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A Esposa de Ninguém - Ceryse Hightower

                          Parte 1

     Era uma jovem donzela quando se casara com o tal príncipe Targaryen, só não era mais jovem do que o noivo. No entanto, Maegor nada se parecia com um garoto; tinha quase a mesma altura de seu pai, o Conquistador — que Ceryse havia visto apenas uma vez —, ombros largos e músculos que nenhum outro garoto, ainda verde, teria. Espantara-se que após sua primeira noite juntos, o garoto pedira aos criados que trouxessem o cervo que havia caçado com seus compatriotas. Era uma criatura enorme, com ferimentos em diversas partes do corpo, todos feitos por Maegor, que conquistara de sua parte alguns arranhões.

    Após um ano juntos, não houvera indícios de que sua união ao jovem dragão havia dado frutos. A Rainha Viúva Visenya era, em grande parte, agradável, mas por vezes lhe lançava olhares furtivos de reprovação. A verdade era que as visitas de Maegor até seus aposentos não era poucas, e que as teorias que rondavam o castelo de Dragonstone diziam que ela era, de fato, infértil. Não demorou muito mais tempo para que Maegor perdesse seu interesse nela.

    Os anos se passaram e a grandiosa Dragonstone parecia cada vez menor e menos impressionante. Porém, juntamente aos ratos, apenas um aspecto manteve-se constante: jovens moças, belas, que iam e vinham dos lugares mais inusitados. Ceryse sabia, os criados sabiam, e certamente a rainha viúva também. Perguntava-se quantos bastardos haviam espalhados em vilarejos da ilha e nos becos de Porto Real, quando convidados pelo irmão rei de Maegor, Aenys.

     Olhou-se no espelho de mão, uma, duas, três vezes. Conseguia ver pequenas rugas acumulando-se ao lado dos olhos e próximo ao arco dos lábios. Não era mais tão jovem e delicada quanto era antes, sentia-se velha e usada. Não era elegante como a esposa do cunhado e tampouco era tão temida e conhecida como a mãe de seu marido. O que lhe restava afinal além da jovialidade que não mais possuía, não para os padrões de Maegor.

— Ele irá me deixar, não é? — perguntou um dia para a rainha consorte, Alyssa. Chovia do lado de fora, uma tempestade tão furiosa que era impossível ver além do horizonte cinza que era a Baía do Água Negra. Pingos de chuva frios caiam sobre seu rosto quente. O meistre de Dragonstone dizia que era mais fácil contrair um resfriado daquela maneira, mas não se importava com suas recomendações.

— É difícil dizer — respondeu Alyssa, do lado de dentro. — Maegor sempre fora imprevisível. A única mulher que consegue compreendê-lo é a mãe. Nem mesmo o Conquistador conseguia enxergá-lo com bons olhos.

— Falando assim é como se meu esposo fosse um monstro, Alyssa — chateou-se Ceryse, escapando das gotas de chuva que de repente tornaram-se muitas. — Maegor por vezes é gentil. Não penso que se sinta atraído por mim, não mais. A masculinidade recém adquirida trouxe a ele a excitação de trazer jovens meninas para cá, para deleitar-se com elas.

— Alguma que lhe tenta chamado atenção? 

— Não. Maegor pensa que é esperto, traz garotas diferentes para que eu não perceba suas verdadeiras funções — disse ela. — Por que pergunta?

— Por que eu temo que uma amiga sofra a dor da substituição — disse. — Querida Ceryse, Alysanne é minha quinta criança. Já estão casados há mais de uma década, as pessoas comentam. Algumas senhoras da corte pensam que é infrutífera.

— Mas não é verdade — defendeu-se Ceryse. — Eu rezo para que a Mãe me dê filhos saudáveis todos os dias, talvez eu esteja deprimida demais para conceber. Sinto falta de Vilavelha, de meus pais e do Septo Estrelado, Dragonstone é enorme e solitária, nem mesmo todos os livros da biblioteca podem me manter entretida para sempre.

— O rei e eu sempre lhe daremos boas-vindas à capital. É uma cidade caótica nos dias de hoje, mas é cheia de música, festas e arte, recebemos muitos pantomimeiros de Westeros, são engraçados — comentou Alyssa. — Por que Maegor não se une à corte de Aenys? Eu garanto que seriam mais felizes lá. Deixe este castelo assombrado para a velha Visenya.

— Maegor não concordaria, ele é orgulhoso demais para viver sob as regras de seu irmão — disse Ceryse. — Ele é um homem muito complexo, mas sensível. Tenho medo de atingir sua sensibilidade e sair prejudicada.

A rainha deixou seus assentos confortáveis para conferir a pesada e entreaberta porta de pedra. Quando a fechou, voltou-se para Ceryse com um olhar nervoso e inquietante.

— E se eu lhe dissesse que há um acordo mais do que vantajoso para que Maegor volta para às graças de Aenys? — indagou Alyssa. — Ele não precisaria ferir seu orgulho e seguir as regras do irmão, não se ele próprio as escrevesse. Um lugar no pequeno conselho de Vossa Majestade o convenceria, não? Uma posição como Mão do Rei.

— Pelo amor dos Sete, Alyssa... não diga essas coisas para me agradar. Meu marido como Mão do Rei? Nós duas sabemos que Maegor prefere empunhar espadas e cavalgar até os confins de Westeros para derramar sangue.

— Os outros homens do pequeno conselho pensam que se Maegor tiver um cargo importante e se mantiver ocupado, sob a supervisão de seu irmão, poderá ser controlado — disse Alyssa. — E eu garanto que você seria mais feliz estando cercada de vida e de arte, pense nas visitas que pode fazer ao Septo.

