Capítulo Três
Tenho pesadelos durante toda a madrugada. Sonho com mortes e sangue. Vejo Eunjin, mamãe, meu pai, Ludame, todos mortos... Mas a morte que mais me assombra é a minha.
O dia amanhece mais frio que o normal. Estou acordada há muitas horas e sinto as pálpebras pesadas, arranhando meus olhos, porém não sucumbo ao sono. Não posso sonhar com minha morte novamente.
Não há janelas na cela, mas posso ouvir o som da chuva baixo, longe, apenas um pequeno ruído. Se eu conseguir localizar de onde vem o som, saberei para onde ir quando me libertar. Repreendo qualquer se. Não há lugar para eles em minha mente.
Estou mais descansada e sinto minhas forças se restaurando aos poucos, apesar de minha cabeça continuar pulsando dolorosamente. Ontem à noite recebi os remédios para hoje, e por um momento considero tomá-los para ajudar com a palpitação irritante, mas logo descarto a possibilidade. Tenho o pressentimento de que irei precisar usá-las de outra maneira.
Não sei que horas são, e isso me irrita. Sei que é manhã, mas se pudesse ter noção do horário exato, poderia estudar quando há troca de turno para a guarda da minha porta. Vejo as sombras de suas botas imóveis pela pequena frecha. Depois de alguns longos minutos em que observo, há um movimento nas sombras. Ouço vozes de pelo menos duas pessoas e a infinidade de fechaduras sendo abertas. Todo o meu corpo se contrai em antecipação.
Ainda estou olhando para o chão quando duas botas pretas entram. Por algum motivo meus olhos são lentos ao olhar para cima. Demoro uma eternidade para encontrar seu rosto. Quando encontro seu olhar ainda passivo, custa-me alguns segundos para reconhecê-lo. Quando lembro, minha respiração fica urgente e o coração acelera de forma que sinto a veia do meu pescoço pulsar. O ódio sobe rapidamente e tudo que eu vejo é vermelho.
Levanto da cama em um movimento rápido, e sem que eu perceba meu punho voa em direção a sua cabeça. Ele não desvia rápido o suficiente e atinjo a maçã de seu rosto em um golpe pungente. Ele não reage como eu espero, apenas toca o local com uma careta antes de se afastar de mim. É como se fosse feito de pedra. Sinto os nós dos meus dedos tensionarem em dor, mas me recuso a fazer uma careta.
— Uma facada não foi o suficiente para você, não é? — diz, rindo. Há um leve sotaque arrastado e desconhecido em sua voz.
Meu corpo me trai e minhas pernas vacilam por um momento antes que eu possa atacar de novo. Ainda não estou forte como gostaria. Um braço me sustenta e há um barulho de metal caindo. Olho para o aperto em meu ombro e penso em quão difícil seria quebrar seu osso ulnar. Não muito se eu colocar bastante força no golpe. Antes que eu possa testar minha teoria, no entanto, ele me solta e se abaixa para pegar a muleta que havia caído.
— Te deixei inválido? — pergunto, querendo ouvir um sim. Ele ri, de novo.
— Como se eu fosse te dar essa satisfação — balança a cabeça e caminha até minha cama, o único lugar que há para sentar além do chão. — Vou mandar colocar uma cadeira aqui — seus olhos passeiam o quarto e me pergunto se ele não esteve aqui antes. Ou talvez não depois da decoração infantil.
— Estou perfeitamente satisfeita — murmuro, sarcástica. Ele me olha diretamente nos olhos. Muda a expressão de descontraída para séria em um segundo e eu estremeço.
— Não é para você.
Continuo em pé, ao lado da porta e aperto meus braços, como se isso fosse construir uma barreira de proteção entre nós. Não gosto de dizer, mas sua presença me intimida. Se não fosse por tantas expressões risonhas e ele estar machucado, eu estaria implorando para sair da cela e ficar bem longe dele.
