04 - Influência
"Os momentos felizes servem para sabermos que a felicidade existe!"
Fabí semicerrou os olhos e analisou a mãe por um momento.
— Do que a senhora está falando? Está bem? — Fabí tocou no rosto da mãe, que sorria com o olhar perdido no vazio.
— Desculpe, minha filha. Já posso ficar em paz.
— Pare com isso. A senhora disse que Anselmo mudaria a minha vida, agora está dizendo a mesma coisa de Ângela. Acho que seus amigos estão confundindo sua cabeça. — Fabí referiu-se aos amigos espirituais de Benta, que era médium. Conseguia visualizar o passado e ter uma noção do futuro de pessoas próximas. Ela sabia que as vidas de Ângela e Fabí estavam cruzadas e que uma precisava da outra para evoluir.
Ângela retornou com um sorriso no rosto ainda segurando a rosa azul:
— Era o Fernando. Não falei nada sobre você. Quero que vocês se vejam pessoalmente antes de qualquer contato.
Benta não parava de admirar as duas. Fabí sorriu quando Ângela falou de Fernando e começou a entender o que Benta queria dizer. Abraçou a mãe com força.
— Eu amo você! Amo muito! E estou com fome! — disse de modo engraçado seguindo a entonação da declaração de amor pela mãe. Ângela riu.
Benta convidou as duas para entrar na casa e serviu bolo, torta de chocolate e de morango e uma variedade de biscoitos.
— Aqui é sempre assim? — Ângela indagou e apontou para a mesa.
Fabí já comia biscoito quente e respondeu lutando com a guloseima para não se queimar:
— A vida toda, graças a Deus! Ela vende, então todo dia é essa a rotina. E só não sou uma baleia de gorda porque sou ruim.
Benta tomava um café enquanto observava as duas conversando. A bombeira colocou um biscoito de nata na boca de Ângela e viu seu rosto se transformar.
— Meu Deus! — a médica exclamou.
— Vou preparar um pouco de cada coisa para você levar. — Benta avisou e sugou o último gole de café de sua xícara.
— Dona Benta, a senhora precisa me ensinar a fazer isso. — Ângela apontou para a rosa. — Eu amei esse lugar. A comida. Tudo, mas a rosa azul me encantou. Eu tenho um jardim e uma estufa, mas são bem pequenos... Aqui é imenso! Um céu.
— Eu sou a maior fornecedora de rosas da região — disse e se levantou, estendendo a mão para ela. — Eu ensino, sim. Venha até a estufa. — Foram ao local. Passaram por um estreito caminho de cerca verde, onde se podia sentir os cheiros das flores e vegetação contida naquele pequeno espaço até o lugar coberto e cheio de espécies de plantas em desenvolvimento. — Aqui é meu laboratório.
— Ela se acha a doutora das rosa! — Fabí gracejou.
Ângela sorriu e ficou observando tudo o que Benta mostrava e explicava sobre as rosas.
— A rosa azul é simbólica em seu significado. É a busca da felicidade, da evolução... O alcance do impossível! — Olhava para as duas alternadamente. — Ela é rara, precisa de muita atenção, paciência para se conseguir o feito desejado, assim como a busca pela felicidade. Se você desistir no caminho nunca irá encontrá-la. Peço a vocês duas que nunca desistam dela. Continuem incansavelmente procurando-a, sem se importar com o que vão pensar, sem prejudicar ninguém.
— Essa coisa de felicidade é muito relativa, minha mãe. Tem momentos que estamos felizes e, em outros, estamos tristes.
— Esse é o segredo. Os momentos felizes servem para sabermos que a felicidade existe. — Escreveu algo num bloquinho de papel e entregou a Ângela, que a abraçou agradecida.
— Mãe, temos que ir — Fabí falou depois de receber uma mensagem de Anselmo. — Vá se arrumar. Vou mostrar o resto do jardim à Ângela.