— É tudo o que eu mais queria — disse Ceryse —, mas não podemos contar com a vontade de Maegor. Ainda que eu saiba que meu marido tem sede por uma posição mais alta, devo lembrá-la que seu marido e sua corte podem não apreciar Maegor e seu gênio.

— Talvez Aenys possa coagi-lo. Para a surpresa de todos, seu marido ama o irmão, e irá obedecer a vontade de Vossa Graça sem reclamar.

                                                                                     Parte 2

    Quando a noite chegou, Alyssa e seu navio já haviam partido. Repousara próxima à janela para observar o quebrar de ondas na orla, ainda havia alguns pequenos barcos de pesca na proximidade que levavam apenas redes e lampiões. Desejou estar em um daqueles barcos, navegando de volta para Vilavelha, onde tudo era mais quente e acolhedor. Uma de suas criadas chegara pouco tempo depois, para anunciar que o jantar já havia sido servido.

     Havia peixe fresco cozidos com o que Maegor e seus comparsas puderam trazer de Essos em sua última viagem à negócios, um caldo de legumes fumegante e uma torta de pombo cremosa, tão cheirosa quanto morna. Maegor gabava-se sobre suas conquistas em algum torneio qualquer enquanto enchia a barriga com um tinto da árvore.

— Derrotei-o sem esforço, os homens daquela família são superestimados. Qualquer valiriano ou ândalo os venceria em um duelo singular — comentou o príncipe ao som de uma risada prepotente. — Ouvi a esposa do homem chorar quando separei seu braço do resto do corpo. Uma senhora da Casa Beesbury, acredito.

     Ceryse sentiu-se enjoada quando olhou o peixe ainda quase inteiro servido, imaginando que sua espinha se parecia com o membro decepado do jovem cavaleiro. Apressou-se a dizer:

— Sor Adam Tarly é um bom cavaleiro, meu querido — disse, voltando-se para o seu próprio jantar. — Já o vi vencer diversas justas quando era menina, lá mesmo em Vilavelha.

— Não sabia que o conhecia.

— É um primo de minha mãe, Melinda Tarly. Era um de seus favoritos.

Após isso, o silêncio tomou um grande espaço na sala de jantar, com Maegor servindo-se com mais e mais vinho, até estar transbordando com a embriaguez.

— A esposa de seu irmão esteve aqui pela manhã — disse Ceryse com um meio sorriso, que para Maegor fora uma surpresa, tendo em vista a quão séria era a esposa. — Ela se recuperou bem de seu parto, dera à luz a uma menina. Chamaram-na de Alysanne.

— Sei bem, estive em Porto Real para felicita-los... é uma coisinha feia e chorona se quer saber minha opinião — disse Maegor, atropelando suas palavras. — O que a vadia estava fazendo aqui, no meu castelo?

— Eu precisava de uma amiga, todas as minhas damas ficaram em Vilavelha e mal me mandam cartas — disse Ceryse, contrariada. — Ela também veio me atualizar sobre as notícias de Porto Real. De acordo com ela o número de credores da Fé vem crescendo cada vez mais, graças à Mãe.

— E nós somos os desafortunados por isso. Mais vinho! — Maegor ergueu seu cálice sobre o olhar atônito de Ceryse. Ele sorriu após tomar um gole do tinto — Ora, não faça essa cara. Sabe o que penso dessa fé.

— Deveria estar mais inclinado a respeitá-la uma vez que eu faço parte dela! — protestou ela. — De qualquer jeito, não é sobre a Fé que quero discutir... deve saber que Lorde Alyn Stokeworth foi morto em uma empreitada contra aquele bárbaro das Terras Fluviais. Ela me disse que o rei discutiu com os homens do pequeno conselho, todos acham que seria melhor se alguém da família assumisse o posto do pobre homem, alguém que pudesse instruir o rei a guiar Westeros pelo caminho forte e correto. Por isso Vossa Graça disse que seria o maior dos presentes se seu irmão estivesse lá por ele.

    Maegor riu com desdém estampado em seu rosto. Ceryse sentiu-se irritada com a reação de seu marido.

— Aenys poderia ter me trazido para sua corte e conselho um milhão de vezes, mas decidiu não o fazê-lo. Decidiu que eu mesmo não era digno o suficiente de sua filha, que agora rebelou-se e amostra-se por aí com seu dragão, uma jovem feroz e formidável — disse ele. — Dizem que ela deu sua donzelice para um pantomimeiro em Tarth, Aenys ficou perplexo e a proibiu de voar por aí.

    Ceryse se sentiu vacilar com a menção à jovem Rhaena, sobrinha de Maegor e agora uma exuberante moça, com quem Maegor deveria se casar. Não pensava em Rhaena como desagradável ou nada semelhante, mas sabia que a Rainha Viúva Visenya tinha planos de casar seu primogênito com a primogênita do rei, para dar continuidade à linhagem valiriana, mas ambos receberam a sobrinha do Alto Septão nas portas de Dragonstone, com um ótimo acordo de paz. Não precisava ser muito inteligente para entender os posicionamentos de mãe e filho sobre a fé.

— Queria poder saber o que é voar em um dragão, mas esta é uma dádiva com a qual os deuses não me agraciaram — disse Ceryse. — Deveria juntar-se a Aenys. Apenas ele e os deuses sabem como precisa de aliados, Dragonstone torna-se pequena conforme os anos se passam. Admita que se cansou... dos mesmos pratos, corredores, dos mesmos criados, das mesmas atividades, das mesmas moças...

     Maegor deixou seu cálice de vinho de lado por instantes, para encarar a esposa que apenas o olhava de escanteio.