Imagino que chances e consequências eu teria se decidisse atacá-lo. Não poderia fazer muito, mesmo ele estando ferido. Ele é um homem bem alto, mesmo para mim, e há muitos músculos em seu corpo esguio. Não tem nenhum sinal de vermelhidão pelo soco em sua pele escura e brilhante como a noite. Fico decepcionada por meu soco não marcar sua pele com um hematoma.
Quase gargalho com a ideia de que a minha tentativa de matá-lo não deu em nada. Provavelmente só acertei um escudo de músculos em sua perna. Deveria ter mirado em seu pescoço.
— Analisando suas chances de me matar? — há um sorriso branco em seus lábios quando diz. Olho-o, surpresa pela leitura.
— Não — minto.
Ele arqueia as sobrancelhas em dúvida, o corpo relaxado encostado na parede tomando muito espaço da cama. Fico com raiva dele por ter uma atitude tão despojada e tranquila, enquanto eu passo cada minuto planejando fugir e pensando se irei morrer tentando.
— Pedi para trazerem seu café-da-manhã. Imagino que esteja com fome — a sugestão de comida faz meu estômago roncar e tento desconversar rapidamente para cobrir o barulho.
— Então seu nome é Kwame? — cruzo os braços na altura da barriga, como se isso fosse adiantar. Ele ri alto, os olhos pequenos franzidos em duas linhas.
— Sim. Kwame Nkosi, primeiro e único — ele pisca e tento não revirar os olhos com a breguice.
— Isso se esse realmente for seu nome — ele dá de ombros com minha sugestão, não parece estar mentindo. Concluo que se eles não se importam em dar seus nomes verdadeiros, o objetivo não é me deixar viva. Eu faria um estrago enorme com essas informações.
— Você realmente não faz ideia alguma — ele murmura, mais para si mesmo do que para mim, porém continua presos aos meus olhos.
— Imagino que minha apresentação seja dispensável — ignoro sua fala e volto a tentar extrair alguma outra informação útil.
— Completamente, Aurora — sussurra, como se me contasse um segredo. Fica sério novamente. Sua mudança de tom me envia pequenos choques de apreensão. Kwame me parece instável e me sinto insegura.
As fechaduras começam a ser abertas novamente e dou um pulo discreto para o lado. O guarda, um homem pálido e grisalho, segura uma bandeja de comida com uma mão. Não deixo de notar que uma alça sustenta uma grande arma de fogo nas suas costas e uma pistola pequena está presa na cintura. Encontro seu olhar, e ele franze as sobrancelhas antes de fechar a porta. Noto rapidamente algumas trancas, e não vejo vestígios de qualquer tecnologia atual. Tudo me parece muito antigo.
Kwame está segurando a bandeja na minha frente e me encolho com sua proximidade. Ele percebe e se afasta, me entregando a bandeja. Seguro-a e continuo em pé, sem saber se é inteligente ficar vulnerável na presença de Kwame. Não procuro seus olhos de novo.
— Sente-se, por favor. Não vou te machucar — há quase um desgosto em sua voz, diferente de qualquer tom que ele tenha mostrado até agora. Ele não faz menção de se levantar, apenas tenta aumentar o espaço para mim, ficando ereto e juntando as pernas, porém não adianta muita coisa.
Sento-me, apoiando a bandeja em meus joelhos. Há salada de frutas, dois pães com geléia, suco de laranja e café, tudo em recipientes de papel, infelizmente nada que eu possa usar como arma.
Sinto o efeito da cafeína em meu corpo assim tomo um gole, e deixo escapar um pequeno murmúrio de prazer.
Kwame não faz nenhum som enquanto estou comendo, e quando viro o rosto após alguns minutos de silêncio, ele está olhando fixamente para meu pescoço exposto. Estico a mão para o local, em instinto e me afastando bruscamente, quase derrubando a bandeja.
— Eu já disse que não vou te machucar — fala baixo, a expressão calma e os olhos presos nos meus. Seus olhos são completamente pretos, de forma que não consigo diferenciar a pupila da íris.