Uma hora depois estavam a caminho da casa de campo de Anselmo. Quando chegaram foram recebidas pelo ansioso delegado. Alguns convidados já estavam lá, dentre eles Roger, um policial carioca que era apaixonado por Ângela. Ao vê-lo, a médica apertou o braço de Fabí:
— Por favor, não me deixa sozinha. O Roger está aqui e já me viu.
— Quem é Roger? — perguntou, olhando em volta.
— É um amigo do meu irmão. Vive atrás de mim.
— Onde ele está? Deixe-me ver se vale a pena!
— Que vale a pena, Fabí? Ele é muito chato. E está vindo para cá.
Fabí a levou pelo braço para dentro da casa. Anselmo entrou logo depois com o amigo.
— Ângela, olha quem está aqui? Achei que se sentiria melhor com um conhecido.
— Oi, Ângela. — Roger cumprimentou e a beijou no rosto.
— Oi, Roger... — Ângela falou, segurando firme o braço de Fabí
A bombeira deu um selinho no namorado e avisou:
— Eu tenho um assunto para tratar com Ângela. Depois nos falamos, está bem?
— Ok. Vamos, Roger. Meu sonho é que essas duas se entendam. São as mulheres que mais amo nessa vida! — Anselmo disse e saiu com o amigo.
Fabí e Ângela foram ao quarto.
— Obrigada, Fabí — disse e limpou o rosto. — Ele deixou meu rosto todo babado, parece beijo de cachorro. Odeio quem me lambeija!
Fabí gargalhou vendo a aflição da médica.
— Você fez uma piada. Está tudo certo então, agora é levar na esportiva. Se não der certo, fala a verdade.
— Você acha que eu já não fiz isso?
— Jura?
Ângela meneou a cabeça e passou as mãos nos cabelos. Olhou para o jardim pela janela e disse, desanimada:
— Precisamos ir, né? Afinal você é a noiva.
— Nem me lembre disso. Mas diga aí, já ficou com o lambeijo?
— Não. Nunca. Que horror! — proferiu, fazendo uma careta e rindo da gargalhada de Fabi.
Saíram do quarto. Benta conversava com Anselmo, ele mostrava as instalações do local. Roger se aproximou das duas novamente.
No final da festa, Ângela se deixou cair no sofá e Fabí sentou-se ao lado dela.
— Meu Deus! Como esse anjinho sofreu hoje! — Fabí brincou e sorriu para a cunhada.
— Você brinca porque não é com você.
Anselmo entrou com Benta naquele momento.
— Amor, sua mãe adorou nossa casa de campo.
Ângela observou a falta de entusiasmo na reação de Fabí. Perguntava-se o porquê ela aceitara se casar com Anselmo se não o amava. Ela não era o tipo de mulher que ficava com homem por dinheiro. Ou era? Mas era explícito que só ele queria aquela união.
— Preciso dormir. Estou muito cansada — Benta avisou, tímida — Vocês me perdoem não poder ficar por mais tempo conversando.
— Levo você ao quarto, mainha. Venha. — Fabí saiu levando a mãe.
Anselmo olhou para a irmã, sorrindo feliz.
— Vejo que vocês estão bem.
— É, conversamos muito. Besteira ficar remoendo o passado. Fiquei chateada, sim, mas passou. — Suspirou — E você? Está feliz?
— Muito. Ela é adorável, não é?
— É. — Desviou os olhos dos dele.
— Estou muito feliz por vocês terem se entendido. Você sabe que sua opinião é muito importante para mim, não sabe?
— Sei. Ela é maravilhosa. Mudou muito, devo reconhecer. Mas casamento é uma coisa muito delicada, Anselmo, os dois têm que estar muito...
— Meu amorzinho — interrompeu a irmã —, já fui casado. Eu sei muito bem como é. Não se esqueça, eu sou o irmão mais velho — garantiu sorrindo e a beijou na cabeça. — Eu amo você.