— Pise com cuidado, Ceryse, é um terreno arredio. Talvez eu não tenha me cansado de tudo o que mencionara antes, mas talvez eu tenha me cansado das promessas vazias que tem me feito sobre herdeiros — disse Maegor, de forma tão amarga e dura que fez com que a mulher se encolhesse, apesar de ser muito mais velha e sabida. — De qualquer forma, sua inoperância não tem a ver com meu problema, não é sua culpa se os deuses a fizeram assim. Talvez eu deva conversar com minha mãe, ela sim sabe muito bem o que fazer em situações como esta.

— Se pensa ser o melhor então vá em frente — resmungou ela com secura, bebericando seu vinho. — Talvez ela tenha uma coisa ou outra a dizer sobre sua falha em cumprir seus juramentos, feitos a mim no dia de nosso casamento.

     Maegor riu com bastante vontade e levantou-se desengonçadamente. Ceryse não tirou os olhos do marido enquanto ele caminhava, passo após passo até estar atrás dela. Uma mão, sem luva e sem ferro deslizou por trás de seu pescoço quente, arrepiando a pele. Maegor ergueu-se sobre ela, permanecendo em sua altura para beijar-lhe a bochecha e sussurrar em seu ouvido.

— Seus desafios me entretêm, Ceryse, lembre-se disso enquanto ainda estiver aqui — disse ele ao pé de seu ouvido. — É o único motivo pelo qual eu não enviei sua carcaça velha em um barco de pesca de volta para Vilavelha.

      Quando os dedos frios deixaram seu pescoço e o ouviu se afastar sentiu um alívio imediato. O dever mandava que amasse ao marido, e ela tentava fazê-lo, mas tudo em Maegor cheirava a perigo, crueldade e desonestidade, eram coisas com quais nunca poderia se acostumar. No fim das contas, Maegor ainda era apenas um garoto, e sentia-se culpada por ainda vê-lo desta forma, mas era o que ele era. Enquanto ela não ficava mais jovem com o tempo e ao contrário de Maegor e de Rhaena, transparecia todos os dias.

     Naquele dia subiu as escadas com lágrimas nos olhos, sem dirigir a palavra à sua guarda pessoal. Quando bateu a pesada porta de pedra, debulhou-se em lágrimas sobre a cama, sentindo-se vencida e humilhada. Deveriam ter se passado horas desde que chegara ao quarto, mas não sabia dizer ao certo. Dormiu quando as gotas de chuva da madrugada começaram a cair, indicando como seria seu próximo dia, ao lado daquele homem a quem não deveria amar.

                                                                                         Parte 3

     Sentiu que poderia desmaiar a qualquer momento. A enorme criatura negra era maior do que qualquer outra coisa viva que já havia visto na vida, e estava inquieta, rosnando e batendo suas grandes asas de couro. O pai tinha livros antiquíssimos em sua biblioteca particular em Torrealta, castelo de sua família; em alguns deles tinham histórias impressionantes, como os dos poderosos mamutes do Norte e os gigantes que os montavam; Balerion poderia devorar um inteiro, gigante ou mamute, sem dificuldade alguma.

— Ele sabe que deixaremos Pedra do Dragão em breve, talvez não queira se despedir de Vhagar — disse Maegor, com uma mão sobre a pele atrás da cabeça do animal, com a intenção de acalmá-lo. — Ele também não costuma carregar mais de uma pessoa por vezes. Apenas fez uma vez.

— Fico contente em saber — Ceryse forçou-se a encarar Balerion, que ao sentir seu olhar sobre ele rosnou mais uma vez. Ela se encolheu. — Quem foi a afortunada?

— A irmã de minha mãe, Rhaenys — disse Maegor, sem qualquer resquício de nostalgia ou felicidade. — Ela tinha uma montaria própria, um dragão branco chamado Meraxes, uma fêmea. Mas o Conquistador quis mostrar a ela o que era estar olhando o mundo da perspectiva da besta mais poderosa do mundo conhecido.

— Sua mãe nunca quis montá-lo? Ele parece digno de sua personalidade — disse Ceryse antes de conseguir se conter. Ao perceber que Maegor a olhava de escanteio, abaixou a cabeça levemente, envergonhada. — Perdão, eu não quis me intrometer. A morte de seu pai e de sua tia ainda deve ser doloro...

— Eu lhe ajudarei a subir na cela — Maegor a interrompeu. — Eu recomendo que vá primeiro: não gostaríamos que Balerion levantasse voo enquanto sobe.

     Talvez tenha sido o mais próximo de atencioso que o marido já fora com ela, de certa forma sentiu-se aliviada. Ele estendeu uma mão enluvada para que ela segurasse como apoio para subir, com um impulso firme, Ceryse prendeu-se às cordas de palha e metal que desciam pelo dorso negro do dragão. Sentia que a subida das escadas em espiral até o poleiro era mais curta. Quando chegou ao topo, percebeu que poderia deitar-se em direção horizontal nas costas de Balerion, talvez coubesse mais quatro ou cinco delas sem nenhuma dificuldade. Em seguida, Maegor a acompanhou, com a espada da família, Blackfyre, brilhando na bainha do cinto.

— Sente-se na minha frente e segure-se — advertiu Maegor. — Sōvēs.

