c a p í t u l o - 1 1
E Ariel sorriu tristemente antes de começar a narrar a longa história daquela vida.
— Era uma vez um anjo, porque normalmente as histórias sempre começam com "era uma vez", um anjo da guarda, para ser mais exato, o qual foi escolhido para ser o protetor de uma criança. Ela era fofa, olhos azuis tão claros e cativantes, uma linda menininha de cabelos louros — Começou ele.
— Minha mãe? — Edith perguntou, e Ariel assentiu.
O ambiente estava agradável, o ar fresco, quente e gelado, era uma das melhores sensações para Edith, que escutava cada palavra atenta.
— E ela foi crescendo, estudando, conquistando amigos. Como é a vida de todos os seres bons. Nascem, crescem, e se vão. Tudo estava indo bem, porém, quando ela tinha quatorze anos, um acontecimento mudou o rumo da sua vida tranquila e alegre: ela viu os pais morrerem.
Ariel pareceu triste ao lembrar, entretanto, continuou sua história. Edith lembrava que sua mãe havia contado sobre a morte dos pais, agora ela havia perdido sua mãe também.
— Eu lembro como se fosse ontem — A voz de Ariel ficou embargada, e ele fitou a linha do horizonte —, a menina levantou do chão e correu para os pais, ela começou a chorar e tremer, e eu não consegui manter a lei de não me deixar ver, pois eu vi um colega, o anjo da morte, guiando os pais dela, não podia atrapalhar seu trabalho, assim como não podia deixar a menina chorando ao lado dos corpos físicos, eu me mostrei para ela e a abracei. Ela me olhou encantada, mas triste. Abraçou-me e chorou.
— Eu imagino o quanto ela estava sofrendo — Edith disse, pensando no corpo de Beatrice se desvanecendo em névoa.
— Não se prenda à carne, pense na alma, pois ela é o que define sua mãe, não o corpo mortal... aquele demônio que você viu, Edith, queria desestabilizá-la quando destruiu a casca mundana da sua mãe — Ariel retrucou, sabendo do que a filha falava — Sua mãe está viva, apenas não mais no plano material.
— Eu sei, mas me dói pensar que não vou vê-la por um bom tempo... , — Edith comentou, tristemente — mas, e daí? O que aconteceu depois da morte dos meus avós?
— Depois daquele dia, ela foi levada para morar com os tios por parte de pai, Joana e Gabe. Os anos foram se passando, e, mesmo ainda existindo a saudade, ela continuou. Eu falava com ela, cantávamos e brincávamos. Quando ela estava entrando na faculdade, virou amiga de outro jovem, Oliver, e os dois começaram uma bela amizade, ele gostava dela mais do que um amigo, e eu senti isso, fiquei com ciúmes, mesmo sem saber que era esse sentimento naquela época, era somente uma agonia vê-la ao lado do garoto ruivo e bonito. Bea não correspondia ao sentimento do garoto, e um dia... a beijei.
Ariel, por mais divertido que pareça, enrubesceu, como se falar aquilo para a filha fosse um pouco vergonhoso. No entanto, Edith achava aquilo romântico, sem entender a gravidade.
— Simplesmente não sei o que aconteceu comigo. E ela correspondeu a mim. Confesso que fiquei assustado com o que fiz, não deveria ter feito. Entretanto, no céu, não houve palavras e continuei com ela. E um dia nós... passamos do juízo. Não pensei que chegaríamos a tal ponto. Era totalmente proibido. Eu não podia ter feito aquilo, mas eu a amava, eu sentia que sem ela nada mais fazia sentido, ela que me guiava agora, não o contrário. Nós nos distanciamos um pouco quando se tratava do toque, do beijo, do carinho, ficamos com medo. E então, assim que terminou a faculdade, me contou que esperava você. Ela me chamou, chorando, estava com medo, principalmente tratando-se de como criaria o bebê sendo eu alguém distante de sua realidade.
— E os anjos ficaram furiosos?
— Eles não sabiam naquele momento. Mas houve um problema, no mesmo dia vieram notícias pelos arcanjos. O demônio que Khazra havia criado fez sua última vítima há pouco tempo. E, quando os exames de Bea chegaram, percebi que foi o mesmo tempo. O mesmo tempo que a aura deixou um corpo e entraria em outro, renascendo. E minha preocupação aumentou quando percebi que você seria caçada. Os arcanjos descobriram sobre Beatrice e você, e me levaram ao tribunal. O Senhor já sabia desde o momento em que ela me contou. Minhas asas foram queimadas enquanto ela assistia. Ela gritava e tentava me ajudar. E então a levaram embora. Não nos vimos a partir daquele dia.
Ariel olhou para Edith procurando alguma expressão. A mesma ouvia fascinada.
— Os arcanjos iriam queimar totalmente as minhas asas, e eu cairia. Porém, Ele intercedeu por mim. Não entendo porque Ele me deixaria livre, mas assim o fez. O tribunal é justo, eu estava aceitando meu destino pelo que fiz, mas Ele me protegeu. Fiquei com minhas asas queimadas e sem ver sua mãe e você durante todos estes anos — Ele terminou.