— Também te amo, só quero que você seja muito feliz. — Abraçou-o com força e o beijou no rosto. — Amo você, mas você me odeia. Precisava trazer o Roger?
— Desculpa, mas ele insistiu em vir, vai deixar o país amanhã. Tentei arrumar uma desculpa, mas você o conhece. Por que você não gosta dele?
— Não me faça essa pergunta. Vou tomar um banho e dormir, estou morta. Salvador é adrenalina pura — concluiu e saiu.
Fabí voltou do quarto, demonstrando cansaço. Deixou Benta na cama. Abraçou o namorado por trás:
— E então, fui bem?
— Foi ótima. Obrigado. Ela até bebeu, coisa que não faz nunca. Está falando mais, está mais...
— Feliz — completou. — Vamos dormir. Estou morta. — Fitou o vazio e murmurou: — Ela parece um anjo. Conquistá-la foi fácil.
— Você vai ficar insuportável por isso? — Anselmo brincou, sorrindo. Virou-se para abraçá-la e beijou seu pescoço.
— Estou brincando. Ela é um anjo de cristal. Preciso ter muito cuidado. Sem contar que é muito linda.
— Fabí, por favor...
— Parei de brincar. — Aumentou o tom de voz e se dirigiu ao quarto. — Se você não vier para a cama agora vou dormir com mãe.
Anselmo alcançou a noiva ainda no corredor. Ângela saiu do banheiro, notou que deixara a porta do quarto aberta, acabou ouvindo a conversa dos dois antes de chegarem ao quarto.
— Quando a gente se casar quero que você seja só minha.
— Vai começar, Anselmo? — perguntou, aborrecida.
— O que você acha? Que vamos nos casar e vou permitir que você continue saindo com outras pessoas?
— Quantas vezes vou ter que te falar que isso tem que partir de mim, que você não é meu dono para me permitir nada?
— Mas meu amor...
— Vou dormir com mãe! — mencionou sair.
— Desculpa.
Ângela já não ouviu mais. Meneou a cabeça.
Por que ele aceita essa situação? É um homem bonito, rico, não precisa disso. — Pensou. Olhou a hora e ligou para Fernando.
Conversaram por meia hora. Ela foi à cozinha, onde encontrou Fabí tomando água.
— Oi... Achei que você...
— Discuti com Anselmo — interrompeu a cunhada.
— Essa história de vocês é muito estranha. Mas não vou me meter. Está tudo bem?
Anselmo chegou à cozinha.
— Fabí, precisamos conversar — falou e viu a irmã. — Ângela, desculpa.
— Anselmo, me deixe sozinha, por favor. — pediu de cenho franzido, exausta daquela situação. — Preciso pensar sobre tudo isso. Vou dormir com minha mãe.
— Vamos conversar. Você precisa parar de sair correndo toda vez que estamos falando de coisa séria.
— Não estávamos falando. Você estava impondo coisas a mim. É sempre assim, você acha que é meu dono só porque aceitei... — virou-se e olhou para Ângela. Deu de ombros, pois os dois estavam na porta, ela não poderia ter saído. — casar com você.
— Tudo bem, eu vou parar com isso, mas volta para o quarto.
— Você sempre diz isso, Anselmo. — Olhou para Ângela e respirou fundo — Desculpe, Ângela. Mas isso é inevitável.
— Com licença! — Ângela pediu e saiu levando um copo com água.
No dia seguinte, Fabí estava se arrumando para voltar para Salvador e levar a mãe de volta a Lauro de Freitas. Anselmo estava no quarto convencendo a irmã a conversar com Fabí.
— Não quero me meter na relação de vocês, Anselmo. Está na cara que esse casamento é um equívoco. Você não precisa disso, meu irmão. Não sei o que acontece, mas para agora.
— Eu a amo tanto que cheguei a adoecer quando brigamos e nos separamos há três meses. — Anselmo contou em lágrimas ignorando o pedido da irmã. — Ela gosta de você, sei que se você falar com ela, ela reconsidera.