     Balerion grunhiu e deu um passo à frente, apoiando-se sobre as patas dianteiras e asas. Ceryse sentiu suas mãos ficarem dormentes com tamanha a força que segurava as rédeas de couro. Sentira um tremor embaixo de si e percebera que a criatura negra havia acelerado e que logo estariam voando no horizonte sem fim. Conseguia ver o final da caverna se aproximando e temeu que fosse cair, mas o marido a agarrou pela cintura no exato momento em que Balerion bateu suas gigantescas asas e tomou impulso para colocar-se acima do chão, e logo estavam caindo em direção ao mar. Ceryse gritou, era o fim, sabia que não deveria confiar naquela criatura velha e ranzinza. Fechou os olhos e segurou as rédeas com ainda mais força, mas para sua surpresa a dor da colisão não chegou. Ainda de olhos fechados, sentiu o vento bater em seus cabelos.

     Ousou espiar de olhos entreabertos, não conseguia ver o mar, mas sim as pedras que se organizavam bem na frente de Dragonstone, como em um belo labirinto, as gaivotas que repousavam em seus picos voaram atordoadas com a proximidade do grande animal, que tentou abocanhar uma delas sem sucesso. Logo, estava olhando para o mundo abaixo de si de uma forma que nunca havia antes. A sombria e melancólica Dragonstone parecia minúscula vista dali, como uma casa de bonecas com as quais brincava quando era apenas uma menininha. Sentiu-se forte de uma maneira que nunca havia antes; a luz brilhante do sol, a azul e ondulatória água do mar e a brisa no rosto davam-lhe uma sensação de liberdade, pensou que nunca havia se sentido tão feliz.

— É lindo — comentou ela, emocionada. — Se eu soubesse teria roubado um ovo de dragão para mim.

— Ele a cozinharia viva quando chocasse — disse Maegor com uma espécie de meio sorriso. — Agora cale-se e aproveite a viagem.

     O vento nos cabelos a poupou das náuseas. Felizmente, Dragonstone era bastante próxima de King's Landing, e apenas alguns minutos eram necessários para terminar o trajeto.

      As colinas da cidade surgiram no horizonte. Os muros da cidade eram pequenas trilhas circulares debaixo das enormes asas do Terror Negro. Havia um conglomerado de casas e edifícios próximos ao meio e nas extremidades, todas construídas em cima do barro e da terra salpicada. Não era grande coisa, mas era mais do que Dragonstone podia oferecer. No entanto, um pequeno pedaço da cidade chamou-lhe a atenção. Eram onde havia grandes casas e ruas com paralelepípedos mais uniformes, antes de um grande muro de pedras avermelhadas. O Forte de Aegon havia sido destruído, e o que futuramente seria um grandioso castelo ainda estava em seu estágio inicial.

      Balerion desceu dos ares e juntou suas asas próximo à um grande horizonte gramado fora dos muros da cidade. Maegor deixara as rédeas para descer primeiro, seguido por Ceryse a quem ajudara a descer em seguida. A moça bateu a saia do vestido rosado para se livrar da poeira. Percebendo o vazio em que estavam, perguntou:

— Pensei que viriam nos buscar pessoalmente — pontou. — Não deveremos andar até lá, não é? Eu não conheço muito dos costumes de sua família, mas a falta de educação sempre me estranhará.

— Não se preocupe, logo virão nos buscar com alguma carruagem ou cavalos. Aprenda a ser paciente, sim?

     Teve vontade de respondê-lo à altura, mas se conteve. Havia conseguido que Maegor fosse minimamente agradável, não jogaria tudo fora. Sabia que não conseguiria salvar seu casamento sem uma criança, mas talvez pudesse atrasar o marido sendo gentil e agradável.

— Ouvi dizer que o castelo ainda não fora finalizado — comentou ela. — Tenho receio de que todas as coisas que estão vindo não caibam em nossos aposentos.

— Tenho certeza de que suas coisas ficarão bem — Maegor disse com rispidez. Ceryse conseguia dizer que ele forçava uma cortesia que não era de sua natureza, mas a ignorou. Suspirando, ele continuou — meu irmão e sua esposa vivem em uma mansão impressionante. Eles têm cinco filhos, não penso que não tenha espaço o bastante.

     Conseguia ouvir as críticas do marido entre as palavras. Sempre que podia, Maegor mencionava os sobrinhos. Não porque os amava. Ele mesmo só havia viajado para King's Landing desde o nascimento de sua sobrinha mais velha duas vezes. Conseguia ouvi-lo dizendo que ela havia fracassado como esposa e mulher, que já estava ficando velha e que terminaria sem filhos.

—Eu não disse que eles chegariam?! — Maegor fez sinal para a estrada de terra e Ceryse o acompanhou. — Veja por você mesma.

     Uma carruagem puxada por quatro cavalos brancos surgiu. Tinha detalhes em prata, mas seu material era pintado de vermelho, talvez fosse ferro, e madeira embaixo. Com um sorriso, Ceryse seguiu para dentro da carruagem, seguido pelo marido.

— Eu pensei que nunca mais entraria em uma dessas.

     A carruagem seguia pelo caminho de terra, cujos os lados estavam marcados por fileiras de longas árvores. Quando atravessaram os muros da cidade, Ceryse esticou-se por cima do marido para observar a cidade em construção. Seu coração batia mais forte a cada nova cena que surgia. King's Landing, com suas ruas emaranhadas e casas que se erguiam como se estivessem competindo por sua posição nos céus. Ouvia o som de martelos batendo, o ruído dos operários e os gritos das crianças que brincavam entre as pilhas de pedra e barro. Sorria como nunca antes, era como estar de volta em casa.

— É impressionante — murmurou Ceryse com um brilho especial nos olhos. — Há tanto movimento, tanta vida...

    Maegor a observou de lado com uma careta.

— Tem potencial, mas é uma cidade em crescimento, Ceryse, nada mais — disse ele, com um tom que misturava desdém e antipatia. — Ainda há muito a ser feito. O progresso não é tão veloz quanto foi prometido. É evidente que meu irmão tem outras prioridades.

