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Capítulo 1: A Fuga


Maite

Sempre desejei conhecer meus pais. Ou pelo menos saber quem eram e por que me abandonaram no Orfanato Luz. Talvez nunca tenha respostas para isso, mas o que sei é que aqui conheci Angelique e Ana, minhas irmãs de coração. Somos inseparáveis.

O Orfanato Luz é sombrio. Não só pelo prédio antigo, com suas paredes descascadas e corredores que parecem sussurrar histórias, mas também pela presença inquietante da diretora. Ela é pálida demais, sua pele sem vida, como se o sol nunca a tocasse. Nunca está por aqui à noite, e sempre veste preto, como se carregasse um luto eterno. Há algo nela que nunca fez sentido, assim como o fato de nunca termos permissão de sair daqui, mesmo quando já temos idade suficiente. Outras meninas vão embora, mas nós três? Nunca.

Por três anos, eu, Angelique e Ana guardamos cada moeda que conseguimos trabalhando como garçonetes em um restaurante local durante o dia. Nosso plano? Fugir. Longe do México, longe deste lugar, para um país onde a liberdade seja possível.

Hoje é o dia. É tudo ou nada.

Enquanto as meninas arrumam nossas coisas no quarto, fico na sala distraindo as outras garotas. Não podemos deixar nada suspeito, nenhum rastro. O sino toca, anunciando a hora de irmos para as camas. Regras são sagradas aqui, e quebrá-las significa punição severa. Mas hoje, essa regra será ignorada.

Ana
O alarme do meu celular vibrou suavemente às 00h30. Coloquei no modo silencioso para que ninguém acordasse. Aqui, celulares são proibidos, mas nós conseguimos contrabandear um. Esse pequeno aparelho é a nossa salvação.

Levanto com cuidado, tentando não fazer barulho, e olho ao redor. Maite e Angelique ainda dormem. Ouço um ruído vindo lá de fora. Espio pela janela e vejo a diretora saindo às escondidas. A rua está deserta, escura e silenciosa como sempre. Não sei como ela não tem medo.

Aproveito o momento e sussurro para as meninas:
— Meninas, acordem! Está na hora! A diretora saiu. Essa é a nossa chance!

Elas tentam me fazer perguntas, mas não respondo. Não há tempo. Pegamos nossas mochilas e itens essenciais. Descemos as escadas com passos leves, como se cada degrau pudesse trair nossa fuga. Na cozinha, pegamos algumas coisas para comer durante a viagem. A porta dos fundos range um pouco, mas conseguimos sair sem que ninguém nos visse. Pelo menos é o que achamos.

Caminhamos pela escuridão até a pensão onde Ana reservou um quarto. Um alívio misturado com medo nos toma. Conseguimos sair, mas o que vem agora?

Angelique
Ainda é madrugada, mas a escuridão nunca me assustou. Na verdade, ela me conforta. Enquanto Maite e Ana dormem, decido sair do quarto por alguns minutos. A luz da lua me alimenta de uma forma que elas jamais entenderiam, e poder sentir isso e livre daquele lugar, me deixa mais tranquila.

A noite estava silenciosa e calma, sem nenhuma alma viva na rua, porém uma sensação inquietante percorre em mim .

"Estou sendo observada"– pensei!

Meus olhos captam um movimento, em um beco e de longe, um homem aparece. Seus olhos verdes brilham no escuro, como duas esmeraldas vivas. Ele me olha fixamente por alguns segundos, e antes que eu possa reagir, ele vira e começa a se afastar.

"Estranho"– falo em voz alta, pra mim mesma parece mais um gato, com esses olhos do que com um humano.

Algo dentro de mim quer segui-lo, mas não posso. Não posso deixar as meninas sozinhas. Volto ao quarto com o coração acelerado, mas não conto nada a elas. Não quero preocupá-las, mas sei que aquilo não foi normal.

Quando o dia começou a clarear, o sol estava mais forte, como se nos desse  boas-vindas a um novo começo.
Saio, e vou pegar algo para comer, enquanto elas ainda dormem.

Ahhh– Ana boceja, se espreguiçando na cama, acordando Maite que está do seu lado.

–Bom dia meninas! – sorrio pra elas, deixando a bandeja na mesa e  indo em sua direção para abraçá-las.

Maite
Acordo  com o bocejo de Ana, e com o aroma de café que Angie trouxe do pequeno refeitório da pensão. Tudo parece calmo, mas algo nos olhos de Angelique está diferente. Conheço-a bem o suficiente para saber que ela está escondendo alguma coisa.

— Tudo bem, Angie? — pergunto, desconfiada.
— Sim, só estou um pouco cansada — responde, desviando o olhar.

Sei que não é verdade, mas decido não insistir para não deixa-lá ainda mais incomodada, além disso, ainda temos coisas urgentes para resolver. Hoje é o começo da nossa liberdade, e precisamos pensar nos próximos passos.

Angie vai até a janela, enquanto eu e Ana nos alimentamos.

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