— Nos conhecemos ontem. Como você garante que...
— Por favor, Ângela, não sei viver sem ela. — Soluçou cortando-a e tentou limpar o rosto com a parte de trás da mão.
— Tudo bem, Anselmo, eu falo com ela, mas depois falaremos sobre isso.
Anselmo sorriu e abraçou a irmã. Ângela o conhecia muito bem. Ele realmente não amava Fabí de verdade, era apenas mais um capricho seu para ter o que não podia e isso era um grande problema.
Quando chegaram a Salvador, Anselmo se ofereceu para levar Benta em casa a fim de deixar as duas sozinhas para que conversassem.
— Ele te pediu para falar comigo, não foi? — Fabí deduziu, cansada.
— Foi. — Ângela respirou fundo, e segurou as mãos de Fabí, que a olhou nos olhos. — Não sei que amor é esse, mas ele entrou em desespero quando veio me pedir para falar com você.
— Não vou acabar com o noivado — garantiu e desviou o olhar do dela. — Vou me casar com ele.
— Meu irmão nunca foi de enlouquecer dessa forma por mulher nenhuma. Você é especial e merece ser feliz de verdade, Fabí.
— Fiquei furiosa porque ele exigiu que eu peça minha exoneração do corpo de bombeiros, não me perguntou nada, apenas mandou, quase fui no inferno. Odeio isso. — Coçou a cabeça e passou a mão na testa, nervosamente.
— O quê? Não acredito nisso. E você vai aceitar isso assim? Imagino o quão seja difícil conseguir um cargo como o seu — falou e pegou o celular para ligar para o irmão, mas foi impedida pela bombeira.
— Deixe. Anselmo sempre fez isso comigo. Mentiroso, machista! — Tinha os olhos vermelhos. — Alegou que o Rio é perigoso demais para eu só pedir transferência, ele é delegado, vou correr risco. — Soltou o ar pela boca. — Desculpe, é seu irmão, mas não é santo.
— Se está errado, isso não importa, pode até mesmo ser o meu pai. Verdade, por mais que doa, é sempre melhor. E existe perigo em todo lugar. Sou a favor da honestidade.
— Esse é o problema, sou sincera demais com ele. Essa discussão começou porque eu disse que você é bonita.
Ângela franziu o cenho e sorriu.
— Ele ficou com ciúme da gente?
— É. Isso é para você ver o que eu sofro. Ele chegou a colocar uma escuta em mim, só para descobrir se eu o estava traindo.
— O quê? — indagou, chocada. — Ele é louco e eu não sei? Meu Deus! — Fitou Fabí nos olhos e perguntou: — E você estava?
— Não, claro que não. Era a mulher mais fiel do mundo. Mas depois disso passei a sair com outras pessoas.
— Como assim? Ainda estou completamente surpresa com o que o meu irmão foi capaz de fazer. — Passou as mãos nos cabelos. — E isso de sair com outras pessoas, foi assim tão simples? Não me vejo fazendo isso... Traindo. Acho que é uma das piores dores.
— Não foi simples. Eu me senti o pior ser do mundo. Você não sabe o que é ser digno de tamanha desconfiança. Como não tenho trava de nada e vi que sentimento bom passava longe dele, eu passei a sair com outras pessoas. No início foi só amizade, depois com o inferno que Anselmo fazia da minha vida, eu fui lá e fiz tudo o que eu estava sendo acusada. — Apoiou os cotovelos nos joelhos olhando para a frente e olhou para Ângela. — Mas me diga, Fernando traiu você?
— Não — respondeu tentando se livrar daquela tensão. — Não que eu saiba. — Fitou-a nos olhos, que correspondia àquele contato visual.
— Acho que o Anselmo vai morrer de ciúme — Fabí disse e se levantou do sofá onde estava. Adiantou-se até a janela. — Você é linda e vou dizer isso sempre.
Ângela sentiu um arrepio intenso percorrer todo o seu corpo naquele momento.
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