     Logo, a simplicidade da cidade em construção foi substituída por ruas altas e mais espaçosas e coloridas, com pessoas mais bem vestidas e homens com cotas de malha em todos os lugares. As pedras se tornaram uniformes e mais claras, abrindo-se em um espaçoso pátio com diversas casas primorosas, tão altas e robustas que mais se pareciam com Septos. Os muros da mansão onde o casal real vivia começaram a se destacar, com suas torres esculpidas cuidadosamente para que se parecessem com dragões e janelas que refletiam a luz dourada do início da tarde. Era um lugar que trazia em si a promessa de conforto, de um lar para quem ainda estava encontrando seu lugar no mundo.

     A carruagem parou com um leve rangido, e Maegor desceu primeiro, suas botas de couro batendo contra o chão. Ceryse, um pouco mais hesitante, seguiu-o e deu um suspiro de alívio ao sentir a terra firme sob seus pés. Antes que pudesse ajustar a saia do vestido, um som de passos pequenos e pressurosos atraiu sua atenção, juntamente com o bater de portas. Aenys e Alyssa, em seus trajes luxuosos, os aguardavam próximos da porta principal e dos guardas que a protegiam.

— Tio! — gritou uma voz alegre. Jaehaerys, com seus cabelos prateados com ouro e olhos lilases como os do pai vinha correndo na direção de Maegor, sendo seguido lentamente pela pequena Alysanne, que com apenas um ano de idade já tentava acompanhar os passos do irmão.

     A garotinha tropeçou nos próprios pés, caindo com uma risada espontânea e inocente. Ceryse reagiu de imediato, abaixando-se para pegá-la antes que ela machucasse as mãozinhas gordas na pedra áspera. Os olhos grandes e azuis se arregalaram com a surpresa de ser acolhida nos braços de Ceryse. Um sorriso, ainda infantil, iluminou seu rosto.

— Não pensei que estivesse tão linda, minha pequena Alysanne — Ceryse sussurrou, sentindo um calor tomar conta de seu peito. A menina não parava de rir, suas mãozinhas pequenas agarravam os dedos da mulher, enquanto as pernas balançavam no ar. — Está ficando tão grande, já consegue correr!

     Jaehaerys observava ambas com um brilho travesso nos olhos e correu até sua irmã para tentar fazer cócegas em seus pés. Maegor, por outro lado, não demonstrou interesse na espada de madeira do sobrinho e nem mesmo na fofura de Alysanne, limitando-se a cumprimentá-los com um aceno de cabeça.

— Maegor — saudou Aenys, com uma voz que era informal demais para um rei. Recebeu o irmão com tapinhas nas costas. — Eu e Alyssa estamos muito felizes em recebê-los. Já era hora de saírem daquela ilha.

— Estamos mais do que felizes em tê-los aqui. King's Landing ainda não é nenhuma Vilavelha, mas tem muito a oferecer — disse Alyssa com um sorriso para os dois, ela virou-se para o irmão do marido com cortesia estampada em seu rosto — Maegor...

— Vossa Graça — Maegor puxou a mão esquerda de Alyssa, sem muito polimento, para deixar um beijo na palma. A rainha se limitou a sorrir. — Têm uma bela casa.

— Oh, obrigada. Os projetos pertenciam ao meu pai, modificamos apenas alguns detalhes — disse ela. Houve um silêncio entre os casais, e depois um pigarro vindo de Aenys. — Espero que a viagem tenha sido confortável.

— Nada que não se possa suportar — respondeu Maegor, a voz era profunda e sem emoção. Aenys ignorou a postura do irmão mais novo e adentrou a mansão ao seu lado. Ao menos ele entendia o irmão. Sabia que Maegor e Alyssa tinham suas desavenças, especialmente depois de Alyssa ter feito uma insinuação sobre os dragões.

     Ceryse observou-o com um suspiro antes de se concentrar nos pequenos. Alysanne, já segura em seus braços, esticou os bracinhos em direção a Jaehaerys, que se inclinou e riu, pegando a menina para brincar com ela. Os três ficaram ali, como um quadro pintado de alegria e inocência, que contrastava com o peso que ela sentia no coração.

Se levantou e olhou em volta, absorvendo a tranquilidade daquele momento. Mesmo sabendo que a política e as intrigas poderiam ser pesadas, um pedaço de sua alma se sentia em paz. Mesmo que só por um instante.

                                                                                       Parte 4

     Para todos os efeitos, a vida na capital era alegre e cheia de vida. No fim, descobrira que podia conviver com Aenys e Alyssa sem preocupação alguma. Seus filhos eram adoráveis, e com certa frequência a residência era visitada por cantores, músicos e pantomimeiros vindos de longe, com histórias sobre Valíria e Yi-Ti. Os anos passaram depressa, e Maegor continuou distante. Porém, as mulheres que vinham visitá-lo em Dragonstone nunca se distanciaram, nunca eram as mesmas. Sabia que ele tinha preferência pelas donzelas vindas de Lys, com seus cabelos prateados, mas nada fazia sobre isso. Havia outros assuntos que exigiam sua atenção, sua fertilidade acima de tudo.

