação, e deixou a sala.
— Ela está escondendo algo. — Concluiu Krent, Zia assentiu.
— E deve ser algo sério para dar uma pausa em uma missão assim. — A garota encostou na parede atrás de si.
— Roy, você devia perguntar o que aconteceu. — Vox sugeriu, deu de ombros e ajeitou os óculos de volta sob a ponta do nariz. O amarelo franziu a testa.
— E por que acha que ela contaria para mim? — Cruzou os braços na altura do peito, ultimamente, Queen tem malhado muito, seus braços estão fortes.
— Vocês vivem de segredinhos pelos cantos. — Vox se levantou da cadeira flutuante, não dando muita importância para o assunto em questão e deixou a sala.
— Errado ele não está, o que você e Bex tanto conversam pelos cantos, Queen? — Krent sorriu de lado, Roy riu.
— Até parece que ele vai contar para a gente, vamos ter que descobrir sozinhos. — Zia sorriu travessa para seu amigo de tantos anos, ele concordou com a cabeça, rindo.
— Vocês são tão imaturos! — Roy deixou a sala, ouvindo a risada dos dois agentes. Entretanto, também riu. Não se incomodava quando alguém achava que ele e Rebecca tinham algo a mais que amizade.
O ex-contrabandista seguiu pelo corredor, o caminho se iluminava conforme avançava.
Usou o elevador para alcançar o ponto mais alto da nave, sabia que Rebecca estaria olhando as constelações.
Assim que adentrou essa grande ala praticamente vazia, avistou Bex em uma das poltronas mais velhas que eles guardaram nessa parte. A mulher não o viu se aproximando, apenas encarava as janelas que iam do chão até o teto.
Roy sentou ao lado dela, se ajeitou na poltrona e cruzou os braços.
— Vai me contar o que aconteceu?
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