— Me desculpe se acho isso difícil de acreditar — faço uma careta, me ajeitando na cama novamente.
Olho para as minhas mãos trêmulas e as fecho em punho no meu colo. Não havia percebido que estou sem minha aliança. Sinto a raiva crescer em meu corpo mais uma vez, e desconfio que posso querer descontá-la da forma mais imprudente possível.
Kwame busca algo em sua perna boa, sacando uma faca pequena. Quase enterro a bandeja em sua cabeça antes que ele levante as mãos, os olhos arregalados.
— Pelo amor de Deus, Aurora! Pare de querer me matar. Só estou tentando te mostrar uma coisa — explica, e eu abaixo a bandeja, ainda vacilante. Ele segura a faca na horizontal, o metal brilhante e completamente limpo refletindo minha imagem. Noto que não é a mesma da outra noite.
— Está vendo? — ele estica a mão para tocar o local muito roxo em meu pescoço. Não desvio dessa vez, mesmo quando seu toque gelado envia um arrepio.
Imagino que seja onde ele injetou a agulha. Não me importo com o hematoma, imagino que há muitos deles espalhados pelo meu corpo.
Aproveito para dar uma olhada geral em meu rosto. Estou com olheiras novas e pareço ter envelhecido alguns anos. Faço uma careta para a imagem e desvio os olhos.
— Sinto muito — ele olha para baixo e vejo... vergonha, talvez.
— Pelo quê? — o pedido de desculpas me pega de surpresa e soo impetuosa. — Um simples sinto muito não apaga um sequestro e me manter em cativeiro.
— Não me desculpo por isso. Estou falando disso — aponta para a mancha acima de minha clavícula. — A agulha do sono. Não queria usá-la, mas fiquei sem opções — aponta para a perna que eu esfaqueei, e guarda a faca em seguida.
Olho para ele com uma expressão confusa. É sério? Tanta coisa mais grave com o que se sentir culpado, mas ele está preocupado com uma agulhada que me deixou doente? Rio em descrença, mas decido ignorá-lo e termino meu café, pondo a bandeja no chão com o copo de suco ainda cheio.
— Você não vai beber? — questiona e eu nego. Ele abaixa com uma expressão de dor e pega o copo para si. — Zero tolerância a desperdício — é o que diz antes de tomar um grande gole.
— Você está aqui para me dizer alguma coisa ou só quer fazer amizade? — indago, tentando pôr todo tom de desprezo em minha voz.
— Na verdade, estou aqui para conversar com você — ignora meu tom e mantém um sorriso no canto dos lábios. — Viria ontem, mas imaginei que sua raiva ainda estaria muito recente.
— O que você quer?
— Aurora... — ele responde depois de muitos segundos pensando e estala a língua nos dentes. Sua expressão se torna séria e eu não consigo desviar de seus olhos negros.
— Eu preciso que você tenha algumas coisas em mente antes de nosso Comandante Geral vir até você. Não confio que ele irá apelar para certos lados da situação, mas eu preciso fazer isso. Pelo nosso bem.
Meu corpo está imóvel em confusão. Não sei o que ele quer dizer e odeio a sensação de que algo muito terrível está vindo. Algo que está fora de minhas mãos.
— O que você vai saber é... — ele procura a palavra.
— Difícil? — sugiro e ele franze a testa, assentindo. Gwen me deu alguma ideia ontem.
— Exato. Eu acredito que você seja uma boa pessoa, Aurora, mas vai ser difícil olhar para a imagem como um todo. Quero pedir que você mantenha sua mente aberta, porque a vida de muitas pessoas vão estar em suas mãos e eu digo isso muito literalmente. Nesse jogo, você é nossa rainha — um frio sinistro atravessa minha espinha, levantando todos os pelos do meu corpo. — Eu sei que você está assustada e provavelmente planejando fugir... — Kwame diz cada palavra como se estivesse conversando com uma criança. Não pisca nem uma vez. — Eu quero te prometer uma coisa.
