Capítulo Vinte e Oito: Uma Por Várias.
--- Como se sente? --- Alasca sentou ao lado da irmã.
Ice estava de cama há quase quatro dias, tivera crises de tosse, febre, indisposição, mais crises asmáticas e perdera peso, além de estar mais pálida que o normal.
Mas estava melhorando.
--- Acho que já posso sair dessa tenda. --- A bruxa deixou o chá de lado --- Alguma notícia do Eisb? Ele já respondeu?
--- Até essa manhã não. Mas, Gless está a mais de seis dias daqui a cavalo, talvez menos para o falcão, bem voando deve ser dois ou três, ele pode já estar a caminho. --- Consolou.
--- Tem razão, espero que nosso irmão consiga resolver o problema com o chanceler. --- Ice ficou em silêncio por um tempo, continuando com um tom preocupado --- Eu atrasei nossos planos, não atrasei?
--- Talvez tenha sido melhor assim. --- Alasca tocou o ombro da irmã --- Sua saúde é importante, Ice, e quem se importa de estarmos pouco mais de dez dias do casamento? É só um detalhe!
A gêmea de olhos brancos balançou a cabeça, os cabelos platinados presos numa trança longa, e olheiras sob os olhos, o branco das íris um pouco sombrio.
A recuperação de Ice havia sido acelerada graças as habilidades dela em cura própria, se curando de dentro para fora lentamente, os vários chás e incisões feitas por Alasca e Octávia a ajudaram muito também.
--- Sabe, os meninos revisaram o plano e o mapa do castelo, mudaram algumas coisas na estratégia, e estamos mais preparados até. --- A gêmea de olhos azuis contou, tentando animar a irmã --- Eu até mesmo melhorei com a espada, acredita?
--- Queria ter podido evoluir em algo também. --- Suspirou a outra --- Mas estou feliz por você, irmã.
--- Obrigada! O quê acha de ver meu treino com a Octávia hoje?
--- Acho uma ótima ideia, preciso andar, esticar as pernas, tomar um sol ou vou enlouquecer! --- Ela sorriu.
--- Não garanto muito sol, choveu a noite toda, e há nuvens pesadas sobre o bosque. --- Alasca ficou de pé --- Vou trazer seu almoço.
Levi e Apolo treinavam arco e flecha numa clareira perto do canal, era crucial que todos aprendessem a usar arco para entrarem no castelo, teriam que derrubar os vigias das torres, e conseguiriam um para cada em Temeron.
--- Acho que seria mais fácil para mim acertar aquela nuvem do que o alvo que você enfiou lá do outro lado. --- Reclamou o ex cavaleiro.
Levi observou o alvo de madeira, branco e pequeno, preso num carvalho alto do outro lado do bosque com expressão irritada.
Três flechas estavam cravadas no centro do alvo, muito próximas umas das outras, Apolo quem havia atirado-as.
--- Se quer tentar a nuvem, fique a vontade. --- Apolo mordeu uma maçã suculenta e continuou --- O sol pode ser o próximo, não pode?
--- Que tal sua testa ser a próxima? --- Devolveu o outro, sacudindo uma flecha para o loiro.
--- Que tal essa maçã? --- O assassino mostrou a fruta vermelha --- Se conseguir acertar, seu treinamento acaba aqui, mas, se eu acerta-la, vai lavar minha capa e lustrar minhas botas.
--- Está brincando? --- Levi levantou as sobrancelhas, com incredulidade.
--- Não. --- O loiro se aproximou do ex cavaleiro --- Você escolhe onde maçã vai ficar e atira, e depois eu faço o mesmo.
--- Você não regula muito bem, sabia? --- Levi pegou a maçã, caminhando até uma pedra, não mais que dez metros de distância --- Saudades da minha espada...
O ex cavaleiro se posicionou e armou a flecha, mirando o melhor que pode, não tinha muitas experiências com arco, com os braços trêmulos e sem firmeza puxou a corda e soltou a flecha, errando a maçã e ficando-a numa árvore.
Apolo riu.
--- Você é uma negação, pedrinha. --- O loiro se adiantou em pegar a maçã, e se aproximou do ex cavaleiro --- Para ser justo, vou atirar da mesma distância.
--- Ao menos isso. --- Ele deixou o arco no chão e cruzou os braços.
Apolo sorriu, era alguns centímetros mais alto que Levi, e não teve dificuldade em deixar a maçã sobre os cabelos castanhos escuros do ex cavaleiro, que franziu as sobrancelhas.
--- Que acha que está fazendo? --- Levi tentou retirar a maçã, mas recebeu um tapa na mão.
--- Escolhendo meu alvo. Agora fique quieto, pedrinha.
Sob o olhar incrédulo de Levi, o loiro pegou o arco de madeira e uma flecha, indo se posicionar ao lado da pedra onde outrora estivera a maçã que, agora jazia na cabeça do ex cavaleiro.
--- Você não vai mesmo atirar, vai? --- Levi perguntou, sentindo o coração errar uma batida quando o loiro mirou --- Apolo?!
--- Shhh. Estou tentando me concentrar. --- O loiro colou a flecha na bochecha, os dedos firmes sobre o arco --- Melhor ficar parado.
Antes que o ex cavaleiro pudesse retrucar, ou gritar como estava se segurando para não fazer, Apolo atirou.
A flecha percorreu a distância veloz, então acertou a maçã, e a levou consigo para ficarem presas numa árvores.
Levi gritou, passando as mãos pela cabeça, se certificando de que não havia flecha nenhuma lá, e suspirando de alívio ao ver que estava perfeitamente bem.