     O meistres diziam que deveria se alimentar bem. Comia carne e leguminosas todos os dias, mas evitava o açúcar e alimentos que poderiam ter algum tipo de peçonha, este fora um conselho de Alyssa. Quando o baile de celebração à nova Mão do Rei chegou, sentia-se leve como uma pena, mas fraca e magra também. O marido agora exibia um broche de bronze pregado ao gibão, tinha o formato de uma mão e era circular. Sabia que apesar de sua satisfação com seu novo cargo, Maegor estava mais do que furioso com a ineficiência de seu irmão em reinar. Esporadicamente reclamava dos altos gastos da coroa com artigos superficiais e do lento desenvolvimento da cidade onde a família real estava, tornando-a menos atrativa para os lordes que a cercavam. Havia percebido também o quanto Aenys tentava apaziguar a situação com a Fé dos Sete, que se tornava cada vez maior e mais praticada, com seus membros mais ferrenhos possuindo agora espadas e chicotes de armas nas mãos. Sabia bem o que Maegor pensava de tudo aquilo...

— Uma estupidez sem tamanho — disse o marido ao perceber que o vinho havia sido banido do baile, para agradar ao homem que havia sido elevado ao cargo de Alto Septão após o falecimento do tio de sua esposa. — Os filhos da puta bebem mais do que podem e gastam mais do devem. Eu devo ficar sem vinho por culpa deles?

— O Alto Septão é uma figura importante, não esqueça que os Ândalos estão em maioria — suspirou Ceryse.

— Quem liga para os Ândalos quando se tem um dragão? — Maegor revirou os olhos. — E além disso: se é uma festa em minha homenagem, não sou eu quem deveria escolher quem vinha e quem não?

— Há coisas que apenas um rei pode fazer — disse ela em um sussurro quase inaudível, não sabia se Maegor havia escutado ou não. Já não se importava mais com seu afeto, não depois que o marido havia deixado de frequentar seus aposentos durante à noite.

     Logo, o salão da mansão tornou-se agitado novamente com a chegada da Princesa Rhaena, sobrinha do marido, no epítome de seus dezesseis anos. Qualquer um poderia reconhecer a beleza de Rhaena, que apesar de jovem já era mais bela que a mãe e do que a maioria das moças de Westeros. Ela tinha longos cabelos prateados com reflexos dourados, eram ondulados e cheios, que caíam como cascata em seus ombros. Tinha olhos lilases como os do pai e vestia-se ricamente com um vestido púrpura com ornamentos dourados. Ceryse também sabia que a sobrinha era mais interessante para o marido do que ela mesma era. Maegor já não conseguia disfarçar os olhares direcionados a ela durante os jantares ou eventos com aquele.

— Me dê licença, querida, eu preciso cumprimentar minha sobrinha — disse Maegor, livrando-se de sua miserável companhia em questão de segundos.

     Sentia os olhos pesados, mal conseguia dormir ultimamente. Tinha saudades de Vilavelha e da família, tinha saudades das amigas com quem crescera e das pessoas que realmente a queriam por perto. Sua única amiga em King's Landing era Alyssa, que se mantinha ocupada parte do dia com suas obrigações como rainha e com a criação dos vários filhos, prestes a dar à luz a mais um.

     O gosto da comida havia se tornado amargo e os cheiros enjoativos. Via o marido conversar com Rhaena de um lado do salão enquanto Aenys e Alyssa davam graças ao mais novo lorde de Harrenhal. Ceryse pensou nele como um homem atraente, com cabelos castanhos e barba rala. Vestia-se ricamente também, tal como um lorde de grande magnitude.

— Por que está aqui sozinha? — perguntou uma voz feminina ao seu lado. — Não gosta da nova Mão?

— Que diferença faz? Eu estaria aqui de qualquer maneira — respondeu Ceryse, mal humorada.

— Eu tenho algo que pode lhe ajudar a se enturmar — disse a moça sedutoramente. — É algo bem importante por aqui.

     Interessada, virou-se para a moça. E surpreendeu-se. A maturidade na voz da jovem não combinava com seu rosto quase infantil. Sabia que a moça misteriosa era bem mais jovem do que ela era, mas também era mais ousada. Vestia-se ricamente com um vestido cor-de-rosa quente, mas ao contrário das outras mulheres no salão, esta mostrava os ombros e o colo, sendo cobertos por camadas de tecido branco que enfeitavam a vestimenta. Tinha cabelos castanhos e olhos simpáticos, mas uma malícia no sorriso. De dentro da parte inferior do vestido, ela sacou um odre médio. Ela o abriu com um estouro silencioso e o pôs na frente do nariz de Ceryse.

— Pensei que o vinho havia sido proibido hoje — comentou Ceryse, de olhos levemente arregalados. — Como você...

— Nós moças devemos ser espertas se quisermos nos divertir — a moça piscou para ela e sacudiu o odre provocativamente. — E então, vai querer ou não.

     Com um leve sorriso, mas com um vestígio de incerteza e desconfiança, Ceryse pegou o recipiente nas mãos, tomando um gole discretamente. Ela fez uma careta e o entregou de volta para a moça que riu dela.

— De onde você tirou essa coisa? Não tem o gosto de nenhum vinho que eu já tenha experimentado.

— Estava nas adegas de meu pai, ele é um grande apreciador — sorriu ela. Estendeu a mão em direção à Ceryse que a apertou sem hesitar muito desta vez. — Sou Alys, muito prazer.

— Ceryse, Ceryse Hightower. Esposa do homenageado.

     Alys riu, desacreditada.

— Não me diga.

     As duas moças se viraram quando uma voz masculina chamou por Alys:

— Querida, querida, venha cá — Ceryse percebeu que era o tal lorde de Harrenhal, Harroway, que não conhecia, mas que havia ouvido dizer que era muito bem apessoado. — Tem uma pessoa que quer lhe conhecer.

     A moça se apressou para atender o pai, percebendo que o mesmo estava na companhia do Rei e de seu irmão, o homenageado da noite. Para não ficar sozinha, Ceryse a seguiu.