— E você se arrepende?
— Nunca — Era uma das principais coisas que Edith queria saber. Se ele se arrependia de tê-la como filha, sofrer, ficar sem seu amor — Não me arrependo de amar.
— Mas eu quero saber... sem mim, esse caçador não existiria?
— Talvez não, mas você carrega o Celestial com você — Ariel disse. Edith pensou que o Celestial do qual o pai falava fosse o simples fato do mesmo ser um anjo — É por isso que ele a quer tanto, eles podem fazer coisas horríveis se tiverem o que você possui.
— E se eu não fosse morta por ele? — Edith ponderava rapidamente. As engrenagens giravam procurando respostas — Se morresse de outro jeito?
— Nem pense nisso, ele só ficaria mais fraco, não morreria.
— Eu já fiz isso, não fiz?
Ariel deu de ombros. Menina esperta. Com tantas vidas anteriores, pensamentos como esse já haviam ocorrido na garota. Ele fitou o mar longínquo novamente. As mentes de pai e filha estavam em outras dimensões e ao mesmo tempo ali.
— Tem certeza que é uma história para dormir? Não sei se vou conseguir — Edith teve que comentar.
Ariel deu uma risada fraca.
— Ele vai te ajudar.
O silêncio ficou por alguns minutos pesando sobre o ambiente. Não que ele fosse ruim, ouvir a natureza estava deixando Edith calma e leve.
— Eu estou com tanto medo — falou ela, de olhos fechados. Ariel pousou sua mão sobre a de Edith, que deixou a sensação boa tomar conta.
— Medo é uma reação natural, anjinha. Mas se a confortar, sempre terá alguém para protegê-la — Edith expressou curiosidade.
— Eu me sinto protegida e ao mesmo tempo tão vulnerável — falou ela.
— Sua alma sempre será protegida por Ele, e seu anjo da guarda vai te proteger fisicamente — explicou ele. Os olhos violetas de Edith brilharam ardentemente.
— Eu tenho um anjo da guarda?
— Sim, não importa se você é parte anjo, sua parte humana ainda necessita de proteção. — Edith sorriu de canto de boca, ela tinha um anjo protetor. Ariel continuou — E mesmo que você não veja, estaremos sempre com você.
— Promete?
— Prometo... — Ele olhou o nada por alguns segundos — Você deve regressar, e antes tenho que lhe dar um presente.
Ariel pegou uma espada da areia ao seu lado. Edith não havia percebido a presença daquela arma ali antes. Era delicada e leve como Edith, foi feita especialmente para a garota. Ela segurou a arma como um brinquedo novo, o cabo era de prata todo detalhado com pequenas pedras ovais de quartzo rosa. O pomo era uma safira adornada de ouro. O gume era de algum material cinzento desconhecido pela menina, com pelo menos setenta centímetros, e o sulco largo era adornado por arabescos em azul e dourado.
— Ela será sua companheira, não a deixe, e ela nunca a deixará na mão.
— Como vou andar com isso na rua? Ou para a escola? Eu sei que só vou amanhã, mas mesmo assim, uma espada na escola?
O pai gargalhou, com toda certeza levar uma espada para o colégio não era algo permitido, se nem tesouras com ponta eram. Não era uma boa ideia. Ele tocou no pomo, e a espada foi encolhendo e se transformando em uma fina pulseira de prata, adornada com uma espiral dourada enfeitada com as mesmas pedras da espada.
— Nossa! — Edith estava maravilhada, colocou a pulseira e então tocou a pedra preciosa fazendo com que a espada novamente tomasse forma em sua mão — Obrigada.
— Foi um presente da sua mãe — Edith olhou fundo nos olhos do pai. Ele percebeu a pergunta sem palavras — Ela sente muito sua falta — O coração de Edith se apertou com a frase. Mesmo com a voz fraca e esganiçada conseguiu dizer.
— Diga a ela que a amo.
— Ela sabe disso, mas direi.
— Ela está... feliz? — Ariel tocou o queixo da filha. Os olhos da jovem mostravam saudade e tristeza.
— Está parcialmente, pois, ao vê-la triste, esse sentimento contagia, Edith. Se você estiver feliz, ela também vai estar.
— Provavelmente ficarei melhor agora que tenho certeza de que ela está bem — Era verdade. Edith sentia muito a falta da mãe — Não posso vê-la?
— Em breve, talvez — respondeu ele, e Edith sorriu de um jeito meio torto.
— Parece uma previsão de morte — O pai então riu.
— Verdade, mas não foi o que quis dizer.
— Eu acho que entendi — O clima pesado se desfez com os risos.
— Deve voltar agora, filha.
— Então tchau... pai — A nefilim se despediu com um grande sorriso, abraçando Ariel.
— Nós nos veremos em breve, anjinha... — disse Ariel, colocando os braços em volta da filha em um gesto protetor.
Edith piscou, retornando à realidade, observando Grendow e Lilayh sorrindo. Assim como Edith, que sorria como nunca havia sorrido tanto após a partida da mãe.
(1656 palavras)
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