— O quê? — pergunto, diante de seu olhar decidido. Ele toca meu braço e eu não recuo.
— Se depois que todas as cartas estiverem na sua mesa e você ainda quiser voltar para o seu mundo, sua vida e seu marido, então eu mesmo te levarei de volta — seu olhar parece doloroso.
Pisco diversas vezes, atordoada. Não há qualquer cenário futuro que eu considere estar longe de minha vida normal, minha empresa, Eunjin, Margareth... não há. Qualquer que seja a informação que eles tenham para mim, não surtirá efeito. Por que eu me importaria com suas vidas em minhas mãos? Eu sou apenas um peão em seu jogo sujo, apenas uma cartada na manga e não irei me rebaixar a esse nível por causa de pessoas que não conheço. Nunca fui muito altruísta, de qualquer forma.
Eu não sou uma boa pessoa e ele não me conhece.
— Não vou confiar em você — digo, surpresa pela rouquidão que toma minha voz.
— Eu sei que não — Kwame diz, já se apoiando em sua muleta e levantando. Me olha novamente com muita seriedade. — Mas, acredite em mim quando eu te digo, confiando ou não, eu sou sua única chance de sair daqui viva.
Meu estômago revira em incredulidade e sinto a necessidade de provar para ele o contrário, de dizer algo muito inteligente e ameaçador. Quero dizer que não preciso da sua ajuda e que irei sair daqui de qualquer forma. Que irei lutar e matar qualquer um que se intrometer em meu caminho. Entretanto, mordo minha língua.
Não digo nada, apenas passo meu olhar flamejante por todo o seu corpo. Mesmo apoiado na muleta, ele transborda autoridade e masculinidade. Diferente de quando chegou, agora já não me deixo intimidar. Fico de pé e tento me esticar, posso nivelar o topo da minha cabeça na direção do seu queixo.
— Você vai voltar? — tento parecer inocente e calma. A subida e descida do seu pomo-de-adão é a única indicação de que ele não é tão relaxado quanto parece.
— Todos os dias.
〆〆〆
Não consigo parar de pensar em seus olhos.
Seus olhos me recuam de volta aos meus dezesseis anos. Seu olhar me expõe a uma nudez interna que odeio sentir.
Estudei-a por três meses, sei cada informação da sua vida. Sei de coisas que ela nem mesmo faz ideia. Sei de tudo, cada detalhe sobre ela. Mas nenhuma foto ou dado havia me preparado para seus olhos. Nenhuma câmera fotográfica foi capaz de captar aquilo.
Geralmente gosto de ser pego de surpresa, mas não estar pronto para enfrentar a imensidão de seus olhos castanhos me deixou muito, muito irritado.
Depois do almoço tento distrair meus pensamentos, tento dormir, tendo várias coisas e nenhuma delas parece funcionar. Resolvo que a dor vai ter um efeito melhor e largo minha muleta ao lado da cama e saio para o corredor, os pontos puxando minha pele e mandando alfinetadas. Foco na dor fina, preciso dela para me aliviar.
Caminho em direção ao pátio, onde os treinamentos são feitos. Por ser um soldado de campo, meus treinos são três vezes por semana, diferente dos Iniciantes que treinam todos os dias. Hoje é um desses dias e sei que vou encontrar alguém do meu nível para lutar comigo. Não seria justo descontar doze anos de experiência nas crianças aprendizes.
Meu alojamento fica atrás do pátio e preciso dar a volta na Estalagem para chegar até lá. A Estalagem 2 é uma construção muito antiga, feita em sua maior parte de concreto e metal. Não é alta para não ser vista de longe e se estende em cima de uma montanha. É cercado de árvores e a única forma de entrar e sair é por aeronaves. Temos Estalagem 1, 2, 3 e 4. Todas separadas em diferentes partes do Continente. Nunca visitei qualquer uma delas, e não faço ideia de quem ou o quê resida por lá. Esse tipo de informação não chega aos ouvidos de um mero soldado. Somos instruídos a obedecer, não questionar. Mesmo assim, não deixo de ficar curioso.