— Papai, eu não sabia que o Senhor tinha intenções de me exibir — brincou a jovem, tirando uma risada de todos, com exceção de Maegor, que a examinava com cautela. Alys se curvou. — É um prazer poder finalmente conhece-los, Vossa Graças. Dou-lhe as maiores das felicitações, Alteza, tenho certeza que é a melhor decisão que Vossa Graça poderia ter tomado.

— Majestades, esta doce donzela é minha filha, Alys — Lorde Harroway apontou orgulhosamente. — Ou como eu singelamente a chamo: a donzela mais bela de todos os Sete Reinos.

— A fama a precede — disse Maegor com um leve sorriso, ele curvou-se levemente para deixar um beijo na mão da moça. — Seu pai tem razão, milady. É muito encantadora.

     Com um audível suspiro, Ceryse deixou a conversa, sem se importar se estava sendo indelicada ou não. Um dia, Maegor já havia tentado esconder que não a desejava mais.

                                                                               Parte 5

     Ceryse estava de joelhos no chão do quarto. Havia pilhas de roupas distribuídas em vários lugares, deixava o ambiente um pouco mais alegre. Dobrava cuidadosamente uma echarpe de linho branco que colocaria dentro de sua arca. O som dos pássaros ao longe era abafado pelo silêncio opressivo do ambiente, também havia ruídos leves dos tecidos sendo dobrados e passados e o ranger ocasional do assoalho.

      Carolyn, sua fiel aia, entrou no aposento brevemente, carregando consigo um vestido verde esmeralda. Depositou-o sobre a cama e hesitou por um instante, como se quisesse dizer algo, mas recuou ao ver a expressão concentrada de sua senhora.

— Obrigada pela ajuda, Carolyn, pode colocar minha echarpe na arca vermelha — disse Ceryse, sem olhar diretamente para a jovem. Tentava ser gentil, mas havia uma rigidez subjacente.

      Os meses passaram depressa. King's Landing era mais adorável do que gostaria de admitir, mas seus eventos eram frustrantes. Estava pensativa desde o baile em homenagem à nova Mão do Rei, onde Maegor a humilhara mais uma vez. Desde então, estiveram mais distantes do que nunca, palavras não eram mais do que cortesia entre eles. Tudo piorou quando a rainha deu à luz a mais uma criança, nomeada Vaella. Infelizmente, não sobreviveu muitos dias após o seu nascimento. Contudo, conseguia ver nos olhos do marido o quanto ele estava insatisfeito, insatisfeito de como o irmão havia recebido uma sexta criança, e ele nenhuma. O que lhe restava era culpar a esposa.

      Fora o próprio Maegor que a convencera a visitar Vilavelha, para visitar o pai e o resto da família. Ceryse sabia que o gesto não havia surgido dos raros momentos de gentileza de Maegor, não. Ele a queria longe, longe para sondar a garota Harroway como quisesse. Sentia-se burra, deveria saber que ele não iria poupá-la de mais humilhações. Agora estava sozinha, em seu quarto, arrumando as arcas para fazer o que Maegor havia ordenado. Sentia-se burra, sim, mas além de tudo sentia-se derrotada.

       Enquanto Carolyn saía silenciosamente do aposento, a porta se abriu novamente, desta vez com mais força. Maegor entrou sem aviso prévio, sua figura era sufocante e dominava o ambiente, Ceryse já não se extasiava mais com nada que vinha daquele príncipe cruel. Até mesmo o ar parecia ter mudado com sua chegada, carregando uma tensão quase palpável. O grande homem parou no meio do quarto, com uma das mãos acariciando o cabo de Blackfyre, embainhada.

— É uma tarde bonita, esposa — cumprimentou ele, a voz baixa e fria como de costume.

      Ceryse ergueu o olhar apenas o suficiente para reconhecê-lo antes de voltar sua atenção ao vestido que dobrava. Seus dedos, porém, traíram a tranquilidade que tentava exibir, apertando o tecido com uma força desnecessária. Finalmente, ela colocou o vestido de lado e levantou-se, a postura era rígida.

— Marido – cumprimentou ela, com a voz igualmente gélida. — A que devo a honra? Irá me acompanhar para finalmente visitar minha família em Vilavelha? Ou apenas para se despedir?

      O sorriso que se formou nos lábios de Maegor era cruel, Ceryse sabia que ele estava se divertindo com sua ida. Deu um passo à frente, diminuindo a distância entre ele e sua esposa.

— Organizei tudo para sua viagem. Será escoltada por cavaleiros muito capacitados que garantirão sua segurança — anunciou ele, inabalado com o sarcasmo da esposa. — Mas você deve saber que desta vez é diferente. Sempre estivemos afastados, Ceryse, mas se tornou insustentável.

— O que está querendo dizer? Que de repente se tornou um marido bom e fiel? — ela riu com a hipótese. — Eu duvido. Nem mesmo sua mãe pensa que deveríamos estar juntos.

— Não será uma visita comum, Ceryse, seu pai sabe disso — disse Maegor, pragmático como sempre. — Você voltará para Vilavelha de uma vez por todas. Eu dispenso o seu papel como minha esposa nesta corte.

      Por um momento, suas palavras pareceram ecoar no vazio do cômodo, como um trovão que antecede a tempestade. Ceryse piscou, incrédula, antes de dar um passo em direção a ele. Estava tão indignada que conseguia sentir o rosto vermelho, todas as humilhações, todas as noites, as grosserias, todos os dias esperando, e para que... anos perdidos de sua vida que não levariam a lugar nenhum.

