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Capítulo CLXXIII - MALU

Um mês depois da invasão, nossa vida parecia estar cada vez mais longe da tão sonhada normalidade. Eu e o Bruno conseguimos voltar a morar na dona Gorete e, como a fábrica vivia sempre a procura de funcionários, conseguimos nossos empregos novamente.

O escândalo do hospital foi notícia em todos os jornais do país e as provas que a Helô conseguiu, apareceu em todos os noticiários. Pelo menos tiveram a decência de manter nossos nomes em sigilo.

Além da Sara, mais três crianças e a Vera morreram no incêndio e esse fator acabou tornando a notícia muito mais dramática e sensacionalista e todos quiseram ganhar com isso. Na semana seguinte já tinham esquecido da nossa existência e foi possível voltar a viver nossas vidinhas miseráveis. Quanto ao médico, não tivemos qualquer notícia sobre ele, o que não reduziu em nada a nossa apreensão. A ideia de que ele pudesse estar planejando alguma coisa não saía da nossa cabeça.

O Pacheco não era mais nosso encarregado, mas um cara ainda mais insuportável chamado Roberto tomou o seu lugar. Ele vivia pegando no nosso pé, mas já estávamos habituados com isso. Durante o almoço, o Zeca sempre dava um jeito de se juntar a nós, mesmo que o almoço dos funcionários da linha de produção fosse separado dos do escritório.

No final do expediente eu sempre voltava para casa com o Bruno, enquanto o Zeca ia para o curso. Depois de tomar banho, ele saía para encontrar a Helô na nova casa deles.

É claro que depois de tudo o que aconteceu, o governo não ia deixá-los morando naquela casa abandonada e tratou de arranjar um local adequado para eles. E com adequado, refiro-me a uma pensão muito parecida com a que morávamos.

Além de casa nova, eles fizeram todos os seus documentos e arranjaram empregos para eles. O Tavinho e a Dani foram matriculados em escolas de turno integral e, mesmo que eles vivessem reclamando que eles só ensinavam coisas óbvias, estavam super contentes.

Com a prisão dos responsáveis pelo hospital, autoridades de outros países vieram assumir a gerência dele e fizeram vários exames e testes na gente. Tínhamos que fazer visitar periódicas aquele lugar para que eles acompanhassem nossa saúde e evolução.

Eu estava tão distraída, que não notei quando o Zeca atravessou a parede para o meu quarto. Ele fazia isso todas as noites, quando chegava do curso.

– Estava pensando no quê? – perguntou, sentando na cama do Bruno.

– Nisso aqui. – Mostrei um folheto de uma escola técnica. – Estava pensando em dar um rumo para a minha vida. O que você acha?

Ele sorriu e me deu um beijo rápido.

– Acho uma ideia ótima. Você não quer ficar ouvindo os desaforos do Roberto para sempre, né?

– Eu não vejo a hora de poder mandá-lo para o inferno – respondi.

Ele se levantou da cama do Bruno e se deitou na minha e eu me deitei ao seu lado, abraçando-o.

– Nós já passamos muito tempo das nossas vidas com medo e fugindo. Acho que já passou da hora de vivermos como pessoas normais. Eu sei que ainda parece estranho, mas a gente vai conseguir.

– Enquanto você estiver comigo, eu não tenho dúvidas.

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