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O cadeado

Cássia se encontra no CCO14, o centro de controle do Bureau localizado no interior do estado de São Paulo, para ajudar a decidir qual seria o futuro dos capturados.

Após quinze minutos de discussões com Dr. Oliveira, foi resolvido o que fazer com o médico e o segurança do deputado.

O primeiro a ser preparado é o segurança. Ele é retirado de seu cativeiro com a ajuda de uma cadeira de rodas, com os olhos vendados e ouvidos cobertos por fones que tocam Black Sabath ele e é conduzido para uma sala bem no centro do CCO14.

Ao chegar na sala, os fones e as vendas são retirados, ele pode ver a mulher que o havia capturado há algumas noites. Ela estava diferente, seus cabelos pretos e lisos estavam amarrados num rabo de cavalo, usava tênis, calça jeans e um jaleco branco.

Do lado de Cássia o segurança pode ver um homem de meia idade, corpo atlético e cabelos um pouco grisalhos. Este vestia roupas todas brancas, tal qual um profissional de saúde. Ele carregava um olhar desconcertante, com uma das sobrancelhas elevadas, e um sorriso com ar de empáfia no canto da boca, como se estivesse a zombar de tudo o que o cercava.

A sala tinha um leve cheiro que lembrava um consultório dentário, devia ter uns trinta metros quadrados, não tinha janelas, a entrada era guardada por duas portas metálicas grossas. Paredes, teto e piso eram da cor bege. O segurança teve um mau pressentimento ao adentrar o local, pensou que não sairia dali.

Cássia e o Dr. Oliveira dão as boas vindas. Como era de praxe eles explicaram à vítima o que seria feito.

- Existem dois tipos de encriptografia da mente, o primeiro consiste em deixar a pessoa consciente e paralisada. Ela poderá ver e ouvir tudo, mas não poderá se comunicar ou mover um único músculo. O segundo tipo de encriptografia da mente consiste em aprisionar a memória do indivíduo, gerando uma espécie de amnésia permanente, permitindo que ele tenha lembranças apenas de alguns minutos, impossibilitando que ele consiga raciocinar e estabelecer relação entre fatos, indivíduos e lugares, a pessoa fica débil. Você entende isso? - Dr. Oliveira pergunta ao segurança.

Após a resposta afirmativa entregaram um papel e uma caneta para que ele pudesse escrever algumas palavras, qualquer coisa que quisesse naquela folha. Disseram a ele que talvez nunca mais reconhecesse seus familiares, mesmo que eles o encontrassem na rua (o que seria muito difícil).

Deram-no dez minutos. O homem não acreditou nas palavras que acabara de ouvir, mas estava apavorado. Pensou que seria morto, "mas pra que toda essa cerimônia?". Uma grande confusão mental o invadiu, já estava preso ali por um longo tempo e sentia que algo ou alguém viria ao seu socorro.

Ele não era uma pessoa religiosa, mas rezou por todas aquelas intermináveis horas em que esteve em poder daquelas pessoas. E agora "essa conversa de apagar memória"... lembrou do comportamento do prefeito, seu patrão e amigo, o padrinho de seu filho, o entregando assim sem nenhuma explicação. "Ele estava muito estranho" pensou. "O que é que aquele cara queria dizer quando falou que o Dr. Mendonça era seu cão? Que lugar é esse? Meu Deus! Acho que não vou sair daqui"...

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O desespero invadiu a alma do segurança e ele pensou que realmente deveria escrever algumas palavras. Então pegou a caneta olhou para o papel branco e muitas coisas vieram a sua cabeça, sentia uma enorme necessidade de falar com sua família através daquela carta, mas lembrou que teria apenas dez minutos e talvez apenas aquela folha de papel fosse pouco para dizer o quanto amava sua família.

Sua esposa, seu filho, sua querida mãe... aos prantos escreveu em tom de despedida, mas alguma coisa dizia a ele que a carta não seria entregue aos destinatários, mas mesmo assim decidiu escrever aquelas poucas palavras carregadas de forte emoção, era uma maneira de se despedir sem vê-los, era como se ele pudesse abraça-los.

Cássia recolheu a carta e a caneta, olhou para o médico e sorriu, saiu pela porta.

Dr. Oliveira prendeu os braços do homem mais firmemente junto aos apoios da cadeira. Colocou Heroes de Bowie para tocar, o segurança continuava em prantos. Dr. Oliveira foi até um enorme armário pegou três frascos leu atentamente os rótulos, consultou uma tabela no computador da sala e realizou alguns cálculos, acompanhava as batidas da música com os frascos, fazendo um som estridente e irritante.

O segurança assistia o médico pegar aquelas coisas com o mesmo olhar de um animal imobilizado que sente o cheiro da morte no ar quando vê e ouve seu algoz amolando uma faca. As batidinhas dos frascos eram aterrorizantes.

A música de Bowie já estava tocando pela terceira vez, Oliveira pega uma seringa numa gaveta e a põe no balcão. Pega uma agulha e a retira da embalagem plástica, encaixa na seringa.