Então, ele se enfureceu.
--- O quê você tem na cabeça?! E se tivesse me acertado?! --- Exclamou pondo as mãos na cintura.
--- Calma, pedrinha. --- Apolo prendeu o arco nas costas --- Você está bem, não? Eu ganhei, e você vai gostar de levar minha capa, as botas então, irá amar!
--- Seu desgra...
--- Olha boca. --- Apolo interrompeu, indo arrancar a flecha da árvore --- Vou ter que lavar com sabão? --- Debochou.
--- Vou te dizer o que fazer com esse sabão. --- Levi rebateu seco, e então pegou a aljava e seu colete, deixados perto de outra árvore --- Fim do treino.
--- Estou mesmo querendo uma pausa. --- Apolo concordou.
Os dois deixaram a clareira para trás e começaram o caminho de volta ao acampamento.
--- Sobre a invasão... --- Levi começou --- Estamos ficando sem tempo, acha que poderemos partir ao final da semana?
--- Ice parece melhor, fui vê-la de manhã, me pareceu bem disposta, se partirmos com ela ao final de semana teremos que ir de devagar, vamos atrasar um dia de viagem. --- O loiro considerou.
--- Viria a calhar, há feiras em Temeron nos finais de semana, muitas pessoas com quem se misturar, passaremos despercebidos, será mais fácil chegar a fronteira.
--- É, seria ótimo, mas, pelas minhas contas, se agirmos com cautela e formos resolver os detalhes do nosso plano para chegar ao castelo, só iremos fazê-lo as vésperas do casamento. --- Apolo informou, desviando de um galho de árvore.
--- Bom, interceptar a comitiva da rainha para entrarmos infiltrados no castelo precisa de planejamento, e de tempo. Teríamos que estuda-los e a rota também.
--- Eu sei, o problema nisso tudo é que Kalias ainda não voltou, ele simplesmente não voltou desde aquele dia.
--- Onde acha que ele está?
--- Perto da rainha Yracedette. --- Apolo respondeu, observando o céu nublado, e ouvindo as correntezas do canal --- Acho que ela vai levá-lo como segurança, para Wells.
--- Isso seria péssimo, Kalias tem boas informações sobre nós, os cavaleiros vão estar de olho, e talvez o plano B seja melhor.
--- Invadir o castelo na cara dura em uma missão suicida? --- O loiro levantou uma sobrancelha.
--- É. Acho que daria certo, eles não sabem que temos três bruxas conosco.
Os dois desceram uma encosta cheia de arbustos, onde o caminho era estreito e tiveram que passar um de cada vez.
--- As meninas são a única coisa entre nós e os cavaleiros sanguinários que tentarão nos matar. --- Apolo ponderou --- Você terá que matar o príncipe, seu príncipe, seu reino, acha que consegue?
Levi ficou em silêncio, parando de andar, Apolo parou ao lado dele, com o acampamento a vista.
--- Vou ter que conseguir. --- Os olhos castanhos estavam sérios, e distantes --- Mas e quanto a rainha?
--- Não há muito cerimônia com ela, qualquer um de nós que estiver livre pode matá-la quando chegar a hora. --- O loiro deu uma batida de leve no ombro do outro --- Se preocupe com o príncipe, os Abraxs costumam ser insanos.
O loiro saiu na frente, e Levi ficou refletindo sobre o que teria de fazer, quando o momento chegasse e eles tivessem que interromper os planos de dois membros da realeza, matando-os.
O grupo já havia debatido sobre o que aconteceria após a morte e o encarceramento dos planos da rainha Yracedette e do príncipe Ângelo.
Os reinos seriam assumidos por outras pessoas, a irmã do príncipe e o único filho da rainha fariam isso mesmo ele sendo quase uma criança, e a chance de tentarem continuar com os planos dos antigos monarcas era mínima.
O povo ficaria furioso, os cavaleiros seriam um problema, mas os verdadeiros inimigos estariam mortos. E talvez, eles também, mas Jeter e a magia que ainda existia nele estaria a salvo.
Os verdadeiros planos de Yracedette e Ângelo eram um segredo confiado a poucos, e era pouquíssimo provável que esses apoiadores tentassem algo sem a proteção deles, da coroa deles.
--- Ah... --- Levi suspirou, a cabeça girando por tanta informação --- Onde eu fui me meter?
Trovão veio trotando para perto do dono, vindo do acampamento, o pelo negro e brilhoso, a crina balançando ao vento. Trovão era o único entre os cavalos que ficava solto.
--- Veio dar sua opinião sobre a minha desgraça? --- Levi sorriu para seu cavalo.
Trovão relinchou, parando ao lado do ex cavaleiro.
--- Bem, qualquer um pode morrer, só estou tentando pegar minha honra de volta, isso se eu sair vivo e conseguir explicar os motivos de matar o príncipe antes de cortarem meu pescoço.
O cavalo bufou, balançando a cabeça e dobrando as orelhas para trás. Levi riu.
--- Parece que você não concorda muito, não é? --- Ele afagou a cabeça do cavalo --- Uma vida por várias, amigo.
Trovão encarou Levi por um tempo, soprando forte pelas narinas, e então deitando a cabeça no ombro dele, que não escondeu a surpresa.
--- Trovão, Trovão, não seja sentimental. --- Brincou, o cavalo se afastou, indo de volta para a o acampamento --- E pensar que ele tentou me matar quando montei nele pela primeira vez.
Levi voltou rindo ao acampamento.
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