O frio constante, a neblina densa e a falta de sol são problemas que aprendemos a lidar e, hoje, com a chuva. Não me preocupo em ficar seco e as gotas grossas atingem minhas costas quando saio ao ar livre, logo encharcando toda a minha roupa.
Cumprimento algumas pessoas pelo caminho. O pátio é aberto e com a tempestade, é o cenário perfeito para os treinos de Ikari. Treinar na chuva aumenta suas habilidades, segundo ela. Não discordo. Há uma cobertura para abrigar os soldados que não estão treinando e caminho para lá, procurando Gwen.
Dois meninos estão no centro do pátio quando chego, o mais alto perdendo para o mais forte. A iniciação começa aos doze anos, mas só são mandados a campo aos dezesseis, quando estão habilidosos e inteligentes o suficiente. Ikari rodeia os meninos, os braços cruzados e pisando forte para levantar lama, analisa a luta e grita incentivos. Pelo menos é assim que ela chama seus gritos.
Acho Gwen na frente e paro ao lado dela, que me olha com as sobrancelhas franzidas.
— Já está cansado de seus pensamentos, Nkosi? — balança a cabeça e eu suspiro. Não tive o melhor comportamento com ela hoje durante o almoço.
— Você sabe que eu sou melhor quando não penso — deixo um beijo no topo de sua cabeça e é suficiente para que ela sorria. Gwen não se ofende por pouco, assim como eu, o que torna tudo muito mais fácil.
Surpreendendo a todos, o menino mais alto consegue se desvencilhar do gancho de seu adversário que torce seu braço para trás, dando uma rasteira que funciona facilmente com a lama escorregadia. O mais forte cai de cara no chão, os dois braços presos atrás das costas pela perna do outro, a outra perna prende o joelho do mais forte. Ikari espera alguns segundos para ver se ele se mantém assim, e anuncia o mais alto como vencedor, que agora esnoba um sorriso de triunfo.
— Vai lutar? — Gwen pergunta quando Ikari chama o próximo soldado. Assinto e dou alguns passos para frente, ficando na frente do próximo garoto, que recua obediente.
Ikari apenas me dá um levantar de sobrancelhas, e chama qualquer pessoa que queira lutar comigo. Os soldados iniciantes olham para o chão automaticamente.
— Eu sou tão ruim assim? — indago, abrindo os braços em desafio. Alguém lá atrás levanta a mão e a cara inchada de Palore surge na minha frente, o cabelo dele trazendo a água da chuva para seu curativo. Aurora fez um belo trabalho.
Ele cospe aos meus pés, adotando uma postura ridícula.
Ah, Palore...
— Não chore como uma mulherzinha quando eu quebrar sua cara, ouviu? — grita. Sou obrigado a franzir os lábios para impedir um riso. Não desrespeito meus adversários na arena.
Gwen, por outro lado, gargalha alto demais e bate suas mãos, pronta para o show. — Deus, isso vai ser ótimo!
Mantenho minha posição de ataque e espero. Palore como sempre apressado demais, dá o primeiro golpe, mas eu desvio e rolo para suas costas, enganchando meu braço em seu pescoço e enfio minha perna em seu joelho para que ele perca o equilíbrio. Sinto meus pontos rasgando minha pele, porém não me importo.
Ele ajoelha na lama, mas consegue agarrar minha camisa e me puxa para frente e eu caio de costas, seu corpo rapidamente em cima do meu, pronto para me golpear. Desvio do soco, já tive a cota do dia. Ele enterra a mão fechada na lama, e uso isso para empurrar seu corpo para o lado. Rolo rapidamente e enfio meu joelho em suas costas e ele urra, sendo abafado pela chuva. Agarro um de seus braços, esticando-o dolorosamente, e engancho meu braço em seu pescoço. Uso meus dedos e aperto seu nariz, quebrando-o novamente. Ele grita alto demais e sinto o sangue quente escorrer em minha mão, sendo rapidamente diluído pela água. Com sorte, o idiota vai ficar com a cara deformada pra sempre.