— Você não pode estar falando sério! — exclamou ela, a voz subindo um tom. Tudo chegou em si em uma ressaca imensa dentro de si, uma tempestade de emoções. — Somos marido e mulher, prestamos votos diante dos Sete! Isso é contra a ordem dos deuses!

      Maegor inclinou levemente a cabeça, como se considerasse as palavras dela uma curiosidade passageira. Seus olhos púrpuras acinzentados brilharam com algo entre o desdém e o divertimento.

— Contra a ordem dos deuses? — ele repetiu, zombando. — O que os deuses têm a dizer sobre um casamento que não dá frutos? Sobre uma esposa que não passa de uma lembrança de uma aliança política fracassada.

       As palavras caíram sobre Ceryse como pedras pesadas. Ela apertou os punhos ao lado do corpo. Lutava com as lágrimas que queriam escorrer pelo rosto.

— Eu falarei com o rei — declarou ela com a voz trêmula. — Ele jamais permitirá que isso aconteça.

       Maegor deu uma risada breve, mas sombria, como o som de uma lâmina.

— Faça isso, não me importo. Meu irmão é fraco e um rei ineficiente, mas é meu irmão, e não tentará nada contra mim — argumentou ele. — Faça o que eu digo, Ceryse, para o seu próprio bem. Você pode fazer suas arcas e deixar a cidade discretamente ou você pode ir sozinha para Vilavelha, eu garantirei que sua única companhia seja um cavalo coxo e um bobo com uma espada de madeira.

       Ceryse olhou para ele com o máximo de desdém que conseguiria reunir: a raiva agora misturada com algo mais profundo: a dor. Suas mãos tremiam quando ela abruptamente virou-se para a mesa do lado e atirou um cálice de vinhos adornados com rubis no chão. Um presente de Maegor. O vidro se despedaçou em diversos fragmentos brilhantes e o vinho espalhou-se como sangue pelo chão.

         Maegor não se moveu. Pelo contrário, ele riu, fazendo com que os olhos de Ceryse ardessem em humilhação e ódio.

— Você nunca gostou de mim! — gritou ela, com a voz quebrada. — Desde o início, você me tratou como um peso! Por que? O que eu fiz para merecer tudo isso?

— O que você fez? — repetiu ele, sua voz era gélida. Ceryse encolheu-se. — Eu era um garoto quando nos casamos, você já não tinha mais a aparência de uma donzela, não uma atraente ao menos. Eu me sentia enojado todas as noites em que você esteve ao meu lado. E então você envelheceu, se tornou usada e feia aos meus olhos. Uma mulherzinha insignificante e carente... eu preferiria compartilhar minha cama com putas baratas do que com você.

       A bofetada veio antes que ela pudesse pensar. O som ecoou pelo quarto, mas Maegor permaneceu impassível, como se o golpe não tivesse força suficiente para sequer arranhá-lo. Ele a observou por um momento antes de continuar:

— Você é estéril, inútil para mim — declarou ele. — Já escolhi uma nova esposa em minha mente. Uma jovem com quem poderei juntar meu sangue e criar um herdeiro.

     Ceryse sentiu o chão desaparecer sob seus pés. Por um instante, ela não conseguiu respirar, falar ou sequer se mover, Maegor já havia feito para ela. As palavras dele ressoavam em sua mente como um martelo, destruindo cada vestígio de esperança que ela ainda tinha.

— Você é um monstro — ela sussurrou, finalmente, quase inaudível. — Os deuses te julgarão severamente por isso.

     Maegor deu um passo para trás, ajeitando a capa com um movimento casual que parecia subestimar a cena lastimável diante dele.

— Que eles tentem — disse ele, caminhando em direção à porta. — Até lá, arrume suas coisas. Não preciso mais de você.

      A porta fechou-se com um estalo sutil e o silêncio que se seguiu era ensurdecedor. Caíra de joelhos, lágrimas finalmente escorrendo por seu rosto compulsiva e livremente. Carolyn, a criada, entrou apressada, praticamente jogando-se ao seu lado. A moça segurou-a nos braços enquanto Ceryse chorava descontroladamente.

— Minha senhora — sussurrou Carolyn carregada de compaixão. — Não chore, ele não merece suas lágrimas, nunca mereceu. Não merece nada da senhora.

      Ceryse chorou e soluçou por mais alguns minutos, mas gradualmente recuperou o controle. Enxugou os olhos com as costas da mão e afastou Carolyn gentilmente.

— Ele pode não merecer — disse ela firme, apesar das lágrimas que ainda brilhavam em seus olhos. — Mas ele terá. Maegor não se livrará de mim, essa é uma tarefa dos deuses somente. Ele deve saber que eu sempre serei sua esposa, e que está condenado a viver comigo e minha sombra para sempre.

      Com movimentos firmes, Ceryse voltou a dobrar as roupas, cada gesto era carregado de uma determinação sombria. Ao fechar a última arca, sentiu uma força diferente se apossar dela. Sabia que jamais seria a mesma depois de tudo que passara de lado de Maegor, um homem cruel. Mas em seu coração ardiam as cinzas de um juramento que ela pretendia cumprir. Maegor era detestável, todos sabiam, Alyssa falava disso com frequência. Eventualmente ele começaria a cair, se os deuses não fizessem seu trabalho, alguém faria, Ceryse acreditava. Ele deveria pagar por tudo o que fez por ela. Teria de pagar. Iria pagar. 

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Mais um capítulp pronto. O capítulo passou por revisões, mas provavelmente ainda há alguns erros de ortografia, então peço perdão kkkkkk

Logo chega mais um capítulo quentinho pra vcs.

XOXO

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