O segurança assiste a tudo resignado, pensa que aquilo poderia ser apenas um sonho e que logo acordaria...

Oliveira pega o frasco do meio, agita e o fura com a agulha da seringa, vira o vidro com a base para cima e puxa dois ml do líquido, põe o frasco novamente no balcão, confere as informações na tela do computador, acompanha as batidas da música batendo com uma das mãos na sua coxa.

O médico vira-se para o segurança e caminha em sua direção com aquele sorriso no canto da boca. Passa um algodão molhado no braço que receberá a aplicação. O segurança sente o cheiro forte do álcool.

- Agora você será inocente novamente meu amigo, nós vamos lhe absolver de todos os seus pecados - diz Dr. Oliveira com os olhos bem vidrados.

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Após aplicar a primeira injeção o médico do CCO volta para o balcão e dispara um cronômetro. Pega dos outros frascos e pacientemente mede três ml de um frasco, pega o outro e puxa mais um ml na mesma seringa, misturando as substâncias para uma nova aplicação. Deixa a seringa no balcão e checa o cronômetro. Vai até o computador e realiza alguns registros na ficha do "paciente" e sai da sala.

O segurança sente seu corpo formigar e sua vista começa a chuviscar ele não consegue firmar sua visão em nenhum ponto da sala, era como se a cadeira estivesse girando.

O médico retorna com uma xícara nas mãos, confere o cronômetro, toma um gole do café, põe a xícara no balcão, pega a seringa e caminha até o aparelho de som, aumenta um pouco mais a música, agora ele vai até o segurança e aplica-lhe a segunda injeção. O homem sente dessa vez uma forte ardência no local da aplicação, sente seu braço queimar, não consegue resistir e começa a gritar!

- Está queimando! O que é isso! Vocês vão me matar seus filhos da puta! Está queimando! - grita de dor o homem.

O médico volta para o balcão, descarta a seringa e volta para o computador e seu café.

A ardência começa rapidamente a dar lugar a um forte formigamento, a respiração do segurança vai ficando curta e acelerada e ele começa a suar e se dar conta que não acordaria do pesadelo.

A cada segundo ele pensava "meu Deus! Eu realmente estou aqui!", noutro segundo sua mente se voltava para a sua cidade, via sua mãe, de repente se dava conta que estava preso naquela cadeira, olhava ao redor e ficava apavorado, aquilo não parecia ser real! Seus olhos estavam pulsando e sua vista não parava de chuviscar, como se fosse uma tv fora do ar.

Mais alguns minutos e via sua esposa com seu filho nos braços, ele estende as mãos mentalmente, mas não consegue alcança-los, "meu Deus! Eu realmente estou preso aqui!". Fecha os olhos e vê seu cão pular em seu peito ele tenta pegá-lo, mas novamente seu consciente o chama para a dura realidade: "estou preso nessa cadeira!".

Ele fecha os olhos novamente e dessa vez vê a sala onde está preso à cadeira, nenhuma lembrança familiar vem em sua mente, mas aquela sensação de se dar conta que aquilo não era um sonho e ele realmente estava ali continuava a apavorá-lo.

Sua visão foi ficando cada vez mais escurecida era como se ele estivesse prestes a desmaiar, mas o desmaio não vinha. Sentia o peito apertado como se estivesse envolto em concreto seco e a respiração era curta e rápida, o ar entrava como se já estivesse saturado e quente. Sua mente girava como um pião revelando a cada instante que ele estava ali!

Já não ouvia mais a música, já não enxergava mais nada, era como se estivesse dormindo acordado e era impossível mover-se ou tentar acordar. A única coisa que acontecia era se dar conta de que estava ali, e sempre se surpreendia.

Heroes de Bowie continuaria a tocar por mais doze horas sem parar.

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No outro dia Dr. Oliveira e Cássia foram verificar o paciente. Entram na sala, desligam o som e caminham até o "ex-segurança", Cássia o chama, mas não obtém resposta. OLIVEIRA pega um frasco remove a tampa e põe próximo às narinas do homem. Após alguns segundos ele acorda.

- Olá rapaz! Tudo bem?

O homem o olha por alguns segundos e depois se vira pra Cássia. Ele tenta falar, mas não sai nada além de um som balbuciado.

- Como você se chama? - pergunta o psiquiatra.

O homem olha para a janela, depois para o chão. Franze o cenho como se estivesse realizando uma operação matemática complexa. Depois de alguns segundos pergunta balbuciando:

- Como vim parar aqui?

Cássia e Dr. Oliveira entreolham-se, sorriem e soltam o ex-segurança da cadeira.

- Tudo vai ficar bem! Nós vamos levá-lo pra casa, mas primeiro vamos comer alguma coisa você deve estar com fome.

Cássia passa as mãos maternalmente nos cabelos do homem e arruma os botões de sua camisa.

- Pra casa? Onde eu moro? Quem sou eu?

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"...A maioria das pessoas não enxerga o óbvio..."

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