Ikari finaliza a luta com um sinal e eu saio de cima dele, encontrando olhares assustados e admirados dos iniciantes e o divertido de Gwen.
— Bem, isso foi rápido — ela diz, balançando a cabeça para Palore que levanta com a mão no nariz e um olhar de ódio.
— Quer tentar fazer mais tempo? — provoco-a e ela assobia, já vindo para minha frente e prendendo o cabelo. Gwen nunca recusa um desafio.
— Você sabe que eu prefiro demorado — ela sussurra em meu ouvido, me distraindo e já lança a perna para o alto, me golpeando no queixo.
Pego sua perna no ar e a giro, colocando Gwen de cabeça para baixo apoiada na outra perna. Infelizmente ou não, ela é flexível demais e não tem problema em se manter assim. Abraça minha perna ao seu alcance e a força para frente, e eu caio de costas, já sentindo os dois braços dela esmagando meu pescoço e um de seus joelhos muito perto da minha virilha.
Ela faz um bico e eu aproveito a deixa para apertar uma de suas coxas. Posso vê-la revirando os olhos, antes de girar seu corpo em cima do meu, fazendo-a ficar de costas. Imobilizo suas duas pernas com as minhas e cruzo seus braços em um ângulo doído. Gwen está escorregadia e não tem problemas em desfazer meu aperto, lançando um cotovelo em minhas costelas. Vacilo com a dor e ela se levanta novamente, me puxando junto e pula em minhas costas, enrolando as pernas em minha cintura. Engancha o braço direito no meu pescoço.
— Eu poderia quebrar seu nariz, sabe? Mas tenho medo de estragar seu rosto bonito — Gwen diz, e não sei como, passa as duas pernas no meu pescoço, seus músculos sufocando minha garganta. Tusso em busca de ar e bato três vezes em sua perna, me rendendo. Ela me livra e pula no chão, caminhando para fazer um agradecimento exagerado para os iniciantes. — Onde está Palore para ver como uma mulherzinha chora?
— Você ensina? — uma menina franzina pergunta. Gwen balança a cabeça.
— Mas posso fazer exceções. Tudo pelo preço certo — pisca para a garota, que sorri tímida.
Ikari nos expulsa do centro do pátio, chamando os próximos soldados para a luta. Andamos devagar, a chuva lavando a lama de nossas peles.
— Você pretende fazer exceções, mesmo? — pergunto quando já estamos longe o suficiente. Gwen não tem a menor paciência para ensinar algo.
— Para a menina? Talvez. Ela lutou antes de você chegar. Não é muito boa, mas tem potencial. Se Ikari permitir, talvez eu possa ensinar uma coisa ou outra a ela.
— Você nunca me ensinou uma coisa ou outra — provoco e ela torce a boca.
— Tem certeza? Eu lembro muito bem de ser uma ótima professora.
— Acho que preciso de lições novas, então — sugiro e ela me olha, cúmplice.
— Depois que você tomar um banho — faz uma careta de nojo como se ela também não estivesse imunda, — e costurar seu ferimento de novo, você sabe onde me encontrar.
Concordo com a cabeça, já sentindo as primeiras pontadas de dor crescerem em minha coxa conforme a adrenalina vai se esvaindo. Pelo menos valeu a pena a distração.
— Soldado Fitz! Soldado Nkosi! — uma voz nos chama e nos viramos para ver o soldado Nebulon correndo até nós. Não espera nossa saudação e fala rapidamente. — O Comandante está de volta. Apresentem-se na Estação de Pouso imediatamente — não espera nossa resposta e sai, abordando qualquer pessoa em seu alcance.
Troco um olhar com Gwen, nós dois sabendo o que isso significa.
NOTA: Espero que vocês tenham gostado desse capítulo tanto quanto eu gostei de escrevê-lo. Não esqueçam de votar e comentar pra ajudar. Até próximo domingo!
meu tt: addixtez
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